quinta-feira, 5 de março de 2020

Estados Unidos – talibãs - sequência e fim do império americano







Robert Bibeau

Capitulação e retirada americana do Afeganistão


Após dezoito anos de massacre pós-colonial no Afeganistão, foi assinado um acordo de retirada das tropas de ocupação da “coligação” entre a administração dos EUA e a resistência nacionalista afegã - liderada pelos Talibã. Este acordo faz parte da reestruturação geoestratégica imperialista no Médio Oriente, levada a cabo desde a guerra na Síria da qual os Estados Unidos foram expulsos, antes de serem extraditados do Iraque, e de se retirar em da Palestina-Israel dissimulados sob o ridículo e farsante "negócio do século" (“deal of the century” – Nota do Tradutor).

Afirmamos isso há já alguns anos! As dificuldades económicas estruturais do império americano forçam os financiadores de Wall Street a reorganizar os seus esforços de guerra em direcção ao seu principal inimigo - a aliança imperial China-Rússia - e a abandonar os campos de confronto como a Síria, Israel-Palestina, o Paquistão, o Iraque, o Irão e o Golfo Pérsico, o Iémene, o Sudão,a  Líbia e o Afeganistão, guerras que o império está a tentar impingir à  NATO e à França.

Nos últimos oito anos ( início da guerra nacional de autodefesa da Síria), em cada um desses terrenos de confrontos – de bombardeamentos – de refugiados - de mortos e destruição - o império americano passou da derrota ao desastre. Em cada um desses países, o império capitula e, depois de semear o caos e a destruição, tenta conter os danos após o seu desmembramento militar e prossegue a sua agressão no plano económico e financeiro, quando tal é possível. De facto, se o Irão, um estado moderno e poderoso, mantiver um comércio internacional florescente com o Ocidente e com o Oriente (China em particular), o Afeganistão, um dos estados mais pobres do planeta, não exporta senão ópio, de que os traficantes da China, da Europa e dos Estados Unidos não podem prescindir. É difícil sob essas condições imaginar como o império em declínio conseguirá sancionar e isolar diplomaticamente esse país subdesenvolvido, onde os Talibãs reinam de facto há, não obstante o que dizem os escribas a soldo do imperialismo .
 Os motivos da invasão americana
É compreendendo os motivos para a invasão deste país subdesenvolvido, isolado, em guerra civil perpétua que podemos fazer um balanço dessa invasão fracassada da qual os ianques emergem enfraquecidos. Qual foi o verdadeiro motivo da invasão deste país exangue? Esqueçam o absurdo de George W. Bush a propósito  da libertação das mulheres da burca (que elas usam sempre incidentalmente); a propósito de Bin Laden, o seu apoio face ao declínio do império soviético; a propósito da Al Qaeda, do Daesh e outros mercenários jihadistas (exfiltrados dos teatros de operações na Síria, no Iraque e no Iémen); esqueçam os Talibãs e a sua guerra de clãs contra os senhores feudais, contra os mercenários jihadistas e outros espantalhos criados pela CIA e financiados pela Arábia Saudita. Não havia necessidade de mobilizar 200.000 soldados de vinte países da OTAN para conter os combatentes da resistência dos Talibãs na sua guerra contra os chefes de tribos corrompidos; bastava cortar o seu financiamento, incluindo o tráfico de ópio, subsídios Wahhabi de Riad e privá-los do armamento da CIA.

Mas então, por que é que essa invasão e essa guerra, que custaram tantos biliões de dólares aos contribuintes americanos que nunca entenderam o que os soldados ianques estavam a fazer naquele país no fim do mundo, sem riqueza natural para saquear, sem mão-de-obra qualificada para explorar? Essa invasão da OTAN não teve como objectivo conter os talibãs, mas recrutá-los para a guerra americana contra as "Novas Rota da Seda" chinesas. Um vasto projecto planetário de vários biliões de dólares que a Aliança de Xangai empreendeu para impulsionar o comércio internacional, do qual se tornou a força incontestada. O megaprojeto das Rotas da Seda (um trilião de dólares em investimentos repartidos ao longo de décadas) é composto por infra-estruturas de transporte marítimo (oceano Índico em particular e portos de águas profundas no Ceilão e no Paquistão); por via aérea (aeroportos internacionais que ligam a China ao Médio Oriente e à Europa, primeiro mercado mundial); por terra (redes de estradas que ligam Pequim aos portos do Mediterrâneo oriental); e gasodutos e oleodutos a ligar a China ao Médio Oriente, fonte de seu aprovisionamento.

Grande parte dessas infraestruturas de transporte passa pelo Afeganistão, em território iraniano e no Cazaquistão membro da Aliança de Xangai e próximo do território afegão. A invasão imperialista do Afeganistão, controlada pelos Talibãs, visava simplesmente impor um governo fantoche pró-OTAN, encarregado de negociar e recrutar os Talibãs como mercenários a soldo dos Estados Unidos, a fim de dinamitar e destruir essa infraestrutura de transporte  e tornar inoperante o vasto projecto das "Novas Rotas da Seda" chinesas, colocando assim o aspirante à hegemonia imperialista mundial à mercê do antigo poder decadente americano.

Hoje, os Estados Unidos teriam conseguido recrutar os talibãs que, até agora, estavam completamente desinteressados ​​pelas ofertas e mercados ocidentais, e conseguiram reconquistar a quase totalidade do país, ao mesmo tempo contra o governo fantoche dos senhores da guerra, os restos da Al-Qaeda e os resíduos do Daesh, todos apoiados pelos restos da Força Expedicionária da OTAN (ou o que resta dela, cerca de 13.000 soldados reclusos e cercados em alguns campos entrincheirados).

Surge agora a questão de saber se os artigos secretos do acordo EUA-Talibãs incluem cláusulas que garantem a sobrevivência do governo fantoche em Cabul e se, em troca da retirada total das tropas americanas e de subsídios generosos, o governo dos Talibãs concordará em importunar, minar e destruir as infraestruturas chinesas que passam pelo território afegão ou próximo dele. O acordo prevê um tempo de espera de 14 meses para se verificar se os talibãs estão a aplicar os termos secretos do mesmo. Assim, alguns dias após o anúncio do acordo, os Talibãs bombardearam as posições do governo fantoche de Cabul, ao qual os EUA reagiram bombardeando santuários dos Talibãs, o que não significa de forma alguma que um ou outro dos signatários do acordo está a quebrar os seus compromissos secretos (2).

O proletariado revolucionário

Para nós, proletários revolucionários, nunca nos deveremos jamais ser  enganados por essas manigâncias entre as forças feudais e burguesias nacionais e seus senhores imperialistas. Negociações que nunca servem para defender os interesses da população afegã trabalhadora. Somente o proletariado afegão pode servir os interesses do povo afegão (a continuar).


Notas

1. Afeganistão: os Estados Unidos e os Talebãs assinam um acordo histórico após dezoito anos de guerra. Os americanos e a OTAN retirarão todas as suas tropas do Afeganistão dentro de 14 meses se os Talebãs cumprem as suas promessas. "Os Estados Unidos e os Talebãs assinaram um acordo de paz no sábado, 29 de Fevereiro, após dezoito anos de guerra. Os americanos e os outros países da OTAN presentes no local (Alemanha, Reino Unido e Itália, em particular) retirarão todas as suas tropas do Afeganistão dentro de 14 meses se os Talibãs cumprirem os seus compromissos (sic), declararam os Governos americano e afegão numa declaração conjunta. "A coligação completará a retirada das tropas que permanecerem no Afeganistão dentro de 14 meses após a publicação desta declaração conjunta e do acordo Estados Unidos-Talibãs (...), desde que os Talibãs respeitem os seus compromissos nos termos do acordo EUA-Taliban ", diz. Os Estados Unidos começariam a reduzir o seu contingente para 8.600 homens dentro de 135 dias após a assinatura do acordo com os Talibãs, que deve ocorrer esta tarde em Doha, acrescenta o comunicado. Por fim, o chefe da diplomacia americana, Mike Pompeo, apelou no sábado aos talibãs que tomem cuidado com o "declarar vitória" e "que mantenham a promessa de ruptura com a Al-Qaeda". https://www.msn.com/fr-ca/actualites/monde/afghanistan-les-etats-unis-et-les-talibans-signent-un-accord-historique-apr%C3%A8s-dix-huit-ans-de-guerre/ar-BB10zcja?ocid=spartanntp




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