domingo, 19 de julho de 2015

O Euro é uma mordaça e é a Guerra!

Numa das mais antigas colectividades operárias de Lisboa, a Sociedade Musical 3 D’Agosto de 1885, em Marvila, decorreu no passado dia 9 de Julho do corrente ano uma Sessão Pública organizada pelo PCTP/MRPP, dedicada ao emergente tema  A Dívida, o euro e a perda da independência nacional – qual a alternativa?


Na parte final da sessão houve lugar a um debate muito rico. É a intervenção do meu camarada Arnaldo Matos, um dos fundadores do MRPP, que aqui transcrevo na íntegra, sugerindo vivamente a sua leitura eanálise, dada a importância e profundidade do seu conteúdo.

A edição e revisão do registo audio desta intervenção são da inteira responsabilidade do autor deste blogue.

Um aspecto que é importante abordar é que a União Europeia não é esse carneiro disfarçado que anda por aí a passear.

É que Lenine também escreveu num artigo posterior àqueles dois que foram aqui citados, que os Estados Unidos da Europa são a guerra. E o elemento de guerra que está já em progresso não é aqui citado por ninguém e parece que nós vivemos no melhor dos mundos.

Não se esqueçam que todo o assalto ao Norte de África foi feito pela União Europeia e pelo imperialismo americano. Portanto, o que Romel não conseguiu no Norte de África a senhora chancelerina Merkel já conseguiu, parcialmente.

A guerra já começou também na Ucrânia e ninguém sabe onde é que vai parar. Mas a guerra, para poder estender-se para fora da União Europeia, teve que começar por ela própria, primeiro do que o euro, que foi a guerra nos Balcãs. Uma necessidade de a Alemanha chegar ao Mediterrâneo.

Portanto, tudo isto é guerra! Desde que se deixou de ter a Comunidade Económica Europeia (CEE) e se passou a ter a União Europeia não tivemos um momento sem guerra na Europa! E parece que as pessoas não se preocupam com isto! Excepto quando ela chegar cá! Ou chegar à Grécia como vai acontecer provavelmente dentro de breve tempo.

Portanto, a história da guerra, nós temos de estar preparados para ela, isto é, para lutar contra ela e não fazer a guerra do imperialismo alemão. A Alemanha, e a União Europeia actual não é outra coisa senão o império alemão, já em três guerras que fez em 150 anos, ia destruindo a Europa toda: 1870, 1914/18, 1939/45 e agora. Esta ainda está a começar.

E parece que ninguém quer ver o óbvio! Toda a gente fala em euro, o euro é uma “boa moeda”, traz-se no bolso, tilinta, mas ninguém se preocupa com mais nada. Só quando estivermos todos envolvidos numa guerra até ao pescoço, então é que se vai ver quais foram os erros que se cometeram, e vai-se ver nessa altura onde é que se colocarão os que venderam o país até agora.

Mas o euro também tem uma história de luta de classes. O euro não é apenas uma questão monetária, é uma questão política e é o preço que nós recebemos por ter vendido a nossa classe operária! Nós vendemos os operários e deixámos de ter a força da revolução e eles mandaram para cá o euro para fazer o que quiserem e que os senhores já estão a ver o que já estão a fazer na Grécia.

Portanto, o problema aqui é que este euro tem uma dupla faceta. Uma das facetas é a que serve para acumular o capital fixo, isto é, serve para investir. E outra das facetas é que serve para roubar. Estas duas facetas nunca são vistas por ninguém, ou é só vista uma delas ou então nem sequer se fala em nenhuma delas.

Também queria chamar a atenção do exemplo da Grécia porque, como dizia um poeta latino, quando se fala da Grécia é de nós que estamos a falar. Para citar essa imagem poética, adaptada a outras circunstâncias, mas parafraseando o poeta, quando se fala da Grécia é de nós que estamos a falar.

Ora os senhores já viram o que aconteceu na Grécia neste momento. Vocês sabem como é que vive um grego hoje? Um grego hoje não tem dinheiro para comer, não tem dinheiro para tratar-se, não tem dinheiro para deslocar-se. A Grécia está neste momento num estado de pavorosa desregulamentação.

E é com essa base que eles vão tentar fazer vergar o Syriza, esse “partidomeco” que tanta gente gosta dele, sem ver as consequências da política desse partido. Mas, evidentemente, é assim que vive a Grécia. A Grécia está de joelhos. A Grécia foi arrombada pela União Europeia. Foi roubada e arrombada!

E os partidos que tem não estão à altura dos acontecimentos porque não se pode ganhar umas eleições sem prometer sair do euro. Os países pobres da União Europeia, que correspondem à orla do Mediterrâneo, estão contra o resto do império alemão. Estiveram toda a vida em que houve império alemão, em 200 anos! E vão continuar a estar agora.

Não há outra forma de dar conta disto. É preciso ler o Brodel, é preciso ler o que as pessoas que conhecem o que é história escrevem, para perceber o que é que se está a passar. Se não, ninguém sabe o que é que se está a passar!

Ora muito bem, se a Grécia pensava, há uma semana, que era melhor não sair do euro, eu gostaria de ver, se fosse feito na próxima 2ª feira(13 de Julho) o referendo, o que é que a Grécia ía dizer da saída do euro. Porque agora é que a Grécia está a perceber porque é que o euro é uma mordaça. Agora é que está a perceber!

Os senhores lembrem-se de uma coisa, nunca se esqueçam disto. Quando foi criado o Banco Central Europeu, ele era a união de todos os bancos europeus. E por isso, os bancos europeus deixaram de emitir moeda, mas o Banco Central emitiria a moeda necessária para os bancos europeus poderem trabalhar. E neste momento o que eles fazem é que eles não dão dinheiro, como nos termos do acordo que assinaram deviam dar, para a Grécia fazer o seu curso normal do comércio interno.

Portanto, eles liquidaram a Grécia. Eles querem que a Grécia seja um exemplo para todos nós. Eles querem que o povo português trema só de ouvir falar na Grécia. Se ajoelhe, só de ouvir falar na Grécia. E que em vez de criar um partido a sério, queira criar um Syriza. Isto é, uma cambada de bandalhos, que são à esquerda dos outros que deram cabo da Grécia, mas que não estão à altura dos acontecimentos.

É preciso romper com a Alemanha, é preciso romper com a Europa, é preciso romper com a União Europeia, é preciso romper com o euro e só um partido nestas condições é que pode ser, é que pode chegar algum dia a ter a estima do seu povo. E isto é uma coisa que não foi aqui bem clarificada.

Eu quis chamar problemas ao debate, não para criar medo, porque nós precisamos de não ter medo. O que eles estão é a querer meter-nos medo. Dizem, não façam nada porque senão vão acabar como o Syriza. Os senhores não façam nada porque senão vão acabar a levantar 60 euros por dia, se tiverem 60 euros para levantar. É isto que está aqui em causa. E é contra isto que a gente tem que lutar.

Sim, nós estamos do lado dos gregos, mas aquele governo dos gregos não serve para nós. Tem de ser outro. E também não serve para a Grécia. E isso a gente já vai ver. Lembrem-se de uma coisa, os gregos nunca cedem. Os gregos desde que estão numa situação que pensem que é o estreito das Termópilas, morrem todos mas não cedem. Lembrem-se disto!

Nós temos uma costela dessa resistência na nossa história. Nós também não cedemos. Mas temos uma outra dificuldade. É que cedimos(nota do blogue – cedemos) muito antes de levantar o cabelo. Temos também uma outra característica, a característica de que vamos aceitando as coisas e só quando já não é possível aguentar mais é que alguém levanta o cabelo. E nunca é as forças armadas, é sempre o povo. Sempre o povo.

Nós precisamos sair do euro. Isso é uma questão de liberdade do nosso país. Da autonomia e independência do nosso país. Se nós não sairmos do euro, vamos passar a vida a engraxar e a lamber as botas ao imperialismo alemão. Não há alternativa aqui. Não me interessa saber o que diz o PCP, não me interessa saber o que dizem os outros partidos, interessa-me saber que esses partidos estão, de uma forma geral, do lado do imperialismo alemão. Duma forma geral, alguns mais, outros menos.

Mas não é o caso do PS. Nem quer discutir. Eu assisti noutro dia a um debate na SEDES em que o PS e o PSD pretendiam proibir que se falasse sobre a dívida nesse debate. Não falem nisso, porque cada vez que se fala da dívida...aumentam os impostos, aumentam os juros! Aumenta tudo desde que a gente fale da dívida!

Ora bem, nós temos de falar na dívida. E temos de falar na dívida para dizer que não a pagamos, para dizer que queremos sair do euro, para dizer que queremos uma nova moeda e para dizer que há outro caminho. Ora, é preciso ver que eu também sou contra aqueles que acham que é preciso pedir ajuda à Alemanha para se sair do euro. Eu acho que se deve sair ao coice. Não é pedir ajuda, é sair ao coice.

Isto é, sair em ruptura. Essa ruptura, a classe operária portuguesa é fraca para fazê-la, mas os patriotas são suficientes para fazê-la. E essa ruptura permite-nos criar, com as condições que nós temos, permite-nos criar um país novo e um país com capacidade de aliar-se a uma quantidade de países no mundo.

Os senhores não se esqueçam duma coisa. Os senhores sabem quais são os grandes países asiáticos? São, a maior parte, países mais pequenos do que Portugal. Os grandes países, os tigres asiáticos, do desenvolvimento económico capitalista, são – tirando o caso da China e tirando o caso do Japão (que aliás está de rastos) -, são países ainda mais pequenos do que nós. E conseguiram fazer o seu desenvolvimento económico. Numa primeira fase, de acumulação, que também se pagou caro, também os operários tiveram de o pagar caro, mas conseguiram.

 E nós também temos ligações. Temos ligações aos países de expressão portuguesa, que têm também ligações connosco, e vamos passar a ter ligações num pé de igualdade. Vai precisar mais o Brasil de nós do que nós do Brasil. Vai precisar mais a África de nós do que nós da África. E não faltam muitos séculos para ver isso. Talvez 50 anos! Já não estamos cá a maior parte para ver isso, mas alguns ainda vão estar e vão-se lembrar desta sessão.


Registo audio desta importante intervenção:
https://www.youtube.com/watch?v=HFGKBiFrgRA














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