21 de Maio de 2021 Robert Bibeau
Por Gilad Atzmon
Um dos aspectos mais interessantes da Guerra do Yom Kippur (1973) é que marcou uma mudança repentina da maníaca "arrogância" israelita para a melancolia, apatia e depressão. Após a sua notável vitória militar em 1967, os israelitas desenvolveram uma atitude arrogante e desrespeitosa em relação aos árabes e às suas capacidades militares. Os serviços secretos israelitas previram que levaria anos para os exércitos árabes se recuperarem. Os militares israelitas não acreditavam que o soldado árabe tivesse a capacidade de lutar, muito menos para vencer.
Mas em 6 de Outubro de 1973, os israelitas tiveram uma surpresa devastadora. Desta vez, o soldado árabe era muito diferente. A estratégia militar de Israel, baseada na superioridade aérea e manobras rápidas de solo apoiadas por tanques, mostrou-se ineficaz em questão de horas. Egipto e Síria, auxiliados pelos novos mísseis anti-tanque e terra-ar soviéticos, conseguiram desmantelar o poder de Israel. Nos primeiros dias da guerra, Israel sofreu pesadas perdas. Os seus líderes e o seu alto comando militar entraram num estado de desespero. No entanto, este tipo de crise não foi realmente um evento raro na história judaica.
O fiasco militar israelita na primeira fase da guerra foi uma repetição de uma síndrome trágica tão antiga quanto os próprios judeus. Esses cenários repetitivos envolvem o orgulho desproporcional da comunidade judaica, impulsionado por um forte senso de excepcionalismo (ou eleição divina), e dão origem a terríveis consequências. Eu chamo-lhe síndrome de Yom Kippur.
Na Berlim da década de 1920, a elite judaica gabava-se do seu poder. Alguns judeus ricos estavam convencidos de que a Alemanha e a sua capital eram o seu parque de recreios. Na época, alguns judeus alemães dominavam o sector bancário e influenciavam a política e a media alemãs. Além disso, a escola de Frankfurt (assim como outras escolas judaicas de pensamento) dedicou-se abertamente à desenraização cultural dos alemães, em nome do "progresso", "psicanálise", "erotismo", "fenomenologia" e "marxismo cultural". Então, quase "do nada", uma onda de ressentimento apareceu, e o resto é conhecido.
Mas houve realmente uma mudança repentina na consciência alemã? O "anti-semitismo" alemão da década de 1930 deveria ter sido uma surpresa? De modo algum. Todos os sinais necessários estavam presentes há algum tempo. Na verdade, os sionistas primitivos como Herzl e Nordau previram correctamente a inevitável ascensão dos sentimentos anti-judeus europeus no final do século XIX. Foi a síndrome do Yom Kippur, o mesmo orgulho desproporcional que impediu a elite judaica de Berlim de avaliar a crescente oposição em torno dela.
O que estamos a observar em Israel agora é obviamente uma manifestação trágica da mesma síndrome. Mais uma vez, os israelitas foram apanhados de surpresa. Mais uma vez, a loucura maníaca da omnipotência é substituída pela melancolia depressiva. Mais uma vez, os israelitas não conseguiram estimar as capacidades militares do Hamas. Eles falharam em reconhecer a crescente frustração dos árabes israelitas e admitir a possibilidade de que as suas frustrações possam intensificar-se em lutas de rua ou mesmo em guerra civil.
Os israelitas sucumbiram à ideia delirante de que a causa palestina se havia evaporado. Eles estavam convencidos de que a repressão da BDS e a fome dos habitantes de Gaza tinham desmantelado as aspirações palestinas. No entanto, foi o Hamas que alcançou a vitória mais crucial unindo os palestinos na Palestina, nos campos e na diáspora, ao lado de muçulmanos em todo o mundo. Esta unidade é ainda mais importante, pois Israel está politicamente dividido e a caminhar para uma quinta eleição.
Mais uma vez, a arrogância israelita está a caminho de uma profunda tristeza. Israel pode fazer algumas perguntas necessárias: O que estamos a fazer de errado? Por que é que a nossa história se está a repetir? Há algo que possamos fazer para mudar o nosso destino? Em vez dessa introspecção necessária, Israel está realmente a fazer o oposto. Em vez de dissecar a crise actual à luz de eventos semelhantes no passado, Israel repete os mesmos erros. Designou a crise actual de "nova onda de violência". Analisa possibilidades estratégicas e tácticas que "imporão um cessar-fogo ao Hamas". Israel está essencialmente a especular sobre o nível de carnificina que mais uma vez colocará os "árabes de joelhos".
Israel define-se como Estado judeu e os seus trágicos erros são naturalmente determinados por esse facto. Se o Yom Kippur é um dia judeu de introspecção, a síndrome do Yom Kippur é o resultado directo de uma total incapacidade de reflectir sobre si mesmo. E mesmo assim, não nos podemos questionar se o judeu se pode emancipar do destino judaico e da síndrome do Yom Kippur em particular? Como o sionista da primeira hora Bernard Lazare, creio que basta afastar-se do excepcionalismo. Mas uma vez despojado do excepcionalismo, não sobra grande coisa do identitarismo judeu contemporâneo.
Acho que aí estamos a lidar com o aspecto existencial mais devastador da síndrome do Yom Kippur; não há fuga ideológica colectiva para o judeu. Estamos essencialmente a enfrentar um limbo cultural e espiritual. Eu costumo acreditar que a única maneira de sair da síndrome do Yom Kippur é individual: exílio auto-imposto. Sair do gueto tarde na noite, rastejar sob a cerca, cavar um túnel sob a "parede de separação". Uma vez na terra da liberdade, vá silenciosa e modestamente em busca do ser humano e do universal.
Fonte: Le syndrome de Yom Kippour revisité – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa
por Luis
Júdice
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