domingo, 6 de outubro de 2024

Para os nossos cérebros, quem são os mais perigosos, os teóricos da conspiração ou os media?

 


 6 de Outubro de 2024  ROBERT GIL  

Pesquisa realizada por Robert Gil

Quando programas como “28 minutes” ou “c'est dans l'air” convidam especialistas ou personalidades à volta da mesa que estão de acordo sobre o assunto em debate: notícia ou conspiração? Quando se ouve sempre a mesma coisa, da rádio matutina à televisão nocturna ou na imprensa, e não há opositores que proponham uma forma de pensar diferente: notícia ou conspiração?

Quando os planos de despedimento se transformam em planos de poupança de postos de trabalho, quando é preciso reduzir as camas para que os hospitais nos possam atender mais facilmente, quando é preciso reduzir as aulas para melhorar o ensino, quando é preciso salvar postos de trabalho despedindo pessoas, quando é preciso aumentar o horário de trabalho para reduzir o desemprego, quando é preciso reduzir a despesa pública para não deixar a dívida aos nossos filhos, quando é preciso reduzir a tributação do capital para financiar as nossas empresas, trata-se de manipulação ou de informação?  Depois, para nos fazer crer que qualquer decisão será cuidadosamente estudada no interesse comum, os nossos meios de comunicação anunciam a abertura de “negociações com os parceiros sociais” ou de “consultas com todos os sectores interessados”. Não se preocupem, pessoas de bem, tudo vai correr bem, mas sobretudo fiquem no vosso lugar: manipulação ou conspiração?

Assim, depois de terem sido enganados pelos nossos dirigentes, depois de terem engolido a papa intelectual dos meios de comunicação social, que já não é informação mas se assemelha escandalosamente a manipulação, muitos vão procurar outra verdade. O fosso entre o que o establishment diz e o que as pessoas estão a viver já não é sustentável. E alguns vão atirar-se para o comboio de teorias por vezes estonteantes, mas de quem é a culpa? É culpa das instituições e dos meios de comunicação social, mas também é culpa dos anti-complotistas, porque enquanto parecerem estar ligados ao bloco do poder, serão inaudíveis para os cépticos e desconfiados, que os verão como parte da máquina de propaganda, o que os encorajará na sua busca de outra verdade. E a confusão acrescenta-se à confusão quando é o próprio governo a sugerir que o movimento dos Gilets Jaunes está a ser dirigido (1) pela Rússia e pela Ultra-Esquerda, não estaremos no meio de uma teoria da conspiração?

A armadilha é que as teorias da conspiração são agora utilizadas para dar crédito à linha oficial, e tudo o que vai contra elas torna-se uma conspiração. Há até especialistas em conspirações que dão pontos positivos e decidem o que é conspiração e o que não é. Os jornais fazem sondagens do tipo “é um teórico da conspiração”, juntando perguntas como “acha que a Máfia esteve envolvida na morte de JFK”, “acha que a Terra é plana”, “acredita em extraterrestres” ou “acha que a CIA matou Allende”. Algumas pessoas transformaram a teoria da conspiração num caldeirão onde a razão não tem lugar. Quem faz demasiadas perguntas corre o risco de ser rotulado de conspiracionista. E a esquerda, desorientada, censura-se a si própria, parecendo, para alguns, culpada de apoiar o discurso oficial contra todas as probabilidades. Torna-se assim inaudível sobre certos assuntos e, em vez de os enfrentar, rejeita sem julgamento aqueles que a fariam correr o risco de ser suspeita de ser conspiracionista.

São utilizadas palavras e conceitos fraudulentos para legitimar o discurso oficial. A conspiração é utilizada como meio de censura e para amordaçar a liberdade de expressão: se pensarmos de forma diferente, somos inevitavelmente conspiracionistas. O efeito perverso é que, para evitar ser acusado de conspiracionista, algumas pessoas censuram-se a si próprias e desconfiam dos outros, deixando de ousar abordar certos assuntos por medo da reacção do seu interlocutor. A armadilha está a fechar-se e a única coisa que resta é a palavra oficial, que ocupa toda a paisagem e, por isso, é a única verdade!

Em 2020, o Covid exacerbou as paixões e a palavra “conspiração” foi usada indiscriminadamente. Qualquer pessoa que pusesse em dúvida a versão oficial das medidas tomadas pelo governo, a letalidade do vírus ou a vacinação, era rapidamente rotulada de teórica da conspiração. Os militantes e simpatizantes de esquerda deveriam estar indignados com estes atalhos. Mas não, uma espécie de manta de chumbo faz com que mesmo o “céptico militante” receie ser posto de lado se as suas palavras forem perturbadoras. Será que vamos chegar ao ponto de uma caça às bruxas que ressuscita as horas negras da nossa história recente? Será que nos tornámos completamente estúpidos? Até os activistas críticos estão a defender desenfreadamente as “verdades” dos grandes meios de comunicação social. Tempos estranhos, em que se formam acoplamentos não naturais e em que todo o pensamento crítico é criticado pelas próprias pessoas que supostamente o deveriam fazer.

Ver conspirações em todos os lugares é como ver lugar nenhum, é incoerente. Então, é claro que existem teorias sobre tudo e mais alguma coisa, a internet é uma mina inesgotável. Mas não podemos chegar a um extremo que consistiria em ridicularizar todos aqueles que não se enquadram no quadro das análises mediáticas e que minam a propriedade dos especialistas e professores que obedientemente servem o sistema em vigor. No final, o termo teoria da conspiração é uma dádiva de Deus para aqueles que querem sequestrar o debate, proteger os interesses dos grandes grupos capitalistas e distanciar activistas ou não-activistas de lutas completamente legítimas, fazendo-os parecer teóricos da conspiração. Portanto, desconfiemos, manipulemos, conspiremos, saibamos colocar as coisas em perspectiva, porque toda essa dialéctica serve de controle social e impede convergências que poderiam ser salutares. Conspiração em todo o lado, revolução em lado nenhum!

(1) Le Point, 01/02/2019: "Macron: Éric Drouet é um produto mediático".

 

Fonte: Pour nos cerveaux qui sont les plus dangereux, les complotistes ou les médias? – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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