quarta-feira, 21 de abril de 2021

A arte de viver à francesa vítima colateral do confinamento

 


 20 de abril de 2021  René  Naba   

RENÉ NABA — Este texto é publicado em parceria com www.madaniya.info.

Nadine Sayegh, uma académica franco-síria, é colunista do site https://www.5njoum.com/, liderado pelo jornalista libanês Sami Kleib, ex-chefe do serviço árabe da RFI e dissidente do canal transfronteiriço do Catar Al Jazeera. Professora de poliglota (inglês, espanhol), ela é a anfitriã da instituição de caridade "Al Sakhra" (Roc) para ajudar os sírios afectados pela guerra.

O Bistrô (pequeno restaurante – NdT) e o "A la bonne franquette" (ambiente informal, familiar – NdT), duas instituições francesas firmemente enraizadas na língua francesa e no convívio, sofreram particularmente com a pandemia coronavírus e o confinamento que se seguiu em França em 2020.

Um olhar para trás para essas duas instituições francesas com as explicações de Nadine Sayegh sobre as suas origens, no primeiro aniversário da introdução do primeiro confinamento devido à pandemia.

O Bistrô

Tão parisiense quanto a Torre Eiffel e o Museu do Louvre, o bistrô continua a ser um lugar obrigatório para todos os franceses. Meio-café meio restaurante, com toalhas de mesa tradicionais com pequenos azulejos vermelhos e brancos, deve a sua reputação ao seu serviço rápido, a preços razoáveis e ambiente familiar. Mas de onde é que isso vem?

Várias interpretações surgiram. Mas desde que a placa etimológica foi descoberta na fachada do restaurante Madre Catarina, na 6 Place du Tertre em Montmartre, as outras versões desapareceram.

De facto, em 1814, após a derrota de Napoleão I, os soldados do exército russo do czar Alexandre I estabeleceram-se em Paris, e, durante o seu serviço, eles iam recarregar algumas bebidas, silenciosamente, nas tavernas ao lado.

Mas, para não serem apanhados pelos seus superiores, ordenaram que fossem atendidos rapidamente, e gritavam "bistrô", o que significa em russo "rápido, rápido". E desde então, esta palavra tem sido adoptada pelos franceses.

Hoje, mesmo que tomem formas ligeiramente variadas, bistrôs parisienses conseguiram manter a sua aparência antiquada, uma grande barra de zinco precedida por algumas mesas de madeira, para servir os seus clientes com esses pequenos pratos tradicionais, que vão desde a terrine (uma espécie de terrina de sopa – NdT), até à blanquette de veau (prato de carne de vitela migada, cenouras e manteiga), em pote levado ao lume, até ao ensopado de carne (bœuf bourguignon ) e as incondicionais batatas fritas!

Tudo isso acompanhado de uma taça de vinho francês. Talvez não seja de uma grande safra, mas que não deixa de ser muito agradável, para não mudar os hábitos!

Para o informal e familiar

O tempo passa, as gerações sucedem-se e as sociedades mudam, daí a influência desta última na linguagem e nos códigos sociais.

Não há nenhuma expressão que tenha retirado o seu significado da Corte Real antes de se familiarizar com as pessoas comuns, antes de se familiarizar  com as pessoas comuns , outrora estranhas aos bons modos. Vejamos o que é o nosso “informal e familiar”?

Esta expressão popular, que nos convida a comer sem complicações e protocolo, em frente ao televisor, com amigos ou em torno de uma pizza, não é de forma alguma desconhecida para nós.

Ela tem a capacidade de colocar os hóspedes à vontade e de fazer os nossos hóspedes  sentirem-se em casa como se fossem luvas do século XVII.

Naquela época, os preciosos eram reis e a mundanidade (socialites) eram rainhas. Ambos se distinguiamm pelo seu comportamento refinado e pensamento subtil. Através da arte da lisonja e da afectação (afféterie), que abundam em salões e mansões até à grandiloquência. Uma situação muito explícita para os leitores de "Précieuses ridicules", de Molière.

Assim, para acentuar essa difracção, Claude Duneton, esse historiador da língua, lembra que "teria sido costume opor duas expressões: 'à la française' (à francesa – NdT) que significava com grande gentileza e compreensão, e a pequena expressão 'à la franquette' (informal, familiar – NdY) para dizer 'francamente, muito simples'.

Somente dois séculos depois, no século XIX, a expressão com o "bom" agregado, assumiria um significado mais alargado para se dizer "de uma maneira franca e simples".

E finalmente é no século XX, quando Marcel Proust o apresenta em "Em Busca do Tempo Perdido": "Não faça chá para nós, vamos falar baixinho, somos pessoas simples, com a informalidade (franquete) certa" que essa fórmula se tornará de uso generalizado.

Fonte: L’art de vivre à la Française victime collatérale du confinement – les 7 du quebec 


 

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