França: Não devemos apenas abolir os privilégios, mas
também banir os privilegiados (Mesloub)
12 de Outubro de 2025 Robert Bibeau
Por Khider Meslou
No dia seguinte à sua nomeação para
Matignon, o novo primeiro-ministro, Sébastien Lecornu, anunciou a sua resolução
de acabar com os "privilégios vitalícios" dos ex-ministros.
O povo trabalhador da França responde que
pretende, por sua vez, acabar em breve, não com os privilégios, mas com os
privilegiados, ou seja, demitir definitivamente os governantes, os capitalistas,
os lacaios políticos, numa palavra, aniquilar o poder de toda a classe burguesa
francesa.
O povo trabalhador da França não pretendem
repetir a falaciosa abolição dos privilégios políticos e administrativos votada
em 4 de Agosto de 1789 por uma assembleia de burgueses mal-desfeudalizados,
ferozes defensores da propriedade privada.
A Declaração de 4 de Agosto certamente
aboliu os direitos feudais, isto é, os privilégios estatais e administrativos
dos nobres, incluindo a natureza hereditária dos cargos (magistratura). Mas
nunca o feudalismo económico e financeiro. Muito menos a sociedade exploradora.
Certamente aboliu a (in)justiça dos
senhores. Mas para substituí-la pela justiça única e injusta da burguesia.
A burguesia certamente aboliu a venalidade
do cargo. Mas ela serve para sobrecarregar, isto é, para disseminar e
contaminar toda a sociedade com a sua mentalidade venal.
Certamente aboliu os deveres senhoriais e
outras servidões pessoais que se tornaram obsoletos sob o capitalismo nascente.
Mas, para substituí-los por servidões assalariadas colectivas, a transformação
de cada camponês empobrecido e artesão arruinado num trabalhador vitalício. Ou
seja, num proletário: alguém que tem apenas a sua força de trabalho para viver
(sobreviver).
Certamente aboliu o dízimo eclesiástico,
pago apenas pelos pobres. Mas substituiu-o pelo potencial imposto de sangue
pago por todos os proletários franceses, simbolizado pelo recrutamento obrigatório
introduzido em 5 de Setembro de 1798.
Nesse ponto, a burguesia terá expulsado os
franceses das igrejas miseráveis para concentrar os seus filhos adolescentes nos
seus novos quartéis em ruínas. O cúmulo do cinismo é que os filhos da burguesia
beneficiarão do direito de alternativa e substituição, permitindo-lhes evitar o
recrutamento. Tudo o que as famílias ricas tinham que fazer, em troca de uma
quantia em dinheiro, era encontrar um recruta para prestar serviço militar no
lugar dos seus filhos. É claro que apenas as famílias mais ricas se podiam permitir
a tal luxo.
Assim, a Revolução Francesa gerou uma nova
oligarquia, a do dinheiro, que ainda reina suprema. O actual presidente
francês, Emmanuel Macron, tem mais poder do que um rei. E o Estado de Direito,
frequentemente citado como prova da democracia, nada tem a ver com a igualdade,
a liberdade ou a fraternidade estampadas nos frontões dos edifícios públicos.
A Revolução burguesa francesa certamente
pôs fim à nobreza e sua ordem social, mas substituiu-as pela oligarquia
financeira e pela ordem capitalista exploradora.
"A história de todas as sociedades
até hoje é a história da luta de classes." E, consequentemente, das
revoluções. No entanto, todas as revoluções ou transformações sociais passadas,
nomeadamente a Revolução Francesa, têm a particularidade de terem instalado uma
nova classe dominante no poder. E por um bom motivo. Essas revoluções foram
lideradas por classes privilegiadas e exploradoras, certamente portadoras de
uma ordem social inovadora e "superior", congruente com os seus
interesses económicos, mas sempre fundada na exploração e na opressão.
A "revolução feudal", ou
transformação social feudal, foi liderada pela nobreza, rompendo com o modo de
produção esclavagista do seio do qual emergiu. A revolução burguesa foi
liderada pela classe empresarial emergente, a burguesia, nascida no mundo
feudal, agora obsoleto.
A partir do século XVII, na Europa,
particularmente na França, o antagonismo de classes que levou ao derrube do
antigo regime feudal, levando à abolição dos privilégios da nobreza, não foi
aquele que opôs a nobreza à classe que ela explorava, o campesinato
escravizado, mas o confronto entre essa mesma nobreza e outra classe
exploradora emergente, a burguesia.
Da mesma forma, a sociedade esclavagista
da Roma antiga não foi abolida pela classe escrava (apesar das suas frequentes
revoltas lendárias ao longo da antiguidade, como a revolta frustrada de
Espártaco em 73 a.C.), mas sim pela nobreza que dominaria o Ocidente cristão durante
quase dois mil anos.
Assim, nas sociedades antigas, as classes
revolucionárias nunca foram classes exploradas, mas sim novas formações sociais
exploradoras, mais dinâmicas. Isso pode ser explicado histórica e
sociologicamente pela fragilidade do desenvolvimento das forças produtivas.
Enquanto o desenvolvimento das forças produtivas foi medíocre o suficiente para
assegurar abundância de bens para toda a sociedade, impondo-lhe a manutenção de
desigualdades económicas e, portanto, de relações de exploração, somente uma
classe exploradora foi capaz de se impor à frente do corpo social.
Essas classes revolucionárias, ao chegarem
ao poder, estavam apenas a substituir uma forma "historicamente
obsoleta" de exploração por outra forma de exploração: a escravidão pela
servidão, a servidão pelo trabalho assalariado.
Por outro lado, sob o modo de produção
capitalista, onde as forças produtivas foram desenvolvidas de forma
extraordinária graças ao trabalho assalariado fornecido pelos operários, pela
primeira vez na história a classe revolucionária é uma classe explorada: o
proletariado.
Porque é que o proletariado (a classe operária,
trabalhadores, empregados, todos sinónimos) é a classe revolucionária do nosso
tempo?
Devido ao lugar central ocupado pelo proletariado
na produção. De facto, o lugar específico ocupado pela classe operária nas
relações capitalistas de produção, o seu status como produtora colectiva da
maior parte da riqueza social e a sua condição como classe explorada por essas
mesmas relações de produção, conferem-lhe uma missão histórica de emancipação
universal.
Na sociedade capitalista desenvolvida, a
maior parte da riqueza social é produzida pelo trabalho da classe operária.
Vale a pena lembrar que a pertença à classe operária é determinada pela
privação da posse dos meios, pela obrigação do proletário de vender a sua força
de trabalho aos donos dos meios de produção, apropriação que lhes permite
monopolizar a mais-valia.
A especificidade do capitalismo reside no
facto de que, graças ao trabalho assalariado, ele desenvolveu as forças
produtivas a um nível sem precedentes. Hoje, esse extraordinário
desenvolvimento económico permite à classe operária realizar o antigo sonho da
humanidade humilde: abolir a exploração através do controlo directo da produção,
ou seja, da apropriação das suas riquezas, alcançada por meios revolucionários.
Noutras palavras, proceder à abolição, não
só dos privilégios, mas também dos privilegiados.
A abolição dos privilegiados, isto é, dos
capitalistas, levará à abolição da propriedade privada dos meios de produção,
da troca de mercadorias, do dinheiro, do trabalho assalariado.
A
riqueza tornar-se-á propriedade colectiva da comunidade humana. Essa apropriação
colectiva pela sociedade da riqueza que produz, e principalmente dos meios de
produção, significa que não é mais possível para uma parte dela mesma, uma
classe social, ter os meios para explorar outra parte.
Ao abolir os privilegiados, isto é, os
capitalistas, e não apenas os privilégios, a sociedade aniquilará
definitivamente qualquer possibilidade de estabelecer relações de exploração.
Khider MESLOUB
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice
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