A história do
capitalismo e do seu estádio supremo, o imperialismo é, por um lado, a história
de uma arrepiante sucessão de crimes, assassinatos, genocídios, guerras,
torturas, pilhagens e destruição, invasão e domínio exercidos sobre povos e
nações e, por outro, a certeza de que ele só pode ser derrubado por uma
violência superior àquela que empregou para se manter no poder.
Quer o chamado capitalismo ocidental, quer
o que resultou das nomenclaturas revisionistas
que tomaram de assalto os aparelhos dos partidos comunistas na URSS e na China,
do estado e do aparelho produtivo, transformando nações onde revoluções
socialistas haviam implementado novas relações de produção socialistas em países
onde passou a pontificar o capitalismo de estado e a burguesia de estado, férteis
em figuras de proa cuja carreira, num sistema que se baseia na exploração do
homem pelo homem, começou organizando-se em autênticos gangs de faccínoras e
bandidos comuns.
Para, passadas algumas gerações, cadeias de favor, corrupção e compadrio, se tornarem legítimos e honrados
empreendedores, à custa de um recorrente processo de lavagem de dinheiro e de
consciências, de cumplicidades a todos os níveis do aparelho de estado, da
justiça e desse instrumento de eleição ao qual a burguesia, a classe dominante,
deita mão quando deseja que o que se lava fique mais branco… a banca!
O recente escândalo que recebeu o nome de código de Swissleaks é disso um paradigmático exemplo. Um astuto e oportunista quanto baste
informático, com a cumplicidade de uns tantos apaniguados, roubou milhares de
dados que demonstravam que o HSBC (Hong Kong and Shangai Bank Corporation) havia
lavado dinheiro de ditadores, traficantes de armas e drogas, auxiliado todo
tipo de gente a operar fraudes fiscais milionárias e a abrir empresas offshore, levando a que a casa mãe tivesse que emitir um seco
comunicado no qual informava que tais práticas, ocorridas até 2007, não tinham
mais lugar e que, desde então, os padrões de controle estavam noutro patamar.
A realidade, porém, demonstra que a cobra
pode perder a pele, mas não os seus intentos nem, muito menos, o seu perigoso
veneno. Num artigo publicado por Vladimir Safatle a 15/02/2015, depois de afirmar que traficantes de drogas e
armas não teriam tanto poder se não existissem bancos que oferecem os seus
serviços de lavagem de dinheiro, o autor contextualiza as circunstâncias
históricas em que se constituiu o HSBC.
Estamos em
1860. O Império Britânico acaba de vencer a famosa “Guerra do Ópio” contra a
China, talvez uma das páginas mais cínicas e criminosas da história cínica e
criminosa do colonialismo. Metade do comércio da Inglaterra com a China
baseia-se na venda ilegal de ópio. Diante da devastação provocada pela droga na
sua população, o governo chinês resolve proibir radicalmente o seu comércio. A
resposta chega por uma sucessão de guerras nas quais a Inglaterra vence e
obriga a China a abrir os seus portos para os traficantes e missionários
cristãos (uma dupla infalível, como veremos mais à frente), além de ocupar Hong
Kong por 155 anos.
Em 1860, terminada
a guerra, os ingleses tiveram a ideia de abrir um banco para financiar o
comércio baseado no tráfico de drogas. Dessa forma apoteótica, nasceu o HKSC,
tempos depois transformado em HSBC (Hong Kong and Shangai Bank Corporation),
conhecido de todos nós actualmente. Sua história é o exemplo mais bem acabado
de como o desenvolvimento do capitalismo financeiro e a cumplicidade com a alta
criminalidade andam de mãos dadas.
A partir dos anos 70 do século passado, por meio da
compra de corporações nos Estados Unidos e no Reino Unido, o HSBC
transformou-se num dos maiores conglomerados financeiros do mundo. Tem
atualmente 270 mil funcionários e actua em mais de 80 países. A sua expansão
deu-se, em larga medida, por meio da aquisição de bancos conhecidos por
envolvimento em negócios ilícitos, entre eles o Republic New York Corporation, propriedade
do banqueiro brasileiro Edmond Safra, morto em circunstâncias misteriosas no
seu apartamento monegasco. Um banco cuja carteira de clientes era composta,
entre outros, por traficantes de diamantes e suspeitos de negócios com a máfia
russa, para citar alguns dos nobres correntistas. Segundo analistas de Wall
Street, a instituição financeira de Nova York teria sido vendida por um preço
40% inferior ao seu valor real.
Em Julho de 2013 é o próprio HSBC que assume a culpa
por lavagem de dinheiro do tráfico de drogas mexicano e colombiano, além de
organizações ligadas ao terrorismo. Tudo ocorreu entre 2003 e 2010. A punição?
Multa irrisória de 1,9 milhão de dólares. Que fantástico!
Entre 2006 e 2010, o director mundial do banco era o pastor anglicano (sim, o
pastor, lembram-se da Guerra do Ópio?) Stephen Green, que, desde 2010, tem um
novo cargo, o de ministro do gabinete conservador de David Cameron, cujo
governo é conhecido por não ser muito ágil na caça à evasão fiscal dos ricos
que escondem o “seu” dinheiro. Enquanto isso, os ingleses vêem o seu serviço
social decompor-se e as suas universidades serem privatizadas de facto. O que
permite perguntas interessantes sobre quem realmente nos governa e quais são os
seus reais interesses.
Tendo em conta a recente divulgação de
mais de 200 nomes de portugueses, titulares de contas no HSBC, melhor se
compreende porque é que, também os sucessivos governos de PS, PSD e CDS não são
muito eficientes no que concerne a fuga de capitais e evasão fiscal,
demonstrando uma recorrente preferência por praticar o roubo dos salários e do
trabalho, privatizar, a preços de saldo, tudo o que é activo público
estratégico, promovendo o desemprego, a miséria e a pobreza e denegando o
acesso do povo e dos seus filhos a uma escola pública de qualidade, a um bom
sistema de saúde e a uma rede de benefícios sociais que proporcionem dignidade,
bem estar e riqueza ao país e a quem trabalha.
Acabar com esta corte de especuladores e
rentistas, que estão seguros de que haverá sempre um HSBC que virá em seu
auxílio, com toda a sua expertise,
para assessorá-los na evasão de divisas e na fraude fiscal, passa por levar a
cabo um programa democrático e patriótico que assente no princípio do não
pagamento de dívidas que resultam deste carrossel especulativo e corrupto,
passa por fazer com que Portugal saia do euro – uma moeda que funciona como
armadilha mortal para a sua soberania e independência nacional – e por que a
banca seja colocada sob o controlo dos seus trabalhadores e ao serviço do povo
português.
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