segunda-feira, 27 de abril de 2020

Guerra sanitária contra o coronavirus ou guerra de classe contra o proletariado ?




 Por Khider Mesloub.


Há mais de um mês, centenas de milhões de pessoas foram condenadas à prisão, sujeitas a controle social e electrónico, denúncias da vizinhança, repressão policial. Ao abrigo da protecção da população decretada em nome da saúde, a mesma que foi massacrada por todos os Estados responsáveis ​​pelo desmantelamento dos hospitais e pela redução da efectivos  de cuidadores, dezenas de países, na sequência de medidas de quarentena iniciadas pela ditadura chinesa, estão alinhados com a mesma política de confinamento. Como se explica esse alinhamento quase pavloviano da maioria dos países "democráticos" com a China?

A resposta pode ser encontrada no contexto económico da crise global contemporânea. Ninguém ignora  a gravidade da deterioração da situação económica que começou depois de 2008. O ano de 2020 anunciava-se catastrófico. Todos os sinais económicos estavam no vermelho.

A economia real foi atormentada pela sobre-produção sem paralelo, enquanto o comércio internacional retraiu a partir de 2018. O sector financeiro especulativo, por sua vez, ameaçava explodir. A frente social estava, ela mesmo, em plena agitação, marcada por revoltas populares em muitos países, sendo os Coletes Amarelos o modelo exemplar https://les7duquebec.net/archives/253109. As classes dirigentes, vítimas de insatisfação política e perda de confiança, foram, nos últimos anos, desqualificadas, desacreditadas, a ponto de perder o poder contestado nas ruas.

É neste contexto de desestabilização económica e de protesto político e social generalizado que aparece oportunamente o coronavírus.

Paradoxalmente, desde os primeiros alertas relacionados com o coronavírus, tirando proveito da psicose alimentada pela comunicação social enfeudada, por vezes sem a presença de casos comprovados no seu território, os países decidiram prontamente impor o confinamento às suas populações. Mesmo que isso significasse comprometer a sua economia nacional, já prejudicada pela cessação da produção, penalizando assim os lucros, precipitando milhões de trabalhadores no desemprego e na precariedade. No entanto, diante de tais medidas irracionais prejudiciais à economia, não testemunhamos protestos de bilionários, banqueiros ou empresários.

Tudo se passa como se esse golpe de estado sanitário, impulsionado pela pandemia de Covid-19, estivesse a solucionar os negócios do grande capital, impaciente para proceder a uma desvalorização do capital, dito de outra forma a uma destruição das infraestruturas económica menos eficazes, para tentar uma regeneração salvadora. De facto, os principais beneficiários da crise sanitária e económica são os grandes patrões. Sem a eclosão de uma guerra armada generalizada, o grande capital está a tenta rejuvenescer económicamente, redesenhar uma nova ordem mundial, com o apoio sustentado dos estados que fornecem subsídios financeiros públicos.



Sob o pretexto da crise sanitária de Covid-19, a maioria dos países do mundo apressou-se em colocar em quarentena a sua população. Sob o pretexto de combater a disseminação do coronavírus, esses estados instauraram o confinamento. No entanto, o confinamento, um método medieval, se garante a possibilidade de retardar a disseminação do vírus e da mortalidade, por outro lado, não salva a vida de pacientes frágeis e idosos, presa favorita do vírus. Assim, a única eficácia do confinamento  é retardar a propagação do vírus, dito de outra forma escalonar a mortalidade, evitando o congestionamento de hospitais que estão insuficientemente preparados ou totalmente em falência. Qualquer que seja a medida de saúde instituída, o vírus sempre segue a sua missão, em alta velocidade ou em câmara lenta. Mas certamente não é o confinamento que impedirá a sua propagação, a sua progressão letal.

Além disso, por que é que os governos, que normalmente não se importam com a saúde das suas populações, como o provaram nas últimas décadas pela sua política de destruição do sistema de saúde perpetrada em nome da austeridade orçamental, decidiram decretar apressadamente o confinamento, apesar das suas repercussões financeiras prejudiciais e do risco de um colapso económico? Os governantes e os poderosos tornaram-se inconscientes e suicidas ao ponto de comprometer o seu poder? Ao ponto de causar tensões sociais que provavelmente levarão a insurreições? Certamente que não. O verdadeiro desafio de todos esses poderosos com domínio precário, envolvidos numa guerra de classe final travada contra as suas populações trabalhadoras ameaçadoras, é a perpetuação da sociedade capitalista mundializada, há vários anos contestada pelos proletários em revolta. E o confinamento, ou melhor, o coronavírus (como costumava ser o terrorismo) é a arma oportuna ideal para impulsionar a militarização da sociedade num contexto de "paz". Como?  Através de um bombardeamento mediático que provoca ansiedade, dito de outr forma em nome da criação de uma atmosfera de insegurança apocalíptica digna de uma guerra nuclear, levando as pessoas ao medo-pânico. O contexto de sideração assim criado paralisa as populações, obrigando-as a reclamar a protecção do seu governo, ainda no dia anterior odiado e contestado. É o início do processo de controle social, o estabelecimento de medidas para restringir as liberdades, a instituição de leis repressivas, a subjugação totalitária da população, supostamente ditada em nome da crise sanitária.

Entrámos na era da ditadura light, da tirania suave. Ela é exercida em nome da saúde da população passiva.

Numa coluna publicada recentemente no Wall Street Journal, Henry escreveu: "A coesão e a prosperidade das nações repousam na convicção de que as suas instituições podem antecipar  as catástrofes, conter os seus efeitos e restaurar a estabilidade. Quando a pandemia do Covid-19 terminar, as instituições de muitos países darão a impressão de ter falhado. (…) após o coronavírus, o mundo nunca mais será o mesmo (noutras palavras, será militarizado, seguro, NDA). O coronavírus atacou em proporções e com uma brutalidade sem precedentes (o emprego da técnica de dramatização provocadora de ansiedade para preparar a população para a aprovação de medidas de segurança totalitárias em preparação por todos os estados do mundo capitalista, NDA). A sua progressão é exponencial: nos Estados Unidos, o número de casos dobra a cada cinco dias. No momento que redijo estas linhas, não existe cura. Os equipamentos médicos existem em quantidade insuficiente para enfrentar as vagas de um cada vez mais importantes número de doentes (falso: a medicina americana é digna dos países do Terceiro Mundo, está sub-equipada, NDA). (…) Os testes não permitem identificar a extensão da infecção, e muito menos inverter a sua propagação. Pode levar de doze a dezoito meses para desenvolver uma vacina. A administração dos EUA fez o que devia para evitar uma catástrofe imediata (impostura vergonhosa: a administração dos EUA mostrou negligência criminal, NDA). O teste final será o de saber se a propagação do vírus pode ser travada e depois invertida de uma maneira e com proporções que preservem a confiança do público na capacidade dos americanos de se governar. O esforço feito para enfrentar a crise, qualquer que seja a sua escala e a sua necessidade, não deve impedir o lançamento urgente de uma iniciativa paralela para garantir a transição para a nova ordem mundial do pós-coronavírus ”(todo o pensamento de Kissinger está sintetizado nesta última frase: O desafio capital, sem trocadilhos, para as classes dominantes, neste contexto de guerra de classes travada em nome da salvaguarda da saúde, é o de salvar na realidade a ordem capitalista mundializada, através de algumas medidas de ajuste político e operações estéticas económicas, para fazer crer no advento de uma ordem mundial refundada, mas sempre dirigida pelos poderosos, NDA).

Assim, a coberto da crise sanitária lançada para o pasto, como um isco ideológico viral, para as populações assustadas e paralisadas pela mediatização provocadora de ansiedade da propagação do coronavírus, a principal aposta dos poderosos é fortalecer o poder dos Estados enfraquecidos nestes últimos anos pelas múltiplas contestações e sublevações populares. Como?  Pelo recurso à "teoria do caos" (que por trás de uma aparente desordem, na  verdade sob controle, a teoria do caos prepara uma ordem totalitária instituída).

De facto, o objectivo principal, neste contexto de colapso económico deliberadamente provocado, o desemprego maciço voluntariamente suscitado, o caos generalizado, marcado pelo sofrimento e pela miséria inevitável iminentes, é duplo. Por um lado, fragilizar, nos planos social e psicológico, as populações a fim de forçá-las a aceitar a mão segura dos seus governantes "benevolentes e generosos", restaurando assim a sua confiança no aparelho burocrático do Estado, nestes últimos anos duramente contestado nas ruas. Por outro lado, correlativamente, assegurar por cima a perenidade da ordem capitalista dominante. Como o confirma Henry Kissinger: "Será necessário também implementar programas para mitigar os efeitos do caos iminente sobre as populações mais vulneráveis ​​do planeta" (dito de outra forma, é preciso que o governo dos ricos preserve a ordem económica dominante restabelecendo o papel proeminente do Estado, com a cumplicidade de certos estratos recrutados para reprimir qualquer rebelião do proletariado actualmente agitado, NDA).

Henry Kissinger, o ex-Secretário de Estado americano, prossegue com os seu conselho aos poderosos: "Hoje, num país dividido, é necessário um governo eficiente e perspicaz para superar obstáculos de magnitude e alcance globais sem precedente ”. (...) "Enfim, os princípios da ordem liberal internacional devem ser preservados. O mito fundador do estado moderno é uma cidade fortificada protegida por líderes poderosos, às vezes despóticos, às vezes benevolentes, mas ainda com força suficiente para proteger o seu povo de um inimigo externo ou interno”, afirma o decano da diplomacia americana.

Tudo está resumido nesta última frase. O inimigo não é o coronavírus, mas o proletariado, esse inimigo interno há vários anos, muito ameaçador, tentado pela insurreição social, esse vírus social mais perigoso que o coronavírus. Essa força suficiente (O Estado), como Kissinger diz, é a única arma do governo dos poderosos para salvar a sua ordem capitalista mundializada. "O desafio histórico para os dirigentes é gerir a crise enquanto constrói o futuro. Um fracasso pode inflamar o mundo ", conclui Henry Kissinger, dirigindo-se aos seus amigos poderosos. O desafio deles, lembra ele, é o de se prepararem para o advento da nova ordem mundial militarizada ou sucumbir ao ataque de pessoas afectadas pelo vírus da rebelião.



Mesloub Khider












Sem comentários:

Enviar um comentário