quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Debates sobre a Colina de Santana:

O tiro que saiu pela culatra a António Costa


Versando o tema “Impacto urbanístico, social e habitacional das propostas” de intervenção na Colina de Santana apresentadas pela ESTAMO à apreciação da CML,  decorreu ontem a 3ª e penúltima Sessão de um Ciclo de Debates sobre a Colina de Santana que, apesar de organizados pela  Assembleia Municipal de Lisboa, merecem o acordo e pleno conhecimento de António Costa.

Acreditando que este seria mais um caso de favas contadas para António Costa e o seu executivo camarário, e que estaria garantido o sucesso da sua acção de manipulação e branqueamento da gigantesca operação de especulação imobiliária que pretendem levar a cabo naquela que classificámos como a Colina de Ouro, as coisas não estão a correr conforme o esperado para o imperador de Lisboa.

É que, em todas as sessões até agora realizadas, a maioria dos intervenientes não só tem demonstrado um profundo conhecimento, quer do sector da saúde, quer do urbanismo ou do património cultural, como tem sido crítica das intenções da actual vereação,  demonstrando estar bastante conscientes do que está por detrás desta manobra de criar condições para o aparecimento, em pleno centro de Lisboa, de uma espécie de Quinta da Marinha. Mas, pelos vistos, o tiro está a sair pela culatra para António Costa.

Uma das intervenções mais paradigmáticas desta 3ª Sessão foi a do Engº S. Pompeu Santos. Começando por considerar que, ao abordar as propostas da Estamo para a Colina de Santana, somos confrontados com várias perplexidades, o supracitado orador elenca várias delas:

·         Em 2008-2010 o Governo de então, a pretexto de arranjar receitas para reduzir o
défice, vendeu os hospitais à Estamo, uma empresa do próprio Estado, por 125
milhões de euros, com a ideia de construir posteriormente um novo hospital,
invocando que os edifícios têm grandes despesas de manutenção. Ora, depois de
vendidos, os encargos passaram a ser ainda bem superiores, pois o Estado passou
a pagar uma renda anual de 6 milhões de euros. Assim, como um novo hospital
nunca estará disponível antes de 2018-2020, até lá o Estado paga em rendas à
Estamo mais de metade do que recebeu.

·         Entretanto, foi sendo preparada a construção do novo hospital, com um custo total
previsto de 600 milhões de euros, através de uma “PPP”, a qual acarreta para o
Estado uma renda anual duns 30 milhões de euros. Portanto, o Estado desfaz-se dos
hospitais actuais porque têm muita despesa e avança para a construção de um novo
hospital, em que o encargo será muito superior. Mas, o Governo de agora tem
dúvidas; anulou a “PPP” e mandou estudar soluções alternativas. Aliás, nunca foram
apresentados estudos credíveis que demonstrem que a opção de substituir os
hospitais existentes pelo novo hospital é a melhor.

·         Por outro lado, e muito antes de saber se o Estado vai avançar para a construção
do novo hospital, a Estamo mandou fazer estudos urbanísticos com vista à
promoção imobiliária nos locais dos hospitais e entregou os pedidos de
licenciamento na Câmara. Isto é criar um facto consumado, uma pressão, para não
dizer chantagem, inadmissível sobre o próprio Estado.”

Para concluir que, “…aliás, o argumento de que os hospitais estão velhos, que não têm condições, que estão a cair de podres, para justificar a construção de um hospital novo, é falacioso. De facto, os hospitais saem dali, fazem-se obras, incluindo novas construções, e
aparecem lá hotéis e condomínios de luxo, tudo num “brinquinho”. Então, porque é
que não se fazem nos hospitais existentes as obras necessárias para os pôr como
novos? Além disso, há as dezenas, senão centenas de milhões de euros e
equipamentos nos hospitais existentes, que são deitados à rua!”.

Concluindo que as propostas da Estamo vão contra o interesse público, este cidadão apresentou uma Proposta de Recomendação, cujo conteúdo publicitamos e subscrevemos:

1-      Suspensão imediata dos processos de licenciamento em curso na Câmara.

2-      Reversão para o Estado dos hospitais vendidos à Estamo, com o pagamento à
Estamo dos valores de aquisição (obviamente, as rendas já pagas cobrem os juros do
capital investido).

3-      Suspensão do processo de construção do novo hospital.

4-      Realização de um levantamento detalhado das necessidades dos hospitais
existentes, em termos de melhoria de equipamentos e de instalações, bem como de
outros equipamentos que possam ser instalados nos hospitais já devolutos.

5-      Realização de um inquérito com vista à identificação de eventuais irregularidades nos
processos de decisão relativos à construção do novo hospital e ao encerramento dos existentes.”

É preciso não esquecer que este afã de António Costa constitui mais um episódio na política de bloco central e deve-se a uma aliança que estabeleceu com o governo de traição nacional, PSD/CDS, que vê neste modelo que António Costa quer implementar para a Colina de Santana mais uma oportunidade para consolidar o seu programa de privatização da saúde, ao mesmo tempo que justifica a sua opção ideológica de menos estado para abandonar as responsabilidades deste na gestão do património arquitectónico e cultural.

Tal como havíamos referido em artigos anteriores há que isolar António Costa e a sua política oportunista, impondo que, não só os pontos acima referidos sejam levados de imediato à prática, como um amplo e democrático debate seja levado a cabo sobre temas tão importantes para os cidadãos de Lisboa como a saúde, o urbanismo e a política de preservação do seu património – que é também património nacional e da humanidade.


2 comentários:

  1. Caro Luis Júdice, um reparo: As 5 sessões de Debates Temáticos sobre a Colina de Santana não são organizadas pela CML, mas sim pela AML - Assembleia Municipal de Lisboa. O Presidente da CML, António Costa, foi previamente informado pela Presidente da AML, Helena Roseta, da sua intenção de promover na AML, sob o nome "Debater Lisboa" uma série de debates abertos à intervenção do público sobre temas do interesse dos Lisboetas. Existe um site da AML em suporte aos debates, que pode ser acedido aqui http://debaterlisboa.am-lisboa.pt/000000/1/index.htm
    A realização deste debate sobre a Colina de Santana foi aprovada pela Conferência de Representantes da AML no dia 12 de Novembro 2013, por proposta da Presidente da AML, tendo o respectivo formato e calendário sido fechados em reunião da mesma instância no dia 3 de Dezembro de 2013. Ao longo das várias sessões, organizadas por temas - neste caso saúde, urbanismo, património - as mesas são organizadas por convite da presidente da AML, incluindo oradores que podem ser sugeridos pelas diferentes bancadas da AML. O público interveniente inscreve-se na véspera através do site Debater Lisboa. No final do debate haverá uma sessão de conclusões e propostas a submeter à Assembleia Municipal de onde sairá uma deliberação da AML sobre a questão em debate. De toda a intenção e processo de organização destes novos debates da AML teve o Presidente da CML conhecimento prévio. Tendo sido sua opinião, antes da eleições, e conhecendo o propósito público de Helena Roseta de organizar um primeiro debate sobre este tema, que os PIPs para os projectos da Colina de Santana ficassem suspensos até estar terminada a série de debates públicos.

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  2. Cara Luisa

    Muito agradeço a sua nota rectificatica ao meu artigo supra. Mas, como deverá concordar, o que assinala não altera em nada o conteúdo e as conclusões a que chego no meu artigo,

    Reafirmam, aliás, que apesar de o autor material da convocação não ser a CML, mas sim a AML, todo o processo é do conhecimento de António Costa e, mais do que isso, é uma forma que serve os intentos deste em branquear e caucionar as suas intenções relativamente à Colina de Santana, tal como têm vindo a ser denunciadas.

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