Passou completamente ao lado dos radares do
jornalixo nacional e dos jornalistas de merda que pululam neste país, o facto
de Marcelo Rebelo de Sousa ter promulgado, no passado dia 8 de Maio de 2021, a “Carta de Direitos Humanos
na Era Digital” que estabelece um novo Direito de “protecção
contra a desinformação”, e que institucionaliza e legaliza a censura, através
de uma Entidade Reguladora e não dos Tribunais, de pessoas singulares ou
colectivas que “produzam, reproduzam ou difundam” narrativas consideradas pelo
Estado como “desinformação”.
Para consolidar a censura que esta “Carta de
Direitos Humanos na Era Digital” prenuncia, o Estado irá “apoiar a criação de
estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social” e
“incentivar a atribuição de selos de qualidade” à imprensa considerada
“fidedigna”.
Refira-se que o artigo 6º da “Carta de Direitos Humanos
na Era Digital” vem no seguimento do Plano Europeu de Acção
contra a Desinformação, e introduz na lei Portuguesa uma definição
oficial de “desinformação” (que não existia anteriormente):
“Considera-se
desinformação toda a narrativa comprovadamente falsa ou enganadora criada,
apresentada e divulgada para obter vantagens económicas ou para enganar
deliberadamente o público, e que seja susceptível de causar um prejuízo
público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, aos
processos de elaboração de políticas públicas e a bens públicos.”,
ponto 2 do Artigo 6º da “Carta de Direitos Humanos na Era Digital”.
A “Ameaça aos bens públicos” é descrita no Plano Europeu de Acção
contra a Desinformação como narrativas falsas em
questões, entre outras, de “saúde, meio ambiente ou segurança”.
O diploma, promulgado em Maio, determina que a Entidade Reguladora para a
Comunicação Social (ERC) irá ter o poder para apreciar e julgar queixas contra
as pessoas singulares e colectivas que propaguem narrativas falsas nas redes
sociais e todas as plataformas digitais, mas sem especificar
quais são as possíveis condenações.
Previamente, aquela que em nossa opinião se prestou a ser a maior
entidade censória do país – a Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC)
-, emitiu, no passado dia 21 de Outubro de 2020, um parecer legislativo às propostas do PS e do PAN onde avisou sobre a “limitação desproporcionada e injustificada da
liberdade de expressão” e questionou sobre os “critérios” para o
“fact-checking”.
A Associação Portuguesa de Imprensa apresentou as
suas dúvidas num parecer às propostas dos dois partidos devido à atribuição de
competências à ERC “que estão fora da sua especialidade” e à implementação
de práticas que “poderão assumir contornos censórios“. Outras entidades como o Conselho Superior de Magistratura, a DECO, a Ordem dos Advogados e o Conselho Superior do Ministério Público não apresentaram quaisquer reservas às
limitações da liberdade de expressão.
Já o Sindicato dos Jornalistas apresentou um
contributo para a proposta do PAN, dizendo que a protecção contra a desinformação
era “parca” (!!!), defendendo que os órgãos de comunicação social também deviam
estar subordinados a esta lei (!!!), incluindo a tutela da Comissão da Carteira
Profissional de Jornalistas (CCPJ). A proposta foi acolhida no diploma final da
Carta, estando os órgãos de comunicação social abrangidos nas “pessoas
singulares ou colectivas”, excepto a parte da tutela pela CCPJ.
Um desplante. O Sindicato dos Jornalistas, não só a dar um “contributo” precioso à legislação censória, como a prestar-se a ser um braço direito da censura, ele próprio um censor.
A demonstrar o clima de “Sagrada
Família” e “União Nacional” que se respira na Assembleia da República, convém
deixar claro que, a “Carta de Direitos Humanos na Era Digital”
foi aprovada naquele fórum da burguesia, no dia 8 de Abril de 2021, com os
votos a favor do PS, PSD, BE, CDS, PAN, das deputadas não inscritas Joacine Katar
Moreira e Cristina Rodrigues e a abstenção
do PCP, PEV, Chega e Iniciativa Liberal, e resultou da junção de dois projectos de lei,
do PS e do PAN.
Claro que os marxistas, os
comunistas, não nutrem quaisquer ilusões sobre a liberdade de imprensa ou a
liberdade de opinião, manifestação, organização, expressão, no contexto de uma
democracia burguesa, capitalista. Basta verificar que, apesar de a Constituição da República Portuguesa garantir nos artigos 37º e 38º a Liberdade de Expressão e de Imprensa -
não podendo ser limitados por “qualquer tipo ou forma de censura” e assegurando
a “liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder
político” - esta “Carta dos Direitos Humanos na Era Digital”, manda a dita
Constituição, liminarmente, para as urtigas!
No quadro do controlo absoluto da informação, a burguesia – que detém os diferentes órgãos de “comunicação social” – deitou mão a uma nova ferramenta de manipulação: os sites de “fact checking”, de que o exemplo mais notório em Portugal é o Polígrafo, programa emitido pela SIC do barão da manipulação informativa, Pinto Balsemão.
Escamoteando o facto de nenhuma informação ser híbrida, acima das classes, ou dos interesses que cada classe tem em relação a um mesmo fenómeno, e que as próprias “conclusões” – aparentemente cientificas – na maioria dos casos estarem feridas de unilateralismo, isto é, não sistematizam as contradições que no seu seio – precisamente por reflectirem contradições de classe antagónicas – se geram, dependendo do que cada um dos campos espera do fenómeno relatado.
Veja-se, na actualidade, o caso da crise pandémica, e de como a maioria das questões que esta suscita são objecto de “debates” públicos, mais ou menos intensos, mas nunca extravasando a narrativa que os governos da burguesia, do grande capital e do imperialismo, autorizam.
O sistema capitalista, que domina a linha editorial da esmagadora maioria dos chamados “órgão da comunicação social” – escrita, falada ou televisionada - , monopoliza os comentários, mormente com tempo de antena diário onde as “autoridades sanitárias” secundadas por toda a sorte de “especialistas” a soldo da BIG PHARMA, e impede um debate sério e livre sobre qualquer tema, capturando o debate contraditório real, ao mesmo tempo que faz aprovar legislação que promove a censura e a ostracização, no mínimo para impedir que “vozes dissonantes” se façam ouvir.
A partir de agora, em Portugal como em muitos outros países capitalistas a nível mundial, apesar da máscara de democracia e liberdade que ostentam, a burguesia dominante impede que a narrativa dos seus governos, que sofre de enormes contradições, seja posta em causa, correndo quem se atrever a demonstrá-las o risco de ser classificado numa categoria estigmatizante, sendo a principal de entre elas a de “conspiração”.
A ciência, que deve ser um espaço de debate e dúvida constante passou a ser apresentada como uma “certeza” infalível, não sujeita a escrutínio e, muito menos, a crítica ou confrontação. Seja no caso da “crise pandémica”, seja noutras temáticas.
Particularmente surpreendente no caso da alegada pandemia de COVID 19, é o facto de a esmagadora maioria dos jornalistas – e dos órgãos que os representam - , que deveriam ser os primeiros a organizar tais debates, onde se gerasse o contraditório, são os primeiros a prestar-se a um papel de “polícias do pensamento”, chegando ao ponto de rastrear as alternativas que se apresentam para melhor as rejeitar do espaço legítimo para a discussão.
Jornalistas que, muitas das vezes, adoptam uma postura de bufos que apontam às autoridades as pessoas ou as manifestações que possam contrariar as narrativas oficiais do governo, por mais contraditórias e incoerentes que elas se apresentem.
Os principais “órgãos de comunicação social” – rádio, televisão, imprensa – apresentam-se cada vez mais envolvidos na propaganda das elites políticas e económicas das quais se tornaram extremamente dependentes do ponto de vista económico e financeiro e, por consequência, ideológico e programático.
A simples análise da cobertura que os media têm realizado aos movimentos de protesto, às guerras travadas nos séculos XX e XXI, quer pelos EUA, quer por outras potências imperialistas, mostram a crescente dependência dos jornalistas em fontes governamentais. Perante a cada vez maior ausência de fontes de financiamento a uma “investigação independente”, instalou-se a “preguiça”, o facilitismo e a capacidade dos jornalistas em se envolverem em investigações longas e, muitas vezes, dispendiosas.
Adoptam, então, e preferencialmente, a política do “corta e cola”, tendo por suporte os comunicados com a visão governamental, que replicam ad nauseum. Para além disso, os órgãos de comunicação onde estão integrados perderam, gradualmente, a sua independência financeira e muitos pertencem, agora, a grandes grupos – industriais ou bilionários – e só sobrevivem graças à publicidade e aos anúncios que esses grupos lhes pagam.
Isto para não falar do recebimento de avultados subsídios governamentais que advêm do papel na distribuição das mais-valias que o governo redistribui pela classe cujos interesses defende – a burguesia capitalista e imperialista. Não surpreende, pois, que esta “comunicação social” seja estruturalmente influenciada pelas potências económicas e políticas cuja visão do mundo e interesses efectivamente transmitem.
Percebe-se, assim, que não existe uma “comunicação social” que transmita informação “neutra”, “acima das classes”, “objectiva” e apenas sustentada nos “factos”. Ainda assim, e para evitar mais surpresas, a burguesia, respaldada nas suspeitas de interferência nas eleições que levaram Donald Trump à presidência dos EUA, alimentou a paranoia das “fake news” e começou a aprovar leis para, alegadamente, combater a disseminação de “informações falsas”.
E não se pense que tal legislação – que está
a ser imposta em vários pontos do mundo, inclusive Portugal – se produziu
apenas num contexto eleitoral. A recente legislação aprovada pela Assembleia da
República, e que não mereceu nenhum voto contra, já foi promulgada por Marcelo
Rebelo de Sousa e entrará em vigor no início de Junho próximo, e dará novos
poderes à ERC – ou a uma entidade a criar para o efeito – que terá por
objectivo combater qualquer producção de informações que possam “perturbar a
ordem pública”.
Estamos perante uma nova forma de censura
de estado e os perigos potenciais contra a liberdade de expressão e informação
que acarreta. Bem vistas a coisas, estamos de volta à condição de censura
fascista da qual nunca, em boa verdade, saímos, apesar da alegada “revolução
dos Cravos” de Abril de 1974. E tudo isto com pareceres favoráveis do Sindicato
de Jornalistas que, inclusive, se prestou a dar alguns “contributos” a esta
legislação censória e fascista.
O controlo da informação passa a basear-se numa justificação
coxa e frágil, tanto mais que nenhum estudo de pesquisa sociológica confirma a
centralidade das “fake news” na evolução de qualquer debate público, seja ele
de que natureza for. O chamado “check facting” – ou verificação de factos – tem, pois, outras razões.
Tendo sido inventado para, dizem, verificar a veracidade do
discurso político, esse estilo de jornalixo faz parte de uma tentativa de
recuperar a credibilidade dos “órgãos de comunicação social” tradicionais,
permitindo que estes se libertem de qualquer processo de investigação no
terreno. A partir de agora, artigos podem ser inteiramente escritos a partir do
escritório, usando um computador ou um telefone. Torna-se corriqueira a falsa
checagem que, subsidiada pelos gigantes da Internet se torna, até,
economicamente lucrativa.
Apesar de poder vestir novas roupagens, estamos a falar do
mesmo tipo de censura que combatemos durante o regime de Salazar e Caetano.
Muitos de nós se lembrarão da narrativa de Salazar e Caetano, da necessidade de
lutar contra a propaganda terrorista e o “conteúdo odioso” de quem se opunha ao
fascismo e à política colonial assassina que nessa época se impunha, quer ao
povo português, quer aos povos das ex-colónias.
Pois bem, essa “luta” agora é, dizem, contra a emergência de
uma extrema-direita que tem sido o centro do desenvolvimento de muitas técnicas
de censura desenvolvidas por esses gigantes da Internet em colaboração com os estados
pseudo-democráticos que são precisamente os patrocinadores das seitas
terroristas e da desinformação sistémica.
Assistimos, agora, ao espalhar gradual para outras formas de
censura, de conteúdo mais político, a ponto de a supracitada legislação, que
entrará em vigor no início de Junho do corrente ano, pretender exercer uma
verdadeira política do pensamento.
É assim que as principais plataformas da web, virtude do seu
monopólio sobre o mercado da informação, passam a exercer esse poder em três
níveis distintos. Primeiro, ao disponibilizar ferramentas de tomada de palavra,
forçam-nas ao mesmo tempo que as tornam possíveis, aplicando um formato. Em
segundo lugar, os seus algoritmos, então, ordenam esses discursos díspares
distribuindo a visibilidade de que precisam para alcançar o seu público. Por
último, os seus dispositivos de “moderação”, que articulam a detecção automática
e a supervisão humana, desempenham funções policiais, decidindo sobre o que
pode ou não ser dito e, mais grave ainda, punindo discursos ou imagens que
contrariem as “regras”.
A censura é apenas o lado menos apresentável de processos de
controlo de informações mais globais. No entanto, a verdadeira censura não é
sobre proibir, cortar, amputar, mas sufocar, ficar atolado em estereótipos,
para alimentar apenas a palavra consagrada dos outros, a maneira repetida da “opinião
actual”, isto é, das narrativas que, a cada momento, interessam à burguesia
capitalista e imperialista dominante.
A
censura não passa de um processo de filtragem de opiniões admitidas pelo
sistema dominante. Esta nova censura, se a ela não nos opusermos
com firmeza, passará a exercer-se sobre o discurso dissidente e, tanto no
sentido sociológico amplo, quanto no sentido jurídico estricto é, portanto,
inseparável da ilusão que serve.
A crise sanitária iniciada pela epidemia de Sars-CoV-2 foi a ocasião para
uma tentativa historicamente sem precedentes de controlo mundial
da informação, ainda mais importante de entender, uma vez que esta epidemia
recebeu cobertura sem precedentes da “comunicação social” na história. Tentativa que assenta num processo de
padronização/normalização editorial com o objectivo de garantir o monopólio da
informação “legítima” (perante o monopólio da violência jurídica). Controlo que
visa garantir o domínio da classe dominante – a burguesia capitalista e
imperialista – sobre os “meios de comunicação social” e obter o consentimento –
submissão/alienação – das populações.
É notória a maneira como se
manifesta esse controlo, por parte da “comunicação social” a soldo do
governo, no caso da corrente crise
pandémica:
1) Primeiro, começaram por exponenciar que
o mundo se vê confrontado com uma pandemia que, alegam, ameaça a sobrevivência
de toda a humanidade,
2) De seguida, realçam a falsa informação
de que não há terapêutica para curar os doentes,
3) Depois, que é necessário confinar as
populações,
4) Para, finalmente, garantirem que a cura
virá apenas de uma vacina.
A ilusão,
aqui, não é só o pensamento dominante, apresentado pelas elites da sociedade
como legítimo. É, também, uma visão do mundo que ajuda a proteger a ordem
social e política estabelecida. Aqui, as pequenas elites intelectuais,
burguesas e escravizadas, são apenas os sacerdotes da religião da dominação
criminosa da classe dominante sobre a classe dominada/alienada.
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