Introdução
à
“Questão Nacional e Revolução Proletária
Sob o Imperialismo Moderno”.
O camarada Arnaldo Matos faleceu há mais de dois anos.
Deixou-nos um enorme património político e ideológico, onde se incluem duas
peças fundamentais que ajudam a classe operária e os revolucionários marxistas
a compreender os erros e desvios que ocorreram durante e na sequência das
Revoluções de Outubro de 1917, na Rússia, e de Democracia Nova, em 1949, na
China.
Pouco antes de falecer, manifestou a sua vontade de publicar o livro de Robert Bibeau, “Questão Nacional e Revolução Proletária Sob o Imperialismo Moderno”. Para tal, deixou uma tradução quase completa – que tive a honra e enorme gosto de concluir – da obra citada, acompanhada de quatro importantes conclusões/notas finais, que reproduziam teses emanadas do próprio livro em causa e que sintetizavam a justeza da análise marxista contida nesta obra de grande fôlego.
Fruto de uma visão oportunista do centralismo democrático, temos
assistido, objectivamente, ao boicote da publicação desta obra, uma visão que
assume possuir um papel de tutor ungido, que determina o que os proletários e os revolucionários, em
Portugal, podem ou não, devem ou não ler.
Quem já teve
oportunidade de ler a palestra que o camarada Arnaldo Matos proferiu no
1º de Maio de 2008 e as suas “Teses da Urgeiriça”, compreenderá certamente a
importância desta questão para os marxistas. Aliás, no Plano de Acção que foi
aprovado, por unanimidade, no I Congresso Extraodinário do PCTP/MRPP, que
ocorreu em Lisboa, nos passados dias 18 e 19 de Setembro de 2020, a QUESTÃO
NACIONAL é um dos temas centrais.
Constatatando a paralisia e deriva daqueles que
assumiram este boicote, decidi proceder à publicação da supracitada obra para que, tal como era desejo do camarada
Arnaldo Matos, ela possa ser alvo do estudo, análise, debate e aplicação
prática por parte dos marxistas portugueses.
Ao mesmo tempo, espero com a sua publicação dar um contributo para que a esquerda dê uma
pedrada no charco putrefacto do oportunismo, do revisionismo e do
neo-revisionismo.
Como se compreenderá, para os marxistas, a Questão
Nacional é central à estratégia e à táctica dos comunistas nesta fase final do
imperialismo moribundo, a braços com uma crise sistémica profunda. Sem
compreender esta questão, os marxistas não poderão – nem saberão - enquadrar adequadamente a estratégia e a
táctica que o camarada Arnaldo Matos apontou aos comunistas portugueses – e de
todo o mundo – para o Século XXI, o Século do Comunismo e da implantação das
relações de producção comunistas. Não compreenderão porque é que o camarada
afirmou que a estratégia é o marxismo e a táctica transformar as guerras
imperialistas em guerras cívis revolucionárias.
A publicação desta obra
visa, também, dar um combate sem tréguas ao oportunismo, ao revisionismo, que
alimentam os equívocos “nacionalistas” burgueses que visam desarmar o
proletariado e atirá-lo para os braços das “suas” burguesias.
E isto porque, tal como se
afirma no livro em causa, “Em caso algum, o Estado nacional burguês pode
tornar-se um agente da emancipação da classe operária. Ao contrário, o Estado
nacional burguês e a ideologia nacionalista burguesa que pretende legitimá-lo
são os alienadores da opressão da classe operária, única classe revolucionária
sob o capitalismo decadente. Depois da emergência do imperialismo moderno, fase
última do modo de producção capitalista, as lutas ditas de “libertação nacional
anti-imperialista“ são guerras reaccionárias conduzidas pelas burguesias
nacionais chauvinistas para assegurar o seu estatuto de guardiães dos interesses
de uma aliança imperialista contra outra.”
Luis Júdice
Robert Bibeau
Questão
Nacional e Revolução Proletária
Sob o Imperialismo Moderno
Prefácio
Robert
Bibeau
Contrariamente às pretensões dos independentistas e mau grado a barragem
mediática envolvendo alguns acontecimentos nacionalistas (Brexit, referendos catalão e escocês, separatismos flamengo e do
Quebec), a questão nacional está cada vez menos presente no espírito do
proletariado internacional. A bem dizer, apenas a direita e a esquerda burguesas se inflamam a propósito das
veleidaddes nacionalistas chauvinistas. O aprofundamento da crise económica
sistémica do imperialismo provoca grandes desordens políticas, militares e
sociais, entre elas o ressurgimento das veleidades nacionalistas gregárias no seio da pequena burguesia, mas isso
passará.
É
preciso remontar a Lenine, aos bolcheviques e à Revolução Russa para redefinir
a origem da confusão, e distinguir entre as lutas de libertação nacional
burguesas (ditas de independência nacional) e as lutas anticapitalistas
internacionalistas da classe proletária.
De seguida, sucede que Estaline levantou o
estandarte do nacional -bolchevismo russo mais alto que o do
nacional-socialismo alemão e a URSS esmagou a potência alemã dos Krupp e dos Messerschmitt,
antes de se afundar por seu turno. Após o nacional-bolchevismo, o nacional-maoismo
montou o cavalo de Tróia do nacionalismo burguês e inventou a luta entre os Três Mundos: o mundo nacional-imperialista
das duas super potências; o mundo nacional-capitalista
das potências secundárias e o mundo nacional
terceiro-mundista dos países não alinhados, presa dos dois primeiros mundos
e que a China maoista teria almejado enfeudar – Deng Xiauping, o Estaline chinês desencadeou a ascensão
económica na China e assegurou a esta potência emergente os meios industriais e
financeiros das suas ambições mundializadas. A infelicidade do capital chinês está em que
a sua ascensão sobreveio no momento em que o modo de produção capitalista mundializado no seu estado imperialista declinante
completa a conquista do planeta. O imperialismo mundializado, tendo atingido o
seu apogeu, não pode senão declinar. Isto é, o capital na China, na Índia e em
África completa a proletarização dos últimos camponeses semi-feudais, a
conquista dos últimos mercados e a prospecção das últimas regiões de recursos excêntricos. Um século após a
predicção de Lenine, a insurreição popular mundial está na ordem do dia e o
proletariado chinês ( e não o campesinato chinês como pensava Mao) pode bem dar
o golpe de arranque insurreccional internacional. Esta evolução acarreta que a
questão nacional terá menos importância na política mundial, porquanto as duas
classes que lutam pela hegemonia são as duas classes nascidas do desenvolvimento
capitalista industrial urbano : a classe capitalista multinacional decadente e a classe proletária internacional
emergente. Desta guerra de titãs nascerá seguramente o modo de producção
proletário comunista que nós não conhecemos e que o proletariado deverá
aprender a dirigir, se ao menos a vanguarda da esquerda burguesa poder
conter-se e deixar andar a classe operária revolucionária.
Neste opúsculo, juntámos alguns textos que
tratam da questão nacional. Alguns dos seus autores adoptam uma postura marxista e condenam toda a posição que,
no seu modo de ver, não corresponde ao canone marxista. Este comportamento sectário e dogmático é herança da II,
da III e da IV Internacionais e da integração destas organizações no aparelho
de Estado burguês. A bolchevização das organizações de esquerda foi marcada
pela prática da exclusão dos dissidentes
e pela glorificação dos gurus pelos seus agentes. Embriagados pelo centralismo democrático militarizado,
com o fim de proteger a pureza ideológica
e a lealdade sectária em relação aos seus mestres efémeros. Quem já não ouviu
falar do Pai dos povos e do Grande Timoneiro? Esta exclusão, que em
primeiro lugar surpreendeu a esquerda alemã, holandesa, polaca, italiana e
francesa teve como consequência infiltrar as seitas saídas desta oposição. Hoje
em dia, cada seita de esquerda pratica a exclusão, a divisão e a recusa de
debate, isolando ferozmente os seus partidários de toda a influência
proletária. Avaliar o nível da concordância de uma linha política de classe com
uma referência estatutária, seja a Marx
ou a Engels, a Bukarine ou Lenine, Trostky ou Estaline, Mao ou Gramsci, é uma prática ideológica
dogmática, anti-materialista dialéctica, que impede validar uma análise de
classe e que apenas alcança medir a conformidade de uma ideia com a de um dogma
sacralizado e fingido. Da nossa parte, não aderimos a nenhuma seita, a nenhum
dogma, totalmente enfeudados como estamos à classe proletária e aos seus
interesses revolucionários e ao método materialista histórico e dialéctico.
Robert Bibeau
Director da revista Web
http://www.les 7 duquebec. com
Capítulo 1
Questão Nacional e revolução
proletária
Robert
Bibeau
Nação e Estado-nação, Dois Estandartes
da Esquerda Burguesa
Nação
e Estado-nação são as formas singulares das relações de producção geradas pelo
modo de producção capitalista (MPC). Quando este modo de producção atingiu o
seu apogeu e a contradição fundamental que rege este sistema começou a entravar
a valorização do capital; quando as relações de producção nacionais pareceram
demasiado estreitas para permitirem a reprodução alargada do capital e o desenvolvimento
das forças produtivas sociais, nação e Estado-nação tornaram-se entraves de que
o MPC procurou desembaraçar-se, esperando assim gerar uma nova era de
prosperidade mundializada. Em 1971, a revogação dos acordos de Bretton Woods pôs fim aos entraves
monetários perante a imperiosa urgência de liberalizar e democratizar as trocas
internacionais. Os esforços para transformar o dólar americano em divisa do
comércio internacional, da mesma maneira que, em consequência das malversações
para fazer emergir o euro como divisa alternativa do comércio mundial, ou
ainda, as maningâncias para com ele substituir o yuan nacional chinês ou os
direitos de saque especiais (DTS), demonstram as dificuldades do sistema
financeiro mundializado.
Nem a preservação nem a conversão das
relações de producção nacionais poderão assegurar a perenidade deste modo de
producção moribundo. A contradição fundamental que rege este sistema não se
situa entre as forças produtivas internacionais e as relações de producção
nacionais, mas no próprio seio das forças produtivas sociais, entre o capital
morto – constante- robotizado e digitalizado, - já valorizado absorvendo o capital
vivo – variável – a força de trabalho social geradora da mais-valia, mas ainda não validada
pela colocação em marcha dos produtos, eis todo o drama deste modo de producção
e o limite da sua expansão.
A classe proletária internacional não deve meter-se a reboque das
burguesias nacionais para tentar preservar as relações de producção nacionais
submetidas às vicissitudes das crises sistémicas do capitalismo mundializado.
As estruturas nacionais burguesas desusadas são inoperantes perante a crise
sistémica do modo de produção capitalista. Todas as estruturas nacionais e ou
multinacionais do capitalismo GNU, CPI, FMI, BM, OCDE, OTAN, União Europeia,
Organização de Cooperação de Shangai, Comunidade dos Estados Independentes, são
obsoletas e devem ser destruídas pela insurreição popular. Em caso algum, o
Estado nacional burguês pode tornar-se um agente da emancipação da classe
operária. Ao contrário, o Estado nacional burguês e a ideologia nacionalista
burguesa que pretende legitimá-lo são os alienadores da opressão da classe
operária, única classe revolucionária sob o capitalismo decadente. Depois da
emergência do imperialismo moderno, fase última do modo de producção
capitalista, as lutas ditas de “libertação
nacional anti-imperialista“ são guerras reaccionárias conduzidas pelas
burguesias nacionais chauvinistas para assegurar o seu estatuto de guardiães
dos interesses de uma aliança imperialista contra outra.
APOGEU E DECLÍNIO DO IMPERIALISMO AMERICANO
Os Estados Unidos da América, primeira potência imperialista do séc. XX,
foram inexoravelmente empurrados contra a França (com a aquisição da Luisiana
em 1803), contra o Canadá (guerra de 1812), contra os restos do Império
espanhol (1819), contra o México (1845-1853), e depois duas facções do capital
americano viraram-se uma contra a outra, a Confederação esclavagista do Sul
contra a União Capitalista do Norte (1861-1865). Mais de 620.000 trabalhadores-soldados
perderam a vida nesta guerra nacional, pois, refeita a unidade, a marcha sanguinária para o
Norte foi retomada. Mais tarde, ambas atacaram o Império
comercial e industrial britânico e o segundo império francês, que desintegraram
a fim de impor o imperialismo moderno – financeiro - no lugar do imperialismo colonial-comercial,
antigo, que não podia seguir porque provocava a ira e sublevações constantes
das burguesias nacionais coloniais, desejando-se libertar politicamente das
metrópoles opressivas, a fim de pôr como intermediários nacionais da exploração
da força de trabalho, local, entregando eles mesmos a mais-valia ao
imperialismo mundializado, globalizado. Todas as guerras ditas de libertação nacional apoiam-se neste
ponto crucial: qual a parte da exploração de trabalho assalariado local que
será entregue aos capitalistas estrangeiros? É o que o presidente americano
Teodoro Roosevelt compreendeu antes de Lenine e dos bolchevistas, sentimento
nacionalista chauvinista que os EU exploraram para desalojar as ex-potências
coloniais comerciais concorrentes e aí substituir o
imperialismo financeiro, sobre o qual Lenine escreveu
brilhantemente, explicando que mesmo
quando oposto ao capitalismo colonial e comercial, o imperialismo financeiro não
explora menos a classe proletária, única
produtora da mais-valia e inimiga jurada do capitalismo mundializado.
Quando parecia evidente que os bolcheviques não entendiam partilhar os
frutos da exploração do proletariado nacional soviético com o imperialismo
ocidental, o conflito degenerou em guerra total
entre o império dos sovietes e o império ocidental, dirigido primeiramente
pela Europa e em seguida pela América. A
guerra a acabar entra então numa fase em que, após muitas desventuras, se
concluiu em 1991, com o triste Sr. Boris Eltsine, inimigo turiferário (lisonjeador, bajulador) mortuário
da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
Durante um século, os Estados Unidos foram os aliados das burguesias
nacionalistas terceiro-mundistas (pseudo não-alinhadas), desejosas de partilhar
com os negociantes de guerra ocidentais uma parte da mais-valia produzida
localmente.
E todos vimos Mandela pavonear-se
sobre as estradas do anti-apartheid onusino
(que os sul-africanos percorrem ainda hoje). Ho Chi Minh, Chou Enlai, Pol Pot, Ceausescu, Tito, Nasser, Gandhi, e os outros, todos felizes de colaborar com o capital americano
para obter a sua pitança nacional, mais abundante do que a que lhes propunha Estaline, Krouchov e Brejnev, dirigindo
a partir de um império
industrial ultrapassado, pré-financeiro. Hoje vemos Castro – o irmão do outro- que empreende a sua viagem a Canossa a fim de obter um salvo conduto dos
Estados Unidos para a sua integração no modo de producção capitalista.
Não se pode conduzir uma guerra anti-imperialista que não seja também uma guerra anti-capitalista, anti-nacionalista e anti-burguesa. Todas e cada uma destas lutas ditas de libertação política nacional conduziram à consolidação de facções capitalistas nacionalistas e à alienação da classe proletária nacional. Seja a URSS, a China, a Coreia do Norte, o Vietname, o Cambodja, a Argélia, Cuba, Angola, a Nicarágua, a Etiópia, os países de Leste, a Albânia, a África do Sul, o Nepal ou a Palestina, etc., outras tantas experiências nacionalistas que sem a eliminação do modo de producção capitalista, fonte de todas as alienações, se tornaram um desastre para a classe proletária alienada desses países gangrenados e que devem hoje libertar-se das suas novas algemas.
Reforma ou Revolução?
É todavia verdade que nas vãs tentativas para salvar o seu capital e o
seu modo de produção moribundo, a classe capitalista internacionalista tenta
desmantelar as antigas relações de producção e as antigas estruturas de
governação nacional para as transformar em qualquer coisa de multinacional, mas
tendo as mesmas funções económicas, políticas, jurídicas, diplomáticas e
militares exploradoras e repressivas. Estas transformações do aparelho de
governação imperialista não visam transformar a essência do modo de producção
capitalista, mas adaptá-las às exigências novas da economia política
imperialista moderna. Os esforços dos populistas e dos esquerdistas para orientar
estas reformas não constituem contribuições à substituição do capitalismo, como
também não sucedia com os artesãos luddistas
que destruíam as máquinas de fiar na Inglaterra do século XIX não contribuíam
para emancipar o proletariado britânico. Assim, o Brexit não é uma resistência
ao imperialismo estadunidense, mas uma adesão ao imperialismo chinês, ou um
pedido de renegociação das entidades com o imperialismo europeu que, tanto uma
como outra não trarão nada ao proletariado britânico. Estes fúteis esforços da
parte da oligarquia reformista não fazem senão prolongar a agonia deste modo de
producção moribundo, da mesma maneira que os cânticos da direita nacionalista e
as lamúrias da direita reaccionária para preservar as velhas castas (coquilles)
nacionais.
É o modo de producção que deve ser substituido. A única solução consiste em criar um novo modo de producção não socialista mas proletário comunista. Deste novo modo de producção surgirão novas relações de producção adaptadas a esta nova maneira de produzir, de comunicar, de distribuir as trocas, de repartir não as mercadorias, substituidas pela mais valias espoliadas, mas dos bens sociais que servem à reprodução colectiva da vida em sociedade, pois é preciso nunca esquecer que a finalidade de o todo o modo de producção é assegurar as condições de reprodução da vida humana. Sabemos muito poucas coisas a propósito deste novo modo de producção proletário comunista e do nome da classe que o fará surgir das suas mãos, da sua experiência e dos seus conhecimentos. As únicas coisas que sabemos com certeza é que este modo de producção será internacional, global, ao serviço do Homem – sem classe social – não mercantil (adeus mercadoria, mais-valia, lucro, moeda, capital, propriedade privada, salariato e Estado). Este novo modo de producção não se assemelhará sobretudo ao que nós conhecemos sob o capitalismo nas suas declinações ocidental, soviética, chinesa, cubana, coreana, vietnamita, albanesa, ou terceiro-mundista. Nós sabemos igualmente que este novo modo de producção proletário, que não responderá às finalidades de reprodução alargada do capital como modo de luta contra a escassez, virá a preencher todas as necessidades sociais e humanas, finalidade última de um modo de producção socializado.
Marx Escreveu
Marx pôs em guarda o proletariado internacional contra o nacionalismo
burguês reaccionário e inscreveu no Manifesto estas duas máximas: “O proletariado
não tem pátria” e “Proletários de todos os países uni-vos!”
Para introduzir a insurreição popular, e depois a revolução proletária, Marx
não apelou aos “povos oprimidos, às nações
exploradas”, aos camponeses
empobrecidos, nem aos pequeno-burgueses esfomeados. Quando Marx constatou
que as condições objectivas da revolução proletária não estavam de modo nenhum
reunidas no princípio do capitalismo triunfante, apelou à dissolução da Primeira
Internacional evitando-lhe tornar-se uma oficina de caciques reformistas
- e de pequeno-burgueses parasitas, estipendiados
pelo poder burguês alimentado
pelas cotizações da classe operária espoliada.
Eis um extracto da correspondência de Marx justamente relativa a estas divisões nacionalistas chauvinistas manipuladas
pelo capital vitoriano para dividir as forças do proletariado internacional no
seio do Império Britânico: “a Inglaterra tem agora uma classe operária
cindida em dois campos inimigos: proletários ingleses e proletários irlandeses.
O operário inglês ordinário detesta o operário irlandês como um concorrente que
baixa o seu nível de vida. Sente-se
ao seu lado como membro de uma nação dominadora, tornado, por esse facto, um
instrumento dos seus aristocratas e capitalistas contra a Irlanda e consolida
assim o seu poder sobre si mesmo. Os preconceitos
religiosos, sociais e nacionais
erguem-no contra o operário irlandês. Conduz-se em relação a ele mais ou menos como os
“brancos pobres” em relação aos negros dos antigos Estados esclavagistas da
União Americana. O irlandês devolve-lhe largamente a
parada. Vê nele ao mesmo tempo o
cúmplice e o instrumento cego da dominação inglesa na Irlanda. Este antagonismo
é entretido artificialmente e espicaçado pela imprensa, pelos sermões e pelas
revistas humoristicas, em suma, por todos os meios de que dispõem as classes no
poder. Este antagonismo constitui o segredo da impotência da classe operária
inglesa a despeito da sua boa organização. É também o segredo da força
persistente da classe capitalista, que se dá disso perfeitamente conta.”
Lenine e os bolcheviques fizeram exactamente o contrário do que Marx
recomendava. Na Rússia czarista feudal – pré-capitalista – constituíram-se em
partido político nacionalista russo – em seita militar secreta
russa – sob directório pequeno-burguês russo; apoderaram-se da direcção da
revolução democrática burguesa sustentada pelas massas camponesas analfabetas, apressadas
em expropriar e partilhar a terra e os meios de producção agrícolas, a fim de
erigir o modo de producção capitalista mercantil, depois industrial sob o nome
de Nova Economia Política (NEP). De
facto não podia haver aí nova economia política socialista, intermediária entre
o capitalismo e o comunismo, e a Rússia czarista feudal não podia gerar senão o
modo de producção capitalista prévio à revolução proletária do futuro. O modo
de producção socialista fez apelo às
modalidades da edificação do capitalismo de Estado na União Soviética. Para a
Revolução de Outubro, os bolcheviques colocaram o pequeno proletariado russo,
fraco e inexperimentado, a reboque do campesinato ávido e da pequena burguesia cupida, e não podia ser de outro modo, dado o estado
lamentável da economia czarista.
Lembremos que a revolução
proletária não é uma revolta da miséria e da pobreza contra as desigualdades,
as injustiças ou contra a opulência e a riqueza dos milionários, como o crê
todo o pequeno burguês, amargo por não receber o que considera a sua justa
parte social. A insurreição popular
será a substituição pela população espoliada do modo de producção capitalista paralisado,
e não a tomada socialista do aparelho
de Estado capitalista como o praticaram as esquerdas burguesas nos diferentes países
socialistas, todos tornados
capitalistas. A revolução proletária
que a seguirá assegurará a edificação do modo de producção proletário comunista.
A revolução nacionalista bolchevique e as outras revoluções anti-coloniais
demonstram que um modo de producção não pode ser escamoteado nem contornado. Para conduzir uma revolução anti-capitalista é
preciso viver sob o modo de producção capitalista. Para conduzir uma revolução
proletária, é preciso uma classe proletária, plenamente desenvolvida, educada,
experimentada na luta de classe anti-capitalista, em primeiro lugar na frente
económica, depois na frente política e enfim na frente ideológica da luta de
classes. Na Rússia, a revolução democrática nacional burguesa derrubou a ordem
feudal e assegurou a edificação de uma sociedade capitalista que Estaline realizou com mão de mestre, para além de toda a esperança sob
a maneira como o capital alemão iria aprendê-lo, provando assim que o
nacional-bolchevismo russo era mais eficiente que o nacional-socialismo alemão.
Setenta anos mais tarde, a obra nacionalista bolchevique – estaliniana - russa iria conhecer o seu carma na Perestroika-Glasnost; no afundamento da aliança imperialista soviética e do seu centro nacional russo paralisado nas relações de producção do capitalismo de Estado industrial, mas sobretudo incapaz de assegurar a reprodução alargada do capital do Estado sovietizado e de passar ao capitalismo financeiro. É na emergência do capital financeiro privado, liberalizado, em concorrência no mercado mundial com o capital ocidental, que o capitalismo russo encontrou o seu segundo sopro. A China maoista, sob o governo de Deng Xiaoping e dos seus interpretes, seguiu a mesma via nacionalista burguesa, sem que o Estado chinês se afundasse, mas simplesmente dando lugar ao capital financeiro nacional e internacional. Hoje, observa-se a emergência da Associação de Cooperação de Sanghai à volta da China nacionalista e da Rússia nacionalista, cada uma destas potências capitalistas estando convencida do seu papel no seio desta aliança imperialista, à qual a Índia nacionalista e o Paquistão nacionalista se juntaram recentemente. Esta nova aliança imperialista fez face à aliança imperialista Atlântica, de que a OTAN é o braço armado. Voltaremos ao assunto.
Libertação Nacional ou Libertação Proletária
Em 1955, para o proletariado revolucionário não havia
nada de esquisito nestas manigâncias internacionais e nestes preparativos de
guerra saídos do chauvinismo nacional dos países não alinhados. Este espírito
chauvinista de Bandung foi a prova de que a classe proletária devia rejeitar
toda a associação com os burgueses terceiro-mundistas que, depois de setenta anos,
fizeram dos proletários carne para canhão para as suas malversações e o
finca-pé das suas ambições com a cumplicidade da esquerda aburguesada. Depois
do fim da Segunda Guerra Mundial, observaram-se 215 conflitos armados no
terceiro-mundo, todos suscitados ou desencadeados pelas potências capitalistas
com a cumplicidade das burguesias nacionalistas locais e constatou-se que
nenhuma destas lutas trouxe a liberdade aos alienados proletários.
Tal como a pequena burguesia, o
campesinato rural , rico ou pobre, nem por isso é uma classe mais
revolucionária. O campesinato esteve no coração do modo de producção feudal
terceiro-mundista e uma das forças motrizes para a passagem das relações de
producção feudais às relações de producção capitalistas mercantis, depois
industrial, para a criação de um domínio fundiário privado, primeiramente
parcelizado, visto que o desenvolvimento do modo de producção capitalista
forçou ao reagrupamento de imensas explorações agrícolas mecanizadas e
irrigadas, onde o campesinato foi progressivamente transformado em proletariado
rural. É este proletariado agrícola empobrecido, privado de toda a propriedade,
não tendo nada senão a sua força de trabalho para vender e poder sobreviver,
que o proletariado revolucionário urbano mobilizará para conduzir a revolução
proletária internacional, não para se apoderar da governação do Estado burguês,
não para fazer dele “o Estado socialista
de todo o Povo “ mas para o erradicar.
Hoje, um século após o
prognóstico de Lenine, as condições objectivas da revolução social proletária
estão enfim reunidas. A primeira destas condições é o pleno desenvolvimento dos
meios de producção, a existência de uma imensa classe proletária mundializada,
educada, formada, limpa, experimentada, na guerra de classe, pauperizada e
ameaçada na sua sobrevivência, mas consciente dos seus interesses de classe e
obrigada a reverter as suas condições de alienação para evitar a sua
destruição. Eis a alternativa que se apresenta ao proletariado internacional,
ao qual se juntam 350 milhões de proletários chineses, e quase outro tanto de
proletários indianos, na grande marcha das forças da fome. A emancipação da
classe proletária será obra da própria classe.
Capítulo 2
Ferguson, Minneapolis, Dallas,
O mesmo combate
Robert
Bibeau
Tomemos
alguns instantes para observar, a partir de um exemplo concreto, a maneira como
a burguesia, através dos média a seu soldo e com a cumplicidade da pequena
burguesia esquerdista, transforma uma luta de resistência de classe- contra- classe
num conflito inter-racial reaccionário. É falso pretender que o assassinato de
cidadãos negros pela policia americana constitui um lapso, ou erro de um
polícia demasiado zeloso, inexperiente ou aterrorizado, ou ainda uma agressão
racista. Não é a população americana que aterroriza a polícia, é a polícia que
aterroriza os proletários americanos de todas as raças, de todas as cores e de
todas as origens étnicas.
Mais
de 500 cidadãos americanos caíram sob as balas da polícia em 2016, e a
hecatombe prosseguiu em cada ano com o aval implícito, senão a recomendação
explícita, das autoridades americanas. Nos Estados Unidos, além da pena de
morte judiciária, o Estado pratica também a pena de morte extra-judiciária,
preventiva, repressiva, exactamente como o exército americano no estrangeiro a
aplica nas diferentes frentes dos seus empenhamentos mortíferos. Khadafi e Ben
Laden foram duas vítimas célebres, como outras menos conhecidas. No tempo do
presidente Obama, em cada terça-feira no gabinete oval, eram condenados à morte
indivíduos, sem processo, pelo chefe da Casa Branca, receptário do prémio Nobel
da Paz!
Esta
política sistemática de repressão policial, especialmente contra o proletariado
negro, mas também contra os latinos, contra os SDF, contra os Autoctones,
contra os escravos asiáticos das lojas de
doces da miséria e contra os emigrantes clandestinos, faz-se sem
discriminação racial, contrariamente às mentiras que propagam os média do
capital. Esta repressão visa não esta ou aquela raça, etnia ou minoria, mas tem
por alvo sobretudo a classe social proletária, o lúmpen proletariado, os SDF
sacrificados, a fim de aparecer exemplar às populações locais e aterrorizá-las.
A mensagem subjacente a estas milhares de mortes policiais é a seguinte: “ Povo de miséria, proletário em cólera cada
vez mais pobre, não resisteis às vossas condições de existência e de alienação,
senão nós vos mataremos sem remissão, para vos aterrorizar, como podeis
observar nestes vídeos difundidos nas redes sociais”.
Em
resumo, a morte policial de Minneapolis participa de um plano estadual
terrorista, visando aterrorizar a população americana resistente… qualquer que
seja a raça ou a cor das pessoas assassinadas na rua.
Como
sempre escrevemos, o proletariado americano é o mais evoluído, o proletariado
mais avançado, o que vive sob a ditadura capitalista mais degenerada, a mais
depravada, a mais desesperada e a mais terrorista, porque a mais amedrontada e
a mais consciente da sua pertença de classe. A situação económica do
imperialismo americano é catastrófica – o que obriga o capital ianque a
acrescer as suas pressões sobre o proletariado estaduniense além do imaginável
e isso simplesmente para se manter à tona, a cabeça acima da crise sistémica
que o capital dos Estados Unidos já perdeu às mãos dos seus concorrentes
imperialistas estrangeiros (a China, nomeadamente), a Alemanha e a Europa
igualmente.
O
que os capitalistas americanos acabam de aprender há dois anos em Ferguson e em
Dallas (5 polícias mortos e 7 feridos) é que o proletariado americano está
armado e é perigoso, e que se eles não se deixam enganar pelas fábulas racistas
do tipo: negros – contra latinos – contra brancos – contra autóctones – contra a
pantera negra e outras estupidezes
racistas como os media a soldo propagam, então a burguesia americana poderá
estar em perigo face à subida da resistência de classe do proletariado
estaduniense, sem distinção de raça nem de etnia. Não são os negros que são visados pelos
assassinatos policiais, mas sim os resistentes proletários em cólera. Mas
atenção: o proletariado não é terrorista, nem anarquista, nem individualista, e
responderá, enquanto classe consciente e organizada, colectivamente solidária,
às provocações do capital americano deteriorado.
Capítulo 3
Os marxistas e a questão nacional
Pierre
Souyri
Neste capítulo, apresentamos as Notas de leitura de Pierre Souyri, publicadas nos Anais de Julho de 1979, no volume de Georges Haupt, Michel Lowy, Claudie Weill, intitulado The Marxists and the National Question, 1848-1914. Integramos os nossos comentários nas suas anotações, identificando-os com as letras NDLR.
Pierre Souyri escreveu aqui, a propósito do marxismo e da questão nacional "Ao elaborar este dossier que reúne alguns dos textos cuja publicação marcou as tomadas de posição, por sua vez complementares e opostas, os teóricos da II Internacional sobre a questão nacional, G. Haupt, M. Lowy e C. Weill tiveram o cuidado de não privilegiar as concepções dos bolcheviques. Essa escolha não teve apenas a vantagem de dar a conhecer aos leitores os pontos de vista que a hegemonia do marxismo russo havia atirado para o esquecimento; permite, também, romper com uma representação banal e portanto insustentável que ordena a história das teorias marxistas, como se existisse um marxismo constituindo um sistema coerente e completo, do qual os bolcheviques teriam recapturado a metodologia e os conceitos para desbloquear, finalmente, aquilo em que todos os outros teóricos da época da II Internacional, haviam consecutivamente errado , sobre a solução justa e necessária da questão nacional, como de resto de todas as outras.
Quando os teóricos que se reclamam de Marx são constrangidos pelas circunstâncias - a ascensão do nacionalismo na Europa Oriental e depois na Ásia - a repensar a questão das nacionalidades das quais Marx e, acima de tudo, Engels, estavam preocupados principalmente na época das revoluções de 1848, eles encontram nos escritos dos "pais fundadores" apenas indicações fragmentárias, às vezes contraditórias e, em qualquer caso, muito fortemente datadas. Marx e Engels, que pensavam que o antagonismo entre capital e trabalho era a fonte essencial do processo histórico da sociedade moderna, haviam concedido à questão nacional apenas um estatuto marginal e subordinado.
Este último apenas os interessou na medida em que a questão nacional interferisse na luta de classes e que a formação de grandes nações pudesse favorecer o crescimento do capitalismo ao mesmo tempo que a recusa proletária da sociedade burguesa. Não levando em consideração as aspirações nacionais senão sob a perspectiva das suas possíveis consequências para a luta de classes, Marx e Engels não consideraram legitimas senão as lutas nacionais que pudessem enfraquecer a contra-revolução europeia. Daí o apoio ao nacionalismo polaco contra o poder do czarismo e, mais tarde, ao nacionalismo irlandês, cuja vitória, acreditavam, promoveria tanto a intensificação das lutas sociais em Inglaterra quanto na Irlanda. Daí também a hostilidade furiosa contra os eslavos do sul que foram usados pela contra-revolução em 1848 e o ódio ao pan-eslavismo, que consideravam ser o instrumento da expansão russa. Engels, especialmente, multiplicou contra os eslavos do sul os epítetos ofensivos. Lowy, que apontou algumas das previsões mais infelizes de Engels sobre o futuro das nações eslavas e outras, mostra, no entanto, que a fúria de Engels é a fúria de um revolucionário, e não a de um chauvinista alemão e um Slavophobe cego. Conduzindo uma análise superficial e errónea das causas da contra-revolução, Engels enjeita injustamente toda a responsabilidade para os eslavos, sem perceber que o fracasso das revoluções de 1848-49 tem raízes de classe mesmo no coração das nações revolucionárias. "
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“Quanto
a nós, contrariamente a Souyri, não vemos nações revolucionárias proletárias.
E, se existem nações revolucionárias, serão necessariamente nações
revolucionárias burguesas, aspirando ao capitalismo como modo de producção,
assegurando o seu pleno desenvolvimento nacional, até à sua negação e até à sua
ultrapassagem. Durante dois séculos, a esquerda foi incapaz de compreender que
as derrotas das revoluções proletárias do século XIX e do século XX se explicam
não por erros tácticos, mas pelo sub-desenvolvimento do modo de produção
capitalista, que não tinha atingido o seu estádio último – imperialista - e, em
consequência ao subdesenvolvimento demográfico, económico, político e
ideológico do seu coveiro, a classe proletária. É impossível conduzir uma
revolução proletária anti-capitalista numa sociedade camponesa feudal ou numa
sociedade capitalista em pleno desenvolvimento. O que a sociedade alemã post-espartaquista
provou, estrebuchando e tomando relevo até à época moderna, quando enfim atingiu a
maturidade revolucionária proletária” NDLR
Pierre Souyri continua "Além disso, o mesmo Engels que atribuiu na ocasião uma essência reaccionária aos povos eslavos, contudo, não deixou de apelar, em 1848, ao derrube do Império dos Habsburgo, que era um obstáculo à libertação dos eslavos e dos italianos. O facto é que Engels analisou problemas nacionais usando repetidamente o conceito hegeliano e estranho ao materialismo histórico de "povo sem história", sem que Marx formulasse a menor crítica ao hegelianismo pré-marxista do seu companheiro. Quando as gerações posteriores são compelidas a actualizar a questão das nacionalidades na teoria marxista, elas partem de um legado que é dos mais incertos e G. Haupt sublinha todas as dificuldades com que as suas inciativas se vão deparar. "
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O leitor terá notado aqui a posição
intelectual pequeno-burguesa que adopta Pierre Souyri que põe o problema em
termos do reactualizar a questão das nacionalidades na teoria marxista, como se
um revolucionário proletário tivesse de se preocupar com uma postura teórica
marxista face a um problema que é posto pela revolução. Um revolucionário
proletário tem o dever de encontrar uma resposta revolucionária proletária para
um problema prático posto pela organização da revolução proletária. Veremos
mais adiante o que um proletário deve fazer a propósito da questão nacional
burguesa. Não é o enriquecimento teórico do marxismo que nos preocupa, mas o
avanço da revolução” N.D.L.R.
Pierre Souyri acrescenta: "Antes do mais, dificuldades ligadas à terminologia e aos conceitos que nem sempre permitem diferenciar claramente os Estados, nações e nacionalidades e que fazem surgir incertezas e controvérsias tanto mais vivas, quanto mais os marxistas estão captivos dos modelos ocidentais da formação das nações que não lhes permite compreender o que está prestes a acontecer na Europa central e sul-oriental no final do século XIX. Aí, ao contrário do que havia acontecido nos países ocidentais, onde os estados tinham sido os instrumentos para agrupar e unificar as nações, os estados só aparecem na última etapa, muito depois de que as nações começaram a afirmar-se lentamente tomando consciência de si mesmas como comunidades de língua e cultura. Além disso, os marxistas frequentemente tinham que violentar os seus próprios hábitos de pensamento para admitir que não havia apenas, como disse J. Guesde, "duas nações; a nação dos capitalistas, da burguesia, da classe dos possuidores, de um lado, e do outro a nação dos proletários, da massa dos deserdados, da classe trabalhadora "e que o proletariado poderia sentir-se preocupado por reivindicações nacionais, e não apenas as suas camadas mais recuadas e mal libertas da ideologia burguesa. G. Haupt mostra como, no final do século XIX, o progresso da industrialização no Império de Habsburgo perturbou a composição social e nacional do proletariado e trouxe sob a bandeira dos trabalhadores alemães qualificados uma massa de manobras resultantes das várias nacionalidades do Império que se sentem social e nacionalmente oprimidas."Ser checo em Viena é ser proletário". Portanto, recusar ter em consideração as aspirações nacionais ou a prestar-lhes apenas uma atenção relutante em nome de um rigoroso internacionalismo de princípio equivale a confinar o socialismo a posições petrificadas que correm o risco de torná-lo estranho ao proletariado real. À medida que o socialismo se espalha para a Europa Oriental e depois para países não europeus, os marxistas vêem-se forçados a reformular a sua problemáticas da questão nacional e a reconsiderar a sua visão do movimento histórico. É necessário que"desocidentalizem" o marxismo, admitir que não é verdade que a crescente internacionalização da vida económica seja suficiente para produzir uma homogeneização da civilização e das culturas, abrindo a perspectiva de ir além das peculiaridades nacionais e que existem, pelo menos, contradições que fazem com que a penetração do capitalismo nos "povos sem história" resulta não só na sua assimilação, mas no seu despertar nacional. "
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À
força de pesquisar para justificar o
nacionalismo chauvinista, Souyri acaba por encontrar alguns esqueletos no
armário.
Não faz aqui nada de original. Todos
os nacionalistas chauvinistas vos dirão que é preciso ser nacionalista, visto
que o proletariado está empedernido – contaminado- de ideias nacionalitas– tal
como de ideias religiosas -de aspirações burguesas – de cultura burguesa- mesmo
quando muitas vezes o proletariado creia que não existe, enquanto classe
social- visto que toda a propaganda dos média burgueses nega a sua existência.
“ Numa sociedade de classes, as dominantes são as da classe dominante”.
Numa sociedade capitalista nacionalista
burguesa, as ideias dominantes são as da classe burguesa, até ao dia em que a
própria burguesia se veja forçada a repudiar a sua própria ideologia
nacionalista, para a fazer evoluir em direcção ao internacionalismo
imperialista, a fim de se conformar às necessidades dos mercados
internacionais; às migrações dos proletários, em marcha para os novos locais de
exploração; às necessidades e expropriação das riquezas naturais; e às
necessidades de importação de mercadorias e de capitais vindos de horizontes
internacionais. Souyri não teria escrito isto se tivesse simplesmente
compreendido que os frutos internacionalistas amadurecem entre as burguesias
ex-nacionalistas que se tornam mundialistas. Assim, qual é a importância que
nos países do Oeste, os Estados tivessem os instrumentos de junção e de
unificação das nações, enquanto que a Leste, os Estados não aparecem senão na
última etapa, muito tempo depois que as nações tenham começado a afirmar-se,
tomando lentamente consciência de si mesmas como comunidades de “língua e de
cultura”? Hoje, o império soviético foi
balcanizado – fragmentado em Estados-nações libertados, dominados – espoliados por
um punhado de monopólios imperialistas gigantes representados por marionetas
políticas nacionalistas. Por vezes, é suficiente esperar que a roda da história
complete o seu ciclo para ver o mundo sob uma luz diferente. Houve um tempo em
que o capital era nacional, hoje tornou-se internacional como o proletariado, a
classe que o derrubará. Para os proletários revolucionários é reaccionário
amantizar-se com a pequena burguesia reformista e com o pequeno capital nacional
para tentar travar a marcha da história mundial pela emergência e depois o
afundamento do imperialismo declinante.” NDLR.
Pierre Souyri, prosseguindo a sua crítica escreve "Nesta evolução histórica do marxismo, a contribuição dos austríacos, especialmente Otto Bauer, é um marco. Sem dúvida, os austro-marxistas estão especialmente preocupados em impedir o colapso do império multinacional reunido pelos Habsburgos e em conter as forças centralistas que ameaçam desintegrar o seu próprio partido. Essa preocupação levou Otto Bauer a desenvolver uma concepção de nacionalidade que amputa o problema da sua dimensão política e ignora o carácter de classe das producções culturais. O. Bauer também será atacado pela extrema esquerda do movimento socialista - A. Pannekoek e Strasser, que persistem em considerar que não pode haver interesses nacionais específicos para o proletariado – a não ser para Kautsky, que não admite que o advento do socialismo possa ser acompanhado por um aprofundamento das diferenças nacionais e pelos bolcheviques que questionarão as concepções "psicoculturais" da nação desenvolvidas pelos austro-marxistas e as soluções que proclama a social-democracia austríaca para resolver a questão nacional. No entanto, os teóricos vienenses ajudaram a abalar a inércia da II Internacional. A sua pesquisa abriu o caminho para a ideia de que o nascimento das nações não pertencia necessariamente ao passado da Europa e do mundo, e que o internacionalismo proletário não poderia virar as costas às aspirações das nacionalidades oprimidas. "
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Perdoar-nos-ão (Relevar-se-nos-á) esta repetição,
mas o argumento é recorrente. O que são as
aspirações das nações oprimidas? Que nações oprimem as nações oprimidas?
Uma certa esquerda burguesa do Quebec foi ao ponto de inventar a “classe nação
quebequense francófona oprimida” (sic), ficando a pertença de classe fixada
pela língua dominante em cada uma dessas comunidades. Esta mística fascista
provinha dos social-fascistas alemães, austríacos, franceses e outros. Uma
nação é composta por uma comunidade humana que antes de ter semelhanças
linguísticas, morais e culturais é em primeiro lugar movida por antagonismos de
classe. Uma pequena porção (burguesa) da nação explora uma grande porção
(proletária) da nação e esta é a maior de todas as contradições sociais. Uma
porção da nação está disposta a conduzir a guerra nacional, até ao último
proletário se necessário, enquanto que uma outra porção da nação aspira à paz
até ao último burguês. Assim, uma pequena porção quebequense francófona
tornou-se rica, próspera, explorando o trabalho assalariado dos proletários
quebequenses e exigindo sempre mais ajudas do Estado burguês. Nos dias de hoje,
esta porção da nação é proprietária de grandes conglomerados internacionais,
enquanto que uma grande parte da nação quebequense francófona e anglófona está
crivada de dívidas, vende quotidianamente a sua força de trabalho a preço vil –
recebe sempre menos do serviço do Estado nacional quebequense e migra para fora
do lar nacional para achar emprego em inglês ou em francês. Os proletários
abandonaram toda a região e desinteressam-se da política burguesa demagógica. A
situação é idêntica entre as duas classes antagónicas que compõem o resto do
conjunto canadiano maioritariamente de língua inglesa. A situação é idêntica
entre as nações ameríndias. Que nações são oprimidas e que nações oprimem no
Quebec e no Canadá? Nenhuma. Podemos identificar uma classe social oprimida –
independentemente da língua de uso dos seus membros e podemos identificar uma
classe social opressora – independentemente da língua de uso dos seus aderentes.
Um capitalista anglófono canadiano explora os proletários canadianos, não
explora os capitalistas da nação quebequense com os quais cruza negócios, e
inversamente para os capitalistas quebequenses com negócios com os capitalistas
do resto do Canadá e do mundo inteiro. Os interesses dos capitalistas
quebequenses não têm nada em comum com os dos proletários do Quebec. Voltaremos
a estas questões”. NDLR
Voltemos às notas de leitura de Pierre Souyri: "Quando, na véspera da guerra, Lenine aborda a questão nacional, a sua reflexão pode basear-se em toda a pesquisa realizada desde Marx, que expandiu e transformou bastante o campo socialista teórico. Mas consegue retomar quase completamente o problema das relações entre as aspirações nacionais e o socialismo, porque o considera em função do tema das desigualdades de crescimento que o capitalismo imprime ao processo histórico e às incompatibilidades que ocorrem nos países mais atrasados entre as tarefas democráticas burguesas e as tarefas proletárias da revolução. A eliminação das peculiaridades nacionais pelo desenvolvimento do capitalismo, que Kautsky havia enfatizado há muito tempo, está a tornar-se uma realidade, mas no século XX torna-se contemporâneo de um despertar nacional causado pela expansão do capital imperialista em direcção aos países atrasados. Esses dois movimentos não são necessariamente contraditórios, na medida em que cabe ao movimento proletário levar a revolução democrática até ao fim, cujas aspirações nacionais são apenas um elemento. No sistema teórico de Lenine, o nacionalismo dos povos oprimidos é assim integrado numa estratégia coerente da revolução. Faz parte de um processo mais geral através do qual a realização das aspirações nacionais prepara o declínio dos particularismos nacionais e é até a condição. Tanto como para Marx ou Rosa Luxemburgo, as aspirações nacionais não têm para Lenine um interesse intrínseco. Eles não são reconhecidos senão para serem utilizados com a finalidade de um movimento que implica a sua superação. No entanto, é impossível não notar hoje que a concepção leninista não resistiu ao teste dos acontecimentos. Lowy mostra que a história nega constantemente as concepções e previsões de Engels. Mas, por razões diferentes, o mesmo se aplica a Lenine. A maioria das nações que se formaram após 1918 e após a desintegração dos impérios coloniais não se baseou na subordinação das aspirações nacionais ao movimento proletário. O inverso costuma ser o caso: mesmo em países onde havia um movimento operário, este deixou-se integrar na luta nacional e tornou-se uma mera força de reforço do nacionalismo que redundou na formação de estados burgueses ou de estados burocráticos que encontraram o seu principal apoio na guerrilha camponesa. A grande estratégia concebida pelos bolcheviques é coerente apenas no abstrato ou no imaginário dos teóricos: não encontrou na prática uma correspondência. "
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“A grande estratégia concebida pelos bolcheviques como o escreve aqui Pierre Souyri, não sofre de incoerência nem de falta de correlação prática. Os bolcheviques encontraram-se à cabeça de uma revolução democrática burguesa antifeudal conduzida pela burguesia russa dirigida por Kerenski e apoiando-se num imenso campesinato submetido e esfomeado ao qual os bolcheviques carrearam o apoio do pequeno proletariado russo nascente, tão nascente como era o modo de producção capitalista industrial na Rússia czarista. Os bolcheviques arrancaram a direcção desta revolução burguesa a Kerenski, ligando-se ao campesinato graças ao slogan reformista “Pão, Paz, Terra”. Como excelente táctico, Lenine forjou uma teoria adaptada a esta prática da luta de classes num contexto de guerra de libertação nacional burguesa que ele empandeirou com os epítetos de “anti-imperialista e socialista”, imaginando mesmo um novo modo de producção a cavalo entre o capitalismo e o comunismo, que chamou de socialismo da Nova Economia Política (NEP). A revolução russa era efectivamente uma revolução anti-imperialista, mas não contra o imperialismo moderno, fase última do modo de producção capitalista, mas contra o imperialismo feudal decadente, que terminava a sua existência e devia deixar o lugar, como o havia feito vários anos antes nos países da velha Europa, ao modo de producção capitalista emergente – uma tarefa revolucionária talhada por medida pela burguesia revolucionária, mas não certamente pelo proletariado nascente, que deveria esperar ainda um século. É aí que estamos hoje. O imperialismo moderno capitalista completou a sua expansão até nas planícies do Ganges e do Ianqusé. Eis a rosa proletária do mundo inteiro: cabe-vos a vós dançar. NDLR.
Capítulo 4
Nacionalismo e Socialismo
Paul
Mattick
Neste capítulo, analisamos um importante texto de Paul Mattick, intitulado "Nacionalismo e Socialismo", publicado em inglês no The American Socialist em Setembro de 1959, em francês no Front Noir (Fevereiro de 1965) e na ICO nº 99 em Novembro de 1970. Mais uma vez os nossos comentários estarão identificados com as letras NDLR.
Mattick escreveu aí: "Os socialistas não utópicos
favoreceram o capitalismo como oposto às
velhas relações sociais de producção, e saudaram o nacionalismo na medida em
que poderia acelerar o desenvolvimento capitalista. Sem admitir isso
abertamente, eles não estavam longe de aceitar o imperialismo capitalista (...) Eles também eram favoráveis ao
desaparecimento de pequenas nações incapazes de desenvolver a economia em larga
escala (...) No entanto, eles apoiaram as pequenas "nações
progressistas" contra os grandes países reaccionários. (...) Em nenhum
momento e em nenhuma ocasião, porém, o nacionalismo foi considerado um objectivo
socialista.
Em
toda a parte, o modo de producção capitalista construiu-se ao abrigo das fronteiras
nacionais, incluindo a União Soviética, a China maoista, o Vietname, a Coreia,
Cuba, etc. Estas fronteiras têm a vocação de preservar por um tempo as
particularidades tribais, feudais, camponesas, étnicas e do comércio local, que
o capitalismo constrói e destrói com o tempo a fim de se consolidar,
dificilmente por vezes, como mostra o nascimento dos nacionalismos no Médio
Oriente e em África. Cada um está em condições de apreciar a clareza do resumo
apresentado por Mattick que concentra a quinta-essência do pensamento pequeno
burguês sobre a questão das lutas de libertação nacional e contra “o
imperialismo político”, depois de Bukarine, Lenine, Trotski, Estaline e Mao. Os
gurus da ortodoxia marxista-leninista apresentam o imperialismo como uma política
de grandes potências e militam contra o retorno
destas regiões ao pré-capitalismo”, processo histórico de regresso à
rectaguarda, de toda a maneira impossível, que mesmo os criminosos de guerra
americanos não conseguiram impor aos vietnamitas, e que os carniceiros khmeres
vermelhos não conseguiram impor aos cambojanos. De mais a mais, é infelizmente falso pretender, como o
faz Mattick, que o nacionalismo nunca tenha sido considerado como um objectivo
socialista. NDLR
Prossigamos com o pensamento de Mattick. Ele escreveu: "Esse novo nacionalismo, que abala a dominação ocidental e estabelece relações capitalistas de producção e indústria moderna em regiões ainda sub-desenvolvidas, ainda é uma força" progressista ", como foi o nacionalismo do passado? Essas aspirações nacionais coincidem de alguma maneira com as aspirações socialistas? Elas apressam o fim do capitalismo enfraquecendo o imperialismo ocidental ou injectam uma nova vida no capitalismo fazendo estender ao mundo inteiro o seu modo de producção? "
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O grande capital e os seus teóricos
insinuaram que haveria uma relação de domínio ocidental contra a civilização
oriental. Aqui Mattick insinua que “ o novo nacionalismo institui as relações
de producção capitalista e a indústria moderna nas regiões subdesenvolvidas”.
Segundo a teoria materialista dialéctica proletária é o desenvolvimento das
forças produtivas e dos meios de producção que instituem o desenvolvimento de
um certo tipo de relações de producção (Estado-nação) e uma ideologia
(nacionalista burguesa) que os intelectuais burgueses prenomeiam "civilização ocidental” se ela é
impregnada de artefactos feudais ocidentais e “civilização oriental” se é impregnada de artefactos feudais
orientais. As relações de producção capitalistas – por todo o lado as mesmas,
pois o modo de producção capitalista industrial é por toda a parte o mesmo -
por seu lado, reforçam o desenvolvimento dos meios de producção. Assim, é o
desenvolvimento industrial da Ásia que permitiu a emergência das relações de producção
capitalistas nacionais (durante a sua fase de emergência), na China maoista
nomeadamente, país que desenvolveu uma indústria vigorosa ao abrigo das suas
fronteiras nacionais e que agora, enquanto estado-nação capitalista atingiu o
estádio último, imperialista, de desenvolvimento, integrando o capital
financeiro mundializado. A China procura portanto abater as barreiras
tarifárias dos seus concorrentes, a fim de conquistar os seus mercados
orientais ou ocidentais. O capitalismo é a condição do nacionalismo que se
reforça até que o capitalismo, chegando ao termo das suas contradições entra na
fase imperialista e faz cair as fronteiras nacionais e repudia a ideologia
nacionalista. NDLR.
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Mattick acrescenta: “ Todavia, no fim do século, é o imperialismo, não o nacionalismo, que estava na ordem do dia.” Os interesses "nacionais" alemães tornaram-se interesses imperialistas que rivalizavam com os imperialismos de outros países. Os interesses "nacionais" franceses eram do Império Francês, assim como os da Grã-Bretanha eram do Império Britânico. O controle do mundo e a partilha desse controle entre as grandes potências imperialistas determinaram políticas "nacionais". As guerras "nacionais" foram guerras imperialistas que culminaram em guerras mundiais”.
“ Nova demonstração (acima) do pensamento
socialista- idealista – burguês a propósito do imperialismo que Bukarine ,
Lenine e os bolcheviques ligaram à III Internacional e aos partidos comunistas nacionalistas
(eurocomunistas, nomeadamente) e que os trotsquistas e outras oposições da
esquerda e da direita adoptaram.
“
É o imperialismo e não o nacionalismo que está na ordem do dia da batalha”,
escreve o autor, estabelecendo uma oposição entre imperialismo e nacionalismo.
O imperialismo não é uma política de grande potência oprimindo os pequenos
países nacionalistas, como Bukarine sugeriu. Não há modo de producção
imperialista francês, britânico, alemão ou americano. O imperialismo é o modo
de producção capitalista nacional chegado à maturidade,e é em toda a parte o
mesmo. O imperialismo moderno
(capitalista) é o capital financiarizado,
globalizado, mundializado que tenta futilmente compensar a depreciação
dos meios de producção com o aumento da produtividade do trabalho e fazendo
isso pela alta da sua composição
orgânica, o que mergulha mais profundamente na sua contradição. O que é
próprio de todo o país capitalista, tão pequeno ou tão grande quanto o seja, é
atingir o estádio último da evolução capitalista – o estádio imperialista- onde as relações de producção capitalistas já
não podem assegurar o desenvolvimento das forças produtivas sociais, impedindo
por esse facto o modo de produção de se reproduzir a fim de assegurar a
valorização do capital; deixando o proletariado inútil, órfão do seu mestre
alienante, forçando-o a emancipar-se ou
a desaparecer. É então, não à escala nacional – o que os marxistas terão
compreendido instintivamente, denunciando as veleidades de construir o modo de
producção comunista num só país -, mas à escala internacional que a revolução
proletária deverá ser conduzida. A política revolucionária do proletariado não
faz suas as lutas de libertação nacional democráticas e burguesas que não são
senão guerras entre clãs capitalistas para o controlo do aparelho de estado
burguês e das fontes da mais-valia. NDLR
Seguindo os passos de Paul Mattick, descobrimos "Um socialismo internacional consistente, como o de Rosa Luxemburgo, por exemplo, que se opôs à" autodeterminação nacional "dos bolcheviques. Para ela, a existência de governos nacionais independentes não alteraria o facto de serem controlados pelas potências imperialistas, uma vez que estas dominavam a economia mundial. Nunca se poderia lutar contra o capitalismo imperialista ou enfraquecê-lo criando novas nações, mas apenas opondo contra o supranacionalismo capitalista o internacionalismo proletário. Esses movimentos pertencem à sociedade capitalista, assim como o seu imperialismo. Mas "usar" esses movimentos nacionais para fins socialistas não poderia significar outra coisa senão que livrá-los do seu carácter nacionalista ".
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Como
é que uma classe operária liliputiana, inexperimentada na luta de classes nas
frentes económica, política e ideológica, saída de meios de producção arcaicos,
na orla do capitalismo industrial ascendente, sempre em expansão em numerosas
regiões, e não tendo ainda conquistado certos países da Ásia, da África e da
América Latina; como é que pode esta classe emergente impor o internacionalismo
proletário que ela nem sequer supõe haver e que não virá senão com a paz
imperialista da evolução do modo de producção? NDRL
E Mattick acrescenta: "A Primeira Guerra Mundial produziu a Revolução Russa e, quaisquer que fossem as suas intenções primitivas, foi uma revolução nacional. Embora esperasse ajuda do exterior, ela nunca foi aportada às forças revolucionárias do exterior, excepto quando essa ajuda foi ditada pelos interesses nacionais russos. A Segunda Guerra Mundial e as suas sequelas trouxeram a independência para a Índia e o Paquistão, a Revolução Chinesa (...) Aparentemente, a era da emancipação nacional não terminou, e é óbvio que a corrente cada vez mais forte contra o imperialismo não serve os fins socialistas revolucionários à escala mundial ".
Que
libertação e que auto-determinação para os proletários da Ásia do Sueste, para
os da África e do Médio Oriente? Numa análise de classe proletária da economia
política, cada conceito tem um significado de classe. Assim, para nós proletários
revolucionários, o termo libertação não pode significar senão a libertação da
exploração da alienação da classe, do jugo do modo de producção capitalista. Em
que é que foram emancipados alguns proletários da Ásia do sueste, da China, da
África, do Médio Oriente, entre 1945 e 1975? Acaba-se assim por compreender que
os socialistas, comunistas, frentes unidas patrióticas, frentes populares e
outras esquerdas burguesas nacionalistas consideram como uma libertação o facto
de que eles se apoderaram da direcção da edificação do capitalismo burguês nos
seus respectivos Estados nacionais. A classe proletária, em curso de internacionalização sob o imperialismo moderno, conhece
as suas novas cadeias, mas continua a não ser emancipada. NDLR
Paul Mattick toma coragem e diz: "O que revela realmente esse novo nacionalismo, são as mudanças estruturais da economia capitalista mundial e o fim do colonialismo do século XIX. O "fardo do homem branco" tornou-se um fardo real em vez de um benefício. Os lucros do domínio colonial estão a diminuir enquanto o custo do império está a aumentar ".
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Os proletários revolucionários rejeitam firmemente toda a
acusação de racismo a propósito do fardo
do homem branco. Há o homem branco capitalista que oprime o homem branco
proletário, assim como o homem negro proletário. Ambos são oprimidos e
explorados pelos seus congéneres raciais, étnicos ou linguísticos. Assim, contrariamente
ao que escrevia Mattick, os lucros da exploração capitalista nos países colonizados
emergentes – recém-chegados ao modo industrial de producção e de reprodução –
não diminuem, são os lucros realizados nos países dominantes, os primeiros
capitalizados países ocidentais, que diminuem em resultado de dois factores: A)
encarecimento do custo da reprodução da força de trabalho social nos países
industrialmente avançados ¸B) o aumento da composição orgânica do capital – os
capitalistas mecanizando a produção têm de aumentar a produtividade e a taxa de
exploração da força de trabalho a fim de reduzir a quantidade global da força
de trabalho social cujo custo está em alta. O nacionalismo chauvinista e reaccionário
não visa senão fazer aceitar estes sacrifícios pela classe operária nacional.
Os capitalistas brancos do norte não hesitaram deslocalizar as suas fábricas do norte
(branco) para o sul (negro) ou para o leste (amarelo) quando tal se tornava
proveitoso. O capitalista, tal como o proletário, é internacionalista e sabe
que o capital não tem pátria, cor ou odor. Temos escrito e repetimo-lo, uma
nação ou um povo oprimido e uma nação ou um povo opressor isso não existe. Sob o modo de producção capitalista,
diferentes classes sociais afrontam-se e destes afrontamentos nascem as
condições de exploração e de opressão da classe operária metropolitana e as condições
de exploração e de opressão da classe proletária dos países ex-colónias também
chamados países capitalistas emergentes, agora que é vantajoso explorá-los
industrialmente. O desenvolvimento
desigual e combinado está votado a ser modificado como o demonstram os
contantes fenómenos da deslocalização e da relocalização industriais. É
nisso que o capital nacional se torna mundial construindo como seu coveiro o
proletariado revolucionário internacional. Na passagem que segue, Paul Mattic
expõe precisamente a incompreensão profunda do conjunto da esquerda
esquerdista, oportunista e reformista com que traiu o imperialismo que
considera como uma evolução da política de domínio das grandes potências
económicas do colonialismo ao neo-colonialismo. NDLR
Mattick escreve: "Em geral, o colonialismo não paga mais, de modo que é em parte o próprio princípio do lucro que nos convida a reconsiderar o problema da dominação imperialista. Duas guerras mundiais destruíram mais ou menos as antigas potências imperialistas. Mas elas não provocaram o fim do imperialismo que, embora assumindo novas formas e expressões, mantém o controle económico e político das nações fortes sobre os fracos (...) a América não foi um poder imperialista no sentido tradicional. Garantiu o benefício do controle imperial, mais pela "diplomacia do dólar" do que pela intervenção militar directa.”
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As nações e os Estados-nação são resíduos
do modo de producção capitalista ascendente e estão condenadas a desaparecer no
seio do cadinho internacional. As guerras não podem “ conduzir” ao fim do
imperialismo como o pretende Mattic. As guerras são o resultado da evolução da
economia política imperialista no seu desenvolvimento contraditório -
dialéctico – e constituem a última táctica do sistema capitalista para tentar
ultrapassar as contradições. Pelo que respeita à “diplomacia do dólar”, que teria substituído a “ diplomacia da canhoneira”, constatamos
simplesmente que os Estados Unidos intervieram militarmente 200 vezes depois do
fim da Segunda Guerra Mundial; que os capitalistas que dominam esse país
conduziram o seu país à guerra durante 220 anos nos seus 240 anos de
existência. Acontece que a potência militar da Aliança imperialista ocidental é
muito activa na defesa dos seus interesses – não nacionais- mas interesses de
capitalistas monopolistas internacionais, nomeadamente financeiros através da
diplomacia da canhoneira, do porta-aviões, do míssil e do drone. A diplomacia
do dólar e a diplomacia da canhoneira são duas tácticas complementares. NDRL
De seguida, Paul Mattick declara: "Nenhuma das potências européias tem hoje força para se opor à dissolução completa do seu império, a não ser com a ajuda americana. Mas essa ajuda submete essas nações, assim como as suas possessões coloniais, à penetração e ao controle americanos. Herdando aquilo que o imperialismo em declínio está a abandonar, os Estados Unidos não sentem a necessidade de voar em socorro do imperialismo da Europa Ocidental ,"Anticolonialismo" não é uma política americana deliberadamente assumida para enfraquecer os aliados ocidentais (...), mas foi escolhido na perspectiva de fortalecer o mundo livre. "
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,, ________
O
modo de producção capitalista americano não está em guerra contra o modo de
producção capitalista europeu, russo ou chinês. Existe uma aliança de empresas
concorrentes que alcançaram a fase imperialista da evolução capitalista e elas
estão todas em competição umas com as outras, mas também em concorrência com as
empresas capitalistas emergentes e mundializadas. Não são os países que são
emergentes, são as grandes empresas dos países do sul que se reagrupam em
conglomerados, a fim de fazer face aos monopólios ocidentais. É para aí que as
empurra muito naturalmente o seu desenvolvimento imperialista. Um inquérito
recente da organização não governamental (ONG) OxFAM revela que
o conjunto das dez maiores corporações do mundo têm rendimentos mais importantes que os
rendimentos governamentais de 180 países combinados, é isso o imperialismo.
Estes imensos conglomerados trocam entre si bens de consumo, mas também meios
de producção – capitais – é neste momento que intervêm os bancos e os mercados
financeiros e partilham entre si os mercados, após ásperas negociações, senão
guerras. A evolução muito rápida das relações de producção capitalistas entre
estes conglomerados emergentes e entre os países emergentes coloca-os já em posição
de conquistadores, cara a cara com os seus antigos mentores ocidentais. O
proletariado deve tomar partido em favor dos capitalistas nacionais emergentes
ou em favor dos antigos capitalistas internacionais? Nem de um nem do outro,
evidentemente. Assim, a China que ainda não completou a integração de 350
milhões dos seus camponeses nas suas forças produtivas industriais nacionais,
está já na corrida para a robotização da sua producção industrial, a fim de
atingir uma maior produtividade que conduza a sustentar a concorrência imperialista
mundial e a sacrificar milhões de proletários que amanhã não terão outra
escolha senão revoltarem-se e destruírem – não a nação chinesa, ou o
imperialismo chinês emergente -, mas o modo de producção capitalista na China,
a título de contribuição para a revolução proletária mundial. NDLR.
Mattick continua: "Privados das possibilidades imperialistas, Alemanha, Itália e Japão, não têm mais uma política independente. O declínio progressivo dos impérios francês e britânico tornou esses países poderes de segunda ordem. Ao mesmo tempo, as aspirações nacionais das regiões menos desenvolvidas e mais fracas só podem ser realizadas se entrarem nos planos de conquista dos imperialismos dominantes ".
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Em que é que a Alemanha e o Japão foram privados de capacidades imperialistas? A força de uma potência capitalista – em fase imperialista – está na medida das suas capacidades económicas, industriais, comerciais, financeiras e por último militares. A Rússia soviética ensinou estas coisas à Alemanha hitleriana. Os Estados Unidos de Roosevelt ensinaram estas coisas ao Japão de Hirohito. A China produz e consome metade dos produtos industriais do mundo, cimento, energia, cauchu, produtos químicos, aço, cobre, alumínio, etc. Assim, a China, em 2016, comprou sózinha metade dos robots industriais colocados no mercado pela Alemanha, o Japão e a Coreia. A produção industrial chinesa representa 55% do PIB desse país e ocupa 45% do total da sua mão-de-obra assalariada, ou seja, 350 milhões de proletários, aos quais 350 milhões de outros esperam juntar-se, ou seja, duas vezes a população total dos Estados Unidos. Nos Estados Unidos 70% do PIB diz respeito ao consumo das mercadorias, que este país não produz, e menos de 12% do PIB nacional provém da indústria, nomeadamente da indústria de armamento subvencionada e parasitária. Menos de 12% do proletariado americano trabalha na indústria produtiva, felizmente a sua taxa de produtividade é muito elevada. Esta potência capitalista, no seu estádio imperialista declinante não fará face por muito tempo à subida em potência da sua substituição não nacional, mas internacional, e que mesmo que ela não se habitue a pôr-se militarmente à frente, será forçada a fazê-lo. NDLR.
Paul Mattick repete e reafirma obstinadamente a sua incompreensão com o conceito do imperialismo como fase final de todo o modo de producção. Ele escreve: "A erosão do imperialismo ocidental, diz-se, cria um vácuo de poder em regiões anteriormente subjugadas. (...) As Revoluções nacionais em regiões atrasadas do ponto de vista capitalista são tentativas de modernização através da industrialização, seja por exprimirem simplesmente uma oposição ao capital estrangeiro, seja porque elas tendem a alterar as relações sociais existentes. Mas enquanto o nacionalismo do século XIX era um instrumento de desenvolvimento do capital privado, o nacionalismo do século XX é essencialmente um instrumento para o desenvolvimento do capitalismo de estado. (...) O nacionalismo actual traz novos solavancos a um mercado mundial (...) ".
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As
revoluções nacionalistas, nas regiões economicamente atrasadas, nunca exprimiram
oposição ao capital e não mudaram as relações sociais capitalistas que muitas
vezes fecharam. O nacionalismo já não é o modo específico e universal das
relações de producção capitalistas, mas uma modalidade de desenvolvimento ideologicamente
orientada, no sentido do último século, e num outro sentido, em relação ao
século presente, no grau de imaginação
fértil dos socialistas e dos esquerdistas. O nacionalismo foi e será sempre a
ideologia da classe burguesa ascendente, qualquer que seja o país ou o
continente em que se desenvolve. No princípio, o nacionalismo opôs-se ao
mercado livre mundial, pois após uma fase da capitalização nacional lançou a
sua integração multinacional no grande mercado mundial imperialista. Foi
verdade na Europa, berço do capitalismo, na América e na Oceania para onde foi transplantado, e na
Ásia onde foi inseminado, e em África onde foi imposto. NDLR
Paul Mattick seguidamente escreve: "Por detrás dos movimentos nacionalistas, é claro, há a pressão da
pobreza, que se está a tornar cada vez mais explosiva à medida que aumenta a
diferença entre nações pobres e ricas. A divisão internacional do trabalho,
determinada pela formação do capital privado, implica a exploração dos países mais pobres pelos mais ricos e a
concentração de capital nos países capitalistas avançados. O novo nacionalismo opõe-se
à concentração de capital determinada pelo mercado, de modo a garantir a
industrialização dos países subdesenvolvidos. (...) Hoje, empresa privada e
controlo governamental operam simultaneamente em cada país capitalista e em
todo o mundo. De modo a que a
subordinação da concorrência privada à concorrência nacional é implacável
(...) ".
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A coberto de teorizar
o princípio do imperialismo e de o opor às aspirações nacionais das regiões pobres
face às regiões ricas, Mattick opõe o capitalismo nacional privado ao
capitalismo nacional público. O Estado capitalista e a sociedade seriam uma
entidade independente da classe capitalista dominante . Para dizê-lo de outra
maneira, haveria de um lado a classe capitalista e do outro, o Estado
capitalista, dirigido por burocratas e caciques estaduais independentes, com a sua própria agenda de
desenvolvimento. Como escreveu Mattick, o Estado capitalista é um organismo
saído do desenvolvimento do modo de producção – é uma componente das relações
sociais de producção capitalista– e nisso o Estado burguês não pode senão responder
às necessidades de desenvolvimento deste modo de producção. Não pode aí haver
subordinação da concorrência privada à concorrência nacional, completando-se as
duas. Este Estado só fica preso no seu
funcionamento quando o modo de producção fica emaranhado nas suas contradições e
bloqueia-se a si próprio. Diz-se então que as condições objectivas da revolução
estão reunidas. NDLR
Mattick acrescenta: "Na raiz das aspirações nacionais e das rivalidades imperialistas está a real necessidade de uma organização global de producção e distribuição, como o geólogo KF Mather assinalou", a Terra é feita muito mais para ser ocupada por homens organizados à escala mundial, que possam praticar ao máximo através do mundo inteiro a livre troca de matérias-primas e de produtos acabados, do que para homens que persistem em criar barreiras entre regiões, mesmo que sejam regiões grandes ou continentes inteiros. Em segundo lugar, porque a producção social não pode ser totalmente desenvolvida e os homens serem libertados da carência e da miséria senão através da cooperação internacional (...) ".
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Segundo
Mattick, “se não for utilizada para fins humanos, uma luta entre nações
produzirá (…) a eliminação da competição capitalista” Tremei capitalistas e
proletários do mundo inteiro, vós deveis aceitar a cooperação industrial, se
não a competição capitalista desaparecerá.
Mas, pode-se dizer, é exactamente o que desejam os grandes monopólios
internacionais que renegaram a sua nacionalidade e que fazem tudo para absorver
os seus adversários e eliminar os seus concorrentes, onde quer que eles se
encontrem, salvo se as leis da economia política capitalista tornarem a coisa
impossível, e que mesmo que este objectivo seja atingido não resolverá a
contradição fundamental do capital. Sob o modo de producção capitalista, não
existe tal contradição que oponha as aspirações nacionais às rivalidades
imperialistas. Porquê? Porque o imperialismo é o resultado do desenvolvimento
capitalista nacional. O imperialismo é o filho do capitalismo nacional e como
pai – que ele mata alcançada a maturidade – o imperialismo tem a vocação de se
expandir e de reinar sobre a humanidade capitalista após o parricídio do nacionalismo
demasiado restrito para lhe permitir reproduzir-se. Retomemos: o capital
mundializado encontra-se exactamente na
estrutura da governação nacional e procura quebrar esta armadura a fim de lhe
dar as condições para a sua reprodução. Ora, esta governação nacional serve os
interesses da pequena burguesia, tão numerosa na sociedade imperialista
avançada (nomeadamente no sector terciário). Esta governação nacional fez assim
o jogo do pequeno capital nacional ainda não monopolista, mas que aspira a
sê-lo , ao abrigo das fronteiras nacionais
que se tornam caducas para o grande capital. Uma guerra de classe
explode então no seio da burguesia (pequena-média-grande) para o controlo do
aparelho de estado nacional; o grande capital para o fazer explodir; o pequeno
capital e a pequena burguesia para o preservar e reforçar. Inevitavelmente é o
grande capital que vencerá, mas esta guerra de classe reaccionária, entre facções
burguesas, não diz respeito à classe operária revolucionária que dela toma nota, nada mais.” NDLR.
Prossigamos com Mattick "Enquanto uma atitude positiva em relação ao nacionalismo trai uma falta de interesse para o socialismo, a posição socialista sobre o nacionalismo é claramente ineficaz, assim como os países que oprimem os outros. Uma posição anti-nacionalista intransigente parece, pelo menos indirectamente, apoiar o imperialismo (...) os socialistas não têm o papel de fomentar as lutas pela autonomia nacional; como o demonstraram os movimentos de "libertação" que surgiram após a Segunda Guerra Mundial. (...) o nacionalismo não poderia ser usado para fins socialistas e não era uma boa maneira estratégica de acelerar o fim do capitalismo ".
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“Paul Mattick pretende que uma luta de classe contra o
capitalismo nacional constituiria um apoio ao imperialismo; todavia, não é
preciso conduzir a luta anti-capitalista para conduzir a guerra
anti-imperialista? O imperialismo não é uma potência económica e política
estrangeira. O imperialismo é a última etapa do desenvolvimento do modo de
producção capitalista, como o escrevemos mais atrás. Noutros termos, cada
Estado capitalista burguês, e cada classe capitalista nacional que controla
esse Estado estão votados a evoluir até se integrarem numa aliança imperialista
e a prosseguir assim a sua luta contra os outros Estados e contra as outras
classes burguesas – mas sobretudo contra a classe proletária mundial de onde
todos tiram a sua mais-valia. Esta integração internacionalista faz-se primeiro
no plano económico pela via do comércio, dos investimentos de capitais (IDEF)
das transacções bolsistas, as trocas de moeda, das tomadas de controlo de
empresas, dos empréstimos, do crédito, da dívida, etc.. O proletariado revolucionário
não tem nenhum controlo sobre esta guerra concorrencial entre alianças
capitalistas que se afrontam por meio da concorrência, e não pode senão sofrer
as consequências. NDLR
Paul Mattick escreve então: "Pelo contrário, o nacionalismo destruiu o socialismo, usando-o para fins nacionalistas. Não é papel do socialismo apoiar o nacionalismo, mesmo quando combate o imperialismo. Combater contra o imperialismo sem simultaneamente enfraquecer o nacionalismo não passa de combater alguns imperialistas para apoiar outros, porque o nacionalismo é necessariamente imperialista ou ilusório. A autodeterminação nacional não emancipou as classes trabalhadoras dos países avançados. Agora não o fará na Ásia e em África. As revoluções nacionais, por exemplo, na Argélia, trarão pouco para as classes mais pobres, além do direito de compartilhar preconceitos nacionais de maneira mais equitativa. Sem dúvida, é algo para os argelinos, que sofreram um sistema colonial particularmente arrogante. Podem-se prever os possíveis resultados da independência da Argélia examinando o caso da Tunísia e Marrocos, onde as relações sociais existentes não mudaram e onde as condições de existência das classes exploradas não foram acentuadamente melhoradas ".
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Desta vez, estamos totalmente de acordo com Paul Mattick. NDLR
Capítulo
5
Marxismo,
nacionalismo e lutas nacionais hoje
David Mcnally
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Nesta secção do volume, reproduzimos o texto de David
Mcnally, um militante canadiano de esquerda que apresenta no “Marxismo,
nacionalismo e lutas nacionais hoje” uma excelente síntese da ideologia
nacionalista esquerdista. Reproduzimos o texto tal como foi publicado em 1996 como documento de discussão
para O Novo Grupo Socialista, traduzido em francês pelo Grupo A Esquerda. Ao
longo do texto, apresentamos as nossas reflexões em itálico, seguidas das
letras NDLR.
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Primeira Parte: o desafio do nacionalismo ao marxismo
1. O nacionalismo
domina a política mundial – e fá-lo com uma facilidade surpreendente. Abri não
importa que jornal, escutai as discussões no trabalho ou na escola, guardai ou
escutai não importa que emissão de notícias, examinai os cursos que se dão nas
universidades, e vereis que a divisão da população global em entidades nomeadas
nações é de maneira esmagadora tomada
em consideração. No momento em que escrevo estas linhas, os Jogos Olímpicos de
verão desenrolam-se em Atlanta. Todos os atletas destes Jogos são organizados
pelos Estados nações, representam o seu Estado, trazem a sua cor e a sua
bandeira. As medalhas ganhas por estes atletas pertencem ao seu país, são os
garantes da honra do seu país e do seu orgulho. Todos os dias, um quadro de
medalhas é aberto para cada nação e é difundido aos milhões de pessoas que
seguem este acontecimento.
Para a vasta
maioria das pessoas, não há nisso nada de bizarro, de insidioso ou de perigoso.
Elas dão por adquirido que são membros de um Estado nação, sentem-se orgulhosas
desta realização, sofrem quando a nação fica embaraçada ou humilhada (lembramo-nos
do caso Ben Johnson?). Raramente se diz, se é que isso tenha tido lugar, que o
sistema dos Estados nações é uma criação recente na história humana, que a
maior parte das sociedades humanas nunca teve um conceito de nação qualquer que ele seja, e
que a expansão do sistema dos Estados nações corresponde ao desenvolvimento
internacional do capitalismo. De mais a mais,muito raramente se acha no debate político o facto de que o sistema do
Estado–nação é a forma política que regula, controla e disciplina as pessoas de
maneira a facilitar a sua exploração pelo capital. A maior parte das vezes
vivemos num universo mental onde as discussões se conduzem em termos nacionais
– automóveis japoneses, aço canadiano, filmes americanos, atletas russos,
música jamaicana e assim sucessivamente – e fazem parte do senso comum que organiza
a nossa compreensão política e cultural do mundo. Mesmo a ascensão dos
nacionalismos étnicos virulentos – como os da ex-Jugoslávia ou os que matam
centenas de milhões de pessoas no Burundi ou no Ruanda actualmente, raramente
nos conduzem a questionar a ideia da nação ou o nosso próprio nacionalismo. De
modo esmagador examina-se o nacionalismo dos outros, que é visto como um problema,
e quase nunca o nosso.
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Que há de extraordinário no facto de que, sob o modo de
producção capitalista, a ideologia burguesa seja dominante e cubra com a sua
chapa de chumbo o conjunto da sociedade e das classes sociais, de que controla
a quase totalidade das instituições e dos órgãos da comunicação social? Todavia
contestamos a afirmação do professor Macnelly no sentido de que o nacionalismo
domina a política mundial. O nacionalismo estiola-se docemente sob os assaltos
das actividades económicas internacionais do capital mundial. NDLR.
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2.
Por todas estas razões, o nacionalismo representa sem dúvida o maior desafio
colocado ao marxismo. “Os trabalhadores não têm pátria”,
diziam Marx e Engels no Manifesto Comunista. Neste espírito,
o marxismo lançou o primeiro movimento político que ensinou nos termos internacionais
que procurava a emancipação da humanidade à escala mundial e afirmava que a
eliminação do Estado nacional era o seu objectivo mais elevado. A Associação
Internacional dos Trabalhadores (mais conhecida como a Primeira Internacional),
lançada em 1864, representava a forma de organização que quadrava com esta
concepção de um movimento político internacional da classe operária. Mas
durante quase todo o período de 150 anos depois da publicação do Manifesto Comunista houve um período
durante o qual os movimentos da classe operária tenderam (fora do interlúdio de
1917-23 ou perto disso) a tornar-se de maneira cada vez mais esmagadora dominada
pelo nacionalismo. Os movimentos operários são quase todos organizações
inteiramente nacionais. Pensam organizar os trabalhadores de um dado país,
tendo poucas preocupações com os seus irmãos e irmãs de outros lados. Mais
ainda: é que são dominados pelo nacionalismo: tendem a sustentar os controlos
das importações (e as outras formas de proteccionismo nacional) a proteger os nossos
empregos e o nosso modo de vida. Não
será exagerado dizer que o nacionalismo de esquerda é a ideologia dominante dos
movimentos operários através do mundo.
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“ Sendo verídicas estas constatações, que
pensas delas? É preciso concluir que, muito
embora a classe operária esteja
desorientada – sem ideologia proletária revolucionária dominante nas suas
fileiras – sem organização proletária
influente, deverá baixar os braços e juntar-se ao nacionalismo burguês ,
às lutas de libertação nacional burguesa
para fazer sair a sociedade do
feudalismo e a fazer entrar no capitalismo e cumprir as duas revoluções
sucessivas como Lenine o propunha? Decerto que não, porque as duas revoluções
em cascata não são realizáveis, como o provam as revoluções russa, chinesa,
cubana e as outras. É preciso saber que estas análises pseudo-científicas da
economia política capitalista são falsas mesmo se os sindicatos, as
organizações de esquerda burguesa e os intelectuais esquerdistas as propaguem.
Cada revolucionário proletário deve
dedicar-se à tarefa e, em lugar de procurar encontrar entre esta
amálgama confusa esquerdizante a explicação mais “marxista “ –
frequentemente a mais dogmática –, deve
fazer um trabalho de pesquisa, de análise da realidade concreta, para difundir
os resultados e debater estas ideias com toda a gente.
Em resumo: recomendamos que os proletários
revolucionários se afastem de todo o partido político, de toda a organização de
esquerda dogmática e sectária, herdeira da II, da III e da IV Internacionais. É
preciso quebrar o cordão sanitário anti-proletário que a pequena burguesia
sectária, sindicalista, as ONGs subvencionadas, a sociedade civil altermundialista , ecosocialista, esquerdista
, oportunista e reformista ergueram à volta dos proletários”. NDLR.
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Se bem que a
influência do nacionalismo possa ser quebrada, as perspetivas são
verdadeiramente fracas para as políticas do internacionalismo socialista. É por
isso que a discussão sobre a questão nacional reaparece
de maneira recorrente no movimento socialista.
No que se segue, tento passar em revista, os elementos principais dos
debates marxistas sobre o nacionalismo, para examinar as suas forças e as suas
fraquezas e para aplicar algumas lições que se podem tirar deste estudo sobre
as questões nacionais no Canadá hoje em dia.
Segunda parte: a questão nacional de
Marx a Trotski
3. A persistência do nacionalismo e da realidade das lutas nacionais forçaram os socialistas a voltar regularmente a esse assunto. Mas sabe-se que generalidades não funcionam neste domínio. A grande maioria dos socialistas adaptaram-se ou acomodaram-se ao nacionalismo; eles viam o seu projecto como uma maneira mais humana e esclarecida de liderar um estado nacional (e não a sua eliminação no curso de uma luta internacional contra a "miséria do mundo"). Uma pequena minoria de socialistas simplesmente tentou ignorar a realidade das lutas nacionais, constantemente pedindo a unidade internacional dos trabalhadores do mundo que não mobilizavam ninguém e que ignoravam questões nacionais reais e concretas. Existem algumas situações importantes em que os socialistas têm lutado para encontrar um caminho internacionalista vinculado às realidades da opressão nacional. A atitude de Marx em relação à Irlanda na década de 1860 e a abordagem de Lenine aos povos oprimidos da Rússia czarista são consistentes com essa visão. Antes de examinar esses exemplos, no entanto, quero me deter por um momento nas duas tendências a que me referi.
A luta do proletariado revolucionário contra o modo de producção capitalista não é uma cruzada, “ uma maneira mais humana e esclarecida de dirigir o Estado–nacional” burguês. É uma guerra que terá de ser levada até ao fim, onde o proletariado ou desaparecerá sob as bombas termonucleares do capital decadente, que não terá de fazer desse capital um capital vivo não valorizável; ou o proletariado substituirá o capital nacional e internacional para dar capacidades de criar um novo modo de producção revolucionário. Contrariamente ao que pretendiam os bolcheviques, não há nenhuma alternativa reformista estadista socialista, nem de coexistência pacífica entre o modo de producção capitalista e o modo de producção proletário comunista. NDLR
4. O movimento socialista mundial
adquiriu um carácter de massas pela primeira vez na Alemanha no final da década
de 1880. Naquela época, a Alemanha era uma monarquia com um parlamento eleito
por uma pequena minoria da população adulta. Com o passar dos anos, mais e mais
trabalhadores tiveram o direito de votar e o partido da classe trabalhadora foi
organizado, o Partido Social Democrata (mais conhecido por suas iniciais
alemãs, o SPD), que se tornou uma força política de primeira importância. O SPD
rapidamente se identificou com a "tomada do controlo" do estado alemão
e não com o seu derrube. Isso levou os líderes do SPD a tornarem-se cada vez
mais influenciados pela ideia de interesse nacional. Gradualmente, os líderes
começaram a defender a idéia de um colonialismo alemão
"progressista". Eles alegaram que um governo do SPD não daria
liberdade às colónias alemãs; simplesmente os trataria melhor. A identificação
com o estado nacional foi tão poderosa, tão arreigada que a maioria da
liderança do SPD veio apoiar o governo alemão quando ele entrou na Primeira
Guerra Mundial. A maioria dos partidos da II Internacional (fundada em 1889)
seguiu rapidamente esse caminho.
5. A marxista germano-polaca Rosa
Luxemburgo e o marxista russo V.I. Lenine estiveram na vanguarda da oposição
socialista à guerra. Ambos denunciaram a guerra como produto do imperialismo e
como consequência da competição entre as principais potências capitalistas para
dividir o mundo. Luxemburgo e Lenine desenvolveram as políticas da oposição
socialista internacional à guerra e argumentaram que os trabalhadores deveriam recusar-se
a apoiar as"suas" classes dominantes nacionais e que deveriam
trabalhar para transformar as crises sociais associadas à guerra em guerra de classe
dos trabalhadores contra o sistema capitalista.
6. Luxemburgo e Lenine deram uma contribuição
essencial ao movimento internacionalista e anti-imperialista dentro do
movimento socialista. Apesar de suas convergências significativas nessa área,
divergiram bastante sobre a questão da atitude socialista em relação às lutas
nacionais. Luxemburgo argumentou que na era do imperialismo e do capitalismo
totalmente internacionalizado, as lutas nacionais estavam desactualizadas. A
economia mundial estava tão desenvolvida que a idéia de um Estado-nação
economicamente independente tornou-se ridícula. "Em meados do século XIX", disse ela, "as guerras
nacionais irromperam velhos impérios e criaram novos estados burgueses
democráticos, e isso foi progressista. Mas desta vez acabou. Na era do
capitalismo internacional, é reaccionário apoiar a criação de novos
estados-nação. A tarefa agora era mobilizar a classe trabalhadora internacional
contra o capitalismo mundial”. Em tempos de capitalismo desenfreado, não
pode mais haver guerras nacionais, disse ela. As lutas nacionais "só podem
servir como meio de desmoralização", de engano das massas. A posição de
Rosa Luxemburgo tinha um ponto forte: o de um internacionalismo de princípios,
sua vigorosa oposição ao nacionalismo. Mas, segundo Lenine, ela tinha duas
fraquezas importantes. Em primeiro lugar,
negligenciava o caráter hierárquico das relações entre as nações - de facto, algumas são dominantes e outras
são oprimidas - e a sua posição pode levar os socialistas a uma posição de
indiferença ou neutralidade nas lutas entre nações opressoras e nações
oprimidas.
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“Detenhamo-nos de novo
nestes conceitos de “nações dominantes,
opressoras e exploradoras” e de “nações
dominadas, oprimidas e exploradas “, hierarquicamente diferentes, afirma o
professor Macnelly. Convenhamos antes de tudo que uma nação não é uma classe
social, mas antes um agrupamento de classes sociais. Numa nação, as pessoas têm
uma ocupação – um ofício – condições de existência – um vende a sua força de
trabalho, a sua propriedade ou quase – a outra compra meios de producção e
força de trabalho para extrair a mais-valia, fonte da sua riqueza, do seu
capital em definitivo. Mercadorias que outros enfim vendem e revendem aos
proletários que aí delapidam os seus salários comidos pela inflacção. Entre
estas diferentes classes sociais não há nada de comum, nada de mentalidade
comum: o proletário tem necessidade da paz para se reproduzir, o capitalista
vem à guerra para assegurar a reprodução do seu capital. Por vezes, até a
língua é diferente de uma classe social para outra, o que em todo o caso não
cria uma opressão linguística de classe. Se a classe dominante capitalista
francesa e o seu Estado oprimem as classes camponesas e proletárias na Costa do
Marfim, não é a classe operária francesa que se aproveita desta exploração de
classe e não é a classe capitalista marfinense que é explorada e oprimida pelos
seus mentores franceses que, ao contrário, lhe atribui prebendas, contratos de
subempreitada e participação de acções das multinacionais do capital, que
erradamente se qualificou de multinacionais francesas, belgas ou americanas. Em
resumo: a nação francesa não explora a nação marfinense. Incidentalmente, após
algum tempo os milionários franceses e marfinenses cooptam-se no seio de
conselhos de administração na Costa do Marfim, em França e algures no mundo.
Ultimamente, anunciou-se que um primeiro milionário vietnamita comprou acções
de uma empresa química multinacional, a mesma que produziu o agente laranja,
cujos efeitos fazem ainda morrer as crianças vietnamitas, cujos pais se
esfalfam nestas fábricas exploradoras de mão de obra da morte propriedade de um
milionário vietnamita. Não há nações oprimidas e exploradas, tal
como não há nações opressoras-exploradoras, não há senão classes sociais
oprimidas e classes sociais opressoras, vivendo para as primeiras sob o tecto
opressivo dos governos nacionais e dos seus Estados, que cada clã
nacionalista burguês quererá controlar para seu benefício. Depois de um século,
depois das vitórias bolcheviques e maoistas, os comunistas e esquerdistas do
mundo inteiro propuseram-se substituir-se aos burgueses nacionalistas apodrecidos e
mutantes, a fim de realizar as revoluções democráticas burguesas, esperando
prosseguir até à revolução socialista em marcha para o modo de producção
comunista. Todas foram derrotadas não pela falta de traidores revisionistas e
oportunistas reformistas, mas porque as condições económicas objectivas, o
desenvolvimento das forças produtivas nesses países atrasados, de um ponto de
vista industrial exigem o desenvolvimento prévio do capitalismo. Os chefes
comunistas têm-se portanto colocado na posição de quadros do capitalismo de
Estado dito em marcha para o modo de producção proletário comunista via a
economia de mercado e o modo de producção socialista que nunca foi outra coisa
senão a via estática totalitária para o capitalismo, e depois para o
imperialismo, como o demonstraram a história da URSS e da China comunista. Na
história nunca houve luta de libertação nacional proletária, nunca houve senão
lutas de uma burguesia nacional ou de uma facção desta, servindo-se das
classes sociais camponesas e proletárias nacionais como carne para canhão para
a defesa das suas causas e das suas ambições assim como o demonstram todas as
guerras de libertação nacional burguesas onde o proletariado se encontra hoje,
após múltiplas guerrilhas e guerras para se libertar dos seus novos carrascos
nacionais. Sem libertação económica
global, não há libertação política e ideológica nacional. Pior: na época do
imperialismo moderno mundializado é impossível para uma secção nacional do
proletariado internacional conduzir uma revolução emancipadora num só, ou em
dois ou três países. A revolução proletária do futuro será mundial ou não será
revolução. NDLR.
Em segundo
lugar, a posição de
Rosa Luxemburgo substima a importância para os socialistas da defesa dos povos
oprimidos até à sua auto determinação como meio de desafiar o chauvinismo
nacional que envolve os trabalhadores e as nações dominantes. Segundo Lenine, o
erro de Luxemburgo, noutros termos, provêm do facto de que ela considera as
lutas nacionais do ponto de vista geralmente abstracto da economia mundial.Ao
fazer isso, perde de vista as dinâmicas políticas concretas, a maneira como os
conflitos nacionais estruturam o terreno da luta política e a consciência de classe
da classe operária. Se os marxistas devem ser realmente parte componente dos
debates políticos na sociedade, afirma Lenine, uma posição abstracta e
intemporal desta espécie “ todas as lutas
nacionais estão ultrapassadas”, não
servem para nada. Ao invés, os
socialistas revolucionários devem tentar compreender como é que as lutas dadas afectam o terreno geral da luta
política na sociedade e constroem a
partir daí o seu ponto de partida Lenine apresentou a tese que desenvoveu
neste domínio como uma elaboração da posição que Marx tinha tomado na luta pela
independencia irlandesa. De facto, a posição de Lenine era muito mais original
do que isso. Ele desenvolveu uma aproximação completamente nova de todo o
problema das lutas nacionais. Mas comecemos por examinar a posição de Marx
sobre a Irlanda e veremos o que fez Lenine.
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O professor Mcnally
penetra aqui no coração da teoria leninista. Mcnally explica que Lenine efectou
algumas piruetas e convida-nos a seguir o
seu caminho: 1) constata que o proletariado é influenciado pela ideologia
burguesa hegemónica, pela ideologia nacionalista chauvinista, nomeadamente. Com
efeito, numa sociedade de classes, a ideologia da classe dominante é
hegemónica, já o escrevemos. 2) Lenine, enquanto táctico pragmático, afirma que
os socialistas devem tentar compreender como as lutas nacionais dadas afectam o
terreno geral da luta política (…) é
preciso construir um ponto de começo a partir daí, sugere Lenine. Tereis notado
que Lenine não propõe ainda que os comunistas se apoderem da direcção das lutas
nacionalistas burguesas, mas simplesmente “que
eles construam um ponto de partida!?...” Sabe-se hoje que este ponto de
partida consistirá, para os partidos comunistas da III Internacional,
nomeadamente, em se substituir aos burgueses nacionalistas hesitantes ou então
em pôr-se a reboque das burguesias nacionais, a fim de assegurar a vitória das
revoluções democráticas capitalistas. 3) Lenine tenta, em seguida, encerrar o
círculo de Rosa Luxemburgo e dos internacionalistas revolucionários, chamando
Marx em socorro. Voltaremos a este ponto. NDLR.
----- x -----
7)
Marx e Engels tinham em primeiro lugar dado pouca importância à luta da
independência irlandesa face à Grã-Bretanha. Em 1848, por exemplo, haviam
afirmado que o movimento operário de massa britânico deste período (conhecido
como o (Chartismo) devia preocupar-se
com este problema. Viam a questão irlandesa como um aspecto verdadeiramente
menor da luta da classe operária de Inglatera e muitas vezes acusaram os nacionalistas
irlandeses de não se aliarem ao Chartismo
.Depois do declinio do Chartismo, como o sentimento
anti-irlandês comecasse a desempenhar um papel mais importante na política
britânica e logo que o movimento Feniano pela indepedência da Irlanda se desenvolveu
de novo nos anos 60, a posição de Marx mudou de novo. A tese de Marx exprimia-se
como se segue: em primeiro lugar,
afirmou que sendo dado que o sentimento anti-irlandês conduziria os
trabalhadores irlandeses a identificarem-se com as classes dirigentes, esta
realidade era o obstáculo mais importante a uma política de independência da
classe operária.
“O trabalhador
inglês ordinário odiava o trabalhador irlandês como um concorrente que baixasse
o seu nível de vida. Nestas relações com os trabalhadores irlandeses o inglês
via-se ele próprio como membro da nação dominante e posicionava-se ele mesmo
como instrumento dos aristocratas e dos capitalistas do seu país contra a Irlanda,reforçando
assim o seu domínio sobre ele. Este antagonismo é o segredo da impotência da
classe operária inglesa.” ( Marx e Engels, a Irlanda e a questão irlandesa).
Em segundo lugar, Marx defende agora que a luta
nacional na Irlanda era a chave que iluminaria a revolução operária na
Inglaterra. Com isso, Marx reconhecia que havia uma alteração da sua posição
anterior. “Durante muito tempo, acreditei
que seria possível substituir o regime irlandês graças à subida da classe
operária inglesa. Um estudo mais aprofundado convenceu-me do contrário: a
classe operária inglesa não fará nada de decisivo aqui na Inglaterra, enquanto
não romper de maneira absolutamente nítida, na sua política para a Irlanda,com
a política das classes dominantes; enquanto não fizer não somente a causa comum com os irlandeses,
mas também não tomar a iniciativa da dissolução da união forçada de 1801 e da
sua substituição por uma confederação igual e livre.” (Marx e Engels, a Irlanda
e a questão irlandesa, página 294).
No extracto precedente,
Marx comete um erro perfeitamente compreensível neste começo do movimento
operário. Marx cria que o proletariado devia organizar-se num vasto partido de
massa e apresentar uma plataforma eleitoral às eleições burguesas. Um programa
de classe compreendendo proposições como
“a substituição da união forçada por uma confederação igual e livre. Mais de um
século de história eleitoralista dos partidos operários no mundo ensina-nos
que, de um ponto de vista revolucionário não há nada a esperar destes partidos
políticos eleitoralistas de massa, nem da participação proletária nas eleições
burguesas. Sabemos agora que o movimento insurreccional e revolucionário espontâneo
se desenvolve de outra maneira, nomeadamente, reforçando o desprezo e a
rejeição completa que de qualquer maneira o proletariado desenvolverá
instintivamente sem desprezo pelos candidatos da “esquerda” face ao estado burguês e à sua governação,
face às mascaradas eleitorais e face ao nacionalismo chauvinista. Nisso podemos
afirmar que a classe operária é a
vanguarda da vanguarda”. NDLR.
----- x -----
A
experiência de repensar a questão irlandesa foi de uma importância universal
para Marx e Engels. Ela conduziu Marx, por exemplo, a formular esta magnífica
reflexão: “Toda a nação que oprime uma
outra forja as suas próprias cadeias”. A bem dizer , o que Lenine fez foi retomar
esta intuição e aplicá-la sistematicamente.
O
imperio dos czares da Rússia englobava dezenas e dezenas de comunidades
internacionais oprimidas. Tentando organizar o movimento da classe operária no
império czarista, os marxistas russos estavam inevitavelmente confrontados com
as aspirações nacionais. Muitos dos marxistas russos recusaram-se a isso e
sugeriram que as questões nacionais não teriam lugar num movimento marxista. Os
primeiros escritos de Lenine não davam atenção a estas questões. Mas com o
tempo a questão nacional acabou por desempenhar um papel cada vez mais
importante no seu pensamento. Com a Primeira Guerra Mundial, desenvolveu uma
atitude muito específica em relação a esta questão. As concepções de Lenine
tomaram os seguintes desenvolvimentos…
----- x -----
Por
que é que Lenine se viu constrangido a desenvolver uma política nacionalista no
decurso da revolução Russa? Porque os bolcheviques não dirigiram uma revolução
proletária anti-capitalista, estando o capitalismo balbuciante e o proletariado
pouco desenvolvido na sociedade russa
semifeudal onde as massas camponesas formadas maioritariamente de mujiques quase escravos, submetidos às relações de
producção feudais, onde os elementos constituintes de uma nação estavam em
desenvolvimento. Não faltava senão o Estado-nação capitalista que Estaline
criou posteriormente. Para conduzir uma
revolução proletária é preciso um vasto proletariado educado, experimentado,
empobrecido, consciente internacionalmente e conectado com as outras facções do
proletariado mundial. Para conseguir a tal revolução democrática capitalista e
abolir o modo de producção feudal, Lenine e os bolcheviques tiveram de
mobilizar e enquadrar as massas camponesas atrasadas, analfabetas, numa vasta insurreição camponesa para “dar a terra a quem
a trabalha” (o que não durará muito tempo), no quadro de comunidades locais
ou regionais, e assim os leninistas consolidaram as nações burguesas de
todas as Rússias, ao mesmo tempo que construíram um capitalismo de Estado
vigoroso, assaz potente para enfrentar o capitalismo alemão. Não há nada de
revolucionário proletário em tudo isto. E a razão pela qual, na morte de
Estaline, Kruchov não teve dificuldade em consolidar o império nacional russo
sob o conjunto nacional soviético, sob o qual ainda hoje voga Vladimir
Putin. NDLR
----- x -----
Em primeiro lugar, a ordem do mundo imperialista estabelece
uma hierarquia entre as nações o que produz inevitavelmente revoltas
nacionalistas. Em segundo lugar, o
problema principal para os marxistas é como encontrar uma base
internacionalista num mundo dominado pelos conflitos nacionais. Em terceiro lugar, o problema
estratégico central é o de tentar levar
trabalhadores com sentimentos nacionalistas para sentimentos
internacionalistas. Em quarto lugar o maior obstáculo para fazer isso é o
nacionalismo dos trabalhadiores das nações dominantes ( como afirmava Marx a
respeito dos os trabalhadores ingleses no caso da Irlanda) o que os conduziu a
identificar-se com a sua classe dirigente, o que rerforçava o nacionalismo dos
trabalhadores das nações oprimidas (porque estes últimos não viam que os
trabalhadores da nação dominante simpatizassem de todo com as suas aspirações de
se libertarem da sua opressão nacional).
Em consequência, segundo Lenine, os
marxistas devem sustentar o direito das nações oprimidas ao direito da auto-determinação,
inclusive o direito de formar um Estado independente.
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Por que é que o facto
do capitalismo se desenvolver a diferentes velocidades nos diferentes países
produzirá revoltas nacionais se não é porque as burguesias desses diversos
países são forçadas a afrontar-se pelos mercados? Que se deve pensar destas
observações de Lenine e da sua conclusão sob o direito das nações à auto-determinação,
ou seja, sobre o direito das nações a disporem de si próprias? Em 1917, e nós
acrescentamos em 1949, no momento da libertação burguesa da China pela
Revolucão da democracia nova, as condições objectivas e subjectivas da revolução proletária internacionalista não
estavam ainda reunidas e desta maneira a revolução proletária era impossível. Um modo de producção não pode
ser substituído, enquanto não tiver desenvolvido todas as forças
produtivas que é capaz de conter
e reproduzir o que estava longe de ser o caso para a indústria nascente na
Rússia czarista, e da mesma maneira para
a China Maoísta em 1949. É esta triste realidade que impulsionou as conclusões
oportunistas de Lenine, e depois de Mao, para justificar que os comunistas
dirigem estas revoluções democráticas nacionalistas burguesas. NDLR
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O
ponto central da tese de Lenine é a sua insistência sobre a política contrária
de Rosa Luxemburgo, que se apoiva sobre uma tese fundamentalmente económica.
Lenine insiste que o nacionalismo representa uma divisão política importante no
interior da classe operária. A aproximação marxista toma esta visão política
como ponto de partida do esforço para a ultrapassar. Nesta finalidade, a
principal questão não é a da viabilidade económica de um dado Estado- nação,
mas quais as tácticas que serão mais importantes para construir a solidariedade
de classe e o internacionalismo. E a resposta de Lenine é clara: minar o
chauvinidsmo nacional dos trabalhadores da nação dominante, fazendo campanha aberta pelo direito das nações oprimidas a determinar o
seu próprio fututo. Para ganhar os trabalhadores da nação oprimida, uma tal
posição deverá representar o principal golpe desferido sobre as identificações
nacionalistas.
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Este raciocínio do
senhor Mcnalli é o contrário do de uma aproximação materialista dialéctica. As
relações de producção decorrem do desenvolvimento das forças produtivas e dos
outros meios de producção, e não o inverso. O que tornará os proletários
internacionalistas não serão os sermões dos comunistas e de outras esquerdas
oportunistas, mas o próprio desenvolvimento do capitalismo mundializado e
globalizado, que forçará a internacionalização da classe operária, na prática,
seja política ou ideológica o que está hoje em vias de se cumprir. NDLR.
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Lenine tornou muito
claro que isso não significava que os marxistas quisessem ver cada vez mais
Estados nacões independentes. Ao contrário como internacionalista marxista ele
favorecia as federações que conduzissem os trabalhadores numa via política
comum. Mas tais federações deviam ser voluntárias. Não deviam opor-se às
federações políticas forçadas ou coercivas ou opressivas.” Se pedimos a liberdade de secessão para os Mongóis, os Persas,
Egípcios e todas as outras nações oprimidas sem excepção, não é porque nós
favoreçamos a secessão, mas somente porque defendemos a associação voluntária e
diferente de uma associação forçada.”
Sustentar o direito
das nações à auto-determinação tornou-se assim um elemento chave da aproximação
estratégica à construcção da solidariedade internacional dos trabalhadores. Não
para sustentar que este direito significa o alinhamento com o nacionalismo dominante. Isto significa que contentar-se
com um internacionalismo abstracto
conduz a reconhecer a importância da experiência da dominação ou o que Lenine
chamava a psicologia que é tão importante no que concerne à questão nacional.”
( Obras Completas, Volume XIX, página 499).
A
solidariedade internacional necessita, noutros termos, que os trabalhadores das
nações dominantes se tornem nos defensores mais consequentes dos direitos dos
povos oprimidos aos seus estados, à sua autodeterminação ( incluindo, à sua
separação)
----- x -----
Mas de onde provém
esta ideia de que um povo oprimido possa
autodeterminar-se e emancipar-se no seu Estado nacional burguês? O
Estado nacional burguês (capitalista classico ou sovietico) nunca foi o estado
de “todo um povo”, e sobretudo nunca foi do proletariado, mas é sempre o Estado da
classe dominante, que oprime esse proletariado. O Estado é o primeiro
instrumento de alienação da classe oprimida. Esta classe se deseja emancipar-se
deve começar por destruir o Estado
democrático burguês nacional e chauvinista. Assim na União Soviética, após
dezenas de anos de capitalismo de Estado, o nacionalismo, o chauvinismo, a religião
retrógrada e toda uma avalanche de ideias burguesas decadentes eram florescentes e explodiriam em
plena luz do dia no momento da Perestroica - Glasnost. As vozes pias dos
bolcheviques a propósito de abordar a auto-determinação nacional nunca permitiu
a um único povo, ou a uma única minoria étnica deixar as correias do Estado
soviético. NDLR
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Ao
mesmo tempo, Lenine defende uma tal oposição de princípio ao nacionalismo
dominante e permite aos trabalhadores das nações oprimidas caminhar do
nacionalismo ao socialismo. Enquanto que os socialistas das nações opresssoras
defendem o direito das oprimidas à auto-determinação, os socialistas das nações
oprimidas “devem conceder uma importância central à unidade e à aliança dos trabalhadores
das nações oprimidas com os das nações opressoras; de outra maneira, as Teses destes
sociais democratas sobre as questões nacionais e coloniais da Internacional
Comunista tornar-se-iam involuntariamente aliadas da sua própria burguesia
nacional.” Na mesma ordem de ideias, afirmam que mesmo concedendo um apoio
às lutas nacionais burguesas contra o nacionalismo, os socialistas insistem
sobre “ a independência de classe do
movimento proletário.”
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Em que
país já se viu os trabalhadores da dita “nação oprimida” caminhar do
nacionalismo para o internacionalismo comunista pela magia espontaneista da
libertação nacional de facto? É precisamente o contrário o que a maior parte
das vezes se observa. Os proletários indiferentes às ideias nacionalistas e
chauvinistas burguesas subjugadas pelas ideias reaccionárias, aprisionadas como
estão nas guerras nacionais fraticidas onde as suas casas são destruídas em
nome da Pátria. Da nossa parte, pensamos que, no momento em que as condições objectivas
da revolução proletária mundial estiverem reunidas, a questão nacionalista
burguesa já não será uma questão importante, sobretudo para o proletariado
internacionalista e isso não será por falta dos comunistas. NDLR
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Esta
análise reforçou consideravelmente a capacidade
dos socialistas se empenharem com seriedade nas lutas nacionais em
curso, sem abandonar os seus objectivos socialistas. Por estas razões, podemos
aprender bastante dos escritos de Marx
sobre a Irlanda e das discussões de Lenine sobre a questão nacional. Ao mesmo
tempo, estes escritos já não oferecem
nada senão balizas. Acima de tudo, defender o direito de separação nada diz
sobre as condições em que se o defende. Mais do que fornecer uma fórmula que
pode simplesmente ser aplicada em todos os contextos, serão um ponto de partida
para guiar a nossa análise. Tentar utilizá-los não é um substituto para uma
análise séria. Antes de discutir como,
devemos utilizar estas análises na nossa aproximação às lutas nacionais no
Estado canadiano, e é importante examinar as jogadas do nacionalismo e do
internacinalismo conforme se exprimem após a morte de Lenine em 1924. O
movimento comunista internacional trepou do internacionalismo ao nacionalismo
sob o impacto da degenescencia da revolução de 1917 na Rússia e da ascensão do
estalinismo.
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A
Revolução de 1917 foi, do princípio ao fim, uma luta da libertação nacional das
burguesias nacionais de todas as Russias
que se precipitaram para aderir ao partido bolchevique enquanto a
aristocracia corrompida migrava em massa para a Europa ou ainda quando ela
erguia as armas brancas para defender o seu modo de producção feudal decadente. O estalinismo não foi o coveiro da revolução proletária russa, pois
esta revolução proletária nunca teve lugar – o pequeno proletário russo, fraco
e inexperiente , era bem incapaz de conduzir uma tal revolução sob o vasto
continente russo atrasado e pouco industrializado e ainda menos de a exportar
para o mundo inteiro. Foi então que Estaline fez a demonstração de que tinha
compreendido a urgência nacional soviética,
que consistia em construir rapidamente um capitalismo nacional e um
Estado industrializado. Rodeada de inimigos como se achava a Rússia
bolchevique, o aventureirismo pseudo- revolucionário de Trotsky, metia medo, e eis
porque este intelectual burguês foi afastado do Poder. Estaline não modificou a
política nacionalista bolchevique, aplicou-a simplesmente e aceleradamente. Apoiando-se sobre este nacionalismo, o “Pai” dos
Povos pôde exigir os maiores sacrifícios estacanovistas aos camponeses russos
transformados em proletários e assegurar assim a industrialização rápida do
país lançando-o para confrontos com o imperialismo alemão. NDLR
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Da
mesma maneira que em 1923, a ideia de um “bolchevismo nacional” foi
desenvolvida pelo Partido Comunista Alemão. Uma vez que Estaline declarou que
era possível construir “ o socialismo num só país”, a porta
ficou aberta para a adopção da ideia de lutas nacionais distintas para o
socialismo, termos de referência dos nacionalismos dominantes. Assim, e por
exemplo, o Partido Comunista do Canadá descobriu rapidamente que o nacionalismo
canadiano era progressista, enquanto que os membros do PC do quebec, que
tentava promover uma compreensão mais deferenciada da luta nacional do Quebec
era regularmente expulso sobre o apodo de nacionalismo
burguês.
Uma
das grandes contribuições históricas de Leão Trotski foi o resistir à noção de
luta pelo socialismo como se fosse uma luta nacional e de se ater firmemente ao
internacionalismo marxista. Com todos os seus terríveis problemas, os grupos
trotsquistas desempenharam um papel importante na salvaguarda destas ideias
vivas à época, onde o nacionalismo dominava
a esquerda. A contribuição específica de Trotsty à época foi a sua
teoria da revolução permanente. Originariamente formulada como a perspectiva
estratégica para a revolução russa do futuro, nos fim dos anos 20, Trostky
reformulou-a como a teoria das relações entre as lutas de classes e as lutas
nacionais na época do imperialismo.
----- x -----
8.
A teoria da revolução permanente foi
uma contribuição brilhante e original para o pensamento marxista. Ao rejeitar a
ideia esquemática, linear e mecânica de que toda a sociedade deveria passar por
certos estádios históricos antes de lutar pelo socialismo, Trotsky defendeu que
a análise concreta das dinâmicas de classe numa dada sociedade deveria fazer-se
no contexto das relações com a economia mundial. Assim, enquanto que a maior
parte dos marxistas russos defendia que a Rússia deveria antes de tudo fazer
uma revolução democrática burguesa contra o czarismo, e então completar um
estádio do desenvolvimento capitalista antes de que a luta pelo poder operário
esteja na ordem do dia, Trotsky defendeu que a burguesia russa estava demasiado
assustada com o poder crescente do jovem proletariado russo para conduzir a
luta contra a monarquia czarista russa. Assustada de que o movimento
revolucinário pela democracia liberal pudesse transformar-se em greves de massa
e fizesse descer o proletariadio insurrecto às ruas, batendo-se pelas suas
reivindicações de classe particulares (o que de facto ocorreu em 1905), a
burguesia russa rapidamente abandonou uma tal luta, sustentava Trotsky. Daí
resultou que a direcção da luta anti-czarista passaria ao proletariado que
imporia a sua marca ao movimento, conduzindo-o em direcção à luta pela
democracia operária. Tomando de empréstimo uma frase de Marx, Trotsky
descreveu-a como a revolução permanente – que começa como um movimento
revolucionário pela democracia liberal e que se transforma numa luta pela democracia socialista e pelo
poder operário.
A
teoria de Trotsky (desenvolvida em 1905-1906) demonstrou uma profunda
antecipação de dinâmica de classe do processo revolucionário de 1917. Sob o
impacto do movimento revolucionário na China nos anos 20, Trotsky rapidamente
estende a teoria da Rússia ao mundo colonial em geral. Nas colónias, sugere ele
que o mesmo modelo deva ser aplicado: uma burguesia temerosa retira-se da luta
anti-colonial, esta última triunfará somente sob a direcção do partido
revolucionário da classe operária.Se bem que haja aí ensinamentos importantes a
extrair desta análise, existe o risco de uma sobregeneralização (sic) De mais a
mais, na ausência de uma classe operária auto-organizada e combativa, como a do
movimento operário russo de 1905 e 1917, por que é que os grupos burgueses e
pequeno burgueses se haveriam de retirar da direcção das lutas nacionais? E,
com efeito, não se retiraram.Em países como a Ìndia, a Argélia, o Paquistão, o
Bangladesh e dezenas de outros, os movimentos nacionalistas não foram dirigidos
pela classe operária e deram lugar ao aparecimento de Estados-nações
independentes. Na China, o dito partido comunista conduziu uma luta sem nenhuma
actividade auto-organizada da classe operária, e sem nenhuma aparição de órgão
de democracia operária.
O mundo posterior a 1945 foi testemunha de uma
sucessão de independencias nacionais nas quais os movimentos da classe operária
não desempenharam um papel significativo. Claro está que estas realidades
exigem que seja revista a teoria de Trostsky. Qualquer que seja a sua força,
não poderá ser utilizada como uma antevisão universalmente válida a respeito das
lutas nacionais na época do imperialismo. Certos trotsquistas procuram discutir
estes acontecimentos que estão claramente em contradição com a teoria de
Trotsky. Outros, todavia, continuam a defender dogmaticamente à letra os
escrotos de Trotsky. A maior organização
trotsquista americana ( Socialist
Workers Party) produziu um documento em 1964, por exemplo, que afirma: “ Na época imperialista, a burguesia
nacional nos países industrialmente retardatários trai a sua própria revolução
e as tarefas democráticas burguesas, e, inclusivé a realização da independencia
nacional não pode ser realizada senão através da revolução socialista.”
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9.
Agora, o facto de que esta pretensão seja evidentemente falsa ( isto é, que a
independencia nacional possa ser relizada sem revolução socialista) não parece
ser tida em conta. Foi Trotsky quem o disse e, por conseguinte, deve ser
verdadeira. E um grande número de trotsquistas que defende uma tal linha
começaram a ver revoluções socialistas e estados operários um pouco por toda a
parte. Na Argélia, no Egipto, onde um regime nacionalista progressista tomara o
poder. Apesar de tudo, se a independencia nacional não pode ser realizada senão
por uma revolução socialista, então a realização da independencia nacional
deveria querer dizer que uma tal revolução já tinha tido lugar. O facto de que
nada de semelhante a uma revolução socialista possa ser reconhecida – como
milhões de pessoas oprimidas, descendo às ruas e lançando as bases do exército,
como greves de massas e ocupação dos lugares de trabalho, como novas
instituições populares de auto-governo apareceram nos locais de trabalho e nas
comunidades não parecem importantes? Indo mais longe do que Trotsky foi, alguns
grupos começaram a defender que havia uma lógica escondida que conduzia as
lutas nacionais à revolução socialista. Mesmo que o não soubessem, os
nacionalistas burgueses e pequeno-burgueses conduzem actualmente revoluções
operárias. A primazia da auto-emancipação operária desapareceu rapidamente(
como se a maior parte dos grupos sociais pudesse construir o socialismo). E inevitavelmente,
a linha entre o nacionalisnmo e o socialismo rompeu-se. No fim de contas, se o
nacionalismo anti-imperialista se transforma automaticamente em socialismo,
então a linha entre os dois é verdadeiramente muito tenue. Certos trotsquistas
que defenderam tais concepções tornaram.-se eventualmente mais ou menos
acríticos e aderiram ao nacionalismo de feição progressista (Cuba, Nicarágua,
Granada) e abandonaram a ideia da revolução permanente e a sua insistência
sobre a independencia da classe operária e da sua organização socialista na
luta nacional. Foi neste sentido que evoluiu o SWP americano ( Socialist Workers Party).
(Recordei)Lembrei
estes elementos porque eles sublinham como é importante resistir às fórmulas
simples quando falamos de lutas nacionais. Não há lei geral ou da dinâmica das
lutas nacionais hoje (e aliás nunca houve) um dos erros de muitos marxistas foi
procurar uma dessas leis, em vez de tomar conta da tarefa, de longe mais
importante de desenvolver uma análise muito concreta da particularidade das
lutas nacionais numa conjuntura histórica determinada. Com esta preocupação na
cabeça, proponho-me rapidamente fazer algumas considerações preliminares sobre
as lutas nacionais no Estado canadiano. Mas antes disso, quero sublinhar os
sectores nos quais a aproximação marxista do nacionalismo permanece fraca e
devemos estar conscientes de que tais sectores devem ser sectores de trabalho para
desenvolver uma compreensão cada vez mais ampla do nacionalismo no mundo moderno.
----- x -----
Terceira Parte : os
Problemas da Teoria Marxista do Nacionalismo
10. Um dos
elementos fortes das concepções de Marx sobre a Irlanda num dos escritos de
Lenine sobre a questão nacional, é que eles fornecem uma maneira de sustentar
as lutas nacionais dos povos oprimidos sem se fazerem campeões de uma qualquer
forma de nacionalismo. É o que torna a sua herança uma herança das mais importantes. Mas dito isto, devemos estar conscientes que
nem Marx nem Lenine nos forneceram realmente uma teoria que nos permita
compreender um dos problemas mais importantes que encontramos neste domínio: o
incrível poder e a persistência do nacionalismo e das identificações nacionais.
Mais do que uma diversão temporaria ou episódica de uma consciência de
classe mais desenvolvida o nacionalismo dominou e continua a dominar os
pensamentos da vasta maioria da classe operária e dos povos oprimidos. Não
pretendo ter todas as respostas pelas quais ele se tornou assim. Mas deixai-me
fornecer quatro explicações parciais
sobre o que deve ser explodado e desenvolvido.
11.
O primeiro
sujeito é o que podemos chamar
a atracção pela
cidadania. Lembremo-nos que nos primeiros movimentos da classe
operária foram criados nos contextos em que a vasta maioria da
classe operária não votava. Por esta razão, a luta pelos direitos democráticos,
especialmente o direito de voto, ocupava um lugar maior na agitação socialista.
Com efeito, o socialismo- habitalmente designado sob o nome social democracia –
apareceu muitras vezes para a inclusão da classe operária no interior da
democracia capitalista. Isso produziu toda uma tradição história onde a
democracia socialista era criticada nuito simplesmente por não ser
sufucientemente inclusiva . Resultado: a questão da forma do poder poítico capitalista
– o Estado-nação burguês – e os seus
problemas inerentes ( burocratismo,
definição nacional de cidadania, separação do poder económico do poder
político) raramente foram ultrapassados. Isso significa que os movimentos
operários procuraram geralmente a plena cidadania no interior da democracia
capitalista. Não se pode negar a importancia desta luta. No fim de contas a
luta pelos direitos democráticos burgueses, a batalha para ser considerado como
um membro de corpo inteiro da sociedade tem um significado fundamental. Mas no
processo, a classe operária acaba muitas vezes ligada a esta especie de ideia,
a de que tem poucas ligações com as tradições políticas que avançam uma crítica
radical dos limites inerentes e das ligações da democracia liberal em si mesma.
Assim, uma definição liberal dos direitos e da cidadania enraizam-se
historicamente e profundamente nos movimentos oprerários - nos quais as pessoas
são definidas como entidades separadas chamadas individuos, que estão em
competição económica nos mercados que são regulados por leis que não reconhecem
senão os direitos dos individuos ( e das suas famílias) que são amplamente
compradores e vendedores de bens e de serviços( tudo isso é num certo sentido
muitas vezes definido como o reformismo
) Diz-se que os marxistas não prestam suficiente atenção ao poder ideológico
das noções de cidadania, preferindo simplesmente sublinhar a corrupção e o carácter
vendido dos dirigentes que trairam o movimento socialista. Se devemos
desenvolver uma alternativea séria ao reformismo, será todavia necessário não
somente denunciar os dirigentes corrompidos
, mas o que é mais importante, de encontrar as maneiras de avançar uma crítica
da democracia socialista e da cidadania, reconhecendo a importância dos direitos quando fazemos uma crítica dos seus
limites, crítica que poderá ter assim eco na experiência da classe operária em
lugar de soar como slogans redutores.
----- x -----
Todos
terão notado que o intelectual titula o
seu capítulo “ Os problemas da
teoria marxista e do nacionalismo” indicando, com isso que o objecto do seu estudo não é o nacionalismo, como entrave à revolução
proletária na prática concreta da luta de classes, mas a teoria marxista em si
mesma, a sua pureza e a sua defesa contra a impureza desviacionista (sic),
actividade que constitui em si mesma um desviacionismo proletário. O
intelectual nem sequer imaginou que “a
incrível persistência do nacionalismo” chauvinista e reaccionário estivesse ligado
à incrível persistência do modo de producção capitalista que nunca acaba de titubear e de se incrementar
uma crise após outra. A esquerda reformista que numa certa época se chamava “
oportunismo de esquerda”, depois “revisionismo de direita” andou sempre errante
na periferia da classe proletária, procurando uma postura não demasiado
constrangente pela qual poderia vender
as suas aspirações visando conservar o regime nacionalista democrático burguês
ou reformá-lo até o tornar aceitável à classe operária. A pequena burguesia foi
sempre a base social do esquerdismo, do anarquismo e do terrorismo, que não são
senão variantes radicais do reformismo. A pequena burguesia, incluindo a sua secção intelectual, – classe social votada ao
desaparecimento sob a evolução imperialista do modo de producção capitalista -
agarrou-se desesperadamente às particularidades do capitalismo nacional que
asseguraram a sua subsistência, tal como o direito burguês, a representação
parlamentar, a governança “democrática” do imenso Estado burguês tentacular.
Tudo isso conduz a subclasse pequeno
burguesa a aderir a todas as lutas para a defesa dos direitos democráticos
burgueses (gentrificação, feminismo, LGBT, direitos dos animais, comunitarismo,
laicidade, justiça social, defesa dos assistidos sociais e dos SDF,
escolaridade, cuidados de saúde, ambiente, agricultura humana, ecologia,
consumo e sobreconsumo, pobreza voluntária, caridade pelo terceiro mundo,
descolonização, nacionalismo, pacifismo, anti-racismo, direitos dos detidos,
ciclismo urbano, naturismo, nutrição, etc), tudo e não importa o quê,
exceptuadas as lutas da classe proletária que ela julga demasiado radical, por
vezes violenta, e que não são publicitadas pelos órgãos de comunicação social
populares e pelos tablóides. A pequena burguesia é muito sensível a este aspecto de visibilidade
mediática e do efeito da moda. Isto está ligado à sua prática social e
cultural. A pequena burguesia tem por função principal assegurar o serviço da
reprodução da população, sob todos os aspectos. O pequeno- burguês concebe a luta de classes como uma missão e um
benevolência onde deve consciencializar e fazer progredir a vontade dos
oprimidos que o pequeno-burguês crê incapazes de compreenderem a sua opressão e
a sua miséria. Para o pequeno-burguês,
se ele consegue convencer suficientemente as pessoas de uma causa, elas
vencerão pela petição porque a pequena burguesia crê sinceramente na democracia representativa burguesa, na
democracia cidadã do número – forçosamente é o seu ganha-pão. O pequeno-burguês
não compreende que para conduzir uma revolução social, deve existir uma
conjuntura revolucionária que mobilizará espontaneamente os efectivos
requeridos – não haverá nada a fazer por isso – a crise económica lá chegará. A
verdadeira questão será então – não quantos operários serão mobilizados – mas
para que objectivos são eles dirigidos? Pela sua luta quotidiana na frente
económica, nomeadamente a classe proletária conhece a pusilanimidade dos “direitos-privilégios”, das aquisições
sociais efémeras arrancadas temporariamente apesar da ditadura do grande
capital. A classe proletária sabe que a ditadura burguesa é “ fecha a boca”, enquanto que a democracia burguesa é “
discute sempre”. Nada senão a
mobilização da classe operária como carne para canhão nas guerras de libertação
nacional burguesas se relacionará com o proletariado, - a mobilização da classe
operária nas guerras burguesas para a defesa da liberdade, da democracia, do direito de negociar e os
pseudo-direitos e aquisições sociais não lhe dizem qualquer respeito, senão a
experiência de luta e das decepções . Sob a crise económica sistémica do
capitalismo não há nenhum programa de reforma que valha. É a substituição do
Estado burguês e a abolição do modo de producção capitalista e a sua
substituição não pela economia socialista mas pelo modo de producção
proletário-comunista que são os objectivos da revolução social proletária. NDLR
12. Ligado com este elemento, há um segundo problema: as versões do
socialismo centradas na questão do Estado dominaram o século XX. Durante todo
este período histórico, a parte mais importante da esquerda apresentou a propriedade
estatal como a essencia social e económica do socialismo. Marx colocou no
centro da sua crítica do capitalismo o que chamou as relações sociais de producção,
o que significa as relações de domínio, de controlo, de alienação e de
exploração induzidas pela maneira como a riqueza é produzida na sociedade
capitalista. O que decorreu desta aproximação foi a ideia de que o socialismo
conduz ao desenvolvvimento de novas relações de producção, baseadas sobre
formas não alienadas de controlo e de auto-gestão da producção pela classe
operária. O controlo operário sobre a produção e de novas instituições
governamentais auto-gestionárias estão no centro de uma tal perspectiva.
Durante a época em que os partidos
comunistas estalinistas dominaram a esquerda (1925-1980 ou à volta disso),
estas aquisições perderam-se. A propriedade estadual dos meios de producção e a economia planificada eram apresentadas
como a essência da nova sociedade. A despeito das melhores intenções, numerosos
trotsquistas também colocaram a esse nível o seu ponto essencial. Resultou que a ideia de propriedade de
Estado é em si mesma progressista, seja em si socialista ou se tenha tornado
largamente partilhada pela esquerda. Isso contribuiu para as políticas centradas
sobre o Estado, onde as ideias de regulamentação estadual e de planificação do
Estado foram elavadas a uma posição de primeiro plano na propaganda socialista. Uma das consequências disto foi que a
natureza opressiva inerente ao Estado nação raramente foi atacada. De
facto, até hoje, muita gente na esquerda continua a defender tais concepções e
parece esquecido da hostilidade das massas para com as burocracias estaduais
centralizadas, que se desenvolveram- por boas razões-, nas fileiras da classe
operária na maioria dos locais do mundo.
O que estas políticas socialistas
estatistas (a que podemos chamar socialismo de cima) esquecem é que o Estado nação
se desenvolveu com o desenvolvimento do
capitalismo pelas classes burguesas, que procuram integrar a marcha nacional
por um sistema uniforme de leis e de taxas, numa língua comum, numa governação
unificada e num exército nacional para defender e avançar as suas pretensões
contra os capitalistas estrangeiros ( e esmagar as revoltas domésticas quando
isso se torne necessário). Assim se perdeu o sentido próprio da forma democrática
inerente à democracia burguesa (como o sublinhou Marx em A Guerra Cívil em França). Enfim, as versões estatistas do socialismo
tendem a perder de vista o facto de que as estruturas nacionais e as
instituições do Estado- nação perpetuam a divisão do mundo entre um nós ( que pertence a uma dada nação) e
um eles ( os estrangeiros, os de
fora). As consequências do socialismo estatista são o reforço do nacionalismo à
custa do internacionalismo.
_____x_____
Contrariamente ao que
pretende Mcnally, não é o socialismo
que conduz ao desenvolvimento de novas relações de producção baseadas em formas
não alienadas de controlo e de auto-gestão da producção pela classe operária,
mas sim o modo de producção comunista que não pode impor-se senão após um longo
e considerável desenvolvimento das forças produtivas sob o capitalismo liberal,
totalitário ou socialista. Incidentalmente, a classe operária tem então vocação
a desaparecer (sob o comunismo). A contradição fundamental de um modo de producção
(qualquer que ele seja) reside sempre no processo de producção e não nas
relações sociais de producção. Assim, o que desqualifica o modo de producção
capitalista é que o capital produtivo já não chega a valorizar-se em grande
quantidade para assegurar a sua reprodução alargada, o que desencadeia a
implosão das relações sociais de producção, provoca tumultos sociais, envenena
as lutas de classes antagónicas até à insurreição e potencialmente até à
revolução. Não decorre dos revolucionários
proletários criar as condições objectivas da crise económica, politica e
depois social, tudo isso será espontâneo, mecânico e incontrolado. O
que será
consequência da revolução dos revolucionários proletários será estimular e
inflectir este movimento popular insurrecional espontâneo, até fazê-lo cumprir
a sua missão histórica, destruir o antigo modo de producção capitalista, para
em seguida transformar esta insurreição popular em revolução proletária, o
que significa construir o novo modo de producção proletário- comunista. Dito
isto, o professor Mcnally tem razão em sublinhar que daí resulta entre os
socialistas que a ideia da propriedade do Estado é em si progressista (….) uma consequência
disso foi que a natureza opressiva inerente ao Estado nação raramente se viu atacada….” Pela esquerda
reformista nacionalista. NDLR.
_____x_____
13. Tudo isto nos conduz a um terceiro ponto: a política do espaço. Os marxistas têm curiosamente
ficado indeferentes quanto às questões do espaço, especialmente no que diz
respeito às idendades dos povos que têm pontos de referência espaciais e geográficos.
Mesmo as memórias pessoais têm invariavelmente dimensões espaciais : Nós
pensamo-nos a nós mesmos como tendo nascido num certo local, vivido , crescido,
trabalhado, ir à escola em diferentes sítios, e assim sucessivamente. Até
agora, para a maior parte da história da humanidade, as relações de espaço não
têm nada a ver com pertencer a uma nação. De facto, as pessoas pertencem a
grupos que têm espaços mais pequenos ou
maiores. Mas o capitalismo construiu aquilo que Benedict Anderson descreveu
como comunidades imaginárias. As
nações são assim, em parte, construcções imaginárias, - organizadas à volta de símbolos
como as bandeiras, os hinos, as cores nacionais, os mitos e as histórias em
grande parte artificiais ligadas às unidades administrativas nomeadas Estado
nação. Nós não temos necessidade senão de observar um fenómeno como os jogos
olímpicos para comprender o poder de atracção das comunidades imaginárias.
Milhões de pessoas que nunca encontraram Silken Launnaum ou Donovan Bailey ajem
todavia como se “fossem sua carne e seu sangue”, glorificando-se das suas
vitórias e mortificanco-se das suas derrotas. Digo isto não porque pense que
tudo é inevitável no que respeita às identificações nacionais, mas pelo
contrário. Mas sem a compreensão socialista revolucionária de que tais
identificações respondem a uma necessidade real – o desejo de pertencer a uma
comunidade com outros, de ter objectivos comuns – substimaremos a necessidade
para os movimentos socialistas de massa no futuro ajudarem a desenvolver
os sentimentos internacionalistas de uma
comunidade que está ligada às experiências locais e mundiais. Não bastará ter
uma vanguarda
que poderá dizer que o nacionalismo é o seu inimigo; será necessário
favorecer com novas experiências de espaço baseadas em formas de organização
que criam nova solidariedade e novas identificações, forjadas na luta comum, e
que ultrapassa o Estado nação.
_____x_____
14. E isto leva-me ao meu quarto
ponto: a subida do nacionalismo na era da mundialização. A globalização
económica desencadeou-se; nenhuma parte do planeta ou quase foi poupada pela
ascensão considerável das empresas transnacionais e pelos mercados financeiros
globais.A maior parte dos Estados nações são economicamente mais pequenos do
que as grandes empresas transnacionais e os mercados monetários mundiais
ultrapassam somas todos os dias que excedem em muito tudo quanto possui um
banco central qualquer ( ver o meu artigo O Fim dos Estados Nações, New socialist, n.º 3, Maio-Julho de 1996).
Estas entidades económicas mundiais causam razias na vida dos povos: as empresas
que encerram, as comunidades que são destruídas, os serviços sociais que são
desfeitos: os hospitais comunitários, as escolas, os escritórios de correios
que desaparecem, tudo em nome da globalização. Em tais circuntancias, o
nacionalismo torna-se o primeiro e mais simples meio de compreender e de
resistir a estas forças. Lembremo-nos que um governo nacional pode parecer como
mais próximo e mais compreensível que os transnacionais ou o mercado monetário
electrónico e global centrado no ciberespaço. Mas pedir ao Estado nacional que
nos proteja contra o capital global conduz inevitavelmente a ver o problema em termos
nacionais. Os estrangeiros ( e o que é estrangeiro) tornam-se inimigos da nossa
segurança e do nosso bem- estar. Os políticos perigosos e sem escrúpulos
tornam-se rapidamente os adeptos que nutrem e manipulam tais sentimentos.
Assim, Os Trabalhadores Unidos do automóvel empenharam-se no afastamento dos
automóveis japoneses, os jovens sem-emprego na Alemanha lançaram bombas
incendiárias contra os hotéis cheios de trabalhadores imigrantes de origem
turca, pessoas da Califórnia sustentaram protestos contra os ilegais do México,
os canadianos-ingleses denunciaram os do Quebeque. Os Servos, os Croatas, os
muçulmanos opuseram-se uns aos outros na ex-Jugoslávia. Os Hutus e os Tutsis
afrontaram-se em conflitos sangrentos no Ruanda e no Burundi – e a lista
poderia alongar-se.
_____x_____
Partindo de um mau
diagnóstico o professor propõe um mau remédio. A “globalização económica” não é
um espectro que se desencadeia, repentinamente nem o fruto de uma má política
liberticida e neoliberal, cujo Estado burguês cumplice poderia protejer o
proletariado. O Estado burguês não é cúmplice é o artesão da globalização e não pode em caso algum ser
a solução para o modo da economia
capitalista e ainda menos da sua vítima proletária. A classe dominante e o seu Estado nacional
não controlam nada no aprofundamento da crise do capitalismo. Quem é esse nós,
que os reformistas utilizam? O nós cidadão-eleitor-consumidor-colaborador
do Estado, transcendem os interesses das classes. É contra este tipo de
reformismo pequeno- burguês que o proletariado se deve prevenir. O Estado
nacional, burguês, renovado e tenso, última masmorra isolada da louca fortaleza
capitalista, não é o último refúgio para a classe proletária revolucionária
que, ao contrário, deve investir para destruí-lo e não fazer dele um Estado
socialista. Sabemos que o espírito de capitulação pequeno-burguês já contaminou
a mentalidade dos proletários desamparados, sabemos que os burocratas sindicais
de negócios, que os mercenários da indústria das ONGs e outras associações da
sociedade civil a soldo já se alastraram fortemente nas fileiras
proletárias e que a lista dos seus crimes se irá alargar; todavia, o dever dos revolucionários
proletários é o de apontar sem cansaço o nosso
inimigo implacável, a
classe capitalista e o seu Estado burguês nacionalista - classe contra classe -
porque o proletariado não tem pátria, tal é a nossa divisa. NDLR.
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Não é por acaso, se neste período de
reestruturação feroz do capital, os antigos e os novos nacionalismos levantam a
cabeça – e que muitos de entre eles se tornem violentos e virulentos. Muito
raramente temos escutado o grito de
clarim dos nacionalismos anti-colonialistas depois dos anos 50 e 60, visto que
a maior parte de entre eles ficaram desacreditados pela incapacidade de
responder às nossas esperanças de desenvolvimento. E num contexto de raiva e de
desespero, quando a esquerda e o movimento operário apareciam enfraquecidos, os
nacionalismos étnicos de direita retomavam a iniciativa política. Mas, ainda
uma vez mais, não havia nada de inevitável.
Seria contudo imprudente subestimar a subida
do nacionalismo de que temos sido testemunhas neste período de globalização. E
devemo-nos lembrar que a necessidade, para os
socialistas, de colocar à frente das suas posições nacionalistas é
talvez mais urgente do que nunca, agora que a maioria da esquerda adoptou o
nacionalismo em 1914. Para o fazer
teremos necessidade de análises da tradição do socialismo internacional e de as
desenvolver em relação às questões políticas do espaço, dos Estados nação, da
globalização económica, e da crítica da forma do Estado nação burguês a partir
de uma perspectiva do socialismo vista de baixo.
Quarta Parte: as Questões Nacionais no Canadá Hoje
15. O Canadá é um produto da expansão
imperialista das potências europeias. Estabelecido como colónia de povoamento,
o Canadá baseou o seu domínio na opressão e no domínio dos povos autóctones e
nos habitantes franceses que tinham povoado a Nova- França e outras partes do
Canadá conquistadas pelos Britânicos em 1759. O Canadá formou-se sob a opressão
destes grupos: por esta razão, as políticas canadianas foram modeladas por duas
lutas nacionais principais: as dos povos autóctones (ou as primeiras nações) e
as dos Quebequenses.
16. Porque os povos autóctones eram
economicamente marginais, politicamente não-libertos e terrivelmente oprimidos
pelos políticos do apartheid da Lei dos Índios perderam muito tempo a encontrar
as alavancas para exercer as suas pressões políticas. Foi precisamente no meio
da explosão de protestos sociais dos anos 60 e 70 que os movimentos autóctones
politicamente organizados deixaram a sua marca. Inspirados por grupos como o Black Panther Party e l’Americaine Indian Moviment dos Estados
Unidos, os militantes autóctones começaram a conduzir lutas mais militantes e
mais coordenadas.
Depois das insurreições do fim dos anos 60 e
do princípio dos anos 70, houve tentativas de profissionalizar o movimento
autóctone para fazer dele o movimento de pressão mais ordinário. Na vanguarda
deste deslizamento esteve a direcção da Assembleia das Primeiras Nações. A APN
centrou o seu trabalho nas mudanças constitucionais, em especial a tentativa de
obter o reconhecimento do direito
inerente ao autogoverno para os povos autóctones inserido no Acto
Constitucional (AANB). É essencial que os socialistas apoiem esta
reivindicação. Dado que os povos autóctones nunca mais aceitaram ser governados
pelo Estado canadiano, o direito inerente a escolher qual seria a forma de
autogoverno que desejavam deve ser reconhecido e defendido.
Da mesma maneira, devemos reconhecer que toda
uma camada de militantes autóctones (muitos de entre eles formaram a jovem
geração dos dirigentes da APN) rejeita a insistência sobre as mudanças
constitucionais e as reclamações territoriais por intermedio dos cursos de
Justiça que dominam a corrente principal dos políticos autóctones.
Estes militantes foram a vanguarda das formas
de acção directa de desobediência civil como os bloqueios de estradas e
autoestradas e as ocupações de terras antigas como vimos em Oka, Gustafen, Lake
e Ipperwash. É essencial que os socialistas, do mesmo passo que defendem as
reivindicações de um grupo como o APN, tentem também organizar a solidariedade
com estas formas mais militantes das lutas autóctones. Devemos tornar claro que
sustentamos a auto-actividade e a auto-organização militante dos autóctones e
que denunciemos as práticas colonialistas do Estado canadiano para todas as
violências que se produzam.
_____x_____
É talvez essencial que os “socialistas” sustentem as aspirações à
autonomia dos chefes das tribos das Primeiras nações que desejam administrar fundos
e doações de caridade, concedidos pelos governos aos grupos autóctones, com o
fim de obter a sua adesão à exploração
dos recursos das reservas, mas isso não é um combate para os proletários
autóctones que desejam sobretudo concentrar os seus esforços sobre a
substituição do modo de producção capitalista em concordância com os seus camaradas proletários canadianos.
NDLR
_____x_____
17. A
questão nacional que domina a política oficial do Canadá é a dos Quebequenses.
Isso tem a ver com o facto de que, querendo aproveitar o desenvolvimento da
agricultura e do comércio da Nova-França, desejam que os agricultores franceses
continuem a trabalhar a sua terra, não tendo os colonizadores britânicos
interesse em expulsar as pessoas da colónia. Enquanto os autóctones são cada
vez mais empurrados para a margem da vida económica as coisas ficam mais
complicadas para os habitantes franceses. Em primeiro lugar, os Britânicos
tentaram suprimir a igreja católica e a língua francesa. Todavia, deram-se
rapidamente conta de que tinham necessidade de uma aliança com a elite francesa
– os senhores, o clero e alguns capitalistas – se realmente queriam governar a
região. Daí resultou o encerramento da Nova- França nas relações de domínio
colonial pelas autoridades britânicas em lugares que tinham feito concessões:
tolerância para a língua francesa, para a igreja católica e para o código civil
francês. Quando o movimento para a integração das colónias britânicas da
América do Norte teve lugar, nos anos de 1860, o Quebeque obteve uma outra
concessão: a restauração da sua própria assembleia legislativa. Daí resultou
que uma entidade política foi criada (a província de Quebeque) onde se
encontrou a segunda mais importante população do país, cuja vasta maioria era
francófona, - e onde se acharam alguns dos mais importantes centros agrícolas,
manufactureiros e comerciais. O que quer dizer que os agravos do Quebeque eram
habitualmente negociados por uma classe dominante que falava antes de tudo
inglês.
Enquanto que as pressões nacionalistas vindas
regularmente do Quebeque ( e isso era muito frustrante para eles em período de
guerra) e enquanto a igreja católica dominava a vida cultural e política, o
nacionalismo do Quebeque não parecia particularmente ameaçado pela classe
dirigente do Canadá. Tudo isso mudou nos anos 60 com a ascensão de uma classe
média laica e um novo movimento operário em ruptura com o movimento da igreja e
aparição de um novo movimento nacionalista (que se cristalizou finalmente com a
criação do Partido Quebequês). A revolução tranquila dos anos 60, a crise de
Outubro de 1970 (na qual o governo de Trudeau utilizou o exército e a polícia
para esmagar a frente de libertação do Quebeque), a greve geral militante de
1972 e a eleição do governo do PQ sob a direcção de René Lévesque em 1976, tudo isso conduziu a
colocar a questão do Quebeque no
poscénio do debate político.
E isso continuou assim pelo período de uma
trintena de anos. Contudo, a obsessão dos políticos federais para resolver a
questão do Quebeque foi explorada pelos políticos de direita que sugeriam que
no meio das provações, os quebequenses procuravam obter um tratamento especial.
18. Antes de tudo, a atitude dos socialistas
deve ser clara: o Quebeque é uma nação oprimida
no Estado Canadiano. Conquistado primeiro pelo imperialismo britânico, o
Estado canadiano continua a negar os direitos democráticos do Quebeque à
autodeterminação, incluindo a secessão da Confederação Canadiana (o que não
significa aceitar o direito do governo do Quebeque a negar o mesmo direito às
nações autóctones). Mas a partir daí as coisas complicam-se. Como o sublinhei
mais acima, não há regras gerais ou de direito universal que digam aos
socialistas se eles devem defender ou opor-se à separação ou à secessão. Para
escolher temos necessidade de uma análise concreta.
No fundo, a atitude socialista deve
assemelhar-se à atitude de Marx a respeito da Irlanda. Se um movimento operário
poderoso, unido, demonstra capacidade de abordar os problemas da opressão
nacional, então a separação nacional não é necessária. Marx pensava que era o
caso da Inglaterra durante o período do Chartismo que culminou em 1848. Mas se
o chauvinismo em relação à nação oprimida se tornar um meio contínuo de
bloquear o desenvolvimento da independência política de classe da classe
operária, então será sensato defender a independência como uma maneira de
acabar com o antagonismo nacional que podem defender os políticos de esquerda.
O que quer que se diga a respeito do passado, creio que um bom exemplo pode ser
extraído das consequências dos debates sobre a Lei 101 e da Lei 172 (as
recentes leis linguísticas do Quebeque), sobre os acordos do Lake Niich e de Charlotte Town e da enorme hostilidade que gerou em todo o país a
ideia de garantir o reconhecimento do Quebeque como uma sociedade distinta; O chauvinismo anti-quebequense funciona da
mesma maneira que o chauvinismo anti-irlandês nos anos de 1860: uma maneira de
ligar os trabalhadores anglófonos com os seus próprios dirigentes e as
tradições do seu Estado canadiano. Todas as tentativas de responder às
reivindicações nacionais do Quebeque reencontram em breve uma poderosa oposição
de uma parte considerável das pessoas comuns de língua inglesa. No meio deste
tecto anti-quebeque a identidade nacional da classe operária unida atrás das tradições do Estado canadiano
afirmou-se. Podemos pôr a questão de saber como defender uma Nova Confederação livre e igualitária, o
que Marx propunha no caso da Inglaterra e da Irlanda, de modo a defender a
nossa posição neste caso.
_____x_____
Foi um erro da parte de Marx propor aos operários assumirem uma
problemática nacionalista burguesa. Isso demonstra a sua inexperiência
política, reflexo da imaturidade da consciência da classe operária britânica no
princípio do capitalismo industrial. Não é de modo algum da alçada do
proletariado solucionar os problemas constitucionais, legislativos e
parlamentares entre duas burguesias nacionalistas e entre dois Estados
capitalistas em guerra. O proletariado não quereria podê–lo fazer, pois que não
possui por único poder e única riqueza senão a sua força de trabalho para
vender sem sequer ter a possibilidade de
recusar . O proletariado britânico desse tempo, como o proletariado
canadiano de hoje, não devem alimentar nenhuma ilusão desta natureza, não
haverá nova confederação dos sovietes realmente livres e igualitários entre os
proletários da terra senão no dia em que a ditadura do proletariado se imporá
sob o modo de producção comunista
proletário. A superestrutura legal repousa sobre a infraestrutura fundamental,
jamais o inverso. Longe de afastar o proletariado duma nação ou de uma outra
futilidade nacionalista, a atitude oportunista da esquerda social-nacionalista
não fez senão semear a confusão de acreditar o mito da opressão nacional e de
uma possível liquidação política nacional, fora de uma fundamental emancipação
económica da classe proletária. NDLR.
_____ x _______
Pretendo deixar bem claro neste ponto que a
minha sugestão de que os socialistas
deveriam naturalmente defender a independência do Quebeque não tem nada a ver
com o pensamento de que um novo Estado do Quebeque seria em si mesmo
progressista, ou que a luta por ele deveria inevitavelmente desencadear um
movimento social radical. Ao invés, contrariamente aos camaradas da Esquerda Socialista , penso que o
Quebeque burguês independente realizado sem sublevação maciça é uma
possibilidade muito real. Dela resultaria um Estado do Quebeque independente
com os controlos de imigração, das práticas racistas e uma hostilidade contra
os povos autóctones, o que me parece muito possível. De facto, penso que os
camaradas da Esquerda Socialista se enganam quando sugerem que os nacionalistas
burgueses do Quebeque (como Lucien Bouchard) não querem realmente um Estado
independente e que os socialistas deviam tentar abordá-los enquanto mais soberanistas do que os soberanistas. De
facto, penso que uma tal posição corre o risco de não ser suficientemente
crítica do nacionalismo quebequês e do estado nacional como forma política
_____x_____
O professor Mcnally resume perfeitamente o
ponto de vista da inteligência proletária burguesa, tanto da esquerda como da
direita, a propósito da questão nacional quebequense. Contudo, o ponto de vista
materialista dialéctico do proletariado revolucionário é muito diferente. Nós
já o explicámos longamente: uma nação não é nunca oprimida, uma nação não é
nunca opressora. Sob o modo de producção capitalista, a classe social dominante
explora e oprime, em primeiro lugar, a classe alienada da sua própria nação, e
se esta classe capitalista está à cabeça de uma infraestrutura industrial,
comercial e de negócios, multinacionais, ela captura e oprime também a classe
proletária dos países estrangeiros. A classe operária canadiana não tira nenhuma
vantagem da exploração dos proletários da província do Quebeque ou dos
proletários autóctones vivendo nas
reservas ou fora das reservas e neste sentido pode dizer-se que esta
classe operária alienada não explora as facções quebequenses ou autóctones da
classe proletária internacional. Ademais, a secção quebequense da classe
capitalista canadiana obteve todos os poderes políticos e jurídicos que lhe
foram requeridos para assegurar o seu desenvolvimento, enquanto secção da
classe dominante no seio do conjunto federal canadiano. Podemos portanto afirmar que a
classe capitalista quebequense não é oprimida pela classe capitalista canadiana
de que faz parte e à qual fornece vários palhaços políticos nacionais. A
emergência de vários milionários de negócios do Quebeque na cena internacional
é disso uma manifestação evidente. Tudo se jogou aquando das negociações do Acto da América do Norte Britânica
(AANB). Nessa ocasião (1867) a burguesia nacional quebequense obteve o controlo
do seu próprio aparelho de Estado burguês, logo que a oportunidade de
participar na governação do aparelho de Estado burguês canadiano assegurou
também o seu desenvolvimento. Melhor, contrariamente às pretensões da esquerda
e da direita burguesas, o governo do Quebeque alertava contra o direito de
secessão (separação – autodeterminação – direito de dispor do proletariado
quebequense). À prova, o governo nacionalista chauvinista do Quebeque fez dois
referendos sobre a questão nacional (1980 e 1995) e se ele tivesse vencido um
ou outro desses referendos, o Quebeque seria hoje um Estado capitalista
soberano assegurando a exploração da classe proletária quebequense multiétnica
e a exploração do proletariado destes países. O capital quebequense enquanto
segmento do capital canadiano atingiu o patamar do desenvolvimento imperialista
da economia capitalista. Como em toda a parte, a dita luta de libertação
política nacional do povo do Quebeque, sem libertação económica da carapuça
capitalista internacional ter-se-ia saldado para os operários pela consolidação
da posição dos seus carcereiros quebequenses. A crise sistémica do imperialismo
internacional bateria mesmo assim duramente o proletariado quebequense
multiétnico como o proletariado canadiano multiétnico, que teriam ambos a
missão histórica internacionalista de substituir a sua classe capitalista e
destruir o seu respectivo Estado, a fim de erigir o modo de producção
proletário-comunista. As classes proletárias quebequense e canadiana recusaram
jogar este jogo nacionalista chauvinista e a cada referendo quebequense ou
canadiano a classe operária internacionalista recusou deixar-se enlear nas
peias grosseiras dos capitalistas e dos
seus comparsas da esquerda aburguesada.
Verdadeiramente a classe proletária canadiana não precisou de uma vanguarda
nacional-socialista de rectaguarda. NDLR.
_____x_____
19.
Uma outra referência deve ser feita no que concerne às questões nacionais do
Canadá. A maior parte das pessoas de esquerda que entretêm estas questões vêm
de um período em que os imigrantes e os povos de cor não estavam ainda
politicamente organizados. Muitas vezes esfalfavam como se existisse uma
entidade homogénea chamada Canadá Inglês, de maneira que parecia não ter o
carácter multiétnico e multiracial do país. Resultou daí que o carácter sistematicamente
racista do canadiano era subestimado
ou ignorado. Isto deve ser corrigido. Os socialistas não devem privilegiar as
questões autóctones ou quebequenses de uma maneira que ignore a opressão racial
das pessoas de cor no Canadá. Por esta razão, o apoio consequente ao
anti-racismo deve ir de par com um apoio de princípio aos direitos dos povos
autóctones e quebequenses à autodeterminação.
_____x_____
20.
As questões nacionais tornar-se-ão mais importantes na política mundial nos
próximos anos. Os socialistas revolucionários têm obrigação de tentar encontrar
as maneiras de fazer face aos debates e às crises que daí decorrerão. Isso nem
sempre será fácil. Se se pode utilizar as contribuições históricas dos
marxistas do passado para guiar as nossa análises, devemos permanecer em guarda
contra as respostas dogmáticas e simplistas que aparecem a prestar justiça à
complexidade dos fenómenos implicados. E apoiando o direito das nações
oprimidas a determinar o seu futuro, não devemos perder nunca de vista que um
dos traços essenciais do socialismo de base é o empenhamento por uma comunidade
mundial sem Estado nação.
Capítulo
6
Leninismo
ou Marxismo?
O
Imperialismo e a Questão Nacional
O
Operário Comunista
Comentário
de Robert Bibeau
Janeiro
de 2017
O jornal O Operário Comunista publicou em
Outubro de 1929 um artigo confrontando a posição leninista e a posição do
jornal atribuída a Rosa Luxemburgo (Junius) cremos ser importante publicar este
documento crucial e comentá-lo.
Em
meados do século XIX, Karl Marx tinha definido o nacionalismo de que se
enfarpelava a burguesia como a solidariedade de classe dos exploradores que se
viravam “dentro das fronteiras contra o proletariado” e fora delas contra a
burguesia de outros países: Marx acrescentava que a fraternidade engendrada
pelas relações de producção capitalistas entre as diferentes nações burguesas
não seria mais fraternal que a engendrada entre as diferentes classes de uma
mesma nação. Para Marx, os fenómenos destrutivos induzidos pelo capitalismo num
país reproduzem-se em proporções gigantescas à escala internacional. Atendo-se
a essa análise apresentada por Marx logo no começo do capitalismo industrial,
as esquerdas europeias concluíram que estas contradições entre as diferentes
burguesias nacionais empurraram os fdalgotes provincianos para o campo
proletário, particularmente dos países coloniais. Lenine nos seus textos
apresenta uma síntese desta posição adoptada pelos bolcheviques. Infelizmente,
a esquerda não completou os seus deveres. Em primeiro lugar, o campesinato é o
grande inimigo do modo de producção comunista e um fanático defensor do pequeno
capitalismo agrícola. O capital conhece estas coisas e antes de expropriar o
latifundiário para reagrupar as parcelas, mecanizar e industrializar a
agricultura, começa por propagandeá-lo antes de
proletarizá–lo Os bolcheviques da
União Soviética não souberam fazê-lo de outra maneira. O desenvolvimento dos
meios de producção e consequentemente da necessidade de matérias primas e de
forças produtivas e a necessária expansão dos mercados empurraram o capital a
destruir as barreiras alfandegárias - as fronteiras nacionais- em resumo, a estripar o bicho-da-seda
nacional que se tornou uma prisão contra a expansão capitalista em fase
imperialista. O desenvolvimento do modo de producção capitalista teve como
consequência que todas as burguesias nacionais foram forçadas a reagruparem-se
em vastas alianças capitalistas, repartindo ente si o fruto da expropriação da
mais-valia em função do investimento e do risco. O que determina que uma
economia nacional pertença a uma ou a outra aliança imperialista é sempre o
nível de interdependência entre as economias que constituem essa aliança. A
classe proletária não tem nenhum ascendente sobre esta aliança e não deve
jamais apoiar uma aliança contra a outra.
Assim,
os Estados Unidos foram os maiores tomadores de riscos económicos e militares,
e foram os primeiros beneficiários da expansão imperialista do modo de producção
capitalista. Foi o que não compreendeu Estaline, quando afirmou que “O capitalismo nada tem a oferecer aos povos
dos países dependentes coloniais e semi-coloniais senão dependência e atraso
económico, exploração forçada, massacres inter- étnicos, guerras e miséria.
Segue-se que nenhum país imperialista tem interesse em ajudar outro país
burguês a dotar-se de uma indústria e de uma agricultura autónoma com medo de
contribuir para forjar um concorrente. Toda a ajuda ao desenvolvimento contém
em si em germe a sua antítese e visa entravar um desenvolvimento económico
nacional verdadeiramente independente.”
Hoje,
em referência às vagas de deslocação industrial é fácil compreender Estaline e
demonstrar que o capital não tem pátria e que ele migra de um país para o outro
segundo as taxas de juro obtidas. A compatibilidade capitalista já não se
estabelece em função dos países, mas em função dos grandes trustes
internacionais os quais se expandem por toda a parte onde se possa investir
para estripar o precioso lucro que lhes dá vida.
Se
os bolcheviques e os partidos comunistas da III Internacional sustentaram as
lutas políticas da dita “libertação nacional e pelo direito à autodeterminação
dos povos” foi porque estes partidos estavam sob direcção da pequena burguesia
nacionalista que queria apoderar-se da direcção das lutas das massas camponesas
dispostas a sacrificar as suas vidas para se apropriar dos seus meios de producção
(a terra), o que conseguiram em vários países com as consequências que se
conhecem. Sem emancipação económica, não há emancipação política, nem
ideológica. Hoje, tudo terá de ser retomado desde o princípio, de um lado, com
a rica experiência acumulada na ocasião destas revoluções falhadas (que não
foram na realidade), e do outro, uma confusão decuplicada nas fileiras da
classe proletária.
O
artigo do camarada Operário Comunista, aparecido em 1929, deve-se lembrá-lo,
demonstra que a ideologia proletária revolucionária não estava morta mesmo
nessa época de dominação absoluta do nacional-bolchevismo. A acuidade, a
profundidade e a justiça da sua análise de classe a propósito da questão
nacional burguesa reconforta-nos sobre as capacidades da nossa classe a manter
o pano da nossa revolução apesar da grande tormenta.
_____x_____
Eis
o Artigo do Operário Comunista
O
conflito actual da China com a Rússia e as ameaças de guerra que decorrem deste
incidente inter-imperialista, como aliás de todos os que nos chegam no
dia-a-dia da actualidade, assinalam a possibilidade eminente de uma nova guerra
mundial e impõem-nos uma atenção renovada para o problema que o levantamento e o
desenvolvimento da guerra de 1914 colocou então brutalmente diante da esquerda
marxista da II Internacional.
Neste
terreno diferendos muito importantes se manifestaram entre elementos Leninistas
(reduzindo-se em espécie a Lenine e Zinoviev que redigiam sozinhos o Socialdemocrat) e a maioria desta
esquerda (sobretudo composta de elementos da Alemanha, da Polónia e da
Holanda). Não é sem importância constatar o isolamento do bolchevismo russo na
sua posição particular sobre a questão nacional em face das outras correntes.
Não é sem dúvida por um simples acaso que o bolchevismo ou leninismo se achava
já neste terreno em contradição com a ideologia proletária ocidental.
Depois
de muito tempo, estas divergências, de uma importância fundamental para o
desenvolvimento da revolução internacional, foram escondidas debaixo do tapete
pelos diversos elementos da III Internacional. Tal como os maioritários, os
ditos oposicionistas catalogados Leninistas, Trotsquistas ou Bordiguistas
fingiram sempre ignorar o antagonismo das tendências Luxemburguistas e
bolchevista. Prometeu, que publicou
ultimamente um artigo de Amadeu Bordiga sobre a questão nacional não faz notar em que é que o conteúdo deste artigo
parecia afastar-se do leninismo para se reaproximar de Luxemburgo. Convém
acrescentar que Bordiga, ele próprio, contribuiu para manter na sombra estes
diferendos que existiam há mais de uma quinzena de anos na esquerda marxista,
vedando-os com o manto da disciplina bolchevique. É somente na sua conferência
sobre Lenine no ano 1924 que ele faz uma vaga alusão a esta divergência e
manifesta numa frase diplomática a sua simpatia pela tendência anti-leninista
da esquerda marxista na II Internacional.
De
facto, a morte de Luxemburgo e a exclusão dos elementos esquerdistas tais como
os Tribunistas holandeses e o Partido
Comunista-Operário Alemão (K.A.P.D.) da III Internacional permitiram ao
leninismo dominar incontestavelmente a táctica do Comintern na questão
nacional, tanto quanto em todas as outras questões.
É
preciso portanto, e em primeiro lugar, pôr em evidência a posição marxista
sobre o problema particular tal como ele ressalta incontestavelmente das
citações alegadas por Zitoniev e Lenine, eles próprios. Em Contra a Corrente, faz-se apelo à opinião de Marx no Manifesto Comunista: “Os
operários não têm pátria”. Reproduzamos na sua integralidade a passagem
do Manifesto onde Marx e Engels
expõem o seu pensamento sobre a questão da pátria em relação com a classe
operária: “Os operários não têm Pátria.
Não se lhes pode tirar aquilo que não possuem. Como o proletariado deve, em
primeiro lugar, conquistar o poder político, elevar-se-á à condição de classe
dirigente da nação tornando-se ele mesmo a nação, ele ainda por isso nacional,
embora nunca no sentido burguês da palavra. Já as demarcações nacionais e os
antagonismos entre os povos desaparecerão cada vez mais com o desenvolvimento
da burguesia, a liberdade do comércio, o mercado mundial, a uniformidade da
produção industrial e as condições de existência que lhes correspondem. O
proletariado no poder fá-las-á desaparecer. A sua acção comum em todos os
países civilizados pelo menos é uma das primeiras condições da sua
emancipação.”
Lenine
dá aqui uma interpretação exacta do
texto de Marx, ao reconhecr que a revolução socialista não pode vencer nos
limites da antiga pátria, que não pode conservar-se dentro das fronteiras
nacionais, que a sua acção comum, como justamente o diz Marx, pelo menos nos
países civilizados, têm uma das primeiras condições de emancipação. É claro que
aqui Karl Marx envolve os proletários avançados num sentido elevado de
internacionalismo mesmo antes da vitória revolucionária, e que vê neles uma
base para o desenvolvimento da revolução. A expresssão nação aplicada ao conjunto social que domina o proletariado e que
ele identifica progressivamente consigo mesmo formal como o resíduo vazio de
sentido deixado pela burguesia na sua queda. Ela não permite de modo nenhum
afirmar que Karl Marx haja sonhado com a existência distinta de uma pátria socialista qualquer.
Ressalta
claramente do resto que os limites nacionais perdem o seu significado económico
e político já sob o regime burguês e que eles estão destinados a uma abolição
completa com o desenvolvimento do poder proletário. O desenvolvimento ulterior
da economia capitalista mostrou, no fundo, a justeza desta tese ao realizar a
unidade universal do mercado das matérias primas, dos minérios e dos capitais.
A última guerra acabou de desmascarar o nacionalismo como uma sobrevivência
ultra-reaccionária que não exprimia mais do que os interessses de uma formação
social autónoma, mas que servia de disfarce ideológico às realidades
imperialistas.
Os
pequeno-burgueses de gema e a aristocracia operária dos monopólios não são os
veículos do patriotismo senão na medida da sua sujeição ao grande capital, que faz deles os seus fantoches, alternando a
comédia da defesa nacional com a do wilsonismo, do lucarnismo, etc..Os
operários não têm nenhuma razão de ligação às demarcações nacionais, o que é
manifesto para o internacionalismo operário; é evidente que a base histórica
das suas lutas e das suas experiências revolucionárias conduzirá o proletariado
a abolir as fronteiras, desde que ele realize a tomada do poder em mais do que
um país. O carácter étnico das nacionalidades acaba de perder todo o valor, a
fusão dos elementos étnicos mais disparatados é há muito tempo uma banalidade,
e as fronteiras naturais não são senão fronteiras étnicas
que não resistem à corrente da civilização.
Assim,
a tese internacionalista do marxismo não deve prestar-se a nenhum desprezo; a
expressão que a resume – Os operários não têm pátria –é de
uma clareza irrevogável, marcando a divisão real entre o nacionalismo burguês e
o internacionalismo proletário, sendo que o desenvolviento histórico anterior
desmascarou o carácter nitidamente burguês da ideologia patriótica e nacional.
E todavia Lenine não apagou completamente da sua concepção marxista a
influência desta ideologia patriótica que os elementos marxistas do ocidente
rejeitaram totalmente.
É
interessante notar que quando Lenine polemiza com os reformistas assume as
posições ultra -esquerdistas, enquanto que quando polemiza com os
ultra-esquerdistas toma atitudes reformistas. Esta posição eclética aparece
generalizadamente nele em todas as questões. As oscilações do seu centrismo
estão muito bem caracterizadas em obras tais como A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky, por um lado e a Doença Infantil do Comunismo, por outro.
No passo citado de Contra a Corrente (página
18 no primeiro volume) Lenine polemiza contra os reformistas e social
traidores. Torna-se puramente internacionalista e cita a expressão marxista:”Os
operários não têm Pátria”. Polemizando contra o holandês Nieuwenhus e
comparando–o a Gustavo Hervé, afirma que este último diz uma burrice: “ quando
deste axioma o que se deve tirar é: toda a pátria não é senão uma vaca de leite
para os capitalistas” : a monarquia
alemã e a república é tudo a mesma coisa para os socialistas. Lenine escreveu:
“ Quando na sua resolução, apresentada no
congresso Hervé declara que para o proletariado é totalmente indiferente que o
país se ache sob a dominação desta ou daquela burguesia nacional, formula e
defende um absurdo, pior que o absurdo de Nieuwenhus. Não é de maneira nenhuma absolutamente indiferente
ao proletariado poder, por exemplo, falar livremente a sua língua materna ou
sofrer uma opressão nacional que venha juntar-se à exploração de classe . Em
lugar de extrair premissas que anunciem o socialismo, esta dedução, de que o
proletariado é a única classe que luta até ao fim, certamente contra toda a opressão
nacional, pela completa igualdade dos direitos das nações, pelo direito das
nações a disporem de si mesmas, em lugar disso, Hervé declara que o
proletariado não tem de ocupar-se da opressão nacional, que ignora a questão
nacional em geral.”
Lenine
adopta naturalmente nesta circunstancias o seu métofo preferido das analogias
para poder recusar uma teoria da traição de um homem. Mas isso não tem muita
importancia para nós. O que é mais importante é o conteúdo dessa passagem que
resume a teoria leninista sobre a questão nacional. E ele pretende extrair esta
concepção particular, para ele e para os bolcheviques, das premissas que
anunciam o socialismo!.
Ora,
ele havia já admitido com Marx que “Os
operários não têm pátria” que a questão nacional não pode ter nenhum interesse
para a classe operária. Marx disse claramente que não se pode roubar-lhes (aos
operários) o que eles nunca tiveram.E portanto desta passagem de Lenine resulta
claramente que não se pode roubar a pátria aos operários, que ela não é apenas
um privilégio das classes dominantes, que ela é também uma vantagem das classes exploradas. Com efeito, “não é indiferente sofrer uma opressão
nacional que venha juntar-se à exploração de classe”. Aqui ressalta
claramente a contradição entre o pensamento marxista e o pensamento leninista.
Para Lenine o proletariado deve ter
interesse na questão nacional, deve ser
contra toda a opressão nacional, a saber, contra toda a opressão da pátria, que
segundo Marx, não é nem nunca pode ser roubada. Para Lenine , o proletariado é
mesmo ele o paladino da defesa nacional, pois que representa a única classe que
lutará até ao fim, nomeadamente contra toda a opressão nacional. Aí estão, sem
dúvida, as fontes do nacional-bolchevismo. E quando se tiver bem reflectido
sobre o significado do pensamento leninista, não nos espantaremos que Bukarine
tenha dito em 1923:” O conflito entre a
França e a Alemanha de 1923 não é uma simples repetição do conflito de 1914.
Tem aqui sobretudo um carácter nacional. Por conseguinte o PCA dever dizer claramente
à classe operária da Alemanha que só ela pode defender a nação alemã contra a
burguesia, que vende os interesses nacionais do seu país.”
E,
com efeito, não era a Alemanha, no
espírito e pensamento leninista um país oprimido? Isso não sofre qualquer
dúvida. As regiões alemãs eram oprimidas pela ocupação francesa, era do dever
dos operários alemães lutarem até ao fim pela libertação destas regiões! Para a
libertação da Alemanha da opressão da Entente tudo a gente conhece bem os
resultados da aplicação da táctica leninista em 1923 na Alemanha.
Ressalta
desta experiência desastrosa que quando o proletariado se mete a defender a sua
pátria, a nação oprimida, atinge um
único resultado, isto é, reforça a sua própria burguesia. Mas será necessário
fazer ressaltar ainda uma contradição mais patente, que existe nos artigos de Contra
a Corrente para se dar conta da natureza equívoca do
Nacional-Bolchevismo. No artigo Os Ladrões de Zinoviev ( página 70 do primeiro volume) diz-se
o seguinte: “Enquanto existirem os
estados capitalistas, isto é, enquanto a política imperialista mundial dominar
a vida interior e exterior dos Estados, o direito das nações a dispor de si
mesmas não terá, nem na paz nem na guerra, a menor importância.Mais ainda: no
actual meio imperialista não há lugar para uma guerra de defesa nacional, e
toda a política socialista que faça abstração deste meio histórico e que queira
orientar-se a partir da base isolada de um só país, está condenada a dar com os
ossos em terra.”
Como
acabamos de notar, o imperialismo suprimiu todas as possibilidades de uma
guerra nacional, no sentido marxista do termo, e a opinião de Karl Marx de 1871
encontrou uma base sólida no desenvolvimento adicional do imperialismo
capitalista. Agora, na passagem precipitada parece que o leninismo se aproxima
na sua linha geral desta opinião. Mas não é. Na sua controvérsia com o polaco
social democrata, Lenine, assim,
desenvolve o seu pensamento em contraste com estes últimos: "Claramente os
autores polacos colocam a questão da "defesa da pátria" de uma forma
completamente diferente de como ele é colocada pelo nosso partido. Rejeitamos a
defesa da pátria na guerra imperialista (...). Obviamente os autores das teses
polacas rejeitam em geral a defesa da patria, isto é dizer também para uma
guerra nacional, pensando talvez que as guerras nacionais, na era imperialista,
são impossíveis".
É evidente
que nesta passagem Lenine afirma que para ele as guerras nacionais ainda não
estão terminadas e que admite a defesa da pátria numa guerra nacional. Pode-se
ver claramente que a ideologia leninista também está em contradição com o
marxismo e com ela mesma. Para Lenine, a realidade oscila entre dois pólos que
se negam mutuamente. Por um lado, ele reconhece a terrível realidade da guerra
imperialista, que extrai a sua aparente origem de um conflito nacional, por
outro ele apega-se desesperadamente a um nacionalismo cortado, antiquado, que
quer forçar reviver. E é por isso que ele procura exemplos nas rebeliões
nacionais que posteriormente desmascararam o seu carácter reaccionário e que
não trouxeram qualquer vantagem para o movimento revolucionário do
proletariado. Lenine diz isto: "Os socialistas querem usar, para a sua
revolução, todos os movimentos nacionais que se desencadeiam contra o
imperialismo. Quanto mais clara e acentuada é a luta do proletariado contra a
frente comum dos imperialismos, mais essencial é o princípio internacionalista que
diz: um povo que oprime outros povos não pode ser ele mesmo livre"(21)
Na sua
controvérsia com o panfleto de Junius (página 154 do segundo volume) o
pensamento de Lenine nesta matéria está a tornar-se cada vez mais preciso. Para
Lenine há uma linha divisória desobstruída entre as guerras nacionais e as
guerras imperialistas: "Somente um sofista (página 158) poderia tentar
apagar a diferença entre uma guerra imperialista e uma guerra
nacional...".
E mais
abaixo ele também afirma a possibilidade de uma grande guerra nacional:
"Se o imperialismo fora da Europa permanecesse durante cerca de vinte
anos, sem deixar lugar ao socialismo, por exemplo, por causa de uma guerra
nipo-americana, então seria possível ter uma grande guerra nacional na
Europa".
Junius
(Luxemburgo) argumenta de forma coerente, como marxista, que já não podem ser
feitas guerras nacionais e Lenine exclama que seria falso «estender a avaliação
da guerra actual para todas as guerras possíveis sob o imperialismo, esquecer
os movimentos nacionais que podem ocorrer contra o imperialismo». E ele
acrescenta que é possível até mesmo uma grande guerra nacional! Aqui a
contradição entre o seu pensamento e o
pensamento marxista torna-se cada vez mais aguda, porque para Zinoviev mesmo a
guerra de 1870-71 fechou a era das grandes guerras nacionais na Europa.
Em vão,
página 122-23 do mesmo trabalho, Lenine tenta sair da sua controvérsia contra
os social-democratas polacos, usando o pensamento de Engels contido na obra O
Pó e o Reno. A sua contradição com o marxismo não é menos óbvia. Engels acredita
que as fronteiras das grandes nações européias foram determinadas no curso da
história de que ela percebeu a absorção de várias nações pequenas e
insustentáveis, integradas cada vez mais numa grande pela língua e as simpatias
das populações. Esta tese de Engels já está muito fraca do ponto de vista
histórico. Mas, acima de tudo, Lenine é obrigado a notar que o capitalismo reaccionário,
imperialista, mais e mais frequentemente quebra essas fronteiras
democraticamente definidas. Agora, deve-se notar que a maneira de ver a
influência do capitalismo na agitação das antigas fronteiras que Engels
considerou ser "naturais" não responde absolutamente à idéia mestre
do marxismo contido no Manifesto dos Comunistas na passagem pré-citada: "Já
as demarcações nacionais e os antagonismos entre os povos estão a desaparecer
cada vez mais com o desenvolvimento da burguesia, a liberdade de comércio, o
mercado mundial, a uniformidade da produção industrial e as condições de
existência que lhes correspondem".
Este
processo de desaparecimento das demarcações nacionais não é considerado por
Marx como um fenómeno reaccionário, como afirma Lenine. Lenine considera todo
esse processo e a forma de considerá-lo posto em prática pelos
social-democratas polacos, como o "economicismo imperialista". Aqui
está o que diz: "Os velhos economistas, não dando dando senão uma
caricatura do marxismo, ensinaram aos operários que "o que é
economia" só importa aos marxistas. Os novos "economistas" pensam que o estado
democrático do socialismo vencedor vai existir sem fronteira, (no tipo de um
complexo de sentimento sem matéria)? Será que eles pensam que as fronteiras
serão determinadas apenas pelas necessidades de producção? Na realidade, estas
fronteiras serão democraticamente determinadas, isto é, de acordo com a vontade
e as simpatias da população. O capitalismo influencia violentamente essas
"simpatias" e com isso acrescenta novas dificuldades ao trabalho de
aproximação das nações"(22).
Existe aqui
um claro contraste entre o pensamento leninista e o pensamento marxista. Para
Marx, a burguesia, a organização económica do capitalismo fazem desaparecer as
fronteiras, eliminam as dificuldades nacionais, para Lenine o capitalismo
aumenta essas dificuldades. Pode-se enfatizar que a burguesia foi progressiva
em 1848 e reaccionária na fase imperialista. Haveria uma distinção que não
serviria muito, porque o desenvolvimento da economia mundial não cessou desde
então, mesmo através de crises formidáveis para determinar uma abordagem cada
vez mais estreita entre as populações nacionais, e, por vezes, a fusão dos
elementos nacionais.
O
pensamento leninista nem percebe o lado artificial dos chamados sentimentos
nacionais alimentados expressamente pela burguesia. Ele não percebe que em
alguns estratos da população os sentimentos chauvinistas são um simples resultado
das suas condições económicas. Que hoje o amor pela pátria é relegado nestas
camadas, como já indicámos acima.
O
pensamento leninista parece-nos aqui como um anacronismo histórico, um retrocesso.
Quer alcançar a unidade dos povos voltando a uma base histórica, que o marxismo
já considerava em 1848 como ameaçada. O pensamento leninista neste terreno bem
ignorado pelos militantes ocidentais comunistas pode ser definido concretamente
como reacionário.
Em vez de
combater sentimentos nacionais, que a burguesia tem todo o interesse em manter
vivos, ela incentiva-os, legitima-os, na verdade, uma base moral de
desenvolvimento do socialismo. Ninguém duvida por um momento, lendo a
controvérsia de Lenine contra Junius que o sofismo está do seu lado. De facto,
qual é o único argumento que pode acrescentar contra Luxemburgo? O pretexto subtil
que a dialética pode deslizar para o sofismo. E ele, portanto, apela à dialéctica
dos gregos que não tem nada a ver com a dialéctica materialista, que não é um
método fora da realidade, mas um método na mesma realidade. Porque esta guerra
nacional (a pequena Sérvia revoltada contra a grande Áustria) se transformou na
guerra imperialista não no abstracto, mas na realidade. Provou claramente que o
sofismo estava no terreno das guerras e das questões nacionais no lado de Lenine.
Mas antes
de rever os acontecimentos históricos que vieram para confirmar este
julgamento, não será mau corrigir de uma forma mais clara o pensamento de Lenine
através de uma citação que não pode dar origem a qualquer disputa no seu
conteúdo. No artigo contra o panfleto de Junius (página 158, segundo volume)
Lenine declara claramente a sua fé nas guerras nacionais e estende a sua teoria
à questão colonial: "Guerras nacionais, diz ele, não são apenas prováveis,
são inevitáveis, numa era de imperialismo, do lado das colónias e semicolónias.
Nas colónias e semicolónias (China, Turquia, Pérsia) há populações que atingem
um total de até um bilião de pessoas, ou seja, mais da metade da população do
globo. Os movimentos de emancipação nacionais, deste lado, ou já são muito
fortes, ou crescem e, na maturidade. A continuação da política nacional de
emancipação das colónias será necessariamente em guerras nacionais que cometem
contra o imperialismo. Guerras desse tipo podem levar a uma guerra dos grandes
poderes imperialistas de hoje, mas eles também podem levar a nada, isso vai
depender de númerosas circunstâncias".
Até agora,
observou-se as contradições entre o marxismo e o leninismo no terreno da
questão nacional. Nós apontamos o contraste gritante entre a tese
nacional-bolchevique do leninismo e o internacionalismo marxista dos alemães
esquerdistas, dos polacos e dos holandeses. Aqueles que leram ou vão ler o artigo
O comunismo e a questão nacional de Bordiga em Prometheus de 15 de setembro 1929, observarão que este contraste
(ao ser escondido) igualmente existiu entre o pensamento da esquerda italiana e
o pensamento leninista.
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Não é por acaso, se neste período de
reestruturação feroz do capital, os antigos e os novos nacionalismos levantam a
cabeça – e que muitos de entre eles se tornem violentos e virulentos. Muito
raramente temos escutado o grito de
clarim dos nacionalismos anti-colonialistas depois dos anos 50 e 60, visto que
a maior parte de entre eles ficaram desacreditados pela incapacidade de
responder às nossas esperanças de desenvolvimento. E num contexto de raiva e de
desespero, quando a esquerda e o movimento operário apareciam enfraquecidos, os
nacionalismos étnicos de direita retomavam a iniciativa política. Mas, ainda
uma vez mais, não havia nada de inevitável.
Estas
considerações, que têm entretanto a sua base teórica, na concepção do
materialismo histórico e que contêm o julgamento da concepção nacional do
leninismo, não seriam suficientes, se não confiarem na bancarrota histórica do
nacional-bolchevismo. Muitos militantes comunistas acreditaram até agora que as
tácticas aplicadas pelo leninismo, bukharismo e estalinismo não tinham nada a
ver com o leninismo, eles pensaram que essas linhas tácticas da International
Comunista eram uma degeneração da linha pura do bolchevismo. Isto é também
devido à atitude diplomática de alguns oponentes de esquerda que, como já
apontamos no início deste artigo, esconderam sérias diferenças com o leninismo,
apelando para a degeneração do bolchevismo. As nuances zinovievistas,
bukharinistas, estalinistas e até mesmo trotskistas não se desprendem
absolutamente do nacional-bolchevismo genuinamente leninista.
É por isso
que temos sido obrigados a usar muitas citações de Lenine para que os
trabalhadores comunistas não-fanáticos, que lêem e reflectem, possam entender
que o nacional-bolchevismo tem uma única fonte que está no leninismo.
Mas vamos
passar à análise do processo histórico após a fundação teórica do
nacional-leninismo para ver a natureza anti-proletária e a sua falência
definitiva.
Já vimos
que Lenine, em contraste com a tese marxista de 1871, contemplava a
possibilidade de uma grande guerra nacional na Europa, vimos que Lenine
acreditava num dever do proletariado defender a nação oprimida. Para os
leninistas em 1923, no período da ocupação e da guerra económica do Ruhr, a
Alemanha fazia uma guerra nacional. Eles alegaram que, no rescaldo do Tratado
de Versalhes, a Alemanha se tinha tornado uma nação oprimida. É por isso que
Bukharin na citação já anexada acreditava que o proletariado alemão teve de
defender a nação. Zinoviev na Rote Fahne de 17 de Junho de 1923 disse que os
comunistas são os verdadeiros defensores do país, do povo e da nação. Bukharin
e Zinoviev eram então leninistas, bolcheviques puros. Lenine em Contracorrente
não tinha previsto a "grande guerra nacional"? Claro que sim.
Zinoviev esqueceu o seu artigo dos Saqueadores, mas Lenine não tinha esquecido
em 1916 as suas considerações de 1914 contra os reformadores? Radek, exaltando
Schlageter e entrando em polémica amigavelmente na Rote Fahne com o fascista
Réventlow, era também ele um leninista coerente, porque passou a defender a
Alemanha oprimida contra o imperialismo do Acordo e a burguesia alemã traidora.
Certamente a Ruth Fischer ultrapassou um pouco os limites do leninismo, quando
ela prosseguiu, na frente dos estudantes racistas, a sua justificação do
anti-semitismo fascista para salvar a pátria oprimida, mas isso foi apenas uma
imprudência devida a um temperamento excessivo. Apenas uma atitude leninista em
Paul Froelich quando ele escreveu na Rote Fahne de 03 de Agosto de
1923:"Não é verdade que nós outros comunistas fomos durante a guerra
anti-nacionais. Nós éstavamos contra a guerra, não porque nós éramos anti-alemães,
mas porque a guerra serviu somente aos interesses do capitalismo... por esta
razão nós não negamos a defesa nacional onde é colocada na agenda!"
Lenine
disse que ele rejeitou a defesa da pátria numa guerra imperialista, mas não de
uma forma geral? Vemos claramente que nem Zinoviev, nem Bukharin, nem Radek,
nem Froelich traíam o leninismo na sua estratégia de 1923. Foi apenas o
leninismo que matou a Revolução alemã, foi o nacional-bolchevismo que, fingindo
salvar a nação contra a burguesia alemã, salvou a burguesia contra o
proletariado alemão. A atenção do proletariado foi afastada do seu principal
objectivo: a luta contra o capitalismo internacional, portanto, o sem pátria
alemão estava tão longe do sem pátria de outras nações, a conversar de opressão
nacional, de traição nacional da burguesia alemã e outros cânticos pequenos
burgueses. Quais foram os resultados da aplicação subsequente da táctica
nacional leninista no 23 alemão? Que o proletariado foi espancado, que a
burguesia alemã fortaleceu tanto que Bukharin no VI° Congresso do Internacional
Comunista foi forçado a revelar-nos a ressurreição do imperialismo alemão!
Isto assim
que a ideologia nacional leninista, pelo menos para o que diz respeito à
"grande guerra nacional europeia", encontrou o seu fim no 23 alemão.
E por trás deste fim aparece a imagem sangrenta do autor do livreto de Junius
gritando: «Não há mais guerra nacional sob o imperialismo capitalista».
Mas se a
grande guerra nacional europeia encontrou a sua sepultura no 23 alemão, as
pequenas guerras nacionais das colónias e semi-colónias (Turquia, Persia e
China) igualmente morreram no pântano da reacção imperialista. Eles também não
foram capazes de escapar à influência do ambiente histórico dominado pelo
capitalismo. A história das guerras nacionais chinesas e turcas é a história
bem conhecida de Kémal Pacha e Chang-Kai-Chek. Estas são as duas tragédias
sangrentas onde o proletariado e os comunistas turcos e chineses fizeram o
papel da vítima. A Rússia de Lenine, do bolchevismo, da edificação socialista
deu as armas para estas guerras nacionais a Chang-Kai-Chek e a Kémal Pacha;
Estes últimos, imediatamente arrastados no círculo da política imperialista, têm
feito com os imperialistas frente unida contra o proletariado, eles usaram as
armas que a Rússia lhes proporcionou contra o proletariado e os comunistas. E
no entanto, a táctica pura leninista foi aplicada nestas circunstâncias, apesar
do que dizem Trotsky e os seus seguidores. Foi dito ao proletariado chinês, ao
proletariado turco para defenderem a sua pátria oprimida pelos imperialistas e
agentes dos imperialistas; proclamou-se a cruzada das nações oprimidas contra o
imperialismo. Lenine não tinha mesmo também recomendado o uso da frente única
das nações oprimidas contra o imperialismo? Certamente não é possível esperar que a luta pela defesa da
nação oprimida possa ser conciliada com o interesse revolucionário dos
trabalhadores, porque a luta do proletariado contra o capitalismo e o
imperialismo internacional é a luta contra a sua burguesia, não em nome de
própria nação, mas em nome do proletariado internacional. O que importou mais
na China ao proletariado chinês e internacional era a entrada da classe operária
chinesa na luta revolucionária proletária e não na luta nacional, que era reaccionária
na sua essência, que não poderia conduzir absolutamente na emancipação nacional
da China, mas em todos os casos ao laço da burguesia chinesa com o
imperialismo. Podemos chamar guerras nacionais hoje a conflitos que não podem
escapar do ambiente histórico do imperialismo? Não, claro que não. Além disso,
a ideologia das guerras nacionais, da pátria não capitalista, não imperialista,
falhou completamente em terríveis derrotas e num mar de sangue proletário. E a
cruzada sagrada das nações oprimidas contra o imperialismo opressor transforma-se num vínculo das burguesias
locais e contra o proletariado mundial.
Se na China
e na Turquia a lenda da guerra nacional foi resolvida com uma tragédia, no
Afeganistão e na Persia morreu sob o riso da história na farsa de Amanoullah.
As próprias
colónias, o Egipto, a Índia, estes países que incorporam milhões de homens e
que Lenine esperava lançar no seu fogo nacional contra o o imperialismo do colosso
capitalista, não nos permitem uma guerra nacional. Porque no Swaraj, no Wafd,
etc, a burguesia local já perdeu a sua agressividade nacional, e procura o
compromisso, a aliança submissa com o colosso imperialista. E, no entanto, os
implacáveis leninistas ainda preparam novas cruzadas nacionalistas, isto é,
novos massacres de proletários coloniais em vez de preparar a revolução
socialista através do desenvolvimento da consciência do proletariado dos mesmos
países.
Que
conclusões podem ser extraídas desta análise de pensamentos e factos sobre a
questão nacional?
Que não há nenhuma questão
nacional para o proletariado, que os trabalhadores não podem tirar proveito da
existência para eles de uma pátria e que eles não têm de lidar com a opressão
nacional, o direito das nações a dispor delas próprias. O proletariado desenvolve o seu movimento,
faz a sua revolução como classe e não como nação. Imediatamente após a vitória
do proletariado em várias nações, as fronteiras só podem desaparecer. A tese
leninista da autonomia nacional dos Estados socialistas é um absurdo. Lenine
diz que enquanto o estado existe, a nação continua sendo uma necessidade.
Agora, a nação é apenas um produto do estado burguês e não do estado
proletário. Os Estados proletários só podem esforçar-se para unir-se e suprimir
as fronteiras. Muito mais: o socialismo como ordem económica e social só pode
ser alcançado com base no desaparecimento total das fronteiras. A abolição das
diferenças económicas nacionais não pode ser alcançada sem a abolição dos
limites nacionais que, de outro modo, são artificiais e convencionais. A
ditadura proletária, o estado operário, que não é o estado burguês, só pode ter
um carácter universal e não nacional, democraticamente unitário e não
federativo. Os comunistas marxistas não têm de construir os Estados Unidos da
Europa ou do mundo, o seu objectivo é a República universal dos conselhos operários.
Os comunistas marxistas
devem propagar, como resultado, entre as grandes massas operárias o ódio pela
pátria, que é um
meio para o capitalismo de semear a divisão entre os proletários dos diferentes
países. Eles devem recomendar entre as grandes massas operárias a necessidade
da fraternidade, da união Internacional de todos os proletários em todos os
países. Eles devem combater furiosamente não só todas as tendências
chauvinistas, fascistas ou social-democratas que envenenam os mesmos ambientes operários,
mas também todas as tendências disfarçadas, que tentam dar uma base qualquer
para o ideal nacional. Eles devem lutar contra o mito das guerras nacionais, o mito
das cruzadas anti-imperialistas populares. Eles devem enraizar-se, usando a
experiência histórica, nas profundezas das massas proletárias, a fé na vitória
do socialismo, apenas em bases puramente de classe, puramente
internacionalistas.
Devemos,
portanto, concentrar todos os nossos esforços na revitalização do verdadeiro
internacionalismo marxista em que os social-reformistas sociais e os
nacional-bolcheviques têm semeado a
confusão.
Sabemos
muito bem que a nossa propaganda não pode sozinha fazer este esforço de trazer
o internacionalismo para as massas e de desenvolvê-lo até um grau desconhecido
até agora. Sabemos que a nossa propaganda, embora seja necessária, não terá a
menor influência, se os desenvolvimentos adicionais do processo histórico não se
encarregarem de a confirmar. Mas também sabemos que estes desenvolvimentos só
podem empurrar o proletariado para as posições que os verdadeiros
internacionalistas nunca traíram, que Rosa Luxembourgo preservou até à sua
morte.
Seria contudo imprudente subestimar a subida
do nacionalismo de que temos sido testemunhas neste período de globalização. E
devemo-nos lembrar que a necessidade, para os
socialistas, de colocar à frente das suas posições nacionalistas é
talvez mais urgente do que nunca, agora que a maioria da esquerda adoptou o nacionalismo
em 1914. Para o fazer teremos
necessidade de análises da tradição do socialismo internacional e de as
desenvolver em relação às questões políticas do espaço, dos estados nação, da
globalização económica, e da crítica da forma do Estado nação burguês a partir
de uma perspectiva do socialismo vista de baixo.
Notas
(1) Robert Bibeau (2016) Questão nacional
e revolução proletária. Url:
Http://les7duquebec.com/7-au-front/question-nationale-et-Revolution-proletarienne
(2) Robert Bibeau (2016) Os mistérios
dourados finalmente revelados. URL: http://www.les7duquebec.com/7-au-front/Les-Mysteres-aurifaires-enfin-reveles Acordos de Bretton Woods.
URL: http://www.les7duquebec.com/actualites-des-7/Le-troisieme-Stade-de-la-crise-systemique-Mondiale/
(3) Direitos de saque especiais. URL: http://www.les7duquebec.com/7-Dailleurs-invites/Mort-et-Resurrection-du-Veau-dor-Americain/
(4) Marx à S. Meyer e A. Vogt, em Marx-Engels,
Correspondências. Url:
Https://www.marxists.org/Francais/Marx/Correspondance.htm
(5) Robert Bibeau (13.10.2014) Estados
Unidos-China, o grande confronto. URL: http://www.les7duquebec.com/actualites-des-7/Etats-Unis-Chine-la-grande-Confrontation/
Robert Bibeau (10.07.2016) Aliança de
Xangai contra a União Europeia. URL: http://www.les7duquebec.com/actualites-des-7/Alliance-de-Shanghai-contre-Union-Europeenne
(6) Conferência em Bandung. URL: https://fr.wikipedia.org/wiki/conf%C3%A9rence_de_Bandung
(7) Luniterre (21.07.2016) Controvérsia com Robert Bibeau. URL: https://tribunemlreypa.WordPress.com/2016/07/22/un-Nouvel-Echange-polemique-avec-Robert-bibeau/
(8) Robert Bibeau (8.07.2016) Ferguson,
Minneapolis, Dallas, mesmo proletariado mesma luta. URL: http://www.les7duquebec.com/7-Dailleurs-invites/Ferguson-Minneapolis-Dallas-proletariat-meme-Combat/
(9) Robert Bibeau (8.07.2016) Ferguson,
Minneapolis, Dallas, mesmo proletariado mesma luta. URL: http://www.les7duquebec.com/7-Dailleurs-invites/Ferguson-Minneapolis-Dallas-proletariat-meme-Combat/
(10) Pierre Souyri (1979). Notas de leitura. Nós usamos a versão do texto publicado no blog Spartacus em 20.07.2016. URL: http://spartacus1918.canalblog.com/archives/2016/07/20/34091094.html
As notas de
leitura de Pierre Soury referem-se ao
volume de Georges, Michel Lowy, Claudie
Weill. Os marxistas e a questão
nacional, 1848-1914. Paris, Maspero. 1974. P. 391 Notas de leitura por Pierre
Souyri publicadas no Annales em julho-agosto 1979. O livro foi reimpresso
por L’Harmattan, Paris, em 1997.
(11) Paul
Mattick (1959) Nacionalismo e socialismo.
Publicado em inglês no The American
Socialist em setembro de 1959, em francês na Front Noir (fevereiro 1965) e no ICO n° 99 (Novembro 1970).
(12) David McNally (1996) Marxismo, nacionalismo e lutas nacionais
hoje. Documento de discussão do New Socialist Group (1996). Tradução do
inglês de La Gauche. Notas não
publicadas.
(13) Citado em James M. Blount, A Questão
Nacional: Descolonizar a Teoria do Nacionalismo. Pag. 67.
(14) Lenin. Trabalhos selecionados.
Vol. 1. Éditions de Moscou. Pag. 409.
(15) Partido dos trabalhadores socialistas (1974) A dinâmica da revolução mundial
hoje. Swp. Pag. 137.
(16) New Socialist (1996) Red Power, uma
entrevista com Howard Adams. New Socialist. No. 2. março-abril 1996.
(17) L’Ouvriere Communiste, n ° 2/3, de outubro 1929. Leninismo ou marxismo? Imperialismo e a questão nacional. URL: https://bataillesocialiste.WordPress.com/Documents-historiques/1929-10-leninisme-ou-Marxisme-limperialisme-et-la-question-Nationale-GOC/
(18) Karl Marx (1848) Sobre o sistema
nacional da economia política de Friedrich List. Discurso sobre o comércio
livre.
(19) Stalin (1913). O marxismo e a
questão nacional e colonial. Url:
Http://spartacus1918.canalblog.com/archives/2016/07/20/34091094.html
(20) Lenin. Zinoviev (1914-1915) Contracorrente.
Traduzido por V. Serge e Parijanne. Página 213. URL: http://Gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k96333462
(21) Lenin. Zinoviev (1914-1915) Contracorrente.
Traduzido por V. Serge e Parijanne. Página 139. URL: http://Gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k96333462
(22) Os "economistas"
formaram uma tendência da democracia russa atribuindo uma importância absoluta
à luta por as reivindicações económicas parciais.
CONTEÚDO
RESUMO
PREFACIO
CAPÍTULO 1 Questão nacional e revolução proletária
CAPÍTULO 2 Ferguson, Minneapolis, Dallas, mesmo
proletariado, mesma luta
CAPÍTULO 3 Os marxistas e a questão nacional
CAPÍTULO 4 Nacionalismo e socialismo
CAPÍTULO 5 Marxismo, nacionalismo e lutas nacionais hoje
CAPÍTULO 6 Leninismo ou marxismo? Imperialismo e a
questão nacional
NOTAS
Página 4 da capa de cobertura
Nesta era imperialista moderna, a política proletária sobre a questão nacional deve ser revista a fim de colocá-la na perspectiva da luta de classes. Desde Lenine e os bolcheviques, a esquerda esqueceu que o proletariado não tem pátria e que as lutas de libertação nacional da burguesia nunca levarão à luta revolucionária dos proletários para erguer o modo de producção comunista.
Para o demonstrar, Robert Bibeau, editor da revista online Les7duquebec, apresenta e comenta seis textos de autores marxistas que apresentam um ponto de vista original sobre a questão nacional e a luta pelo “direito dos povos à autodeterminação” sob o imperialismo moribundo.
Bio
Robert Bibeau foi activista em grupos de esquerda nas décadas de 1970 e 1980, e depois activista sindical nos anos 1990. Ele é agora editor da revista internacional da web http://www.les7duquebec.com. Robert Bibeau é o autor dos volumes: Le "projet" de Fatima (2012), L’Harmattan, Paris. Manifesto do partido Operário (2014), Publibook, Paris. E Narcissism, Neurosis of an Era (2015), Publibook, Paris.
Conclusões
Pg 128/130
Que conclusões se podem tirar desta análise de pensamentos e de factos sob a questão nacional?
1. Que não existe questão nacional para o proletariado, que os operários não
podem tirar nenhuma vantagem da existência para eles de uma pátria e que eles
não têm de se ocupar de opressões nacionais, do direito das nações a disporem
de si próprias. O
proletariado desenvolve o seu movimento, faz a sua revolução como classe e não
como nação. Tão rapidamente quanto a vitória do proletariado nas diversas
nações, as fronteiras não podem deixar de desaparecer. A tese leninista da
autonomia nacional dos estados socialistas é um non-senso. Lenine afirma que
enquanto exista o Estado a nação permanece uma necessidade. Ora, a nação não é
senão um produto do estado burguês e não do estado proletário. Os estados
proletários não podem senão tender a unificarem-se e a suprimir as fronteiras.
Ou melhor ainda: o socialismo, em tanto que ordem económica e social não pode
realizar-se senão na base da desaparição total das fronteiras. A supressão das
diferenças económicas nacionais não pode realizar-se sem a supressão dos
limites nacionais que são sempre artificiais e convencionais. A ditadura
proletária, o estado operário, que não é o estado burguês nem pode ter senão um carácter universal e
nunca nacional, democraticamente unitário e não federativo. Os comunistas
marxistas não podem edificar os Estados Unidos da Europa ou do Mundo, o seu fim
é a República Universal dos concelhos operários.
2. Os comunistas marxistas devem propagar, em consequência, entre as largas
massas operárias o ódio à pátria, que é o meio para o capitalismo semear a divisão entre os
proletários dos diferentes países. Devem
preconizar entre as massas operárias a necessidade da confraternização, da
união internacional de todos os proletários em todos os países. Devem combater
encarniçadamente não apenas todas as tendências chauvinistas, fascistas ou
social-democratas, que envenenam até
os meios operários, mas também todas
as tendências mesquinhas que tentarão dar uma base qualquer ao ideal nacional.
Devem combater contra a lenda das guerras nacionais, a lenda das cruzadas populares anti-imperialistas. Devem incutir,
utilizando a experiência histórica, no mais profundo das massas proletárias a
fé na vitória do socialismo, nada senão
em bases puramente classistas, puramente internacionalistas.
3. Em consequência, é preciso conduzir
todos os nossos esforços para o renascimento do verdadeiro internacionalismo
marxista, no qual os social- reformistas e os nacional-bolchevistas semearam a
confusão.
4. Sabemos muito bem que a nossa
propaganda não pode por si só realizar este esforço de ligar o
internacionalismo entre as massas e desenvolvê-lo até um grau desconhecido no
momento presente. Sabemos que a nossa propaganda, muito embora necessária, não
terá a menor influência se os desenvolvimentos ulteriores do processo histórico
não se encarregarem de o confirmar. Mas sabemos também que estes
desenvolvimentos não podem senão empurrar o proletariado para as posições que os
verdadeiros internacionalistas nunca trairão, que Rosa Luxemburgo conservou até à morte.
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