A 26 de Abril deste ano, nas páginas do Luta Popular online, denunciávamos de forma vigorosa a pandemia paralela que se desenvolvia por virtude da diminuição da realização de urgências e consultas hospitalares, no texto Uma pandemia paralela provocada pela diminuição da realização de urgências e consultas hospitalares!
Demonstrámos, então, que a forma como o actual governo havia decidido dar resposta à crise sanitária provocada pela pandemia de Covid-19, resultava da ausência total de uma estratégia e de um plano de emergência, com sérias consequências para a saúde dos operários e trabalhadores e para o agravamento do número de óbitos.
A suspensão criminosa de todos os actos que não fossem “considerados graves” e a famigerada estratégia assente na formulação dos “hospitais Covid”, levou a um massivo afastamento dos doentes das unidades de saúde e dos hospitais, impedidos de recorrerem às urgências e às consultas hospitalares e nos Centros de Saúde, tendo sido criminosamente adiadas milhares de cirurgias.
No supracitado artigo evidenciámos a política reaccionária deste e do anterior governo em prosseguir a privatização acelerada do sector da saúde, e como esta estratégia de confinamento e congelamento de toda a sorte de actos clínicos, médicos, de enfermagem, de recurso a meios suplementares de diagnóstico, favoreciam total e cabalmente esse objectivo.
A pandemia de Covid-19, para além do medo propositadamente induzido para favorecer a obediência cega a normas absolutamente fascistas e castradoras de direitos constitucionais – o confinamento medieval imposto –, veio favorecer os cortes sistemáticos que se faziam sentir no sector da saúde, sem necessidade de proceder, como até então o Ministério das Finanças fazia, às famigeradas cativações ou à desculpa dos défices zero salazaristas.
O que se pretendeu sempre foi esconder as fragilidades em que assentava o Sistema Nacional de Saúde para dar resposta adequada, eficiente e eficaz, a uma pandemia para a qual, apesar de ter tido mais do que tempo para se preparar, o governo não mostrou qualquer diligência em o fazer.
Esta política criminosa, que constitui, diremos mesmo, uma crime contra a humanidade, levou a uma diminuição de quase 30 milhões de actos clínicos, entre consultas, exames, urgências e cirurgias e a que a pandemia paralela à pandemia Covid fosse responsável por mais de 30 mortes diárias. Isto para além de, claro, ter criado um insustentável clima de desconfiança por parte dos doentes em recorrer a urgências e consultas hospitalares, devido à manifesta incapacidade do SNS assegurar a prevenção de infecções por Covid-19.
Na altura vários sectores da “esquerda parlamentar” acusaram-nos de alarmismo e de estarmos a fazer o “jogo da direita”, querendo assim paralisar a nossa denúncia e fazer crer que as medidas tomadas pelo executivo de António Costa, essas sim, seriam de “esquerda”!
A verdade, porém, é como o azeite. Mergulhado em água, vem sempre à tona. E nem a barragem mediática que governo e suas muletas construíram, impede que a verdade, como o azeite, veja a luz do dia.
E os factos estão aí para o comprovar:
• No mês de Julho registaram-se mais óbitos do que em igual período...desde 2009!!!
• Porém, a pandemia de Covid-19 só foi responsável por 1,5% das mortes registadas em Portugal nesse mês.
• Porém, a pandemia de Covid-19 só foi responsável por 1,5% das mortes registadas em Portugal nesse mês.
Como é habitual, a Direcção-Geral de Saúde aponta para razões externas esse aumento de óbitos, nomeadamente às duas ondas de calor que ocorreram durante o mês de Julho. Mas, vários especialistas, apontam para a verdadeira razão – a falta de acesso aos cuidados de saúde.
Mas, vamos a factos:
• Durante o mês de Julho morreram 10.390 pessoas no nosso país. É o valor mais elevado desde que há registo no sistema nacional de Vigilância da Mortalidade.
• Comparativamente com o mesmo mês do ano passado, este ano morreram mais 2.137 pessoas, isto é, um aumento de 26%.
• Durante o mês de Julho morreram 10.390 pessoas no nosso país. É o valor mais elevado desde que há registo no sistema nacional de Vigilância da Mortalidade.
• Comparativamente com o mesmo mês do ano passado, este ano morreram mais 2.137 pessoas, isto é, um aumento de 26%.
Para que não reste margem de manobra para que os “técnicos” da DGS adulterem e mascarem os números, é necessário evidenciar que, num contexto de pandemia por SARS-CoV-2, apenas 1,53% (159) das mortes é oficialmente atribuída ao Covid-19. Recordamos que desde Março passado e até 2ª feira passada, morreram em Portugal 1.738 pessoas das 51.569 confirmadas como infectadas (sendo que mais de 50% destes casos foi dado como curado).
Significativas são as declarações de Alexandre Abrantes, sub-director da Escola Nacional de Saúde Pública que, tal como outros especialistas, enfatiza que as principais razões deste aumento da mortalidade de devem às maiores dificuldades encontradas pelos doentes no acesso ao SNS, por causa do Covid-19, seja porque tiveram medo – que lhes foi induzido – de recorrer aos cuidados e serviços, seja porque as consultas, exames e cirurgias foram desmarcadas.
A polarização gerada propositadamente pelo governo e instituições que tutela – como a DGS –-, exponenciada por toda uma imprensa a soldo e toda a sorte de jornalismo e jornalistas de merda, sem coluna vertebral, fez com que o resto tivesse sido “esquecido no serviço de saúde”, denuncia ainda Alexandre Abrantes, que considera também que esta estratégia afastou a hipótese de os hospitais não terem capacidade – quer em termos de pessoal, quer em termos de infraestruturas – para tratar outros casos que não fossem de Covid-19.
Já o presidente do Conselho Científico do Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência, António Vaz Carneiro, não podia ter sido mais claro e contundente ao afirmar que existe um “excesso de mortalidade provocado pela negligência e impossibilidade de acesso a cuidados que os dois milhões de doentes crónicos em Portugal deixaram de ter”. Sublinhando, mais adiante, que “...temos uma população altamente negligenciada, doentes crónicos com múltiplas doenças que pura e simplesmente não têm consultas”. Para acusar, em jeito de pergunta: “No interior do país, consegue marcar uma consulta? É impossível”!!!
Compreendemos a opinião de Paulo Jorge Nogueira, um técnico de estatística no Instituto de Medicina Preventiva e de Saúde Pública da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, que constata o envelhecimento da população e nos alerta para o facto de que “nunca tivemos uma população tão idosa”. Para acrescentar que “há muitas pessoas em sobrevida”, podendo isso ser também um factor que nos leve a compreender as causas que levaram ao mês de Julho mais mortal desde 2009.
Em nosso entender, esta opinião privilegia a compreensão dos efeitos do envelhecimento da sociedade, mas releva as verdadeiras causas desse envelhecimento. Isto é, uma política levada a cabo por sucessivos governos, liderados por partidos da direita e da extrema direita – PS e PSD – que levaram a um colapso demográfico sem retorno, como aquele a que assistimos.
Quem se poderá sentir atraído a constituir família e ter filhos, num quadro de crescente desemprego, precariedade, ausência ou falência de sistemas de saúde, habitação e transporte? Quem poderá sentir o apelo à reposição demográfica quando pende sob o seu futuro e a dos filhos – muitas vezes desejados, outras tantas adiados –, a iminência da fome, da miséria e da humilhação degradante?
Estes são os crimes de que acusamos o governo de António Costa e de todos os governos que o antecederam, bem como daqueles que agora tentam seguir-se-lhe. Percebem-se agora melhor as razões porque insistimos, há meses, na exigência de demissão imediata da Ministra da Saúde, Marta Temido, e da Directora-Geral da Saúde, Graça Freitas. Isto para além, claro, dos procedimentos políticos e judiciais que se reservam a criminosos.
Tal como afirmávamos no final do artigo que publicámos a 26 de Abril de 2020, cujo link reproduzimos acima, enquanto persistir este sistema capitalista, claro está, nenhuma medida – por mais justa que pareça – será consequente e duradoura. Só uma revolução que imponha a destruição do modo de produção capitalista e acabe com a escravatura assalariada poderá garantir uma política de saúde efectivamente ao serviço da classe operária e dos trabalhadores.
05Ago2020
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