A
burguesia americana e os seus aliados no mundo inteiro, persistem em considerar
que o assassinato de George Floyd foi um acto de puro racismo. Os levantamentos
populares a que assistimos em várias cidades americanas e noutros pontos do
mundo, revelam, no entanto, que este assassinato decorre da intensificação da
luta de classes nos Estados Unidos, larvar de há muito tempo a esta parte.
O que as
manifestações de milhares de operários e trabalhadores americanos – de todas as
raças e credos – nos estão a revelar, há vários dias seguidos, é a imagem geral
do impacto da crise económica, da pandemia e do confinamento nos Estados Unidos
na luta de classes naquele país.
Se é
certo que a sublevação começou por ser um protesto da população negra contra o
racismo assassino da polícia local, este evento rapidamente despoletou a
agudização da luta de classes que, aliás, já levou a burguesia ao desespero,
tendo-a obrigado a enviar milhares de soldados da Guarda Nacional (uma espécie
de exército na reserva) para as ruas das várias cidades americanas onde ocorrem
manifestações, protestos e levantamentos populares, alguns de grande magnitude,
como foi o caso ocorrido hoje, frente à Casa Branca, que obrigou os Serviços
Secretos a conduzir Donald Trump para o bunker que existe naquele edifício, afim
de garantir a sua segurança, enquanto as forças policiais tentam conter um
movimento cada vez mais vigoroso e imparável.
A cidade
de Minneapolis, no Estado do Minnesota – onde ocorreu o assassinato de
George Floyd – ( "cidade gémea" de St. Paul, capital daquele estado) tornou-se o espelho da actualidade do que se passa no mundo
inteiro. A crise sistémica do capitalismo e do imperialismo, agravada pela
pandemia e pelo confinamento mortal, afectou o sector de serviços e o trabalho
precário, os sectores de produção industrial e agrícola o que levou a que, no
final do mês de Março, dois terços dos trabalhadores interrogados afirmassem
que tinham trabalhado menos horas: 41% foram despedidos; 31% viram as horas de
trabalho reduzidas e, somente 28% continua a trabalhar como é habitual.
Porém,
no fim de Abril, empregos outroramente considerados seguros também deixaram de
existir: 58% dos trabalhadores tinham perdido o seu emprego e somente 20%
trabalhavam normalmente. Mas, entre os que foram despedidos, menos de um em
cada cinco trabalhadores conseguiu, até à data, receber qualquer subsídio de
desemprego. Tudo isto ocorre num contexto em que cerca de 40% dos americanos
estavam, antes da pandemia, incapacitados de pagar despesas de urgência de 400
dólares.
Há uma
semana, o departamento do trabalho americano assinalou que mais de 40 milhões
de pessoas tinham solicitado subsídios desde o início da crise e,
aproximadamente 30 milhões já os estariam a receber. O quadro geral indica que
as facturas por pagar se acumulam e os bancos alimentares são mais solicitados
do que nunca. Uma forma de a burguesia não abrir mão das mais valias que obtém
à custa da exploração do trabalho, remetendo para a caridadezinha – tal como a
burguesia portuguesa faz – esse papel.
Para uma
parte importante da classe operária americana, o que a espera é um verdadeiro
precipício. As noites quase festivas que incendeiam os edifícios e os símbolos
dos corpos repressivos locais, odiados, filmando de telemóvel em punho como um
louco só para obter uma recordação, oferece mais alívio do que outra coisa
qualquer. Infelizmente, separados por todos os níveis de classe e na ausência
de todas as formas de organização, eles reafirmam a ideologia da sua
contingência pelos grupos demográficos (raciais) e identitários (étnicos) que é
a estratégia da burguesia para manter impotente e dividida a classe operária
daquele país.
A
situação não é muito melhor no resto do mundo. Mormente na América Latina onde
a ONU estima que 14 milhões de pessoas podem estar a sofrer de fome na nova
fase da crise. A crise industrial é evidente, os encerramentos de fábricas e
empresas apenas começaram. A Renault apresentou um plano de redução de custos
de 2 biliões de dólares. Em Espanha, 80% das pessoas interrogadas pensam que os
seus salários vão congelar ou baixar. A OIT prevê que o desemprego entre os
jovens se tornará “estrutural”, o quer dizer que assim ficará até nova ordem. A
“geração
covid” vai sofrer uma insegurança maciça em todos os países, incluindo
a Alemanha.
O futuro
do modo de produção capitalista é, seguramente, o caixote do lixo da história.
A pandemia de Covid-19 apenas veio sublinhar o quão obsoleto e caduco ele é. A
crise pandémica e a táctica de confinamento policial são programas temporários.
Enquanto os clãs do grande capital mundial
contam as suas armas virais, nucleares e convencionais, o proletariado
internacional não deve perder a oportunidade de confrontar o aparato repressivo
dos estados dos ricos. Longe vão os tempos em que o proletariado era
considerado como carne para canhão. Somos todos proletários e deveríamos transformar
esta guerra reaccionária em guerra revolucionária.
Retirado de: http://www.lutapopularonline.org/index.php/internacional/2729-estados-unidos-um-crime-de-racismo-ou-um-episodio-da-luta-de-classes
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