RENÉ — Este texto é publicado em parceria comwww.madaniya.info.
Entrevista de René no jornal Al Moujahid entrevista por Yasmina Houmad
A Argélia tornou-se um médico de emergência com a missão de ressuscitar o mundo árabe moribundo, tão urgente era a necessidade de uma consulta inter-árabe face à mudança geoestratégica no mundo, após a derrota americana no Afeganistão e a guerra na Ucrânia.
A presença do Hamas em Argel pretendia apagar na opinião árabe a imagem de uma garantia do movimento islamista palestiniano para a normalização marroquino-israelita, tal como surgiu da visita de Ismail Haniyeh a Rabat em 2021, em apoio ao primeiro-ministro islamista que assinou o acordo de normalização.
É particularmente
inapropriado falar de normalização. Na realidade, trata-se de uma oficialização
das relações clandestinas e subterrâneas que se mantêm há décadas entre os
países árabes e o Estado hebraico.
A
Argélia acolheu a 31ª Cimeira da Liga Árabe, de 1 a 2 de Novembro de 2022. Uma
cimeira que Argel quer "unificar". Será o simbolismo da data da
Cimeira, do local e do período do diálogo, da presença de chefes de Estado árabes,
dos ingredientes de uma operação diplomática excepcional? O que acha que será
especial nesta Cimeira?
Resposta René: A Argélia deu ao mundo árabe, e para além disso ao Ocidente, uma "lição das coisas" diplomática, uma demonstração do seu lendário saber diplomático, que já se manifestou com a suspensão da adesão de Israel à União Africana.
Em primeiro lugar, em concertação com Damasco, a Argélia foi ilibada da ausência da Síria na cimeira. A Argélia nunca teria concordado em acolher uma cimeira árabe na ausência da Síria, em conformidade com os seus compromissos internacionais, especialmente em relação a um país que foi parceiro da Argélia na sua guerra de independência.
Nota do editor: A bandeira síria sobrevoou no entanto o local da conferência durante os dois dias da cimeira, como se significasse a determinação da Argélia em reintegrar a Síria, o país de refúgio do Emir Abdel Kader Al Jazairi, no seio do rebanho árabe, um dos países árabes juntamente com o Líbano que não fez um pacto com o Estado hebreu.
Segundo: Numa mensagem subliminar ao mundo árabe, a Argélia convidou Marrocos, um país vizinho com o qual está em conflito aberto, para esta cimeira. Prova da sua abertura de espírito e recusa em ser ostracizada.
Para esta cimeira, a Argélia agiu como médico de emergência com a missão de ressuscitar o mundo árabe moribundo, tão urgente era a necessidade de consulta inter-árabe face à mudança geoestratégica no mundo, após a derrota americana no Afeganistão e a guerra na Ucrânia.
O Parlamento Árabe (AP) manifestou a sua convicção de que a próxima Cimeira Árabe em Argel será "excepcional", e assistirá à unificação das fileiras árabes. Podemos dizer que a Argélia foi bem sucedida no desafio de reunir as fileiras dos países árabes e pôr em marcha o processo de reconciliação para ultrapassar as divisões que tão duramente atingiram a OLP?
Resposta
RN: Só a história dirá se esta cimeira será excepcional. Será julgado com
base nos seus resultados. É contraproducente fazer com que esta cimeira tenha
mais peso do que pode suportar, dada a decomposição óbvia do mundo árabe. Com o
apoio mais ou menos activo dos países árabes, a Argélia elaborou um relatório
médico sobre o mundo árabe, colocando-o em cuidados intensivos enquanto se
aguarda a sua convalescença.
O Egipto, uma pálida figura diplomática no mundo árabe desde que concluiu um tratado de paz com Israel, está mais preocupado em estabilizar a situação na Líbia, um país limítrofe de ambos os países, de acordo com a Argélia, e em encontrar uma solução para o espinhoso problema da barragem etíope no Nilo, uma solução que espera encontrar através da mediação da Argélia na União Africana.
O Líbano será representado por um Primeiro-Ministro sem derramamento de sangue, Najib Mikati, na ausência dos dois protagonistas de um braço de ferro diplomático-militar contra o Estado hebreu com vista à delimitação das suas fronteiras marítimas: o Presidente Michel Aoun, no final do seu mandato, e o Hezbollah libanês, a bête noire de Israel, os países ocidentais e as petro-monarquias do Golfo.
Para não falar da ausência da Síria, um país no campo de batalha, fornecedor de armas estratégicas ao Hezbollah libanês, e do Iémen, que resiste contra uma coligação petro-monárquico-atlântica através dos Houthistas, numa palavra, a ausência da franja árabe combativa e combatente...
Em suma, a contagem das ausências e dos extras poderia de certa forma atenuar o carácter excepcional desta cimeira;
A 13 de Outubro no Palais des Nations, o Presidente da República, Abdelmadjid Tebboune, sorriu amplamente ao lado dos líderes das facções palestinianas que assinaram a "Declaração de Argel". Será este o regresso da era dourada da diplomacia argelina?
Resposta René: É importante proclamá-lo alto e bom som: a Argélia nunca, jamais, instrumentalizou a causa palestiniana, nem se drapejando no título de guardiã dos Lugares Santos do Islão nem no de presidente do Comité Al Quds. A solidariedade com os palestinianos, "opressores ou oprimidos", (Zaliman Kana Aww Mazloum) tem sido infalível. Nenhum país do mundo professou tal profissão de fé e aderiu estritamente a ela. Era importante reconhecer isto à Argélia.
Dito isto, a reconciliação inter-palestiniana sob a égide da Argélia é precária, devido às divisões profundas que minam o movimento nacional palestiniano. A Argélia não se deixa enganar por isto. Mas ao proceder a uma reconciliação, mesmo temporária, entre os palestinianos, a Argélia quis sugerir um modus operandi tanto aos palestinianos como aos árabes: a unidade das facções combatentes é o único caminho que pode conduzir à vitória.
Além disso, a presença do Hamas em Argel destinava-se a apagar na opinião árabe a imagem do movimento islamista palestiniano de apoio ao primeiro-ministro islamista marroquino, imagem que foi forjada durante a visita de Ismail Haniyeh a Rabat em 2021, voando em socorro do seu colega islamista marroquino numa má situação depois de ter assinado o acordo de normalização, em nome do rei, o comandante dos crentes.......
A este respeito, é particularmente inapropriado falar de normalização. Na realidade, trata-se de uma oficialização das relações clandestinas e subterrâneas que se mantêm há décadas entre os países árabes e o Estado hebraico.
O Hamas em Argel foi a antecâmara da visita de uma delegação do Hamas à Síria uma semana mais tarde, selando assim oficialmente uma reconciliação entre a Síria e o Hamas após onze anos de disputa, após a deserção do movimento islamista palestiniano do campo de batalha. Argel serviu assim de câmara de descompressão para a reconciliação Hamas-Síria, o trabalho do Hezbollah libanês.
O que pensa das tentativas de parasitismo da cimeira árabe em Argel, da acusação relativa à presença da República saharaui em Argel, da falta de protocolo em relação ao ministro dos Negócios Estrangeiros marroquino Nasser Bourrita?
Resposta René: Este é o jogo clássico das chancelarias para encobrir um constrangimento. O ruído dos meios de comunicação social para mascarar o desconforto diplomático. Marrocos estará presente, tal como outros países que estão a normalizar com Israel.
Mas no final, a imagem que restará desta cimeira é a do Presidente Abdelmadjid Tebboune entronizado entre os seus pares, quase metade dos quais queria excluir a Argélia da Liga Árabe por se ter oposto à exclusão da Síria da organização pan-árabe.
Todos os principais protagonistas desta sequência entraram para a história: Hamad Ben Jassem (Qatar), Nicolas Sarkozy (França), David Cameron (Reino Unido), Bandar Ben Sultan (Arábia Saudita)...... enquanto a Argélia é promovida à categoria de país anfitrião da cimeira árabe e presidente em exercício da Liga durante um ano.
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PARA IR MAIS LONGE
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https://www.madaniya.info/2022/10/30/algerie-interview-de-rene--a-la-patrie-news/
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https://www.madaniya.info/2022/03/18/le-grand-retour-de-lalgerie-sur-la-scene-internationale/
Este artigo
foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice
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