27 de Fevereiro de 2023 Roberto Bibeau
Há muitos indícios do óbvio declínio do império americano. Entre estas, a desvalorização do "dólar-rei", moeda de reserva e valor cada vez menos porto seguro é a mais óbvia (https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2023/02/o-colapso-do-dolar-esta-em-curso-arabia.html ). Assim, observamos recentemente que: "A participação do dólar nas reservas internacionais está a diminuir gradualmente. Em meados dos anos 80, o dólar representava 85% das reservas mundiais, no início dos anos 2000 – 72% e no primeiro semestre de 2022 – apenas 59%. Até agora, em termos de utilização no comércio internacional, o dólar cobre 41,19%, o euro – 35,49%, a libra esterlina – 6,45%, o iene japonês – 2,82%, o yuan chinês – 2,2% do volume total de transacções... No final de 2022, o crescimento das compras de ouro pelos bancos centrais situou-se em 18%. O banco central da Federação Russa em compras está em 4º lugar. O ouro é considerado o principal activo de protecção numa crise, em oposição ao dólar. Um artigo na revista
Já não há dúvidas: o dólar está prestes a perder o seu estatuto de moeda
internacional em grande parte do planeta. Os BRICS querem voltar a uma moeda
lastreada em ouro. A revolução de 2023 será tão significativa quanto a de 1789
no derrube da ordem estabelecida.
Mas primeiro, vamos dar um passo atrás...
Em 26 de Abril de 2006, no seu boletim GEAB, o
Laboratório Europeu de Antecipação Política escreveu:
"Estimamos agora em mais de 80% a
probabilidade de que na semana de 20 a 26 de Março de 2006 se assista à eclosão
da principal crise política mundial desde a queda da Cortina de Ferro em 1989,
acompanhada por uma crise económica e financeira de magnitude comparável à de
1929. Esta semana do final de Março de 2006 marcará o ponto de inflexão de
desenvolvimentos críticos, conduzindo a uma aceleração de todos os factores
conducentes a uma grande crise, mesmo sem uma intervenção militar dos EUA ou de
Israel contra o Irão. No caso de tal intervenção, a probabilidade de uma grande
crise chega a 100%.
O anúncio desta crise é o resultado da análise das decisões tomadas pelos dois principais intervenientes na actual principal crise internacional, os Estados Unidos e o Irão:
§
Por um lado, é a
decisão iraniana de abrir em Teerão, em 20 de Março de 2006, a primeira bolsa
de petróleo em euros, aberta a todos os produtores de petróleo da região;
§ E, por outro lado, a decisão da Reserva Federal dos EUA de deixar a partir de 23 de Março de 2006 de publicar os números de M3 (o indicador mais fiável da quantidade de dólares em circulação no mundo)»
No 1º de Fevereiro de
2021, a Federal Reserve dos EUA parou de
publicar dados monetários M1 e M2. Hoje é impossível saber a
quantidade real de dólares que circulam no mundo. A Fed pode imprimir à
vontade, conforme necessário, para evitar um calote nas dívidas de curto prazo
deste ou daquele banco ou desta ou daquela nação.
Desde Abril de 2006 realizaram-se muitos eventos. A primeira foi a crise
sistémica de 2008 e a cimeira do G20 em Washington, em Novembro, durante a qual
a maioria das principais nações apelou a uma mudança no sistema monetário
internacional.
Já em 2009, os quatro líderes dos países
emergentes (Brasil, Rússia, Índia e China – BRIC) começaram a estruturar-se com
o objetivo de se emancipar do sistema financeiro ocidental. A primeira
reunião oficial dos países BRIC foi realizada em Junho de 2009 em
Ecaterimburgo, Rússia. No ano seguinte, a África do Sul juntou-se ao grupo,
cuja sigla se tornou BRICS. Em 2013, o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) foi
criado para se libertar do neo-colonialismo financeiro do Banco Mundial e do
FMI.
No G20 pós-2008, os
países emergentes pediram mais vozes em ambos os órgãos, mas o Congresso dos
EUA recusou-se a apoiar estas mudanças. São necessários 85% dos votos para
mudar a ordem das coisas no FMI, mas os Estados Unidos detêm 17%, o que lhe
permite bloquear qualquer desenvolvimento significativo. Washington estava a
usar e a abusar do seu direito de voto. Tanto que Christine Lagarde, directora
do FMI, teve que dar um ultimato ao Congresso em 14 de Abril de 2014 para obter uma mudança muito ligeira no
status quo. No ano seguinte, em 2015, o yuan finalmente conseguiu um lugar de
salto na cesta de SDR e a China duplicou o seu poder de voto de 3,8% para 6,1%.
Mas como os Estados Unidos não abriram mão dos seus direitos de veto, o
desejo dos BRICS de criar um sistema paralelo foi fortalecido.
Em Março de 2009, a China emitiu uma carta de intenções sobre o futuro
sistema monetário, com uma referência ao Bancor proposto por John Maynard Keynes
em Bretton Woods em 1944. Esta moeda deveria consistir num cabaz das principais
moedas mundiais, como os DSE do FMI, e ser estabilizada por um cabaz de 40
matérias-primas, ponderadas de acordo com a sua escassez. Desde então, tenho
rastreado qualquer menção a tal sistema nos noticiários.
Já em Setembro de
2009, a China encorajou os seus cidadãos a investir
em ouro e prata. Este gráfico mostra os volumes de ouro físico
negociados na Bolsa de Ouro de Xangai (SGE) e dá uma ideia das acções de metal
amarelo existentes na China. O dólar está claramente a perder o seu estatuto de moeda de comércio internacional.
Os BRICS querem voltar a uma moeda garantia-ouro.
Ao mesmo tempo, a política dos principais bancos centrais em relação ao ouro sofreu uma viragem de 180°. Quase imediatamente após o G20 em Novembro de 2008, os bancos centrais que tinham sido vendedores líquidos de ouro durante mais de 20 anos tornaram-se compradores líquidos. O ano de 2022 foi marcado por um aumento muito acentuado destas compras de ouro, pelas razões que veremos mais adiante.
Os Estados Unidos, ao
cortar o acesso à rede SWIFT ao Irão em 2018, pressionaram a China e a Rússia a
desenvolver os seus próprios sistemas de mensagens interbancárias. Estes
sistemas já estavam operacionais quando o Ocidente o fez novamente, privando a
Rússia do SWIFT em Fevereiro de 2022.
Vale a pena lembrar que qualquer transacção internacional em dólares deve
passar por um banco americano. Como resultado, os Estados Unidos rastreiam
quase todo o comércio entre os vários intervenientes no comércio mundial.
Em fevereiro de 2022,
os Estados Unidos e seus aliados congelaram os activos financeiros dos russos
em bancos ocidentais. Esta sanção tornou todas as outras nações conscientes de
que Washington poderia arruiná-las de um dia para o outro e que deter activos
em dólares nos Estados Unidos ou na União Europeia era arriscado, se não se
cumprisse servilmente a política americana. Como sempre, não é o acontecimento
que conta, mas sim a exploração do evento. No entanto, a China e a Rússia
fizeram questão de fazer passar a mensagem a muitos países, encorajando-os
a desdolarizar tanto quanto possível. Para isso, a maneira mais fácil é usar
os seus dólares para comprar ouro, o que explica o movimento maciço
de compra de ouro pelos bancos centrais em 2022.
Após a primeira salva
de sanções ocidentais e a queda do rublo, Moscovo impôs que o seu petróleo
fosse vendido por ouro, a um preço fixo de 5.000 rublos por onça. O rublo tinha então
subido em relação ao dólar e a procura por ouro em Londres tinha disparado,
especialmente por causa dos correctores de petróleo indianos. Na verdade, pago
em ouro, o preço do petróleo russo era muito barato. Comerciantes indianos e
chineses conseguiram comprar petróleo e gás da Rússia, proibido na Europa, e
depois revendê-lo com uma alta margem para a União Europeia. Em 2022, a Índia
aumentou as suas compras de petróleo russo em 33 vezes em comparação com o ano
anterior.
As sanções ocidentais
estrangularam mais a Europa do que a Rússia, mergulhando as nações europeias
numa crise energética e inflaccionista. Como todos sabem, a inflacção é uma diminuição do poder
de compra das moedas (e um imposto oculto – NdT).
Na década de 1970, o
economista Martin Armstrong percebeu que era impossível fazer previsões económicas
confiáveis sem calcular uma série de dados por conta própria, incluindo a inflacção,
com cada país a usar as suas próprias receitas para minimizá-la. Estas
diferentes receitas evoluem regularmente para esconder cada vez mais a
realidade. Segundo Martin Armstrong, a inflacção nos Estados
Unidos em 2022 foi de 32% (veja aqui). A economia dos EUA sofreu,
portanto, muito com a guerra comercial e cambial travada contra a Rússia e a
China.
O sistema petrodólar, negociado entre os
Estados Unidos, o "Cartel
das Sete Irmãs" e a OPEP na década de 1970, exigia que os
países produtores vendessem petróleo e gás em dólares americanos. Como
resultado, todos os países consumidores de energia tiveram que manter grandes
reservas cambiais em dólares para pagar as suas facturas. Em 2018, a China
lançou a Bolsa Internacional de Energia de Xangai, na qual os contratos futuros
são negociados em yuan.
Em 9 de Dezembro de
2022, durante a primeira visita de um líder chinês ao Golfo Pérsico, Xi Jinping
jogou uma pedra no charco ao pressionar para que as transacções de petróleo e gás fossem liquidadas em yuans em vez
de dólares. No fórum de Davos, em Janeiro, o ministro das Finanças saudita,
Mohammed Al-Jadaan, disse que o seu país agora estava pronto para negociar noutras
moedas além do dólar ou do euro. Sabemos que a Rússia já vende o seu petróleo e
gás em yuan à China, ou em ouro à Índia.
Através de seu
vice-presidente, Mahamudu Bawumia, o Gana anunciou em 24 de Novembro que o país
passaria a comprar o seu petróleo em ouro em vez de dólares.
Estamos a assistir ao crepúsculo do petrodólar.
Em 14 de Fevereiro de
2022, The Cradle publicou uma entrevista com Sergey Glazyev, economista russo,
ministro responsável pela Integração e Macro-economia da União Económica da
Eurásia. Glazyev revelou que, há mais de 10 anos, a Rússia e a UEE trabalham
com a China num projecto de reforma monetária, que deverá ver a luz do dia em
breve. Este sistema está extremamente próximo do Bancor
de Keynes, com uma cesta de moedas estabilizada por uma cesta de 20
commodities.
No dia 27 de Dezembro
de 2022, em entrevista para a Vedomosti.ru, Sergyev Glazyev falou sobre a
evolução deste projecto monetário. Depois de lembrar o papel histórico do ouro
e da prata como padrões monetários, Glazyev disse que todas as mercadorias
poderiam ser valorizadas em gramas de ouro. Com base em cálculos de Zoltan Pozsar, do Credit Suisse, ele afirma que a
Rússia planeia avaliar 2 barris de petróleo numa grama de ouro, o que duplicaria
automaticamente o preço
do ouro em dólares, elevando-o para US$ 3.600.
Entre Bretton
Woods e o fim do Gold Exchange Standard em 1971, quando o preço do ouro foi fixado em
US$ 35 por onça, o preço do petróleo moveu-se quase linearmente. Por uma onça
de ouro, obtivemos entre 11,4 e 13 barris de petróleo (WTI). Assim, um grama de
ouro tornou possível obter 0,35 ou 0,40 barris de petróleo.
Em 28 de Dezembro, o
maior banco da Rússia, o SberBank, anunciou
que havia concluído com sucesso sua primeira transacção envolvendo uma
stablecoin ligada ao ouro. A operação foi realizada na plataforma blockchain
criada pela Atomyze, um dos muitos emissores de activos financeiros digitais (DFAs) autorizados
pelo Banco da Rússia. Esta
stablecoin é apoiada por um stock de ouro e pode ser usada como moeda.
Desde então, a Rússia
e o Irão interligaram as suas mensagens interbancárias. De acordo com Pepe Escobar, os dois países trabalhariam
na criação de uma stablecoin para o seu comércio, ou seja, uma moeda digital garantida
em ouro como a que acaba de ser lançada pelo SberBank. (Ver: https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2023/02/parceria-china-irao-esta-formar-se-uma.html
).
As discussões multiplicam-se nos bastidores. A desdolarização e
remonetização do ouro está a acelerar.
Em 2023, o grupo BRICS definirá novos critérios para a adesão ao bloco e
decidirá sobre a admissão de novos membros elegíveis. A Arábia Saudita é
candidata a integrar os BRICS, mas também os Emirados Árabes Unidos, Argélia,
Irão, Nigéria, Egipto, Turquia, Argentina, Indonésia e Tailândia. Os principais
países produtores de petróleo querem aderir à União dos Países Emergentes.
Para Zoltan Pozsar, as nações do G7, que dominam o mundo monetário e
financeiro desde Bretton Woods, só conseguiram prosperar graças à energia
barata e à mão de obra barata dos países emergentes. Hoje, o clã dos 7 países
consumidores encontra-se em confronto com o clube dos 5.
O dinheiro puramente
fiduciário, imposto pelos Estados Unidos e seus parceiros do G7, pode ser
fabricado em poucos cliques e sem qualquer criação de riqueza equivalente. Os
países ricos em matérias-primas aspiram agora a obter uma contrapartida real no
seu comércio com os países consumidores.
Tudo isto aponta para um aumento acentuado dos preços dos metais preciosos
e de todas as matérias-primas.
Por outras palavras, a inflacção está apenas a começar.
A China é o maior país produtor de ouro do mundo, com 370 toneladas, bem como o terceiro maior país produtor de prata, com 3.400 toneladas. Na China, a relação entre a produção de ouro/prata está, portanto, próxima de 1/9. Na Rússia, as minas produzem apenas 4,3 vezes mais prata do que ouro. Todos os países produtores sabem que o rácio actual de 1:85, imposto pela coligação LBMA/COMEX, é totalmente absurdo. Este último certamente trabalhará no reajuste dessa proporção, e é por isso que pode ser interessante comprar prata física antes disso.
2023 será palco de convulsões sociais, monetárias e financeiras, numa
escala semelhante à da Revolução Francesa de 1789. Esperem que o clube BRICS
alargado anule a ordem estabelecida pelos EUA e pelo G7.
Esperemos, no entanto, que as moedas digitais dos bancos centrais (CBDCs)
não sejam atribuições que arruinem as pessoas.
Fonte: or.fr
Fonte: Or: le bouleversement monétaire est en marche de concert avec la crise financière! – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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