domingo, 12 de abril de 2020

A crise económica sistémica depois da crise sanitária do coronavirus




Os escribas em posição de combate

Os aduladores, escribas, analistas e economistas de todos os tipos cerram agora fileiras para programar a opinião pública em antecipação do período pós-pandemia - este período de recessão económica aterradora que se seguirá à epidemia e ao confinamento, qualificado por Donald Trump, de "remédio pior que o mal" e que destruirá a economia capitalista mundializada (1). Leiam o que dizem os "especialistas" contratados pela Oxford Economics:

"A recuperação económica global pode ser bastante rápida quando o coronavírus estiver sob controle, segundo analistas da empresa de pesquisa britânica Oxford Economics, que analisaram o impacto de epidemias de curto prazo no crescimento económico mundial". Eles tomaram como exemplo a epidemia de pneumonia atípica da SARS de 2003 e da pandemia de gripe suína de 2009 e concluíram que, após experimentar um declínio de curto prazo, a economia mundial experimentou uma recuperação rápida e significativa. (2)

"Os temores sociais aumentaram com o aumento das infecções, mas desapareceram rapidamente quando as epidemias foram controladas", disseram os analistas. A Oxford Economics prevê que a disseminação do coronavírus será interrompida no segundo semestre e, em seguida, a taxa de crescimento do PIB global poderá chegar aos 5%. "A história mostra que a economia recupera rapidamente, mesmo após fortes choques. Por agora, ainda estamos  à espera de uma recuperação significativa no segundo semestre, após o primeiro que foi terrível ", concluem especialistas da Oxford Economics, os campeões da farsa econométrica.

Os analistas britânicos permanecem em silêncio em relação a dois vectores que políticos amestrados e seus patrões, financeiros e banqueiros paralisados, manipularam fortemente durante a crise do coronavírus (Covid-19). No coração de uma crise financeira - monetária - de petróleo - do mercado de acções, marcada por um endividamento abismal dos estados, empresas e particulares, os bancos centrais emitiram e emprestaram, sem garantias, mais de 5.000 biliões de dólares de dinheiro faz de conta (do francês  monnaie de singe – Nota do tradutor) , somados aos 1.800 triliões de dólares de dívidas públicas e privadas acumuladas desde a pandemia da gripe suína de 2009. Pior ainda, essa questão de títulos do tesouro ilusórios foi operada quando metade da população mundial estava produtivamente parada, condenada ao confinamento, numa fase de sobre-endividamento no contexto de um  consumo anémico.

Sintetizando, nada vai bem nesta economia reclusa. Pepe Escobar acrescenta: “As fontes bancárias de Nova York disseram-me a verdade: o risco sistémico tornou-se muito mais grave em 2020 do que em 1979, 1987 ou 2008, devido ao risco extremamente aumentado de colapso do mercado dos derivativos financeiros de 1,5 quadriliões (quadrillion )de dólares (1,5 × 10 ^ 24). Como dizem as minhas fontes, a história nunca viu nada parecido com a intervenção do Fed através da eliminação pouco compreensiva das exigências de reservas dos bancos comerciais, desencadeando uma expansão potencialmente ilimitada do crédito para evitar uma implosão do mercado de derivativos financeiros resultante de um colapso total de matérias-primas e bolsas de valores em todo o mundo ”(3)..

O que um simples bilionário entende facilmente, um analista de renome como Patrick Artus é incapaz de entender. E eis o panfletário a especular sobre o futuro ameaçado da variante neoliberal do capitalismo moribundo.

Artus especula e interroga-se: "A crise do coronavírus irá provavelmente provocar um retorno às cadeias de valor regionais, em vez das cadeias de valor globais, ou seja, vai presidir a desglobalização-desmundialização das economias reais. Um aumento duradouro dos gastos públicos em saúde, indemnização por desemprego, apoio às empresas e, portanto, o fim da austeridade orçamental lá onde foi instalada (Europa) e o crescimento da concorrência tributária. Compreender o que é necessário para o Estado intervir para definir e desenvolver indústrias estratégicas (farmacêuticas, assim como Novas Tecnologias, energias renováveis, etc.). O entendimento (mesmo nos Estados Unidos) de que todas a população deve beneficiar de uma protecção social adequada ". Tudo isso significa claramente o fim do “capitalismo neoliberal” que escolhera globalização-mundialização, a redução do papel do Estado e da pressão tributária, as privatizações e, em certos países, a fragilidade da protecção social (4).

É precisamente aí que bastão magoa.

O capitalismo neoliberal, global e mundial, não é uma escolha do grande capital internacional, não mais do que a redução de um certo tipo de intervenção estatal, a implantação de paraísos fiscais, as privatizações e o adiamento e a cobrança directa aos trabalhadores das despesas sociais, sanotárias e médicas. Essa forma de capitalismo de Estado liberal-laxista para os trabalhadores, mas intervencionista a favor do capital, é uma necessidade, o destino consagrado nas inexoráveis ​​leis da produção e na acumulação de valor sob o capitalismo liberal ou intervencionista ... fazendo oscilar o pêndulo do estado burguês do polo esquerdo - intervencionista - do Estado providência num período de "descolagem" ou da retoma da acumulação. – Estes são períodos históricos de regozijo para esquerdas aburguesadas que são então chamadas a governar, sob protectorado financeiro, os destinos das sociedades "nacionalizadas"-. Invariavelmente, o sistema afunda-se nas suas contradições, no seu balancear entre os seus meios de produção superabundantes e as suas forças produtivas com desempenhos excessivos; as suas mercadorias em excesso e os mercados anémicos e sobre- endividados, o polo direito do Estado  providência é chamado à governança. Em anexo, apresentamos um resumo da análise da firma Nataxis, que explica a actual fase dessa crise do capitalismo e o que preparou a crise em análise.

As tácticas do capital não podem mascarar a sua estratégia a longo prazo.

Esta oscilação do pólo esquerdo - intervencionista - para o pólo direito - laxista - do Estado capitalista-fetichista nunca põe em causa a necessidade estratégica imperativa da monopolização - globalização - mundialização dos meios de produção, de comercialização, de comunicação e em última análise, dos meios de acumulação - valorização do capital. É por isso que aconselhamos o proletariado internacional a preparar-se para resistir em todo o mundo aos períodos de restrição, convulsão, repressão e recessão económica que se seguirão ao confinamento que parecerá muito benigno em comparação com os "remédios" que nos serão infligidos para salvar este modo de produção moribundo. A pequena burguesia ao serviço da burguesia  nos meios de comunicação social já meteu mãos à obra afim de preparar a opinião pública para se resignar, permanecer confinada entre a casa e a oficina. Certamente, o Estado burguês aproveitará esta oportunidade para estreitar o seu domínio sobre o proletariado por meio da "Corona-ditadura", para quebrar toda a resistência popular (5).



ANEXO

Nataxis,  a nossa interpretação da presente crise é a seguinte:

·         existe um excesso mundial de capacidade de produção, principalmente devido essencialmente à globalização e a investimentos muito significativos (realocação) em países emergentes;
·         o excesso de capacidade deveria normalmente diminuir a lucratividade das empresas; em resposta a esta evolução, as empresas tentaram reduzir os salários, daí o declínio da parcela dos salários no PIB em muitos países, o que exacerba a procura insuficiente em relação à capacidade excedente da produção -comercialização. As grandes empresas estão a tentar  tornar-se líderes no seu sector de actividade para beneficiar de margens de oligopólio;
·         o excesso de capacidade produtiva empurra os Estados a adoptarem políticas não cooperativas, visando aumentar a taxa nacional de utilização e valorização das capacidades e da valorização do capital mundial: estímulo ao crédito pelas políticas monetárias muito expansionistas, de onde as bolhas especulativas sobre os preços dos activos, o excesso de dívida e as crises bolsista como índices de crises de acumulação – valorizações sistémicas; acompanhadas de subvalorização das taxas de câmbio (do valor real da moeda nacional) nos países emergentes. Isso penaliza os assalariados locais, que trabalham por salários da miséria. Por aqui podemos perceber o quanto o mercado de trabalho e da mão-de-obra estão totalmente integrados - globalizados - mundializados.

Os estão burgueses estão confrontados com:

§  A situação de excesso de capacidade relativa de produção;
§  a compressão dos salários implementada pelas empresas e pelo estado fetichista.
Existe, portanto, um excesso de oferta de bens e serviços (mercadorias) e a insuficiente procura. Confrontados com esta situação, os Estados adoptaram políticas não cooperativas de apoio à procura, na tentativa de evitar a interrupção do processo de acumulação - valorização aquilo que os economistas designam por  sub-utilização das capacidades de produção .

Essas políticas assumem a forma:

·         antes da crise, políticas monetárias expansionistas destinadas a estimular a procura doméstica, estimulando o crédito. Isso levou a um crescimento muito forte da dívida nos Estados Unidos, Reino Unido, Canadá e área do euro, excluindo a Alemanha, com baixas taxas de juros em relação às taxas de crescimento. Desde a crise de 2008, a procura foi estimulada por défices públicos e crédito gratuito ou quase;
·         nos países emergentes, os governos estão a tentar corrigir a sub-utilização das capacidades de produção- valorização do capital, estimulando as exportações pela sub-avaliação das suas divisas. Essa desvalorização é assim mantida graças à acumulação de reservas cambiais em dólares nos países emergentes (de onde o yuan procura expulsá-lo), o que permite a esses países ganharem parcelas do mercado de exportação, objecto da guerra comercial em curso.
Nós interpretamos, portanto, as políticas de apoio ao crédito nas políticas da OCDE e de sub-valorização das taxas de câmbio nos países emergentes como políticas não cooperativas para responder ao excesso de capacidade global de produção e salários mais baixos pelas empresas, destinadas a rectificar a taxa de uso da capacidade produtiva (em última análise, a valorização do capital) de um país em detrimento de outros países.





Essas políticas interagem para gerar um enorme crescimento da liquidez mundial, que está na raiz das crises desde que elas viram a luz do dia:

§  bolhas financeiras (acções, imobiliária), que em seguida explodem
§  excesso de endividamento que descambou em 2007-2008 numa enésima crise financeira.
§

Notas

2.      Source : SPUTNIK
4.      Patrick Artus. Public Natixis FlashEconomie30mars2020-
















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