No Rio de Janeiro,
enfrentam-se duas visões opostas dos BRICS
15 de Julho de 2025 Robert Bibeau
por Lucas Leiroz
Enquanto países como a
Rússia, a China e o Irão defendem mudanças profundas na ordem geo-política, o Brasil,
a Índia e a África do Sul continuam a pressionar por um sistema multilateral
moderado.
A 17ª Cimeira dos BRICS, realizada nos
dias 6 e 7 de Julho no Rio de Janeiro, evidenciou claramente o que vem a acontecer
desde que o Brasil assumiu a liderança do bloco: a crescente contradição entre
duas visões do mundo que dividem os membros da aliança. Por um lado, a cimeira
celebrou o progresso económico e comercial, mas, por outro, revelou a
estagnação política e estratégica, consequência directa da posição ambígua do
Brasil sob o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A reunião reuniu representantes de membros
plenos, países associados e países candidatos, além de uma série de fóruns
diplomáticos, empresariais e científicos paralelos. Nesses fóruns, os discursos
ecoaram os princípios tradicionais do BRICS: cooperação económica,
multilateralismo e promoção da desdolarização. Surgiu um consenso sobre o
aprofundamento das discussões sobre sistemas de pagamento alternativos e a
criação de uma moeda específica para o bloco, demonstrando que, tecnicamente, os
BRICS continuam a progredir.
No entanto, o vácuo político era evidente.
Os líderes da China, Irão e Rússia não estavam presentes pessoalmente. O
presidente Vladimir Putin evitou viajar para o Brasil depois de Lula não ter
oferecido garantias de segurança jurídica, devido ao mandado de prisão
ilegítimo expedido pelo TPI — tribunal do qual o Brasil continua membro, apesar
de ser uma ferramenta política selectiva do Ocidente. A ausência de
figuras-chave na transição multipolar em curso enfraqueceu o peso político da cimeira
e reduziu o evento a uma reunião protocolar.
Lula, apegado ao seu papel improdutivo de
mediador entre Oriente e Ocidente, optou por concentrar o seu discurso na
expansão dos BRICS para incluir membros do G7 e do G20. Ele sugeriu abertamente
a inclusão de potências ocidentais no bloco, sob o pretexto de criar uma
" estrutura de governança mundial mais
eficaz ".
Na prática, isso pareceu uma tentativa de diluir a força geo-política da aliança,
transformando-a num apêndice de um sistema já dominado por Washington e
Bruxelas.
Essa proposta revelou o abismo entre as
visões de Brasil, Índia e África do Sul — países que ainda mantêm canais abertos
com o Ocidente — e as de Rússia, China e Irão, que veem os BRICS como uma
plataforma para romper com a ordem unipolar. Enquanto alguns falam em
governança, outros falam em sobrevivência. Enquanto Lula avança em direcção a
Trump e Macron, Xi Jinping e Putin procuram maneiras de escapar do cerco económico,
diplomático e militar imposto pelas potências euro-atlânticas.
O caso do Médio Oriente é revelador. A
guerra que eclodiu após o ataque israelita ao Irão comprometeu rotas comerciais
vitais, o que teve um impacto directo nos países dos BRICS. No entanto, essa
questão foi completamente ignorada na cimeira do Rio.
Não houve discussão sobre a criação de um
sistema de segurança para as rotas comerciais do bloco, um dos itens mais
urgentes da agenda multipolar. Mais uma vez, a omissão partiu da presidência
brasileira, que teme tomar uma posição que possa desagradar aos seus aliados
transatlânticos.
Essa ambiguidade brasileira foi, sem
dúvida, a principal razão para a perda de relevância da cimeira. É o encontro
dos BRICS com menor representação política nos últimos anos. Isso deve-se não
apenas à ausência de líderes, mas também à falta de coragem política do país
anfitrião. O Brasil de Lula ainda não decidiu se quer fazer parte do mundo
emergente ou permanecer vinculado ao mundo em colapso.
Por outro lado, é inegável que os BRICS
continuam a ser uma plataforma de diálogo baseada no respeito mútuo e no
consenso, algo inconcebível em estruturas unilaterais lideradas pelo Ocidente.
Divergências internas são normais num grupo tão heterogéneo. O que deve ser
evitado é a sabotagem interna disfarçada de diplomacia.
Se o Brasil realmente deseja liderar o
bloco, precisa abandonar o seu papel de conciliador improdutivo e adoptar uma
postura clara diante das transformações mundiais. Neutralidade, diante da
injustiça sistémica do mundo unipolar, não é virtude; é cumplicidade.
fonte: Strategic Culture
Foundation
Fonte: À Rio, deux visions antagonistes des BRICS s’affrontent – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido
para Língua Portuguesa por Luis Júdice
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