domingo, 24 de janeiro de 2021

Um genocídio anunciado - agrava-se o quadro de mortes não-covid!

 



Num artigo escrito por mim e publicado a 26 de Abril de 2020 no Órgão Central do PCTP/MRPP, o Luta Popular online -  Uma pandemia paralela provocada pela diminuição da realização de urgências e consultas hospitalares! - denunciava-se como se estavam a gerar as condições para uma mortandade sem precedentes – a roçar a eugenia -, e onde se acusava o governo de Costa e dos seus ministros lacaios por esse facto. Os números, nessa altura, já prenunciavam o genocídio inqualificável, que a história irá certamente classificar como um autêntico crime contra a humanidade e os seus autores julgados e condenados sem apelo nem agravo.

Noutro artigo assinado por mim para o supracitado Órgão - http://www.lutapopularonline.org/index.php/pais/104-politica-geral/2792-sns-aumento-do-numero-de-mortes-indicador-de-uma-politica-assassina - a 20 de Outubro de 2020, já se demonstrava que existia uma nova pandemia, muito mais grave e profunda do que a alegada pandemia de Covid-19, como o demonstrava o número de mortes não-Covid a mais que se havia registado em igual período de anos anteriores.

Explicávamos que o que estava a emergir se devia ao facto de que o esforço de trabalho do SNS estava a ser dedicado maioritariamente a uma só doença – o Covid-19. E denunciámos que, se aquelas eram já as consequências, a política errática, terrorista e assassina do governo Costa - ao serviço da OMS e da máfia da indústria farmacêutica - iria agravar a situação se Marcelo Rebelo de Sousa não se dispusesse a correr, quer com Costa, quer com os seus ministros lacaios. Quase metade da actividade hospitalar – ou seja, uma em cada duas camas – está destinada à Covid. Como seria de esperar, à custa de se estar a perder o resto da população doente.

Pois bem, na quarta-feira da semana que agora termina, Portugal registou o maior número de mortes diárias – 721 – desde que existe registo estatístico dos óbitos. Sendo que, alegadamente atribuídas ao Covid-19, se registaram 219 óbitos. E dizemos alegadamente porque existe uma fronteira difusa entre morrer de Covid e morrer com Covid, que o governo, para se eximir das responsabilidades do desastre que alimentou, explora até à exaustão.

A questão que se coloca, então, é a de saber do que é que faleceram os outros  500 doentes. Em nosso entender – e sintetizando o que muitos profissionais de saúde defendem – isto significa que existe uma disrupção total no controlo sanitário do país. Quer quanto aos doentes Covid, quer em relação aos outros doentes e ao que deveria ser uma prioridade para os médicos, hospitalares, de saúde pública e dos serviços primários. A estes últimos, por exemplo, nada mais tem sido permitido do que fazer Trace Covid (ou seja, rastreio).

As consequências de bloquear a principal porta de acesso aos cuidados de saúde, a medicina geral e familiar, têm-se revelado catastróficas. A saúde pública também está bloqueada e, com os recursos que existem é admirável como, ainda assim, e muito graças ao empenho de médicos, enfermeiros e demais profissionais da saúde – que tem levado ao chamado burnout (esgotamento) – se tem conseguido fazer o que se tem feito. Quando se canalizam as equipas de saúde pública para a realização de inquéritos epidemiológicos, alegando que tal produzirá o efeito de quebrar as cadeias de transmissão, não se poderia esperar outro resultado que não o abandono da vertente preventiva e de monotorização permanente das doenças e dos doentes.

E leva a situações de limite que nunca deveriam, quer do ponto de vista ético, quer do ponto de vista operacional, levar equipas médicas e de enfermagem a ter de tomar decisões tais como as de priorizar quem vão observar e tratar ou de prescindir de umas coisas a favor de outras porque não têm o dom da ubiquidade e são em número manifestamente insuficiente para chegar a todos.

Isto porque, tal como sempre se denunciou, o modelo de gestão capitalista que TODOS os governos têm adoptado estão a levar à liquidação do SNS e à criação das condições para que a saúde privada se desenvolva ainda mais. Uma gestão que se baseia no princípio “just in time”, isto é, de não programar os serviços, os equipamentos e, sobretudo, os profissionais de saúde senão ao estritamente definido por Leis do Orçamento Geral de Estado restritivos para qualquer financiamento para o sector da saúde.

Consequência. Os recursos são cada vez mais finitos. Tão finitos que, depois, se recorre, à pressa, à construção de hospitais de campanha. Que, no entanto, não abrem ou funcionam a meio gás. Não porque não tenham camas ou espaço mas, simplesmente, porque não existem recursos para alocar. Sobretudo recursos humanos, médicos, enfermeiros, técnicos da mais variada índole, e outros profissionais da saúde.

O quadro é, pois, o de médicos e enfermeiros esgotados nas urgências hospitalares, equipamentos inoperacionais por falta de recursos humanos para o fazer, profissionais de saúde que, perante o quadro de precariedade, baixos salários e falta de perspectivas de carreira debandam para outras paragens, mormente para a saúde privada ou para fora de Portugal, onde o seu esforço, o seu empenho e a sua experiência, são premiadas de forma incomensuravelmente superior àquela com que são maltratados no seu país.

O SNS só sairá reforçado desta crise se,  a par da enorme solidariedade e empenho dos profissionais da saúde, entre si, e para com os doentes, olharmos para o Serviço Nacional de Saúde como um todo, isto é, para um SNS onde estejam integradas todas as vertentes e operadores da saúde – pública, privada e social. Claro que não alimentamos ilusões quanto à possibilidade de esse pressuposto poder ser cumprido no quadro do sistema capitalista.

Para que o mais importante seja que os doentes e a população em geral sejam tratados condignamente e tenham o direito à vida e à dignidade, torna-se necessário remover do caminho o escolho do modo de produção capitalista, assente na exploração do homem pelo homem, na escravatura assalariada, que impede que esse desiderato se cumpra.

 

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