sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

"Alfarelos: O espelho de um país, uma desgraça adiada".


2013-01-21-acidente alfarelos
O acidente ocorrido no passado dia 21, na Estação de Alfarelos pelas 21.15H, entre um comboio Intercidades e outro Regional, vem trazer, mais uma vez, para a ribalta as condições de segurança em que circulam os nossos comboios. Depois de lutas intensas, por parte dos maquinistas e restante pessoal circulante, para a implementação de um sistema de controlo e segurança, depressa se verificou que o sistema implementado não era completamente eficaz, pois apenas fornece informação pontual, ao invés de permanente, como acontece noutras redes e seria lógico. Como tudo o resto nesta sociedade, a exploração desenfreada e o investimento público reduzido ao mínimo indispensável, sobrepõem-se aos interesses gerais da população e aqui até à segurança.
A estação de Alfarelos está inserida na Linha do Norte, na qual o sistema de cantonamento é o de Bloco Orientável, com comando central em Braço de Prata (Lisboa). O controlo de entrada e saída daquela estação é contudo comandado localmente por uma mesa que já data dos anos 60, do século passado. Só por si, daqui não viria qualquer mal, não fosse o facto da tecnologia utilizada estar há décadas ultrapassada e a manutenção ser deficiente, com aliás quase tudo o que diga respeito a material ferroviário, independentemente da empresa que o detém. Esta mesa estava programada para ser substituída no próximo mês.
No passado sábado, em virtude da intempérie que se abateu em várias zonas do País, a Estação de Alfarelos esteve inundada acontecendo avarias e descomandos vários nos AMV (aparelhos de mudança de via) e sinalização.
Vários maquinistas têm referido que já há algum tempo, e principalmente depois de sábado, que a aproximação àquele sinal principal se encontra bastante escorregadio. Isto em virtude da existência de massa nos carris proveniente de um lubrificador de via estar a debitar mais que a necessária e como tal na mistura com a água da chuva se ir espalhando ao longo do carril , a aproximação se fazer em declive acentuado e a existência de todo o tipo de lixos nos carris. O próprio tipo de carril ali instalado, macio, contribui para a falta de aderência. A falta de eficácia de frenagem, de algumas unidades motoras, é também referida desde há tempos por aqueles profissionais.
É assim que o primeiro comboio (Regional), passa pelo sinal principal fechado sem conseguir parar, indo imobilizar-se na linha 3 da Estação. Ao segundo acontece o mesmo, só que já lá estava o outro e a inevitabilidade do embate. Neste ponto a pergunta que se impõe é, como é que depois de um comboio ter passado o sinal, o que faz accionar um alarme na mesa de comando, e ir parar à linha 3, porque não foi possível desfazer aquele caminho, para outra linha, para que ao comboio subsequente não acontecesse o mesmo e se desse o embate, sabendo-se que este último iria ultrapassar o primeiro. Talvez a resposta esteja na tal mesa de comando dos anos 60.
Dos inquéritos mandados instaurar pelo governo à REFER e CP, já sabemos o que esperar: a estafada “falha humana”, quer seja atribuída ao maquinista ou se calhar agora ao operador da mesa. E quando assim não é, vão-se protelando as conclusões e saída desses inquéritos até caírem no esquecimento como aconteceu com o do último acidente ocorrido em Caxias, na linha de Cascais há já quase um ano. Nunca são aí apontadas as responsabilidades de quem dirige a empresa ou de quem, no poder, tinha a obrigação de providenciar as melhores condições de segurança. Os verdadeiros responsáveis por situações como esta nunca são apontados.
As consequências não foram mais graves, em termos de vítimas, porque a política da CP é a de afastar cada vez mais as pessoas do transporte ferroviário e daí apenas 5 passageiros viajarem na última carruagem da UTE embatida.

Retirado de:
http://lutapopularonline.org/index.php/pais/104-politica-geral/546-alfarelos-o-espelho-de-um-pais-uma-desgraca-adiada

2 comentários:

  1. Recordo essa célebre Mesa de Comando, da responsabilidade dos Franceses (ALSTHOM).Participei, como electricista, na sua construção, ensaios e colocação em serviço. Admito que esteja "ultrapassada", mas o problema é quase igual em todo o país. Não se valoriza o trabalho manual, a manutenção dos equipamentos é desvalorizado, para haver possibilidade de comprar novos equipamentos, fonte de lucros exorbitantes de algumas empresas e corrupção dos quadros e chefes das empresas públicas. Continua a ser difícil mudar.... António Bexiga Lopes

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    1. Em primeiro lugar, o meu muito obrigado por ter lido esta nota, Depois, e não menos importante, a sua achega ao mesmo, valendo-se da sua experiência e prática profissional e conhecimento, em concreto, da situação.

      Agradeço-lhe que se tiver, e assim o desejar, utilizar-se desde espaço para nos trazer informação mais detalhada sobre o transporte a política de transportes, mormente o ferroviário, está à vontade para o fazer.

      Um abraço

      Luis Júdice

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