sexta-feira, 15 de novembro de 2024

Macron ou o caminho do caos

 


 15 de Novembro de 2024  Robert Bibeau 

Por Julie JAUFFRINEAU.


Se o mundo nos parece caótico, o mesmo acontece com os discursos do Presidente francês. De afirmações a reversões da situação, a duplicidade dos discursos do Presidente já não engana ninguém. As palavras perdem o sentido à medida que ele as agita. Paz, cessar-fogo, direito internacional. Por trás dos elementos sedutores da linguagem, o "país dos direitos humanos" já não convence ninguém na cena internacional. De discursos de paz desconcertantes para a Ucrânia ao súbito reconhecimento da soberania marroquina sobre o Sara Ocidental, passando por discursos equilibrados sobre a situação no Médio Oriente, as decepções acumulam-se, a hipocrisia é indigna e o fio ameaça partir-se.

Paz através da guerra

O tempo em que Macron nos foi apresentado como o primeiro Presidente europeu a encontrar-se com Putin, no início da entrada da Rússia na guerra contra a Ucrânia, acabou. Pensávamos que estávamos a assistir ao ressurgimento do poder de negociação da França. Foi apenas um solavanco. Agora, o governo francês defende a paz para a Ucrânia pela força. "Vou ter que mandar gaijos para Odessa", é necessário "derrotar a Rússia", "tornar impossível a [sua] vitória"; A França prestará "apoio ilimitado" à Ucrânia; "Estamos à procura da paz. A França será capaz de unir forças com todos os parceiros sinceros." Que maneira singular de proteger a população civil ucraniana para forçá-la a morrer em combate!

Do lado diplomático, nada está a correr bem. Para além da não renovação da aprovação diplomática de Alexander Makogonov, porta-voz da embaixada russa em França – que não passa de uma expulsão –, como não nos indignarmos com o despejo da Rússia na cimeira de "alto nível" sobre a paz na Ucrânia, em Junho passado? Enquanto a França foi lá orgulhosa, a China, pelo contrário, ficou ofendida. Ela não viu o sentido de tal viagem. Que paz se pode prever entre a Rússia e a Ucrânia na ausência do principal interveniente em causa?

Não é alimentando o círculo vicioso das armas que o conflito será resolvido. Também não é através de discursos de paz inconsistentes que a França restaurará a soberania da Ucrânia e recuperará o respeito internacional. Para parar tudo, a França faria melhor em promover negociações entre a Rússia e os Estados Unidos, porque estes últimos se recusam a ceder por enquanto e usam a Ucrânia para conter o seu adversário. Entretanto, a paz desejada para a Europa não passa de pólvora.


Curva a espinha e recupera a tua soberania

No entanto, os paradoxos do governo não param na Ucrânia. Na última Assembleia Geral das Nações Unidas, Emmanuel Macron disse, falando da Rússia: "Quando vejo algumas pessoas a querer propor a paz pedindo capitulação, fico surpreso que possamos até apoiar tal ideia". Não é isso que propõe para o Líbano?

Em 24 de Outubro, durante a Conferência Internacional de Apoio à População e à Soberania do Líbano, o Presidente francês expressou muitos pesares, condenou os ataques do Hezbollah e prometeu a ajuda humanitária esperada. Mas de forma alguma condenou Israel pelos seus inúmeros ataques ao Líbano e ao seu povo. Afirmou o apoio da França à ONU para garantir o regresso da paz ao país, sem sequer mencionar o bombardeamento israelita da UNIFIL, no qual morreram vários elementos das forças de manutenção da paz. Apelou a um cessar-fogo, na condição de o Hezbollah respeitar a Resolução 1701 da ONU, não denunciando as mais de cinquenta resoluções da ONU emitidas contra Israel e desrespeitadas pelo Estado judeu. Por último, propõe o reforço do exército libanês, agora desarmado e à mercê do Ocidente, uma vez acordado o cessar-fogo e desmantelado o Hezbollah. Ou seja, pede ao Líbano que se livre do seu poder dissuasor e que se dobre à vontade de Israel para recuperar a sua liberdade e plena soberania. O absurdo não poderia ser mais total. Dentro de quantos anos aceitará o Ocidente que o exército libanês reforce o seu poder militar, incluindo o aéreo, para adquirir uma força dissuasora? O sul do rio Litani ainda será libanês? Será então que o Líbano se chamará Israel?

Portanto, quando Emmanuel Macron afirma que "a guerra não deve permitir que as forças do caos vençam, nem no Líbano nem em qualquer lugar da região", pode-se perguntar a quem se está ele a referir. Israel? Hezbollah? O eixo da resistência? Macron considera o general De Gaulle a sua grande inspiração. Em vez de herdar o seu carisma e a sua defesa da soberania da França, ele manteve apenas a verve esquiva de "Eu entendi-te!" Sem saber quem são estas "forças do caos" designadas pelo Presidente francês, recordaremos o esforço de caos em que o próprio Macron participa activamente


Direito internacional, um recurso de geometria variável

Muito recentemente, pudemos constatar uma nova façanha do Presidente francês, que a Liga dos Direitos do Homem denuncia. Emmanuel Macron tomou a decisão de reconhecer a soberania marroquina sobre o Sara Ocidental. Sem consulta ou votação parlamentar, inverteu a posição francesa em relação a esta região, que, desde 1963, está na lista de territórios a descolonizar. Suplantou a ONU, para gáudio de Mohamed VI. Será que o povo sarauí a viu sob a mesma luz?

Esta última posição atropela o direito à autodeterminação do povo sarauí. A Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sara Ocidental (MINURSO) foi criada para este fim em 1991. Neste caso, na ausência de um referendo – até agora rejeitado por Marrocos, por receio de um voto sarauí a favor da independência – os países que reconhecem a soberania da realeza sobre este território não autónomo estão a denegrir a voz dos sarauís e a violar o direito internacional. É o caso, em particular, dos Estados Unidos e de Israel, os primeiros Estados a fazê-lo, no final de 2020, durante a primeira administração Trump, em troca da normalização das relações entre Rabat e Telavive. O "acordo do século", segundo Donald Trump.

Para a França, o reforço do poder colonial de Marrocos permite, por um lado, ganhar toda a simpatia da realeza para explorar os imensos recursos que abundam nos subsolos do Sara Ocidental, em desprezo pelo povo sarauí. Empresas francesas, como a TotalEnergies e a Engie, aproveitaram a recente viagem de Macron a Marrocos para assinar novos contratos. Por outro lado, poder-se-ia considerar que o objectivo subjacente a esta tomada de decisão é legitimar a soberania da França sobre a Nova Caledónia. Este outro território, imerso no Pacífico, também está na lista de territórios não autónomos e a serem descolonizados, como o Saara Ocidental. E os referendos pela independência do território continuam a ser controversos neste momento.


Finalmente, para Macron, o uso do direito internacional – ou melhor, da "ordem baseada em regras" – é uma arma política que é acenada ao capricho de interesses geopolíticos. Se ajuda a justificar a guerra contra a Rússia, branqueia-a. Se obriga Israel a respeitar os direitos dos povos palestiniano e libanês, evade-se. E se complica a pilhagem de recursos, enterra-a. Ao virar constantemente as costas a si próprio, ao mesmo tempo que se afasta do direito internacional, o Presidente francês perdeu toda a credibilidade. Pior ainda, prejudica os interesses geopolíticos do país.

Quanto tempo vai demorar para este circo parar? Pois tudo isto não passa de um espectáculo protagonizado por maus actores que gostariam de se acreditar guardiões da razão, perdidos no meio da arrogância. Para pôr fim ao caos, a França deve procurar soluções diplomáticas para os conflitos, reforçar as suas posições através de acções concretas e defender incondicionalmente o respeito pelo direito internacional.

 

Fonte: Macron ou la voie du chaos – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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