O Líbano em contraplano 1/5: A divisão do Líbano pela
OTAN
René
Naba, 1 DE setembrO DE 2025
EM Actualités, LÍbanO
A Ziad Rahbani, In Memoriam
A Ziad Rahbani, filho da grande estrela da música
árabe Fairouz, falecido em Julho de 2025, pela sua eminente contribuição para a
crítica dos costumes controversos do Líbano.
Este dossier
em cinco partes é publicado por ocasião da morte, em 28 de Setembro de 2024, de
Sayyed Hassan Nasrallah, líder do Hezbollah libanês, a formação paramilitar
xiita libanesa e animador da resistência anti-israelita em todo o mundo árabe.
Nota da redacção de https://www.madaniya.info/
O
contra-campo é uma tomada realizada a partir de um ponto simetricamente oposto
a outra tomada; a cena assim filmada é montada alternadamente. Recorrendo a
esta técnica narrativa, o autor deste texto propõe-se fazer uma leitura não
conformista da história do Líbano, o queridinho do Ocidente... Uma leitura não
conforme com a imagem veiculada pelos meios de comunicação ocidentais, que se
assemelha mais a brochuras publicitárias do que à sombria realidade deste país.
Fim da nota.
A divisão do Líbano pela
OTAN
A NATO não
só está a conduzir uma guerra suave (soft war) contra o Líbano, como também
está a proceder ao seu cerco militar com o objectivo de subjugar o menor país
árabe, fronteiriço com Israel, e de o prender definitivamente ao seio
atlantista, na sequência da destruição da Síria, a fim de neutralizar qualquer
ameaça potencial ao Estado hebraico proveniente da sua fronteira setentrional.
O espaço
aéreo e marítimo, bem como as fronteiras terrestres, estão bloqueados pelos
países ocidentais, assim como os dois pulmões económicos do Líbano, o aeroporto
e o porto de Beirute.
Alemanha e Reino Unido
A Alemanha e
o Reino Unido, os principais fornecedores de armas a Israel, depois dos Estados
Unidos, durante a guerra israelo-palestiniana de 2023-2024, controlam, o
primeiro, as fronteiras marítimas do Líbano e, o segundo, a fronteira terrestre
entre o Líbano e a Síria.
A marinha
alemã, operando no âmbito da Finul, controla as costas libanesas, perseguindo o
tráfico clandestino de drogas e armas com destino ao Líbano. Mas permanece
inerte em relação às operações israelitas contra o Líbano.
Todas as
suas intercepções são comunicadas à ONU, mas também a Israel, em virtude da
solidariedade expiatória que liga a Alemanha ao Estado judeu devido ao
genocídio hitleriano. O Reino Unido, por sua vez, instalou uma dúzia de postos
de observação para ajudar o exército libanês a controlar melhor a fronteira com
a Síria. Essas torres, instaladas desde 2014 numa parte da fronteira de 375 km
de extensão que separa os dois países, têm como objectivo, secundariamente,
impedir a invasão jihadista no Líbano em plena guerra de destruição da Síria,
mas principalmente vigiar o abastecimento de armas do Hezbollah pelo Irão
através da Síria.
A juventude cristã e xiita, bem como as mulheres: alavanca da política britânica no Líbano
«O Reino Unido quis incendiar o Líbano, reciclando contra o país vizinho de
Israel a estratégia implementada contra a Síria desde 2011. O governo de Sua
Majestade tentou influenciar as orientações políticas do Líbano, através de
empresas de relações públicas, infiltrando nas instituições libanesas espiões
locais ao seu serviço. «Para tal, o governo de Sua Majestade ofereceu a sua
assistência ao governo libanês, recorrendo a artimanhas para o levar a admitir
espiões disfarçados em organizações da sociedade civil, nas forças armadas e
nos meios de comunicação social, com vista a satisfazer os seus objectivos imperiais
(...). «O objectivo subjacente de Londres era conseguir derrubar o poder
libanês, mesmo que este beneficiasse do apoio da sua população», revelam os
documentos divulgados pelo Anonymous e dos quais o diário libanês Al Akhbar
publicou amplos excertos na segunda-feira, 14, e na terça-feira, 15 de Dezembro
de 2020.
· Pour le lectorat anglophone, cf ce lien : https://covertactionmagazine.com/2021/05/27/secret-documents-expose-british-cloak-and-dagger-activities-in-lebanon.
«Com o objectivo
de provocar uma «mudança social positiva», a empresa britânica ARK propôs
destacar a «luta contra a corrupção» para incentivar os libaneses a provocar a
mudança. «A cooperação com o exército e as forças de segurança, com vista a
ganhar a confiança dessas duas instituições, será um dos pilares da estratégia
britânica.
O Ministério
dos Negócios Estrangeiros aplicou o roteiro elaborado pela ARK (Analysis,
Research, Knowledges), nomeadamente visando a população libanesa com o objectivo
de provocar um derrube pacífico do poder; uma reprodução realizada pela empresa
britânica anteriormente solicitada para a desestabilização da Síria.
«A ARK visou
principalmente os jovens cristãos e xiitas, que representam 12% da população
libanesa, bem como as mulheres, particularmente afectadas pelo medo da pobreza
e da descida social. O projecto foi aprovado pelo governo britânico em 19 de Julho
de 2019, três meses antes da revolta popular que provocou a demissão do
primeiro-ministro libanês Saad Hariri, levando a um prolongado vazio no poder.
Cf. New
Leaks Show How British Spies Infiltrate And Undermine Lebanon’s Security
Services:
Os Estados Unidos
Os Estados
Unidos têm o controlo sobre o exército que financiam e equipam, mas privam-no
de meios de defesa reais, opondo-se a dotá-lo de uma força aérea e marinha para
proteger o espaço vital de Israel. Um domínio que prolongam através do controlo
indirecto do Aeroporto Khaldé de Beirute.
Washington
forneceu gratuitamente o sistema de videovigilância desta instalação,
localizada a sul de Beirute, perto do reduto do Hezbollah, o que lhe permite,
em troca, ter acesso, em virtude desta gratuidade, à visualização de todo o
tráfego aéreo do aeroporto, tanto de passageiros como de mercadorias. Uma mina
de informações considerável que não hesita em partilhar com o seu aliado
israelita. Durante a guerra israelo-libanesa de 2023-2024, os serviços de segurança
do aeroporto, sob forte pressão americana, revistaram uma alta personalidade
iraniana à sua chegada ao aeroporto, numa atitude pouco protocolar, mas
particularmente desagradável para a imagem do Líbano e do Irão, que tendia a
demonstrar a omnipresença americana neste recinto.
Em
sobreposição, o aeroporto militar de Hamate, no norte do Líbano, foi
transformado numa base da OTAN de facto durante a guerra israelo-libanesa.
Cinquenta e cinco (55) aviões militares da OTAN aterraram no Líbano entre 8 e
20 de Outubro de 2023, ou seja, no dia seguinte à operação palestiniana «Dilúvio
de Al Aqsa», com o pretexto de reforçar a segurança das embaixadas ocidentais
no Líbano e preparar a evacuação dos cidadãos ocidentais deste país, na
eventualidade de o conflito entre Israel e o Hamas se alargar ao Líbano.
As sanções económicas, uma
ferramenta de guerra
As sanções
económicas parecem ter-se tornado uma ferramenta da guerra moderna. Nicholas
Mulder defende na sua obra «The Economic Weapon: The Rise of Sanctions as a
Tool of Modern War» que um terço da população mundial vive sob uma forma ou
outra de sanções económicas, por vezes extremamente mortíferas.
Os Estados
Unidos teriam provocado «mudanças de regime» em mais de 70 países desde a
Segunda Guerra Mundial. Nos últimos anos, os Estados Unidos estiveram
envolvidos directa ou indirectamente em guerras no Afeganistão, Iraque, Líbia,
Síria, Iémen, na Somália, na Ucrânia, anteriormente no Irão (Mossadegh-1953) e
na Guatemala (1954) e no Líbano (1975-1990) e no Vietname (1986-1975), sem
mencionar o plano Condor de subversão anti-comunista na América Latina, na
década de 1970.
Desde 2001,
ou seja, desde o ataque terrorista de 11 de Setembro de 2001 contra os símbolos
da hiperpotência americana, os Estados Unidos e os seus aliados lançaram pelo
menos 326 000 bombas e mísseis sobre países da região do Grande Médio
Oriente/Norte de África. Esta é a conclusão das novas pesquisas de Medea
Benjamin e Nicolas J.S. Davies, do grupo anti-guerra CODEPINK.
O Iraque, a
Síria, o Afeganistão e o Iémen são os países que mais sofreram com a violência,
mas o Líbano, a Líbia, o Paquistão, a Palestina e a Somália também foram alvos.
Em média, foram lançadas 46 bombas por dia nos últimos 20 anos.
No Médio
Oriente, nada menos que seis países vivem sob bloqueio ocidental: o Irão desde
1980, ou seja, há 44 anos, a Síria desde 2011 (13 anos), Gaza desde que foi
tomada pelo Hamas em 2007 (24 anos), o Iémen desde 2015 (9 anos), antes disso o
Iraque de 1990 a 2010 (20 anos) e, finalmente, o Líbano desde 2019 (5 anos).
O Líbano, foco regional e polígono
de tiro da tecnologia militar pós-Vietname
Desde a
queda de Saigão, bastião americano na Ásia, até à primeira Guerra do Golfo, o
Líbano foi, durante quinze anos (1975-1990), o principal foco de tensão da
guerra israelo-árabe e dos conflitos de poder pelo controlo dos recursos
energéticos da zona, bem como das grandes rotas de navegação transoceânica na
costa sul da Europa, no auge da Guerra Fria entre a União Soviética e os
Estados Unidos. Sob o efeito de forças centrípetas, alimentadas abundantemente
pelos protagonistas locais, a lendária convivialidade intercomunitária libanesa
foi destruída, pulverizada por rivalidades interconfessionais, elas próprias
amplificadas pelos desafios estratégicos das potências regionais (Israel, Egipto,
Arábia Saudita, Iraque, Irão, Síria, Líbia) e dos seus respectivos
patrocinadores para transformar este minúsculo país num campo de tiro
permanente da tecnologia militar pós-Vietname.
Num contexto
de normalização das relações entre o Egipto e Israel (1979) e de conflito pela
liderança regional entre dois países muçulmanos produtores de petróleo, um
xiita, o Irão, e outro sunita, o Iraque (1980-1989), e da ascensão do fenómeno
islâmico tanto no Irão dos Pasdaran xiitas quanto no Afeganistão dos talibãs
sunitas, a guerra do Líbano serviu de desvio para todos os conflitos latentes
do Arco de Crise, desde o Corno de África até ao Afeganistão, graças à
instrumentalização do Islão como arma de combate político. Um conflito
substituto destinado a canalizar o descontentamento difuso do mundo muçulmano
não contra os Estados Unidos, o protector de Israel, mas contra a União
Soviética, sob o pretexto do ateísmo da doutrina marxista, mesmo que a URSS
fosse o principal fornecedor de armas dos países do campo de batalha e dos
países de apoio: Iémen, Síria, Iraque, Argélia, Líbia, Sudão, Somália, Iémen do
Sul e OLP. No total, 9 países árabes, ou seja, aproximadamente metade dos
países da Liga Árabe.
Com o objectivo
de garantir a perenidade de Israel e dos interesses petrolíferos americanos, os
Estados Unidos sempre se empenharam em separar o Golfo Árabe-Pérsico, zona de
prosperidade que era importante manter sob o seu domínio, do Mediterrâneo, zona
de escassez rebelde, que era importante neutralizar sob a pressão israelita.
O porto: uma intrigante acusação ao
Hezbollah pela explosão
Situado na
convergência das rotas comerciais europeias, asiáticas e africanas, o porto de
Beirute reveste-se de uma importância geo-estratégica evidente, que permitiu ao
Líbano ser uma plataforma de intercâmbio comercial e agrícola e também tornar-se
um centro financeiro de grande importância ao longo da história.
Em 4 de Agosto
de 2020, mais de 217 pessoas morreram e 7.000 ficaram feridas após a explosão
de 2.750 toneladas de nitrato de amónio no porto de Beirute, localizado no
bairro cristão da capital libanesa.
A destruição
maciça levou à deslocação de cerca de 300 000 pessoas, uma vez que a explosão
causou danos num raio de 20 quilómetros.
Muitos meios
de comunicação ocidentais e árabes financiados pelas monarquias petrolíferas
culparam o Hezbollah por este desastre, embora o porto esteja geograficamente
localizado no sector cristão de Beirute, onde vive apenas um número
infinitesimal de muçulmanos, geralmente sunitas e não xiitas, e a poucos passos
da sede do partido falangista, que este último saqueou durante a guerra civil
libanesa (1975-1990) para fazer dele o seu tesouro de guerra.
Essas
acusações continuaram apesar do facto de o responsável pela segurança do porto,
Ziad Al Awf, ter sido exilado para os Estados Unidos, apesar de estar sujeito a uma proibição de
saída do território.
Será que ele
era uma testemunha incómoda das manobras contra o Hezbollah? Será que se quis
silenciá-lo para encobrir as negligências dos responsáveis libaneses
pró-ocidentais nesta tragédia?
- https://www.intelligenceonline.fr/renseignement-d-etat/2023/02/02/comment-abbas-ibrahim-a-favorise-l-exfiltration-vers-washington-du-directeur-de-la-securite-du-port-de-beyrouth,109909143-art
- https://www.madaniya.info/2023/02/03/liban-israel-tirs-croises-sur-le-hezbollah/
Seja como for, este caso obscuro dá uma ideia da omnipresença americana na vida pública libanesa e da amplitude das suas interferências, reduzindo os decisores libaneses a um papel de escribas dóceis.
Assim, as
conclusões da investigação do alemão Detliv Mehlis sobre o assassinato do
ex-primeiro-ministro libanês Rafic Hariri passaram por Israel antes de chegarem
a Haia, sede do Tribunal Especial para o Líbano, sem dúvida para obter a
aprovação israelita para essas investigações, embora a investigação tenha sido
conduzida exclusivamente contra o Hezbollah, sem que nenhuma outra pista
criminal tivesse sido considerada, enquanto o bilionário libanês-saudita foi
assassinado, em 2005, ao regressar do Iraque, onde tinha procurado unir as
tribos sunitas em apoio às tropas invasoras americanas, face à guerrilha anti-americana.
Os Estados
Unidos disponibilizaram, em três anos, desde 2006, segundo o próprio reconhecimento
dos responsáveis americanos, através da USAID e da Middle East Partnership
Initiative (MEPI), mais de 500 milhões de dólares para neutralizar o Hezbollah,
a mais importante formação paramilitar do terceiro mundo, distribuindo por quase
setecentas personalidades e instituições libanesas uma chuva de dólares «para
criar alternativas ao extremismo e reduzir a influência do Hezbollah na
juventude» (10). A esta soma acrescenta-se o financiamento da campanha
eleitoral da coligação governamental nas eleições de Junho de 2009, da ordem
dos 780 milhões de dólares, ou seja, um total de 1,2 mil milhões de dólares em
três anos, à razão de 400 milhões de dólares por ano.
Esta é, em
essência, a declaração feita no Senado americano, em 8 de Junho de 2010, por
Jeffrey D. Feltman, assistente do secretário de Estado americano e responsável
pelo gabinete de assuntos do Próximo Oriente, e por Daniel Benjamin,
coordenador do gabinete de luta contra o terrorismo. A este respeito, o jornal
libanês «As Safir», em 29 de Junho de 2010, da autoria de Nabil Haitham,
afirmou que «circula uma lista de 700 nomes de pessoas e organizações que
beneficiaram da ajuda americana e que algumas receberam montantes entre 100 000
e 2 milhões de dólares.
O New York
Times, por sua vez, acusou a Arábia Saudita e os Estados Unidos, num artigo
intitulado «Eleições libanesas: as mais caras do mundo», de interferência no
processo eleitoral das próximas eleições legislativas de Junho de 2009, de ter
injectado cerca de 700 milhões de dólares para financiar candidatos opostos ao
movimento xiita Hezbollah e para financiar a viagem de expatriados libaneses, e
até mesmo para comprar o voto colectivo de comunidades inteiras a favor dos
seus aliados locais
Ver estes
links Tribunal Hariri 1/2: Réquiem por
uma fraude política, uma impostura judicial, uma traição moral
- https://www.madaniya.info/2023/12/05/clap-de-fin-pour-le-tribunal-special-sur-le-liban-ou-tribunal-hariri-requiem-pour-une-escroquerie-politique-une-imposture-judiciaire-une-forfaiture-morale/
- https://www.madaniya.info/2023/12/08/clap-de-fin-pour-le-tribunal-special-sur-le-liban-ou-tribunal-hariri-2-2-les-etats-unis-une-justice-a-la-carte-la-france-une-suspicion-legitime/
O comportamento autoritário e arbitrário dos Estados Unidos é prática comum no Líbano, uma excepção permanente, como demonstra outro exemplo de exfiltração escandalosa, a do carrasco da prisão de Khiam, Amer Fakhoury, o guarda prisional desse centro que opera em nome das milícias cristãs pró-Israel, no sul do Líbano.
Em 16 de Março
de 2020, Amer Fakhoury, antigo torturador da penitenciária de Khiam, no sul do
Líbano, foi exfiltrado do Líbano de helicóptero pela embaixada dos Estados
Unidos, enquanto a justiça libanesa se preparava para julgá-lo por crimes
contra a humanidade e alta traição. Fakhoury tinha sido condenado em 1996, à
revelia, a 15 anos de prisão por colaboração com Israel. Acreditando estar
protegido pela prescrição, regressou ao país em Setembro de 2019, sem esperar
que as autoridades o prendessem por outros crimes, nomeadamente tortura e morte
de antigos detidos, ou a alegada obtenção da nacionalidade israelita.
No final de
Fevereiro, a senadora democrata americana Jeanne Shaheen, que se mobilizou para
obter a libertação do antigo responsável da ALS, anunciou ter apresentado um
projecto de lei bipartidário com o senador republicano Ted Cruz, prevendo
sanções contra os responsáveis libaneses envolvidos na detenção ou prisão de
qualquer cidadão americano no Líbano. Este projecto de lei foi intitulado
«tolerância zero para detenções ilegais» de cidadãos americanos no Líbano (Zero
Tolerance Act).
A laxismo
dos Estados Unidos em relação a um criminoso de guerra contrasta com o seu
comportamento exorbitante em relação a outro detido libanês famoso, Georges
Ibrahim Abdallah, cidadão libanês, militante cristão comunista
pró-palestiniano, detido em França há mais de 40 anos, por ordem dos Estados
Unidos, por um crime presumido contra um diplomata americano.
Assim, o
mais antigo prisioneiro político do mundo, Georges Ibrahim Abdallah, cuja culpa
é questionável, está detido arbitrariamente na «Pátria dos Direitos Humanos». O
antigo torturador do centro penitenciário de Khiam, construído pelos agentes
libaneses de Israel no sul do Líbano para torturar os seus compatriotas, foi
libertado à força do Líbano pela «Grande Democracia Americana». Curiosa concepção
de democracia.
Figura
mítica da luta pela libertação nacional árabe, Georges Ibrahim Abdallah herdou
uma dupla pena: a sua detenção para além do período normal da sua prisão. O
executor das baixas instituições israelitas com dupla nacionalidade, israelita
e americana.
Os
torturadores, como é sabido, são sempre os outros. Nunca o Ocidente. Isso é tão
verdadeiro que nenhuma grande consciência moral ocidental, nem mesmo os
editorialistas que profetizam o dia inteiro nas janelas, achou por bem
denunciar a conivência dos Estados Unidos com um torturador.
Tal
duplicidade de comportamento traz a marca do Ocidente e explica parte do seu
descrédito no quarto mundo. Georges Ibrahim Abdallah e Amer Fakhoury
representam, em suma, variações sobre o mesmo tema da decadência moral do
Ocidente.
Alternando
entre a cenoura e o chicote, numa subtil distribuição de papéis, ou melhor,
entre o polícia bom e o polícia mau, os ocidentais duplicaram a sua rede
militar no Líbano com uma rede da sociedade civil com grandes fundações
filantrópicas.
Entre os
principais actores desta Softwar (Guerra Suave), encontram-se as grandes
agências dos países da NATO: USAID, Ford Foundation, UK AID e BBN Media Action,
Agence Française pour le Développement (AFD), apoiadas pela Open Society
Foundation do bilionário George Soros, que se destacou na Europa Oriental, bem
como as três grandes fundações alemãs: Heinrich Böll Stiftung, Frederic Naumann
Stiftung e Frederic Ebert Stiftung.
A
filantropia ocidental encontrou terreno fértil no Líbano, atingido por uma
crescente pobreza da sua população devido precisamente à guerra da NATO contra
este país, levando muitos libaneses a ligarem-se, de corpo e alma, às suas
grandes fundações com a maior docilidade, afectando o seu patriotismo e
espírito cívico. E isto poderia explicar aquilo.
Sobre as
relações entre os Estados Unidos e o Líbano, consulte estes links:
- https://www.madaniya.info/2023/04/18/apres-bagdad-fortress-america-one-le-liban-fortress-america-two-1-2/
- https://www.madaniya.info/2023/04/25/lambassade-des-etats-unis-au-liban-ou-la-nouvelle-forteresse-americaine-2-2/
ILUSTRAÇÃO
Omar Havana/AFP
René Naba
Jornalista e escritor, ex-responsável
pelo mundo árabe-muçulmano no serviço diplomático da AFP, depois conselheiro do
director-geral da RMC Médio Oriente, responsável pela informação, membro do
grupo consultivo do Instituto Escandinavo dos Direitos Humanos e da Associação
de Amizade Euro-Árabe. De 1969 a 1979, foi correspondente rotativo no
escritório regional da Agência France-Presse (AFP) em Beirute, onde cobriu,
nomeadamente, a guerra civil jordano-palestiniana, o «Setembro Negro» de 1970,
a nacionalização das instalações petrolíferas do Iraque e da Líbia (1972), uma
dezena de golpes de Estado e sequestros de aviões, bem como a guerra do Líbano
(1975-1990), a terceira guerra israelo-árabe de Outubro de 1973 e as primeiras
negociações de paz entre o Egipto e Israel em Mena House, no Cairo (1979). De
1979 a 1989, foi responsável pelo mundo árabe-muçulmano no serviço diplomático
da AFP[ref. necessária], depois conselheiro do director-geral da RMC Médio
Oriente, encarregado da informação, de 1989 a 1995. Autor de «L'Arabie
saoudite, un royaume des ténèbres» (Golias), «Du Bougnoule au sauvageon, voyage
dans l'imaginaire français» (Harmattan), «Hariri, de père en fils, hommes
d'affaires, premiers ministres» (Harmattan), “Les révolutions arabes et la
malédiction de Camp David” (Bachari), "Média et Démocratie, la captation
de l'imaginaire un enjeu du XXIme siècle (Golias). Desde 2013, é membro do
grupo consultivo do Instituto Escandinavo dos Direitos Humanos (SIHR), com sede
em Genebra. Além disso, é vice-presidente do Centro Internacional Contra o
Terrorismo (ICALT), em Genebra; presidente da associação de caridade LINA, que
actua nos bairros do norte de Marselha, e presidente honorário da «Car tu y es
libre» (Quartier libre), que trabalha para a promoção social e política das
zonas periurbanas do departamento de Bouches-du-Rhône, no sul da França. Desde
2014, é consultor do Instituto Internacional para a Paz, a Justiça e os
Direitos Humanos (IIPJDH), com sede em Genebra. Desde 1 de Setembro de 2014, é
responsável pela coordenação editorial do site https://www.madaniya.info e apresentador de uma crónica semanal na Radio
Galère (Marselha), às quintas-feiras, das 16h às 18h.
Fonte: Le
Liban en contrechamp 1/5 : Du quadrillage du Liban par l'OTAN - Madaniya
Este artigo foi traduzido para Língua
Portuguesa por Luis Júdice
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