segunda-feira, 7 de junho de 2021

Questão Nacional e Revolução Proletária Sob o Imperialismo Moderno, de Robert Bibeau

 




Introdução à “Questão Nacional e Revolução Proletária Sob o Imperialismo Moderno”.

O camarada Arnaldo Matos faleceu há mais de dois anos. Deixou-nos um enorme património político e ideológico, onde se incluem duas peças fundamentais que ajudam a classe operária e os revolucionários marxistas a compreender os erros e desvios que ocorreram durante e na sequência das Revoluções de Outubro de 1917, na Rússia, e de Democracia Nova, em 1949, na China.

Pouco antes de falecer, manifestou a sua vontade de publicar o livro de Robert Bibeau,  “Questão Nacional e Revolução Proletária Sob o Imperialismo Moderno”. Para tal, deixou uma tradução quase completa – que tive a honra e enorme gosto de concluir – da obra citada, acompanhada de quatro importantes conclusões/notas finais, que reproduziam teses emanadas do próprio livro em causa e que sintetizavam a justeza da análise marxista contida nesta obra de grande fôlego. 

Fruto de uma visão oportunista do centralismo democrático, temos assistido, objectivamente, ao boicote da publicação desta obra, uma visão que assume possuir um papel de tutor ungido, que determina o  que os proletários e os revolucionários, em Portugal, podem ou não, devem ou não ler.

Quem já teve  oportunidade de ler a palestra que o camarada Arnaldo Matos proferiu no 1º de Maio de 2008 e as suas “Teses da Urgeiriça”, compreenderá certamente a importância desta questão para os marxistas. Aliás, no Plano de Acção que foi aprovado, por unanimidade, no I Congresso Extraodinário do PCTP/MRPP, que ocorreu em Lisboa, nos passados dias 18 e 19 de Setembro de 2020, a QUESTÃO NACIONAL é um dos temas centrais.

Constatatando a paralisia e deriva daqueles que assumiram este boicote, decidi proceder à publicação da supracitada obra para que, tal como era desejo do camarada Arnaldo Matos, ela possa ser alvo do estudo, análise, debate e aplicação prática por parte dos marxistas portugueses. 

Ao mesmo tempo, espero com a sua publicação  dar um contributo para que a esquerda dê uma pedrada no charco putrefacto do oportunismo, do revisionismo e do neo-revisionismo.

Como se compreenderá, para os marxistas, a Questão Nacional é central à estratégia e à táctica dos comunistas nesta fase final do imperialismo moribundo, a braços com uma crise sistémica profunda. Sem compreender esta questão, os marxistas não poderão – nem saberão -  enquadrar adequadamente a estratégia e a táctica que o camarada Arnaldo Matos apontou aos comunistas portugueses – e de todo o mundo – para o Século XXI, o Século do Comunismo e da implantação das relações de producção comunistas. Não compreenderão porque é que o camarada afirmou que a estratégia é o marxismo e a táctica transformar as guerras imperialistas em guerras cívis revolucionárias.

A publicação desta obra visa, também, dar um combate sem tréguas ao oportunismo, ao revisionismo, que alimentam os equívocos “nacionalistas” burgueses que visam desarmar o proletariado e atirá-lo para os braços das “suas” burguesias.

E isto porque, tal como se afirma no livro em causa,Em caso algum, o Estado nacional burguês pode tornar-se um agente da emancipação da classe operária. Ao contrário, o Estado nacional burguês e a ideologia nacionalista burguesa que pretende legitimá-lo são os alienadores da opressão da classe operária, única classe revolucionária sob o capitalismo decadente. Depois da emergência do imperialismo moderno, fase última do modo de producção capitalista, as lutas ditas de “libertação nacional anti-imperialista“ são guerras reaccionárias conduzidas pelas burguesias nacionais chauvinistas para assegurar o seu estatuto de guardiães dos interesses de uma aliança imperialista contra outra.

Luis Júdice



Robert Bibeau

 

                                    Questão Nacional e Revolução Proletária

                               Sob o Imperialismo Moderno

 

 

Prefácio

 

Robert Bibeau

 

             Contrariamente às pretensões dos independentistas e mau grado a barragem mediática envolvendo alguns acontecimentos nacionalistas (Brexit, referendos catalão e escocês, separatismos flamengo e do Quebec), a questão nacional está cada vez menos presente no espírito do proletariado internacional. A bem dizer, apenas a direita e a esquerda  burguesas se inflamam a propósito das veleidaddes nacionalistas chauvinistas. O aprofundamento da crise económica sistémica do imperialismo provoca grandes desordens políticas, militares e sociais, entre elas o ressurgimento das veleidades  nacionalistas gregárias  no seio da pequena burguesia, mas isso passará.

            É preciso remontar a Lenine, aos bolcheviques e à Revolução Russa para redefinir a origem da confusão, e distinguir entre as lutas de libertação nacional burguesas (ditas de independência nacional) e as lutas anticapitalistas internacionalistas da classe proletária.

             De seguida, sucede que Estaline levantou o estandarte do nacional -bolchevismo russo mais alto que o do nacional-socialismo alemão e a URSS esmagou a potência alemã dos Krupp e dos Messerschmitt, antes de se afundar por seu turno. Após o nacional-bolchevismo, o nacional-maoismo montou o cavalo de Tróia do nacionalismo burguês e inventou  a luta entre os Três Mundos: o mundo nacional-imperialista das duas super potências; o mundo nacional-capitalista das potências secundárias e o mundo nacional terceiro-mundista dos países não alinhados, presa dos dois primeiros mundos e que a China maoista teria almejado enfeudar – Deng Xiauping, o Estaline chinês desencadeou a ascensão económica na China e assegurou a esta potência emergente os meios industriais e financeiros das suas ambições mundializadas.    A infelicidade do capital chinês está em que a sua ascensão sobreveio no momento em que o modo de produção capitalista mundializado  no seu estado imperialista declinante completa a conquista do planeta. O imperialismo mundializado, tendo atingido o seu apogeu, não pode senão declinar. Isto é, o capital na China, na Índia e em África completa a proletarização dos últimos camponeses semi-feudais, a conquista dos últimos mercados e a prospecção das últimas regiões  de recursos excêntricos. Um século após a predicção de Lenine, a insurreição popular mundial está na ordem do dia e o proletariado chinês ( e não o campesinato chinês como pensava Mao) pode bem dar o golpe de arranque insurreccional internacional. Esta evolução acarreta que a questão nacional terá menos importância na política mundial, porquanto as duas classes que lutam pela hegemonia são as duas classes nascidas do desenvolvimento capitalista industrial urbano : a classe capitalista multinacional  decadente e a classe proletária internacional emergente. Desta guerra de titãs nascerá seguramente o modo de producção proletário comunista que nós não conhecemos e que o proletariado deverá aprender a dirigir, se ao menos a vanguarda da esquerda burguesa poder conter-se e deixar andar a classe operária revolucionária.

   Neste opúsculo, juntámos alguns textos que tratam da questão nacional. Alguns dos seus autores adoptam uma postura marxista e condenam toda a posição que, no seu modo de ver, não corresponde ao canone marxista. Este comportamento sectário e dogmático é herança da II, da III e da IV Internacionais e da integração destas organizações no aparelho de Estado burguês. A bolchevização das organizações de esquerda foi marcada pela prática da exclusão dos dissidentes e pela glorificação dos gurus pelos seus agentes. Embriagados pelo centralismo democrático militarizado, com o fim de proteger a pureza ideológica e a lealdade sectária em relação aos seus mestres efémeros. Quem já não ouviu falar do Pai dos povos e do Grande Timoneiro? Esta exclusão, que em primeiro lugar surpreendeu a esquerda alemã, holandesa, polaca, italiana e francesa teve como consequência infiltrar as seitas saídas desta oposição. Hoje em dia, cada seita de esquerda pratica a exclusão, a divisão e a recusa de debate, isolando ferozmente os seus partidários de toda a influência proletária. Avaliar o nível da concordância de uma linha política de classe com uma referência estatutária, seja a Marx ou a Engels, a Bukarine ou Lenine, Trostky ou Estaline, Mao ou Gramsci, é uma prática ideológica dogmática, anti-materialista dialéctica, que impede validar uma análise de classe e que apenas alcança medir a conformidade de uma ideia com a de um dogma sacralizado e fingido. Da nossa parte, não aderimos a nenhuma seita, a nenhum dogma, totalmente enfeudados como estamos à classe proletária e aos seus interesses revolucionários e ao método materialista histórico e dialéctico.

                                                                                                   Robert Bibeau

                                                                                            Director da revista Web

 

                                                                                 http://www.les 7 duquebec. com  

 

Capítulo 1

           Questão Nacional e revolução

            proletária       

 

Robert Bibeau

  

          Nação e Estado-nação, Dois Estandartes da Esquerda Burguesa

 

Nação e Estado-nação são as formas singulares das relações de producção geradas pelo modo de producção capitalista (MPC). Quando este modo de producção atingiu o seu apogeu e a contradição fundamental que rege este sistema começou a entravar a valorização do capital; quando as relações de producção nacionais pareceram demasiado estreitas para permitirem a reprodução alargada do capital e o desenvolvimento das forças produtivas sociais, nação e Estado-nação tornaram-se entraves de que o MPC procurou desembaraçar-se, esperando assim gerar uma nova era de prosperidade mundializada. Em 1971, a revogação dos acordos de Bretton Woods pôs fim aos entraves monetários perante a imperiosa urgência de liberalizar e democratizar as trocas internacionais. Os esforços para transformar o dólar americano em divisa do comércio internacional, da mesma maneira que, em consequência das malversações para fazer emergir o euro como divisa alternativa do comércio mundial, ou ainda, as maningâncias para com ele substituir o yuan nacional chinês ou os direitos de saque especiais (DTS), demonstram as dificuldades do sistema financeiro mundializado. 

  Nem a preservação nem a conversão das relações de producção nacionais poderão assegurar a perenidade deste modo de producção moribundo. A contradição fundamental que rege este sistema não se situa entre as forças produtivas internacionais e as relações de producção nacionais, mas no próprio seio das forças produtivas sociais, entre o capital morto – constante- robotizado e digitalizado, - já valorizado absorvendo o capital vivo – variável – a força de trabalho social geradora da mais-valia, mas ainda não validada pela colocação em marcha dos produtos, eis todo o drama deste modo de producção e o limite da sua expansão.

A classe proletária internacional não deve meter-se a reboque das burguesias nacionais para tentar preservar as relações de producção nacionais submetidas às vicissitudes das crises sistémicas do capitalismo mundializado. As estruturas nacionais burguesas desusadas são inoperantes perante a crise sistémica do modo de produção capitalista. Todas as estruturas nacionais e ou multinacionais do capitalismo GNU, CPI, FMI, BM, OCDE, OTAN, União Europeia, Organização de Cooperação de Shangai, Comunidade dos Estados Independentes, são obsoletas e devem ser destruídas pela insurreição popular. Em caso algum, o Estado nacional burguês pode tornar-se um agente da emancipação da classe operária. Ao contrário, o Estado nacional burguês e a ideologia nacionalista burguesa que pretende legitimá-lo são os alienadores da opressão da classe operária, única classe revolucionária sob o capitalismo decadente. Depois da emergência do imperialismo moderno, fase última do modo de producção capitalista, as lutas ditas de “libertação nacional anti-imperialista“ são guerras reaccionárias conduzidas pelas burguesias nacionais chauvinistas para assegurar o seu estatuto de guardiães dos interesses de uma aliança imperialista contra outra.

 

APOGEU E DECLÍNIO DO IMPERIALISMO AMERICANO

 

Os Estados Unidos da América, primeira potência imperialista do séc. XX, foram inexoravelmente empurrados contra a França (com a aquisição da Luisiana em 1803), contra o Canadá (guerra de 1812), contra os restos do Império espanhol (1819), contra o México (1845-1853), e depois duas facções do capital americano viraram-se uma contra a outra, a Confederação esclavagista do Sul contra a União Capitalista do Norte (1861-1865). Mais de 620.000 trabalhadores-soldados perderam a vida nesta guerra nacional, pois, refeita a unidade, a marcha  sanguinária para o Norte foi retomada. Mais tarde, ambas atacaram o Império comercial e industrial britânico e o segundo império francês, que desintegraram a fim de impor o imperialismo moderno – financeiro - no lugar do imperialismo colonial-comercial, antigo, que não podia seguir porque provocava a ira e sublevações constantes das burguesias nacionais coloniais, desejando-se libertar politicamente das metrópoles opressivas, a fim de pôr como intermediários nacionais da exploração da força de trabalho, local, entregando eles mesmos a mais-valia ao imperialismo mundializado, globalizado. Todas as guerras ditas de libertação nacional apoiam-se neste ponto crucial: qual a parte da exploração de trabalho assalariado local que será entregue aos capitalistas estrangeiros? É o que o presidente americano Teodoro Roosevelt compreendeu antes de Lenine e dos bolchevistas, sentimento nacionalista chauvinista que os EU exploraram para desalojar as ex-potências coloniais comerciais concorrentes e aí substituir  o  imperialismo financeiro, sobre o qual Lenine escreveu brilhantemente,  explicando que mesmo quando oposto ao capitalismo colonial e comercial, o imperialismo financeiro não explora  menos a classe proletária, única  produtora da mais-valia  e inimiga jurada do capitalismo mundializado.

Quando parecia evidente que os bolcheviques não entendiam partilhar os frutos da exploração do proletariado nacional soviético com o imperialismo ocidental, o conflito degenerou em guerra total  entre  o império dos sovietes  e o império ocidental, dirigido primeiramente pela Europa  e em seguida pela América. A guerra a acabar entra então numa fase em que, após muitas desventuras, se concluiu em 1991, com o triste Sr. Boris Eltsine,  inimigo turiferário (lisonjeador, bajulador) mortuário da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

Durante um século, os Estados Unidos foram os aliados das burguesias nacionalistas terceiro-mundistas (pseudo não-alinhadas), desejosas de partilhar com os negociantes de guerra ocidentais uma parte da mais-valia produzida localmente.

E todos vimos Mandela pavonear-se sobre as estradas do anti-apartheid onusino  (que os sul-africanos percorrem ainda hoje). Ho Chi Minh, Chou Enlai, Pol Pot, Ceausescu, Tito, Nasser, Gandhi, e os outros, todos felizes de colaborar com o capital americano para obter a sua pitança nacional, mais abundante do que a que lhes propunha Estaline, Krouchov e Brejnev, dirigindo a partir de um império industrial ultrapassado, pré-financeiro. Hoje vemos Castro – o irmão do outro- que empreende a sua viagem a Canossa a fim de obter um salvo conduto dos Estados Unidos para a sua integração no modo de producção capitalista.

Não se pode conduzir uma guerra anti-imperialista que não seja também uma guerra anti-capitalista, anti-nacionalista e anti-burguesa. Todas e cada uma destas lutas ditas de libertação política nacional conduziram à consolidação de facções capitalistas nacionalistas e à alienação da classe proletária nacional. Seja a URSS, a China, a Coreia do Norte, o Vietname, o Cambodja, a Argélia, Cuba, Angola, a Nicarágua, a Etiópia, os países de Leste, a Albânia, a África do Sul, o Nepal ou a Palestina, etc., outras tantas experiências nacionalistas que sem a eliminação do modo de producção capitalista, fonte de todas as alienações, se tornaram um desastre para a classe proletária alienada desses países gangrenados e que devem hoje libertar-se das suas novas algemas.

Reforma ou Revolução?

É todavia verdade que nas vãs tentativas para salvar o seu capital e o seu modo de produção moribundo, a classe capitalista internacionalista tenta desmantelar as antigas relações de producção e as antigas estruturas de governação nacional para as transformar em qualquer coisa de multinacional, mas tendo as mesmas funções económicas, políticas, jurídicas, diplomáticas e militares exploradoras e repressivas. Estas transformações do aparelho de governação imperialista não visam transformar a essência do modo de producção capitalista, mas adaptá-las às exigências novas da economia política imperialista moderna. Os esforços dos populistas e dos esquerdistas para orientar estas reformas não constituem contribuições à substituição do capitalismo, como também não sucedia com os artesãos luddistas que destruíam as máquinas de fiar na Inglaterra do século XIX não contribuíam para emancipar o proletariado britânico. Assim, o Brexit não é uma resistência ao imperialismo estadunidense, mas uma adesão ao imperialismo chinês, ou um pedido de renegociação das entidades com o imperialismo europeu que, tanto uma como outra não trarão nada ao proletariado britânico. Estes fúteis esforços da parte da oligarquia reformista não fazem senão prolongar a agonia deste modo de producção moribundo, da mesma maneira que os cânticos da direita nacionalista e as lamúrias da direita reaccionária para preservar as velhas castas (coquilles) nacionais.

É o modo de producção que deve ser substituido. A única solução consiste em criar um novo modo de producção não socialista mas proletário comunista. Deste novo modo de producção surgirão novas relações de producção adaptadas a esta nova maneira de produzir, de comunicar, de distribuir as trocas, de repartir não as mercadorias, substituidas pela mais valias espoliadas, mas dos bens sociais que servem à reprodução colectiva da  vida em sociedade, pois é preciso nunca  esquecer que  a finalidade de o todo o modo de producção é assegurar as condições de reprodução da vida humana. Sabemos muito poucas coisas a propósito deste novo modo de producção proletário comunista e do nome da classe que o fará surgir das suas mãos, da sua experiência e dos seus conhecimentos. As únicas coisas que sabemos com certeza é que este modo de producção será internacional, global, ao serviço do Homem – sem classe social – não mercantil (adeus mercadoria, mais-valia, lucro, moeda, capital, propriedade privada, salariato e Estado). Este novo modo de producção não se assemelhará sobretudo ao que nós conhecemos sob o capitalismo nas suas declinações ocidental, soviética, chinesa, cubana, coreana, vietnamita, albanesa, ou terceiro-mundista. Nós sabemos igualmente que este novo modo de producção proletário, que não responderá às finalidades de reprodução alargada do capital como modo de luta  contra a escassez, virá a preencher todas as necessidades sociais e humanas, finalidade última de um modo de producção socializado.

Marx Escreveu

 

Marx pôs em guarda o proletariado internacional contra o nacionalismo burguês reaccionário e inscreveu no Manifesto estas duas máximas: “O proletariado não tem pátria” e “Proletários de todos os países uni-vos!” Para introduzir a insurreição popular, e depois a revolução proletária, Marx não apelou  aos “povos oprimidos, às nações exploradas”, aos camponeses empobrecidos, nem aos pequeno-burgueses esfomeados. Quando Marx constatou que as condições objectivas da revolução proletária não estavam de modo nenhum reunidas no princípio do capitalismo triunfante, apelou à dissolução da Primeira Internacional evitando-lhe tornar-se uma oficina de caciques reformistas -  e de pequeno-burgueses parasitas, estipendiados pelo poder burguês alimentado pelas cotizações da classe operária espoliada.

Eis um extracto da correspondência de Marx  justamente relativa a estas  divisões nacionalistas chauvinistas manipuladas pelo capital vitoriano para dividir as forças do proletariado internacional no seio do Império Britânico: a Inglaterra tem agora uma classe operária cindida em dois campos inimigos: proletários ingleses e proletários irlandeses. O operário inglês ordinário detesta o operário irlandês como um concorrente que baixa o seu nível de vida. Sente-se ao seu lado como membro de uma nação dominadora, tornado, por esse facto, um instrumento dos seus aristocratas e capitalistas contra a Irlanda e consolida assim o seu poder sobre si mesmo. Os preconceitos religiosos,  sociais e nacionais erguem-no contra o operário irlandês. Conduz-se  em relação a ele mais ou menos como os “brancos pobres” em relação aos negros dos antigos Estados esclavagistas da União Americana. O irlandês devolve-lhe largamente a parada.  Vê nele ao mesmo tempo o cúmplice e o instrumento cego da dominação inglesa na Irlanda. Este antagonismo é entretido artificialmente e espicaçado pela imprensa, pelos sermões e pelas revistas humoristicas, em suma, por todos os meios de que dispõem as classes no poder. Este antagonismo constitui o segredo da impotência da classe operária inglesa a despeito da sua boa organização. É também o segredo da força persistente da classe capitalista, que se dá disso perfeitamente conta.”

Lenine e os bolcheviques fizeram exactamente o contrário do que Marx recomendava. Na Rússia czarista feudal – pré-capitalista – constituíram-se em partido político nacionalista russo – em seita militar secreta russa – sob directório pequeno-burguês russo; apoderaram-se da direcção da revolução democrática burguesa sustentada pelas massas camponesas analfabetas, apressadas em expropriar e partilhar a terra e os meios de producção agrícolas, a fim de erigir o modo de producção capitalista mercantil, depois industrial sob o nome de Nova Economia Política (NEP). De facto não podia haver aí nova economia política socialista, intermediária entre o capitalismo e o comunismo, e a Rússia czarista feudal não podia gerar senão o modo de producção capitalista prévio à revolução proletária do futuro. O modo de producção socialista fez apelo às modalidades da edificação do capitalismo de Estado na União Soviética. Para a Revolução de Outubro, os bolcheviques colocaram o pequeno proletariado russo, fraco e inexperimentado, a reboque do campesinato ávido e da pequena burguesia cupida, e não podia ser de outro modo, dado o estado lamentável da economia czarista.

Lembremos que a revolução proletária não é uma revolta da miséria e da pobreza contra as desigualdades, as injustiças ou contra a opulência e a riqueza dos milionários, como o crê todo o pequeno burguês, amargo por não receber o que considera a sua justa parte social. A insurreição popular será a substituição pela população espoliada do modo de producção capitalista paralisado, e não a tomada socialista do aparelho de Estado capitalista como o praticaram as esquerdas burguesas nos diferentes países socialistas, todos tornados capitalistas. A revolução proletária que a seguirá assegurará a edificação do modo de producção proletário comunista. A revolução nacionalista bolchevique e as outras revoluções anti-coloniais demonstram que um modo de producção não pode ser escamoteado nem contornado. Para conduzir uma revolução anti-capitalista é preciso viver sob o modo de producção capitalista. Para conduzir uma revolução proletária, é preciso uma classe proletária, plenamente desenvolvida, educada, experimentada na luta de classe anti-capitalista, em primeiro lugar na frente económica, depois na frente política e enfim na frente ideológica da luta de classes. Na Rússia, a revolução democrática nacional burguesa derrubou a ordem feudal e assegurou a edificação de uma sociedade capitalista que Estaline realizou com mão de mestre, para além de toda a esperança sob a maneira como o capital alemão iria aprendê-lo, provando assim que o nacional-bolchevismo russo era mais eficiente que o nacional-socialismo alemão.

Setenta anos mais tarde, a obra nacionalista bolchevique – estaliniana - russa iria conhecer o seu carma na Perestroika-Glasnost; no afundamento da aliança imperialista soviética e do seu centro nacional russo paralisado nas relações de producção do capitalismo de Estado industrial, mas sobretudo incapaz de assegurar a reprodução alargada do capital do Estado sovietizado e de passar ao  capitalismo financeiro. É na emergência do capital financeiro privado, liberalizado, em concorrência no mercado mundial com o capital ocidental, que o capitalismo russo encontrou o seu segundo sopro. A China maoista, sob o governo de Deng Xiaoping e dos seus interpretes, seguiu a mesma via nacionalista burguesa, sem que o Estado chinês se afundasse, mas simplesmente dando lugar ao capital financeiro nacional e internacional. Hoje, observa-se a emergência da Associação de Cooperação de Sanghai à volta da China nacionalista e da Rússia nacionalista, cada uma destas potências capitalistas estando convencida do seu papel no seio desta aliança imperialista, à qual a Índia nacionalista e o Paquistão nacionalista se juntaram recentemente. Esta nova aliança imperialista fez face à aliança imperialista Atlântica, de que a  OTAN é o braço armado. Voltaremos ao assunto.

Libertação Nacional ou Libertação Proletária 

            Em 1955, para o proletariado revolucionário não havia nada de esquisito nestas manigâncias internacionais e nestes preparativos de guerra saídos do chauvinismo nacional dos países não alinhados. Este espírito chauvinista de Bandung foi a prova de que a classe proletária devia rejeitar toda a associação com os burgueses terceiro-mundistas que, depois de setenta anos, fizeram dos proletários carne para canhão para as suas malversações e o finca-pé das suas ambições com a cumplicidade da esquerda aburguesada. Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, observaram-se 215 conflitos armados no terceiro-mundo, todos suscitados ou desencadeados pelas potências capitalistas com a cumplicidade das burguesias nacionalistas locais e constatou-se que nenhuma destas lutas trouxe a liberdade aos alienados proletários.

     Tal como a pequena burguesia, o campesinato rural , rico ou pobre, nem por isso é uma classe mais revolucionária. O campesinato esteve no coração do modo de producção feudal terceiro-mundista e uma das forças motrizes para a passagem das relações de producção feudais às relações de producção capitalistas mercantis, depois industrial, para a criação de um domínio fundiário privado, primeiramente parcelizado, visto que o desenvolvimento do modo de producção capitalista forçou ao reagrupamento de imensas explorações agrícolas mecanizadas e irrigadas, onde o campesinato foi progressivamente transformado em proletariado rural. É este proletariado agrícola empobrecido, privado de toda a propriedade, não tendo nada senão a sua força de trabalho para vender e poder sobreviver, que o proletariado revolucionário urbano mobilizará para conduzir a revolução proletária internacional, não para se apoderar da governação do Estado burguês, não para fazer dele “o Estado socialista de todo o Povo “ mas para o erradicar.

Hoje, um século após o prognóstico de Lenine, as condições objectivas da revolução social proletária estão enfim reunidas. A primeira destas condições é o pleno desenvolvimento dos meios de producção, a existência de uma imensa classe proletária mundializada, educada, formada, limpa, experimentada, na guerra de classe, pauperizada e ameaçada na sua sobrevivência, mas consciente dos seus interesses de classe e obrigada a reverter as suas condições de alienação para evitar a sua destruição. Eis a alternativa que se apresenta ao proletariado internacional, ao qual se juntam 350 milhões de proletários chineses, e quase outro tanto de proletários indianos, na grande marcha das forças da fome. A emancipação da classe proletária será obra da própria classe.

 

Capítulo 2

Ferguson, Minneapolis, Dallas,

        O mesmo combate

 

Robert Bibeau

 

Tomemos alguns instantes para observar, a partir de um exemplo concreto, a maneira como a burguesia, através dos média a seu soldo e com a cumplicidade da pequena burguesia esquerdista, transforma uma luta de resistência de classe- contra- classe num conflito inter-racial reaccionário. É falso pretender que o assassinato de cidadãos negros pela policia americana constitui um lapso, ou erro de um polícia demasiado zeloso, inexperiente ou aterrorizado, ou ainda uma agressão racista. Não é a população americana que aterroriza a polícia, é a polícia que aterroriza os proletários americanos de todas as raças, de todas as cores e de todas as origens étnicas.

Mais de 500 cidadãos americanos caíram sob as balas da polícia em 2016, e a hecatombe prosseguiu em cada ano com o aval implícito, senão a recomendação explícita, das autoridades americanas. Nos Estados Unidos, além da pena de morte judiciária, o Estado pratica também a pena de morte extra-judiciária, preventiva, repressiva, exactamente como o exército americano no estrangeiro a aplica nas diferentes frentes dos seus empenhamentos mortíferos. Khadafi e Ben Laden foram duas vítimas célebres, como outras menos conhecidas. No tempo do presidente Obama, em cada terça-feira no gabinete oval, eram condenados à morte indivíduos, sem processo, pelo chefe da Casa Branca, receptário do prémio Nobel da Paz!

Esta política sistemática de repressão policial, especialmente contra o proletariado negro, mas também contra os latinos, contra os SDF, contra os Autoctones, contra os escravos asiáticos das lojas de doces da miséria e contra os emigrantes clandestinos, faz-se sem discriminação racial, contrariamente às mentiras que propagam os média do capital. Esta repressão visa não esta ou aquela raça, etnia ou minoria, mas tem por alvo sobretudo a classe social proletária, o lúmpen proletariado, os SDF sacrificados, a fim de aparecer exemplar às populações locais e aterrorizá-las. A mensagem subjacente a estas milhares de mortes policiais é a seguinte: “ Povo de miséria, proletário em cólera cada vez mais pobre, não resisteis às vossas condições de existência e de alienação, senão nós vos mataremos sem remissão, para vos aterrorizar, como podeis observar nestes vídeos difundidos nas redes sociais”.

Em resumo, a morte policial de Minneapolis participa de um plano estadual terrorista, visando aterrorizar a população americana resistente… qualquer que seja a raça ou a cor das pessoas assassinadas na rua.

Como sempre escrevemos, o proletariado americano é o mais evoluído, o proletariado mais avançado, o que vive sob a ditadura capitalista mais degenerada, a mais depravada, a mais desesperada e a mais terrorista, porque a mais amedrontada e a mais consciente da sua pertença de classe. A situação económica do imperialismo americano é catastrófica – o que obriga o capital ianque a acrescer as suas pressões sobre o proletariado estaduniense além do imaginável e isso simplesmente para se manter à tona, a cabeça acima da crise sistémica que o capital dos Estados Unidos já perdeu às mãos dos seus concorrentes imperialistas estrangeiros (a China, nomeadamente), a Alemanha e a Europa igualmente.

O que os capitalistas americanos acabam de aprender há dois anos em Ferguson e em Dallas (5 polícias mortos e 7 feridos) é que o proletariado americano está armado e é perigoso, e que se eles não se deixam enganar pelas fábulas racistas do tipo: negros – contra latinos – contra brancos – contra autóctones – contra a pantera negra  e outras estupidezes racistas como os media a soldo propagam, então a burguesia americana poderá estar em perigo face à subida da resistência de classe do proletariado estaduniense, sem distinção de raça nem de  etnia. Não são os negros que são visados pelos assassinatos policiais, mas sim os resistentes proletários em cólera. Mas atenção: o proletariado não é terrorista, nem anarquista, nem individualista, e responderá, enquanto classe consciente e organizada, colectivamente solidária, às provocações do capital  americano deteriorado.

 

Capítulo 3

Os marxistas e a questão nacional

                      Pierre Souyri

 

     Neste capítulo, apresentamos as Notas de leitura de Pierre Souyri, publicadas nos Anais de Julho de 1979, no volume de Georges Haupt, Michel Lowy, Claudie Weill, intitulado The Marxists and the National Question, 1848-1914. Integramos os nossos comentários  nas suas anotações,  identificando-os com as letras NDLR.

 

       Pierre Souyri escreveu aqui, a propósito do marxismo e da questão nacional "Ao elaborar este dossier que reúne alguns dos textos cuja publicação marcou as tomadas de posição, por sua vez complementares e opostas, os teóricos da II Internacional sobre a questão nacional, G. Haupt, M. Lowy e C. Weill tiveram o cuidado de não privilegiar as concepções dos bolcheviques. Essa escolha não teve apenas a vantagem de dar a conhecer aos leitores os pontos de vista que a hegemonia do marxismo russo havia atirado para o esquecimento; permite, também, romper com uma representação banal e portanto insustentável que ordena a história das teorias marxistas, como se existisse um marxismo constituindo um sistema coerente e completo, do qual os bolcheviques teriam recapturado a metodologia e os conceitos para desbloquear, finalmente, aquilo em que todos os outros teóricos da época da II Internacional, haviam consecutivamente errado , sobre a solução justa e necessária da questão nacional, como de resto de todas as outras.

 Quando os teóricos que se reclamam de Marx são constrangidos pelas circunstâncias - a ascensão do nacionalismo na Europa Oriental e depois na Ásia - a repensar a questão das nacionalidades das quais Marx e, acima de tudo, Engels, estavam preocupados principalmente na época das revoluções de 1848, eles encontram nos escritos dos "pais fundadores" apenas indicações fragmentárias, às vezes contraditórias e, em qualquer caso, muito fortemente datadas. Marx e Engels, que pensavam que o antagonismo entre capital e trabalho era a fonte essencial do processo histórico da sociedade moderna, haviam concedido à questão nacional apenas um estatuto marginal e subordinado.

 Este último apenas os interessou na medida em que a questão nacional interferisse na luta de classes e que a formação de grandes nações pudesse favorecer o crescimento do capitalismo ao mesmo tempo que a recusa proletária da sociedade burguesa. Não levando em consideração as aspirações nacionais senão sob a perspectiva das suas possíveis consequências para a luta de classes, Marx e Engels não consideraram legitimas senão as lutas nacionais que pudessem enfraquecer a contra-revolução europeia. Daí o apoio ao nacionalismo polaco contra o poder do czarismo e, mais tarde, ao nacionalismo irlandês, cuja vitória, acreditavam, promoveria tanto a intensificação das lutas sociais em Inglaterra quanto na Irlanda. Daí também a hostilidade furiosa contra os eslavos do sul que foram usados ​​pela contra-revolução em 1848 e o ódio ao pan-eslavismo, que consideravam ser o instrumento da expansão russa. Engels, especialmente, multiplicou contra os eslavos do sul os epítetos ofensivos. Lowy, que apontou algumas das previsões mais infelizes de Engels sobre o futuro das nações eslavas e outras, mostra, no entanto, que a fúria de Engels é a fúria de um revolucionário, e não a de um chauvinista alemão e um Slavophobe cego. Conduzindo uma análise superficial e errónea das causas da contra-revolução, Engels enjeita injustamente toda a responsabilidade para os eslavos, sem perceber que o fracasso das revoluções de 1848-49 tem raízes de classe mesmo no coração das nações revolucionárias. "

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     “Quanto a nós, contrariamente a Souyri, não vemos nações revolucionárias proletárias. E, se existem nações revolucionárias, serão necessariamente nações revolucionárias burguesas, aspirando ao capitalismo como modo de producção, assegurando o seu pleno desenvolvimento nacional, até à sua negação e até à sua ultrapassagem. Durante dois séculos, a esquerda foi incapaz de compreender que as derrotas das revoluções proletárias do século XIX e do século XX se explicam não por erros tácticos, mas pelo sub-desenvolvimento do modo de produção capitalista, que não tinha atingido o seu estádio último – imperialista - e, em consequência ao subdesenvolvimento demográfico, económico, político e ideológico do seu coveiro, a classe proletária. É impossível conduzir uma revolução proletária anti-capitalista numa sociedade camponesa feudal ou numa sociedade capitalista em pleno desenvolvimento. O que a sociedade alemã post-espartaquista provou, estrebuchando e tomando relevo  até à época moderna, quando enfim atingiu a maturidade revolucionária proletária” NDLR

Pierre Souyri continua "Além disso, o mesmo Engels que atribuiu  na ocasião uma essência reaccionária aos povos eslavos, contudo, não deixou de apelar, em 1848, ao derrube do Império dos Habsburgo, que era um obstáculo à libertação dos eslavos e dos italianos. O facto é que Engels analisou problemas nacionais usando repetidamente o conceito hegeliano e estranho ao materialismo histórico de "povo sem história", sem que Marx formulasse a menor crítica ao hegelianismo pré-marxista do seu companheiro. Quando as gerações posteriores são compelidas a actualizar a questão das nacionalidades na teoria marxista, elas partem de um legado que é dos mais incertos e G. Haupt sublinha todas as dificuldades com que as suas inciativas se vão deparar. "

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O leitor terá notado aqui a posição intelectual pequeno-burguesa que adopta Pierre Souyri que põe o problema em termos do reactualizar a questão das nacionalidades na teoria marxista, como se um revolucionário proletário tivesse de se preocupar com uma postura teórica marxista face a um problema que é posto pela revolução. Um revolucionário proletário tem o dever de encontrar uma resposta revolucionária proletária para um problema prático posto pela organização da revolução proletária. Veremos mais adiante o que um proletário deve fazer a propósito da questão nacional burguesa. Não é o enriquecimento teórico do marxismo que nos preocupa, mas o avanço da revolução” N.D.L.R.

         Pierre Souyri acrescenta: "Antes do mais, dificuldades ligadas à terminologia e aos conceitos que nem sempre permitem diferenciar claramente os Estados, nações e nacionalidades e que fazem surgir incertezas e controvérsias tanto mais vivas, quanto mais os marxistas estão captivos dos modelos ocidentais da formação das nações que não lhes permite compreender o que está prestes a acontecer na Europa central e sul-oriental no final do século XIX. Aí, ao contrário do que havia acontecido nos países ocidentais, onde os estados tinham sido os instrumentos para agrupar e unificar as nações, os estados só aparecem na última etapa, muito depois de que as nações começaram a afirmar-se lentamente tomando consciência de si mesmas como comunidades de língua e cultura. Além disso, os marxistas frequentemente tinham que violentar os seus próprios hábitos de pensamento para admitir que não havia apenas, como disse J. Guesde, "duas nações; a nação dos capitalistas, da burguesia, da classe dos possuidores, de um lado, e do outro a nação dos proletários, da massa dos deserdados, da classe trabalhadora "e que o proletariado poderia sentir-se preocupado por reivindicações nacionais, e não apenas as suas camadas mais recuadas e mal libertas da ideologia burguesa. G. Haupt mostra como, no final do século XIX, o progresso da industrialização no Império de Habsburgo perturbou a composição social e nacional do proletariado e trouxe sob a bandeira dos trabalhadores alemães qualificados uma massa de manobras resultantes das várias nacionalidades do Império  que se sentem social e nacionalmente oprimidas."Ser checo em Viena é ser proletário". Portanto, recusar ter em consideração as aspirações nacionais ou a prestar-lhes apenas uma atenção relutante em nome de um rigoroso internacionalismo de princípio equivale a confinar o socialismo  a posições petrificadas que correm o risco de torná-lo estranho ao proletariado real. À medida que o socialismo se espalha para a Europa Oriental e depois para países não europeus, os marxistas vêem-se forçados a reformular a sua problemáticas da questão nacional e a reconsiderar a sua visão do movimento histórico. É necessário que"desocidentalizem" o marxismo, admitir que não é verdade que a crescente internacionalização da vida económica seja suficiente para produzir uma homogeneização da civilização e das culturas, abrindo a perspectiva de ir além das peculiaridades nacionais e que existem, pelo menos, contradições que fazem com que a penetração do capitalismo nos "povos sem história" resulta não só na sua assimilação, mas no seu despertar nacional. " 

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À força de pesquisar para justificar o nacionalismo chauvinista, Souyri acaba por encontrar alguns esqueletos no armário.

Não faz aqui nada de original. Todos os nacionalistas chauvinistas vos dirão que é preciso ser nacionalista, visto que o proletariado está empedernido – contaminado- de ideias nacionalitas– tal como de ideias religiosas -de aspirações burguesas – de cultura burguesa- mesmo quando muitas vezes o proletariado creia que não existe, enquanto classe social- visto que toda a propaganda dos média burgueses nega a sua existência. “ Numa sociedade de classes, as  dominantes são as da classe dominante”. Numa sociedade capitalista nacionalista burguesa, as ideias dominantes são as da classe burguesa, até ao dia em que a própria burguesia se veja forçada a repudiar a sua própria ideologia nacionalista, para a fazer evoluir em direcção ao internacionalismo imperialista, a fim de se conformar às necessidades dos mercados internacionais; às migrações dos proletários, em marcha para os novos locais de exploração; às necessidades e expropriação das riquezas naturais; e às necessidades de importação de mercadorias e de capitais vindos de horizontes internacionais. Souyri não teria escrito isto se tivesse simplesmente compreendido que os frutos internacionalistas amadurecem entre as burguesias ex-nacionalistas que se tornam mundialistas. Assim, qual é a importância que nos países do Oeste, os Estados tivessem os instrumentos de junção e de unificação das nações, enquanto que a Leste, os Estados não aparecem senão na última etapa, muito tempo depois que as nações tenham começado a afirmar-se, tomando lentamente consciência de si mesmas como comunidades de “língua e de cultura”?  Hoje, o império soviético foi balcanizado – fragmentado em Estados-nações libertados, dominados – espoliados por um punhado de monopólios imperialistas gigantes representados por marionetas políticas nacionalistas. Por vezes, é suficiente esperar que a roda da história complete o seu ciclo para ver o mundo sob uma luz diferente. Houve um tempo em que o capital era nacional, hoje tornou-se internacional como o proletariado, a classe que o derrubará. Para os proletários revolucionários é reaccionário amantizar-se com a pequena burguesia reformista e com o pequeno capital nacional para tentar travar a marcha da história mundial pela emergência e depois o afundamento do imperialismo declinante.” NDLR.

            Pierre Souyri, prosseguindo a sua crítica escreve "Nesta evolução histórica do marxismo, a contribuição dos austríacos, especialmente Otto Bauer, é um marco. Sem dúvida, os austro-marxistas estão especialmente preocupados em impedir o colapso do império multinacional reunido pelos Habsburgos e em conter as forças centralistas que ameaçam desintegrar o seu próprio partido. Essa preocupação levou Otto Bauer a desenvolver uma concepção de nacionalidade que amputa o problema da sua dimensão política e ignora o carácter de classe das producções culturais. O. Bauer também será atacado pela extrema esquerda do movimento socialista - A. Pannekoek e Strasser, que persistem em considerar que não pode haver interesses nacionais específicos para o proletariado – a não ser para Kautsky, que não admite que o advento do socialismo possa ser acompanhado por um aprofundamento das diferenças nacionais e pelos bolcheviques que questionarão as concepções "psicoculturais" da nação desenvolvidas pelos austro-marxistas e as soluções que proclama a social-democracia austríaca para resolver a questão nacional. No entanto, os teóricos vienenses ajudaram a abalar a inércia da II Internacional. A sua pesquisa abriu o caminho para a ideia de que o nascimento das nações não pertencia necessariamente ao passado da Europa e do mundo, e que o internacionalismo proletário não poderia virar as costas às aspirações das nacionalidades oprimidas. " 

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Perdoar-nos-ão (Relevar-se-nos-á) esta repetição, mas o argumento é recorrente. O que são as aspirações das nações oprimidas? Que nações oprimem as nações oprimidas? Uma certa esquerda burguesa do Quebec foi  ao ponto de inventar a “classe nação quebequense francófona oprimida” (sic), ficando a pertença de classe fixada pela língua dominante em cada uma dessas comunidades. Esta mística fascista provinha dos social-fascistas alemães, austríacos, franceses e outros. Uma nação é composta por uma comunidade humana que antes de ter semelhanças linguísticas, morais e culturais é em primeiro lugar movida por antagonismos de classe. Uma pequena porção (burguesa) da nação explora uma grande porção (proletária) da nação e esta é a maior de todas as contradições sociais. Uma porção da nação está disposta a conduzir a guerra nacional, até ao último proletário se necessário, enquanto que uma outra porção da nação aspira à paz até ao último burguês. Assim, uma pequena porção quebequense francófona tornou-se rica, próspera, explorando o trabalho assalariado dos proletários quebequenses e exigindo sempre mais ajudas do Estado burguês. Nos dias de hoje, esta porção da nação é proprietária de grandes conglomerados internacionais, enquanto que uma grande parte da nação quebequense francófona e anglófona está crivada de dívidas, vende quotidianamente a sua força de trabalho a preço vil – recebe sempre menos do serviço do Estado nacional quebequense e migra para fora do lar nacional para achar emprego em inglês ou em francês. Os proletários abandonaram toda a região e desinteressam-se da política burguesa demagógica. A situação é idêntica entre as duas classes antagónicas que compõem o resto do conjunto canadiano maioritariamente de língua inglesa. A situação é idêntica entre as nações ameríndias. Que nações são oprimidas e que nações oprimem no Quebec e no Canadá? Nenhuma. Podemos identificar uma classe social oprimida – independentemente da língua de uso dos seus membros e podemos identificar uma classe social opressora – independentemente da língua de uso dos seus aderentes. Um capitalista anglófono canadiano explora os proletários canadianos, não explora os capitalistas da nação quebequense com os quais cruza negócios, e inversamente para os capitalistas quebequenses com negócios com os capitalistas do resto do Canadá e do mundo inteiro. Os interesses dos capitalistas quebequenses não têm nada em comum com os dos proletários do Quebec. Voltaremos a estas questões”. NDLR

            Voltemos às notas de leitura de Pierre Souyri: "Quando, na véspera da guerra, Lenine aborda a questão nacional, a sua reflexão pode basear-se em toda a pesquisa realizada desde Marx, que expandiu e transformou bastante o campo socialista teórico. Mas consegue retomar quase completamente o problema das relações entre as aspirações nacionais e o socialismo, porque o considera em função do tema das desigualdades de crescimento que o capitalismo imprime ao processo histórico e às incompatibilidades que ocorrem nos países mais atrasados entre as tarefas democráticas burguesas e as tarefas proletárias da revolução. A eliminação das peculiaridades nacionais pelo desenvolvimento do capitalismo, que Kautsky havia enfatizado há muito tempo, está a tornar-se uma realidade, mas no século XX  torna-se contemporâneo de um despertar nacional causado pela expansão do capital imperialista em direcção aos países atrasados. Esses dois movimentos não são necessariamente contraditórios, na medida em que cabe ao movimento proletário levar a revolução democrática até ao fim, cujas aspirações nacionais são apenas um elemento. No sistema teórico de Lenine, o nacionalismo dos povos oprimidos é assim integrado numa estratégia coerente da revolução. Faz parte de um processo mais geral através do qual a realização das aspirações nacionais prepara o declínio dos particularismos nacionais e é até a condição. Tanto como para  Marx ou Rosa Luxemburgo, as aspirações nacionais não têm para Lenine um interesse intrínseco. Eles não são reconhecidos senão para serem utilizados com a finalidade de um movimento que implica a sua superação. No entanto, é impossível não notar hoje que a concepção leninista não resistiu ao teste dos acontecimentos. Lowy mostra que a história nega constantemente as concepções e previsões de Engels. Mas, por razões diferentes, o mesmo se aplica a Lenine. A maioria das nações que se formaram após 1918 e após a desintegração dos impérios coloniais não se baseou na subordinação das aspirações nacionais ao movimento proletário. O inverso costuma ser o caso: mesmo em países onde havia um movimento operário, este deixou-se integrar na luta nacional e tornou-se uma mera força de reforço do nacionalismo que redundou na formação de estados burgueses ou de estados burocráticos que encontraram o seu principal apoio na guerrilha camponesa. A grande estratégia concebida pelos bolcheviques é coerente apenas no abstrato ou no imaginário dos teóricos: não encontrou na prática uma correspondência. "

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            “A grande estratégia concebida pelos bolcheviques como o escreve aqui Pierre Souyri, não sofre de incoerência nem de falta de correlação prática. Os bolcheviques encontraram-se à cabeça de uma revolução democrática burguesa antifeudal conduzida pela burguesia russa dirigida por Kerenski e apoiando-se num imenso campesinato submetido e esfomeado ao qual os bolcheviques carrearam o apoio do pequeno proletariado russo nascente, tão nascente como era o modo de producção capitalista industrial na Rússia czarista. Os bolcheviques arrancaram a direcção desta revolução burguesa a Kerenski, ligando-se ao campesinato graças ao slogan reformista “Pão, Paz, Terra”. Como excelente táctico, Lenine forjou uma teoria adaptada a esta prática da luta de classes num contexto de guerra de libertação nacional burguesa que ele empandeirou com os epítetos de “anti-imperialista e socialista”, imaginando mesmo um novo modo de producção a cavalo entre o capitalismo e o comunismo, que chamou de socialismo da Nova Economia Política (NEP). A revolução russa era efectivamente uma revolução anti-imperialista, mas não contra o imperialismo moderno, fase última do modo de producção capitalista, mas contra o imperialismo feudal decadente, que terminava a sua existência e devia deixar o lugar, como o havia feito vários anos antes nos países da velha Europa, ao modo de producção capitalista emergente – uma tarefa revolucionária talhada por medida pela burguesia revolucionária, mas não certamente pelo proletariado nascente, que deveria esperar ainda um século. É aí que estamos hoje. O imperialismo moderno capitalista completou a sua expansão até nas planícies do Ganges e do Ianqusé. Eis a rosa proletária do mundo inteiro: cabe-vos a vós dançar. NDLR.

 

 

Capítulo 4

Nacionalismo e Socialismo

 

Paul Mattick

 

         Neste capítulo, analisamos um importante texto de Paul Mattick, intitulado "Nacionalismo e Socialismo", publicado em inglês no The American Socialist em Setembro de 1959, em francês no Front Noir (Fevereiro de 1965) e na ICO nº 99 em Novembro de 1970. Mais uma vez os nossos comentários estarão identificados com as letras NDLR.

Mattick escreveu aí: "Os socialistas não utópicos favoreceram o capitalismo como oposto  às velhas relações sociais de producção, e saudaram o nacionalismo na medida em que poderia acelerar o desenvolvimento capitalista. Sem admitir isso abertamente, eles não estavam longe de aceitar o imperialismo capitalista (...) Eles também eram favoráveis ​​ao desaparecimento de pequenas nações incapazes de desenvolver a economia em larga escala (...) No entanto, eles apoiaram as pequenas "nações progressistas" contra os grandes países reaccionários. (...) Em nenhum momento e em nenhuma ocasião, porém, o nacionalismo foi considerado um objectivo socialista.

Em toda a parte, o modo de producção capitalista construiu-se ao abrigo das fronteiras nacionais, incluindo a União Soviética, a China maoista, o Vietname, a Coreia, Cuba, etc. Estas fronteiras têm a vocação de preservar por um tempo as particularidades tribais, feudais, camponesas, étnicas e do comércio local, que o capitalismo constrói e destrói com o tempo a fim de se consolidar, dificilmente por vezes, como mostra o nascimento dos nacionalismos no Médio Oriente e em África. Cada um está em condições de apreciar a clareza do resumo apresentado por Mattick que concentra a quinta-essência do pensamento pequeno burguês sobre a questão das lutas de libertação nacional e contra “o imperialismo político”, depois de Bukarine, Lenine, Trotski, Estaline e Mao. Os gurus da ortodoxia marxista-leninista apresentam o imperialismo como uma política de grandes potências e militam contra  o retorno destas regiões ao pré-capitalismo”, processo histórico de regresso à rectaguarda, de toda a maneira impossível, que mesmo os criminosos de guerra americanos não conseguiram impor aos vietnamitas, e que os carniceiros khmeres vermelhos não conseguiram impor aos cambojanos. De mais a  mais, é infelizmente falso pretender, como o faz Mattick, que o nacionalismo nunca tenha sido considerado como um objectivo socialista. NDLR

Prossigamos com o pensamento de Mattick. Ele escreveu: "Esse novo nacionalismo, que abala a dominação ocidental e estabelece relações capitalistas de producção e indústria moderna em regiões ainda sub-desenvolvidas, ainda é uma força" progressista ", como foi o nacionalismo do passado? Essas aspirações nacionais coincidem de alguma maneira com as aspirações socialistas? Elas apressam o fim do capitalismo enfraquecendo o imperialismo ocidental ou injectam uma nova vida no capitalismo fazendo estender ao mundo inteiro o seu modo de producção? "

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    O grande capital e os seus teóricos insinuaram que haveria uma relação de domínio ocidental contra a civilização oriental. Aqui Mattick insinua que “ o novo nacionalismo institui as relações de producção capitalista e a indústria moderna nas regiões subdesenvolvidas”. Segundo a teoria materialista dialéctica proletária é o desenvolvimento das forças produtivas e dos meios de producção que instituem o desenvolvimento de um certo tipo de relações de producção (Estado-nação) e uma ideologia (nacionalista burguesa) que os intelectuais burgueses prenomeiam "civilização ocidental” se ela é impregnada de artefactos feudais ocidentais e “civilização oriental” se é impregnada de artefactos feudais orientais. As relações de producção capitalistas – por todo o lado as mesmas, pois o modo de producção capitalista industrial é por toda a parte o mesmo - por seu lado, reforçam o desenvolvimento dos meios de producção. Assim, é o desenvolvimento industrial da Ásia que permitiu a emergência das relações de producção capitalistas nacionais (durante a sua fase de emergência), na China maoista nomeadamente, país que desenvolveu uma indústria vigorosa ao abrigo das suas fronteiras nacionais e que agora, enquanto estado-nação capitalista atingiu o estádio último, imperialista, de desenvolvimento, integrando o capital financeiro mundializado. A China procura portanto abater as barreiras tarifárias dos seus concorrentes, a fim de conquistar os seus mercados orientais ou ocidentais. O capitalismo é a condição do nacionalismo que se reforça até que o capitalismo, chegando ao termo das suas contradições entra na fase imperialista e faz cair as fronteiras nacionais e repudia a ideologia nacionalista. NDLR.

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      Mattick acrescenta“ Todavia, no fim do século, é o imperialismo, não o nacionalismo, que estava na ordem do dia.Os interesses "nacionais" alemães tornaram-se interesses imperialistas que rivalizavam com os imperialismos de outros países. Os interesses "nacionais" franceses eram do Império Francês, assim como os da Grã-Bretanha eram do Império Britânico. O controle do mundo e a partilha desse controle entre as grandes potências imperialistas determinaram políticas "nacionais". As guerras "nacionais" foram guerras imperialistas que culminaram em guerras mundiais”.

 “ Nova demonstração (acima) do pensamento socialista- idealista – burguês a propósito do imperialismo que Bukarine , Lenine e os bolcheviques ligaram à III Internacional e aos partidos comunistas nacionalistas (eurocomunistas, nomeadamente) e que os trotsquistas e outras oposições da esquerda e da direita adoptaram.

“ É o imperialismo e não o nacionalismo que está na ordem do dia da batalha”, escreve o autor, estabelecendo uma oposição entre imperialismo e nacionalismo. O imperialismo não é uma política de grande potência oprimindo os pequenos países nacionalistas, como Bukarine sugeriu. Não há modo de producção imperialista francês, britânico, alemão ou americano. O imperialismo é o modo de producção capitalista nacional chegado à maturidade,e é em toda a parte o mesmo. O imperialismo moderno (capitalista) é o capital financiarizado,  globalizado, mundializado que tenta futilmente compensar a depreciação dos meios de producção com o aumento da produtividade do trabalho e fazendo isso pela alta da sua composição orgânica, o que mergulha mais profundamente na sua contradição. O que é próprio de todo o país capitalista, tão pequeno ou tão grande quanto o seja, é atingir o estádio último da evolução capitalista – o estádio imperialista-  onde as relações de producção capitalistas já não podem assegurar o desenvolvimento das forças produtivas sociais, impedindo por esse facto o modo de produção de se reproduzir a fim de assegurar a valorização do capital; deixando o proletariado inútil, órfão do seu mestre alienante, forçando-o  a emancipar-se ou a desaparecer. É então, não à escala nacional – o que os marxistas terão compreendido instintivamente, denunciando as veleidades de construir o modo de producção comunista num só país -, mas à escala internacional que a revolução proletária deverá ser conduzida. A política revolucionária do proletariado não faz suas as lutas de libertação nacional democráticas e burguesas que não são senão guerras entre clãs capitalistas para o controlo do aparelho de estado burguês e das fontes da mais-valia. NDLR

Seguindo os passos de Paul Mattick, descobrimos "Um socialismo internacional consistente, como o de Rosa Luxemburgo, por exemplo, que se opôs à" autodeterminação nacional "dos bolcheviques. Para ela, a existência de governos nacionais independentes não alteraria o facto de serem controlados pelas potências imperialistas, uma vez que estas dominavam a economia mundial. Nunca se poderia lutar contra o capitalismo imperialista ou enfraquecê-lo criando novas nações, mas apenas opondo contra o supranacionalismo capitalista o internacionalismo proletário. Esses movimentos pertencem à sociedade capitalista, assim como o seu imperialismo. Mas "usar" esses movimentos nacionais para fins socialistas não poderia significar outra coisa senão que livrá-los do seu carácter nacionalista ".

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Como é que uma classe operária liliputiana, inexperimentada na luta de classes nas frentes económica, política e ideológica, saída de meios de producção arcaicos, na orla do capitalismo industrial ascendente, sempre em expansão em numerosas regiões, e não tendo ainda conquistado certos países da Ásia, da África e da América Latina; como é que pode esta classe emergente impor o internacionalismo proletário que ela nem sequer supõe haver e que não virá senão com a paz imperialista da evolução do modo de producção? NDRL

E Mattick acrescenta: "A Primeira Guerra Mundial produziu a Revolução Russa e, quaisquer que fossem as suas intenções primitivas, foi uma revolução nacional. Embora esperasse ajuda do exterior, ela nunca foi aportada às forças revolucionárias do exterior, excepto quando essa ajuda foi ditada pelos interesses nacionais russos. A Segunda Guerra Mundial e as suas sequelas trouxeram a independência para a Índia e o Paquistão, a Revolução Chinesa (...) Aparentemente, a era da emancipação nacional  não terminou, e é óbvio que a corrente cada vez mais forte contra o imperialismo não serve os fins socialistas revolucionários à escala mundial ". 

Que libertação e que auto-determinação para os proletários da Ásia do Sueste, para os da África e do Médio Oriente? Numa análise de classe proletária da economia política, cada conceito tem um significado de classe. Assim, para nós proletários revolucionários, o termo libertação não pode significar senão a libertação da exploração da alienação da classe, do jugo do modo de producção capitalista. Em que é que foram emancipados alguns proletários da Ásia do sueste, da China, da África, do Médio Oriente, entre 1945 e 1975? Acaba-se assim por compreender que os socialistas, comunistas, frentes unidas patrióticas, frentes populares e outras esquerdas burguesas nacionalistas consideram como uma libertação o facto de que eles se apoderaram da direcção da edificação do capitalismo burguês nos seus respectivos Estados nacionais. A classe proletária, em curso de internacionalização sob o imperialismo moderno, conhece as suas novas cadeias, mas continua a não ser emancipada. NDLR

Paul Mattick toma coragem e diz: "O que revela realmente esse novo nacionalismo, são as mudanças estruturais da economia capitalista mundial e o fim do colonialismo do século XIX. O "fardo do homem branco" tornou-se um fardo real em vez de um benefício. Os lucros do domínio colonial estão a diminuir enquanto o custo do império está a aumentar ".

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            Os proletários revolucionários rejeitam firmemente toda a acusação de racismo a propósito do fardo do homem branco. Há o homem branco capitalista que oprime o homem branco proletário, assim como o homem negro proletário. Ambos são oprimidos e explorados pelos seus congéneres raciais, étnicos ou linguísticos. Assim, contrariamente ao que escrevia Mattick, os lucros da exploração capitalista nos países colonizados emergentes – recém-chegados ao modo industrial de producção e de reprodução – não diminuem, são os lucros realizados nos países dominantes, os primeiros capitalizados países ocidentais, que diminuem em resultado de dois factores: A) encarecimento do custo da reprodução da força de trabalho social nos países industrialmente avançados ¸B) o aumento da composição orgânica do capital – os capitalistas mecanizando a produção têm de aumentar a produtividade e a taxa de exploração da força de trabalho a fim de reduzir a quantidade global da força de trabalho social cujo custo está em alta. O nacionalismo chauvinista e reaccionário não visa senão fazer aceitar estes sacrifícios pela classe operária nacional. Os capitalistas brancos do norte não hesitaram  deslocalizar as suas fábricas do norte (branco) para o sul (negro) ou para o leste (amarelo) quando tal se tornava proveitoso. O capitalista, tal como o proletário, é internacionalista e sabe que o capital não tem pátria, cor ou odor. Temos escrito e repetimo-lo, uma nação ou um povo oprimido e uma nação ou um povo opressor isso não  existe. Sob o modo de producção capitalista, diferentes classes sociais afrontam-se e destes afrontamentos nascem as condições de exploração e de opressão da classe operária metropolitana e as condições de exploração e de opressão da classe proletária dos países ex-colónias também chamados países capitalistas emergentes, agora que é vantajoso explorá-los industrialmente. O desenvolvimento desigual e combinado está votado a ser modificado como o demonstram os contantes fenómenos da deslocalização e da relocalização industriais. É nisso que o capital nacional se torna mundial construindo como seu coveiro o proletariado revolucionário internacional. Na passagem que segue, Paul Mattic expõe precisamente a incompreensão profunda do conjunto da esquerda esquerdista, oportunista e reformista com que traiu o imperialismo que considera como uma evolução da política de domínio das grandes potências económicas do colonialismo ao neo-colonialismo. NDLR

Mattick escreve: "Em geral, o colonialismo não paga mais, de modo que é em parte o próprio princípio do lucro que nos convida a reconsiderar o problema da dominação imperialista. Duas guerras mundiais destruíram mais ou menos as antigas potências imperialistas. Mas elas não provocaram o fim do imperialismo que, embora assumindo novas formas e expressões, mantém o controle económico e político das nações fortes sobre os fracos (...) a América não foi um poder imperialista no sentido tradicional. Garantiu o benefício do controle imperial, mais pela "diplomacia do dólar" do que pela intervenção militar directa.”

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     As nações e os Estados-nação são resíduos do modo de producção capitalista ascendente e estão condenadas a desaparecer no seio do cadinho internacional. As guerras não podem “ conduzir” ao fim do imperialismo como o pretende Mattic. As guerras são o resultado da evolução da economia política imperialista no seu desenvolvimento contraditório - dialéctico – e constituem a última táctica do sistema capitalista para tentar ultrapassar as contradições. Pelo que respeita à “diplomacia do dólar”, que teria substituído a “ diplomacia da canhoneira”, constatamos simplesmente que os Estados Unidos intervieram militarmente 200 vezes depois do fim da Segunda Guerra Mundial; que os capitalistas que dominam esse país conduziram o seu país à guerra durante 220 anos nos seus 240 anos de existência. Acontece que a potência militar da Aliança imperialista ocidental é muito activa na defesa dos seus interesses – não nacionais- mas interesses de capitalistas monopolistas internacionais, nomeadamente financeiros através da diplomacia da canhoneira, do porta-aviões, do míssil e do drone. A diplomacia do dólar e a diplomacia da canhoneira são duas tácticas complementares. NDRL

De seguida, Paul Mattick declara: "Nenhuma das potências européias tem hoje força para se opor à dissolução completa do seu império, a não ser com a ajuda americana. Mas essa ajuda submete essas nações, assim como as suas possessões coloniais, à penetração e ao controle americanos. Herdando aquilo que o imperialismo em declínio está a abandonar, os Estados Unidos não sentem a necessidade de voar em socorro do imperialismo da Europa Ocidental ,"Anticolonialismo" não é uma política americana deliberadamente assumida para enfraquecer os aliados ocidentais (...), mas foi escolhido na perspectiva de fortalecer o mundo livre. "

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     O modo de producção capitalista americano não está em guerra contra o modo de producção capitalista europeu, russo ou chinês. Existe uma aliança de empresas concorrentes que alcançaram a fase imperialista da evolução capitalista e elas estão todas em competição umas com as outras, mas também em concorrência com as empresas capitalistas emergentes e mundializadas. Não são os países que são emergentes, são as grandes empresas dos países do sul que se reagrupam em conglomerados, a fim de fazer face aos monopólios ocidentais. É para aí que as empurra muito naturalmente o seu desenvolvimento imperialista. Um inquérito recente da organização não governamental (ONG) OxFAM revela que o conjunto das dez maiores corporações do mundo têm rendimentos mais importantes que os rendimentos governamentais de 180 países combinados, é isso o imperialismo. Estes imensos conglomerados trocam entre si bens de consumo, mas também meios de producção – capitais – é neste momento que intervêm os bancos e os mercados financeiros e partilham entre si os mercados, após ásperas negociações, senão guerras. A evolução muito rápida das relações de producção capitalistas entre estes conglomerados emergentes e entre os países emergentes coloca-os já em posição de conquistadores, cara a cara com os seus antigos mentores ocidentais. O proletariado deve tomar partido em favor dos capitalistas nacionais emergentes ou em favor dos antigos capitalistas internacionais? Nem de um nem do outro, evidentemente. Assim, a China que ainda não completou a integração de 350 milhões dos seus camponeses nas suas forças produtivas industriais nacionais, está já na corrida para a robotização da sua producção industrial, a fim de atingir uma maior produtividade que conduza a sustentar a concorrência imperialista mundial e a sacrificar milhões de proletários que amanhã não terão outra escolha senão revoltarem-se e destruírem – não a nação chinesa, ou o imperialismo chinês emergente -, mas o modo de producção capitalista na China, a título de contribuição para a revolução proletária mundial. NDLR.

Mattick continua: "Privados das possibilidades imperialistas, Alemanha, Itália e Japão, não têm mais uma política independente. O declínio progressivo dos impérios francês e britânico tornou esses países poderes de segunda ordem. Ao mesmo tempo, as aspirações nacionais das regiões menos desenvolvidas e mais fracas só podem ser realizadas se entrarem nos planos de conquista dos imperialismos dominantes ".

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Em que é que a Alemanha e o Japão foram privados de capacidades imperialistas? A força de uma potência capitalista – em fase imperialista – está na medida das suas capacidades económicas, industriais, comerciais, financeiras e por último militares. A Rússia soviética ensinou estas coisas à Alemanha hitleriana. Os Estados Unidos de Roosevelt ensinaram estas coisas ao Japão de Hirohito. A China produz e consome metade dos produtos industriais do mundo, cimento, energia, cauchu, produtos químicos, aço, cobre, alumínio, etc. Assim, a China, em 2016, comprou sózinha metade dos robots industriais colocados no mercado pela Alemanha, o Japão e a Coreia. A produção industrial chinesa representa 55% do PIB desse país e ocupa 45% do total da sua mão-de-obra assalariada, ou seja, 350 milhões de proletários, aos quais 350 milhões de outros esperam juntar-se, ou seja, duas vezes a população total dos Estados Unidos. Nos Estados Unidos 70% do PIB diz respeito ao consumo das mercadorias, que este país não produz, e menos de 12% do PIB nacional provém da indústria, nomeadamente da indústria de armamento subvencionada e parasitária. Menos de 12% do proletariado americano trabalha na indústria produtiva, felizmente a sua taxa de produtividade é muito elevada. Esta potência capitalista, no seu estádio imperialista declinante não fará face por muito tempo à subida em potência da sua substituição não nacional, mas internacional, e que mesmo que ela não se habitue a pôr-se militarmente à frente, será forçada a fazê-lo. NDLR.

Paul Mattick repete e reafirma obstinadamente a sua incompreensão com o conceito do imperialismo como fase final de todo o modo de producção. Ele escreve: "A erosão do imperialismo ocidental, diz-se, cria um vácuo de poder em regiões anteriormente subjugadas. (...) As Revoluções nacionais em regiões atrasadas do ponto de vista capitalista são tentativas de modernização através da industrialização, seja por exprimirem simplesmente uma oposição ao capital estrangeiro, seja porque elas tendem a alterar as relações sociais existentes. Mas enquanto o nacionalismo do século XIX era um instrumento de desenvolvimento do capital privado, o nacionalismo do século XX é essencialmente um instrumento para o desenvolvimento do capitalismo de estado. (...) O nacionalismo actual traz novos solavancos a um mercado mundial (...) ".

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 As revoluções nacionalistas, nas regiões economicamente atrasadas, nunca exprimiram oposição ao capital e não mudaram as relações sociais capitalistas que muitas vezes fecharam. O nacionalismo já não é o modo específico e universal das relações de producção capitalistas, mas uma modalidade de desenvolvimento ideologicamente orientada, no sentido do último século, e num outro sentido, em relação ao século presente, no  grau de imaginação fértil dos socialistas e dos esquerdistas. O nacionalismo foi e será sempre a ideologia da classe burguesa ascendente, qualquer que seja o país ou o continente em que se desenvolve. No princípio, o nacionalismo opôs-se ao mercado livre mundial, pois após uma fase da capitalização nacional lançou a sua integração multinacional no grande mercado mundial imperialista. Foi verdade na Europa, berço do capitalismo, na América e  na Oceania para onde foi transplantado, e na Ásia onde foi inseminado, e em África onde foi imposto. NDLR


Paul Mattick seguidamente escreve: "Por detrás dos movimentos nacionalistas, é claro, há a pressão da pobreza, que se está a tornar cada vez mais explosiva à medida que aumenta a diferença entre nações pobres e ricas. A divisão internacional do trabalho, determinada pela formação do capital privado, implica a exploração dos países mais pobres pelos mais ricos e a concentração de capital nos países capitalistas avançados. O novo nacionalismo opõe-se à concentração de capital determinada pelo mercado, de modo a garantir a industrialização dos países subdesenvolvidos. (...) Hoje, empresa privada e controlo governamental operam simultaneamente em cada país capitalista e em todo o mundo. De modo a que a subordinação da concorrência privada à concorrência nacional é implacável (...) ".

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A coberto de teorizar o princípio do imperialismo e de o opor às aspirações nacionais das regiões pobres face às regiões ricas, Mattick opõe o capitalismo nacional privado ao capitalismo nacional público. O Estado capitalista e a sociedade seriam uma entidade independente da classe capitalista dominante . Para dizê-lo de outra maneira, haveria de um lado a classe capitalista e do outro, o Estado capitalista, dirigido por burocratas e caciques estaduais  independentes, com a sua própria agenda de desenvolvimento. Como escreveu Mattick, o Estado capitalista é um organismo saído do desenvolvimento do modo de producção – é uma componente das relações sociais de producção capitalista– e nisso o Estado burguês não pode senão responder às necessidades de desenvolvimento deste modo de producção. Não pode aí haver subordinação da concorrência privada à concorrência nacional, completando-se as duas. Este Estado só fica preso  no seu funcionamento quando o modo de producção fica emaranhado nas suas contradições e bloqueia-se a si próprio. Diz-se então que as condições objectivas da revolução estão reunidas. NDLR

Mattick acrescenta: "Na raiz das aspirações nacionais e das rivalidades imperialistas está a real necessidade de uma organização global de producção e distribuição, como o geólogo KF Mather assinalou", a Terra é feita muito mais para ser ocupada por homens organizados à escala mundial, que possam praticar ao máximo através do mundo inteiro a livre troca de matérias-primas e de produtos acabados, do que para homens que persistem em criar barreiras entre regiões, mesmo que sejam regiões grandes ou continentes inteiros. Em segundo lugar, porque a producção social não pode ser totalmente desenvolvida e os homens serem libertados da carência e da miséria senão através da cooperação internacional (...) ".

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Segundo Mattick, “se não for utilizada para fins humanos, uma luta entre nações produzirá (…) a eliminação da competição capitalista” Tremei capitalistas e proletários do mundo inteiro, vós deveis aceitar a cooperação industrial, se não a competição  capitalista desaparecerá. Mas, pode-se dizer, é exactamente o que desejam os grandes monopólios internacionais que renegaram a sua nacionalidade e que fazem tudo para absorver os seus adversários e eliminar os seus concorrentes, onde quer que eles se encontrem, salvo se as leis da economia política capitalista tornarem a coisa impossível, e que mesmo que este objectivo seja atingido não resolverá a contradição fundamental do capital. Sob o modo de producção capitalista, não existe tal contradição que oponha as aspirações nacionais às rivalidades imperialistas. Porquê? Porque o imperialismo é o resultado do desenvolvimento capitalista nacional. O imperialismo é o filho do capitalismo nacional e como pai – que ele mata alcançada a maturidade – o imperialismo tem a vocação de se expandir e de reinar sobre a humanidade capitalista após o parricídio do nacionalismo demasiado restrito para lhe permitir reproduzir-se. Retomemos: o capital mundializado encontra-se  exactamente na estrutura da governação nacional e procura quebrar esta armadura a fim de lhe dar as condições para a sua reprodução. Ora, esta governação nacional serve os interesses da pequena burguesia, tão numerosa na sociedade imperialista avançada (nomeadamente no sector terciário). Esta governação nacional fez assim o jogo do pequeno capital nacional ainda não monopolista, mas que aspira a sê-lo , ao abrigo das fronteiras nacionais  que se tornam caducas para o grande capital. Uma guerra de classe explode então no seio da burguesia (pequena-média-grande) para o controlo do aparelho de estado nacional; o grande capital para o fazer explodir; o pequeno capital e a pequena burguesia para o preservar e reforçar. Inevitavelmente é o grande capital que vencerá, mas esta guerra de classe reaccionária, entre facções burguesas, não diz respeito à classe operária revolucionária que  dela toma nota, nada mais.” NDLR.

          Prossigamos com Mattick "Enquanto uma atitude positiva em relação ao nacionalismo trai uma falta de interesse para o socialismo, a posição socialista sobre o nacionalismo é claramente ineficaz, assim como os países que oprimem os outros. Uma posição anti-nacionalista intransigente parece, pelo menos indirectamente, apoiar o imperialismo (...) os socialistas não têm o papel de fomentar as lutas pela autonomia nacional; como o demonstraram os movimentos de "libertação" que surgiram após a Segunda Guerra Mundial. (...) o nacionalismo não poderia ser usado para fins socialistas e não era uma boa maneira estratégica de acelerar o fim do capitalismo ".

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“Paul Mattick pretende que uma luta de classe contra o capitalismo nacional constituiria um apoio ao imperialismo; todavia, não é preciso conduzir a luta anti-capitalista para conduzir a guerra anti-imperialista? O imperialismo não é uma potência económica e política estrangeira. O imperialismo é a última etapa do desenvolvimento do modo de producção capitalista, como o escrevemos mais atrás. Noutros termos, cada Estado capitalista burguês, e cada classe capitalista nacional que controla esse Estado estão votados a evoluir até se integrarem numa aliança imperialista e a prosseguir assim a sua luta contra os outros Estados e contra as outras classes burguesas – mas sobretudo contra a classe proletária mundial de onde todos tiram a sua mais-valia. Esta integração internacionalista faz-se primeiro no plano económico pela via do comércio, dos investimentos de capitais (IDEF) das transacções bolsistas, as trocas de moeda, das tomadas de controlo de empresas, dos empréstimos, do crédito, da dívida, etc.. O proletariado revolucionário não tem nenhum controlo sobre esta guerra concorrencial entre alianças capitalistas que se afrontam por meio da concorrência, e não pode senão sofrer as consequências. NDLR

Paul Mattick escreve então: "Pelo contrário, o nacionalismo destruiu o socialismo, usando-o para fins nacionalistas. Não é papel do socialismo apoiar o nacionalismo, mesmo quando combate o imperialismo. Combater contra o imperialismo sem simultaneamente enfraquecer o nacionalismo não passa de combater alguns imperialistas para apoiar outros, porque o nacionalismo é necessariamente imperialista ou ilusório. A autodeterminação nacional não emancipou as classes trabalhadoras dos países avançados. Agora não o fará na Ásia e em África. As revoluções nacionais, por exemplo, na Argélia, trarão pouco para as classes mais pobres, além do direito de compartilhar preconceitos nacionais de maneira mais equitativa. Sem dúvida, é algo para os argelinos, que sofreram um sistema colonial particularmente arrogante.  Podem-se prever os possíveis resultados da independência da Argélia examinando o caso da Tunísia e Marrocos, onde as relações sociais existentes não mudaram e onde as condições de existência das classes exploradas não foram  acentuadamente melhoradas ".

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Desta vez, estamos totalmente de acordo com Paul Mattick. NDLR

 

Capítulo 5

Marxismo, nacionalismo e lutas nacionais hoje

David Mcnally

 

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Nesta secção do volume, reproduzimos o texto de David Mcnally, um militante canadiano de esquerda que apresenta no “Marxismo, nacionalismo e lutas nacionais hoje” uma excelente síntese da ideologia nacionalista esquerdista. Reproduzimos o texto tal como foi  publicado em 1996 como documento de discussão para O Novo Grupo Socialista, traduzido em francês pelo Grupo A Esquerda. Ao longo do texto, apresentamos as nossas reflexões em itálico, seguidas das letras NDLR.

 

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Primeira Parte: o desafio do nacionalismo ao marxismo

 

1. O nacionalismo domina a política mundial – e fá-lo com uma facilidade surpreendente. Abri não importa que jornal, escutai as discussões no trabalho ou na escola, guardai ou escutai não importa que emissão de notícias, examinai os cursos que se dão nas universidades, e vereis que a divisão da população global em entidades nomeadas nações é de maneira esmagadora tomada em consideração. No momento em que escrevo estas linhas, os Jogos Olímpicos de verão desenrolam-se em Atlanta. Todos os atletas destes Jogos são organizados pelos Estados nações, representam o seu Estado, trazem a sua cor e a sua bandeira. As medalhas ganhas por estes atletas pertencem ao seu país, são os garantes da honra do seu país e do seu orgulho. Todos os dias, um quadro de medalhas é aberto para cada nação e é difundido aos milhões de pessoas que seguem este acontecimento.

Para a vasta maioria das pessoas, não há nisso nada de bizarro, de insidioso ou de perigoso. Elas dão por adquirido que são membros de um Estado nação, sentem-se orgulhosas desta realização, sofrem quando a nação fica embaraçada ou humilhada (lembramo-nos do caso Ben Johnson?). Raramente se diz, se é que isso tenha tido lugar, que o sistema dos Estados nações é uma criação recente na história humana, que a maior parte das sociedades humanas nunca teve  um conceito de nação qualquer que ele seja, e que a expansão do sistema dos Estados nações corresponde ao desenvolvimento internacional do capitalismo. De mais a mais,muito raramente se acha  no debate político o facto de que o sistema do Estado–nação é a forma política que regula, controla e disciplina as pessoas de maneira a facilitar a sua exploração pelo capital. A maior parte das vezes vivemos num universo mental onde as discussões se conduzem em termos nacionais – automóveis japoneses, aço canadiano, filmes americanos, atletas russos, música jamaicana e assim sucessivamente – e fazem parte do senso comum que organiza a nossa compreensão política e cultural do mundo. Mesmo a ascensão dos nacionalismos étnicos virulentos – como os da ex-Jugoslávia ou os que matam centenas de milhões de pessoas no Burundi ou no Ruanda actualmente, raramente nos conduzem a questionar a ideia da nação ou o nosso próprio nacionalismo. De modo esmagador examina-se o nacionalismo dos outros, que é visto como um problema, e quase nunca o nosso.

 

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Que há de extraordinário no facto de que, sob o modo de producção capitalista, a ideologia burguesa seja dominante e cubra com a sua chapa de chumbo o conjunto da sociedade e das classes sociais, de que controla a quase totalidade das instituições e dos órgãos da comunicação social? Todavia contestamos a afirmação do professor Macnelly no sentido de que o nacionalismo domina a política mundial. O nacionalismo estiola-se docemente sob os assaltos das actividades económicas internacionais do capital mundial. NDLR.

 

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2. Por todas estas razões, o nacionalismo representa sem dúvida o maior desafio colocado ao marxismo. “Os trabalhadores não têm pátria”, diziam Marx e Engels no Manifesto Comunista. Neste espírito, o marxismo lançou o primeiro movimento político que ensinou nos termos internacionais que procurava a emancipação da humanidade à escala mundial e afirmava que a eliminação do Estado nacional era o seu objectivo mais elevado. A Associação Internacional dos Trabalhadores (mais conhecida como a Primeira Internacional), lançada em 1864, representava a forma de organização que quadrava com esta concepção de um movimento político internacional da classe operária. Mas durante quase todo o período de 150 anos depois da publicação do Manifesto Comunista houve um período durante o qual os movimentos da classe operária tenderam (fora do interlúdio de 1917-23 ou perto disso) a tornar-se de maneira cada vez mais esmagadora dominada pelo nacionalismo. Os movimentos operários são quase todos organizações inteiramente nacionais. Pensam organizar os trabalhadores de um dado país, tendo poucas preocupações com os seus irmãos e irmãs de outros lados. Mais ainda: é que são dominados pelo nacionalismo: tendem a sustentar os controlos das importações (e as outras formas de proteccionismo nacional) a proteger  os nossos empregos e o nosso modo de vida. Não será exagerado dizer que o nacionalismo de esquerda é a ideologia dominante dos movimentos operários através do mundo.

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 “ Sendo verídicas estas constatações, que pensas delas? É preciso concluir que,  muito embora a classe operária  esteja desorientada – sem ideologia proletária revolucionária dominante nas suas fileiras – sem organização proletária  influente, deverá baixar os braços e juntar-se ao nacionalismo burguês , às lutas de libertação nacional burguesa  para fazer sair a sociedade  do feudalismo e a fazer entrar no capitalismo e cumprir as duas revoluções sucessivas como Lenine o propunha? Decerto que não, porque as duas revoluções em cascata não são realizáveis, como o provam as revoluções russa, chinesa, cubana e as outras. É preciso saber que estas análises pseudo-científicas da economia política capitalista são falsas mesmo se os sindicatos, as organizações de esquerda burguesa e os intelectuais esquerdistas as propaguem. Cada revolucionário proletário  deve dedicar-se à tarefa e, em lugar  de procurar encontrar entre esta amálgama confusa esquerdizante a explicação mais  “marxista “ – frequentemente  a mais dogmática –, deve fazer um trabalho de pesquisa, de análise da realidade concreta, para difundir os resultados e debater estas ideias com toda a gente.

Em resumo: recomendamos que os proletários revolucionários se afastem de todo o partido político, de toda a organização de esquerda dogmática e sectária, herdeira da II, da III e da IV Internacionais. É preciso quebrar o cordão sanitário anti-proletário que a pequena burguesia sectária, sindicalista, as ONGs subvencionadas, a sociedade civil  altermundialista , ecosocialista, esquerdista , oportunista e reformista ergueram à volta dos proletários”. NDLR.

 

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Se bem que a influência do nacionalismo possa ser quebrada, as perspetivas são verdadeiramente fracas para as políticas do internacionalismo socialista. É por isso que  a  discussão sobre a questão nacional reaparece de maneira recorrente no movimento socialista.  No que se segue, tento passar em revista, os elementos principais dos debates marxistas sobre o nacionalismo, para examinar as suas forças e as suas fraquezas e para aplicar algumas lições que se podem tirar deste estudo sobre as questões nacionais no Canadá hoje em dia.

 

Segunda parte: a questão nacional de Marx a Trotski

 

3. A persistência do nacionalismo e da realidade das lutas nacionais forçaram os socialistas a voltar regularmente a esse assunto. Mas sabe-se que generalidades não funcionam neste domínio. A grande maioria dos socialistas adaptaram-se ou acomodaram-se ao nacionalismo; eles viam o seu projecto como uma maneira mais humana e esclarecida de liderar um estado nacional (e não a sua eliminação no curso de uma luta internacional contra a "miséria do mundo"). Uma pequena minoria de socialistas simplesmente tentou ignorar a realidade das lutas nacionais, constantemente pedindo a unidade internacional dos trabalhadores do mundo que não mobilizavam ninguém e que ignoravam questões nacionais reais e concretas. Existem algumas situações importantes em que os socialistas têm lutado para encontrar um caminho internacionalista vinculado às realidades da opressão nacional. A atitude de Marx em relação à Irlanda na década de 1860 e a abordagem de Lenine aos povos oprimidos da Rússia czarista são consistentes com essa visão. Antes de examinar esses exemplos, no entanto, quero me deter por um momento nas duas tendências a que me referi. 

A luta do proletariado revolucionário contra o modo de producção capitalista não é uma cruzada, “ uma maneira mais humana e esclarecida de dirigir o Estado–nacional” burguês. É uma guerra que terá de ser levada até ao fim, onde o proletariado ou  desaparecerá sob as bombas termonucleares do capital decadente, que não terá de fazer desse capital  um  capital vivo não valorizável; ou o proletariado substituirá o capital nacional e internacional para dar capacidades de  criar um novo modo de producção revolucionário. Contrariamente ao que pretendiam os bolcheviques, não há nenhuma alternativa reformista estadista socialista, nem de coexistência pacífica entre o modo de producção capitalista e o modo de producção proletário comunista. NDLR

4. O movimento socialista mundial adquiriu um carácter de massas pela primeira vez na Alemanha no final da década de 1880. Naquela época, a Alemanha era uma monarquia com um parlamento eleito por uma pequena minoria da população adulta. Com o passar dos anos, mais e mais trabalhadores tiveram o direito de votar e o partido da classe trabalhadora foi organizado, o Partido Social Democrata (mais conhecido por suas iniciais alemãs, o SPD), que se tornou uma força política de primeira importância. O SPD rapidamente se identificou com a "tomada do controlo" do estado alemão e não com o seu derrube. Isso levou os líderes do SPD a tornarem-se cada vez mais influenciados pela ideia de interesse nacional. Gradualmente, os líderes começaram a defender a idéia de um colonialismo alemão "progressista". Eles alegaram que um governo do SPD não daria liberdade às colónias alemãs; simplesmente os trataria melhor. A identificação com o estado nacional foi tão poderosa, tão arreigada que a maioria da liderança do SPD veio apoiar o governo alemão quando ele entrou na Primeira Guerra Mundial. A maioria dos partidos da II Internacional (fundada em 1889) seguiu rapidamente esse caminho.

5. A marxista germano-polaca Rosa Luxemburgo e o marxista russo V.I. Lenine estiveram na vanguarda da oposição socialista à guerra. Ambos denunciaram a guerra como produto do imperialismo e como consequência da competição entre as principais potências capitalistas para dividir o mundo. Luxemburgo e Lenine desenvolveram as políticas da oposição socialista internacional à guerra e argumentaram que os trabalhadores deveriam recusar-se a apoiar as"suas" classes dominantes nacionais e que deveriam trabalhar para transformar as crises sociais associadas à guerra em guerra de classe dos trabalhadores contra o sistema capitalista.

6. Luxemburgo e Lenine deram uma contribuição essencial ao movimento internacionalista e anti-imperialista dentro do movimento socialista. Apesar de suas convergências significativas nessa área, divergiram bastante sobre a questão da atitude socialista em relação às lutas nacionais. Luxemburgo argumentou que na era do imperialismo e do capitalismo totalmente internacionalizado, as lutas nacionais estavam desactualizadas. A economia mundial estava tão desenvolvida que a idéia de um Estado-nação economicamente independente tornou-se ridícula. "Em meados do século XIX", disse ela, "as guerras nacionais irromperam velhos impérios e criaram novos estados burgueses democráticos, e isso foi progressista. Mas desta vez acabou. Na era do capitalismo internacional, é reaccionário apoiar a criação de novos estados-nação. A tarefa agora era mobilizar a classe trabalhadora internacional contra o capitalismo mundial”. Em tempos de capitalismo desenfreado, não pode mais haver guerras nacionais, disse ela. As lutas nacionais "só podem servir como meio de desmoralização", de engano das massas. A posição de Rosa Luxemburgo tinha um ponto forte: o de um internacionalismo de princípios, sua vigorosa oposição ao nacionalismo. Mas, segundo Lenine, ela tinha duas fraquezas importantes. Em primeiro lugar, negligenciava o caráter hierárquico das relações entre as nações - de facto, algumas são dominantes e outras são oprimidas - e a sua posição pode levar os socialistas a uma posição de indiferença ou neutralidade nas lutas entre nações opressoras e nações oprimidas.

 

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“Detenhamo-nos de novo nestes conceitos de “nações dominantes, opressoras e exploradoras” e de “nações dominadas, oprimidas e exploradas “, hierarquicamente diferentes, afirma o professor Macnelly. Convenhamos antes de tudo que uma nação não é uma classe social, mas antes um agrupamento de classes sociais. Numa nação, as pessoas têm uma ocupação – um ofício – condições de existência – um vende a sua força de trabalho, a sua propriedade ou quase – a outra compra meios de producção e força de trabalho para extrair a mais-valia, fonte da sua riqueza, do seu capital em definitivo. Mercadorias que outros enfim vendem e revendem aos proletários que aí delapidam os seus salários comidos pela inflacção. Entre estas diferentes classes sociais não há nada de comum, nada de mentalidade comum: o proletário tem necessidade da paz para se reproduzir, o capitalista vem à guerra para assegurar a reprodução do seu capital. Por vezes, até a língua é diferente de uma classe social para outra, o que em todo o caso não cria uma opressão linguística de classe. Se a classe dominante capitalista francesa e o seu Estado oprimem as classes camponesas e proletárias na Costa do Marfim, não é a classe operária francesa que se aproveita desta exploração de classe e não é a classe capitalista marfinense que é explorada e oprimida pelos seus mentores franceses que, ao contrário, lhe atribui prebendas, contratos de subempreitada e participação de acções das multinacionais do capital, que erradamente se qualificou de multinacionais francesas, belgas ou americanas. Em resumo: a nação francesa não explora a nação marfinense. Incidentalmente, após algum tempo os milionários franceses e marfinenses cooptam-se no seio de conselhos de administração na Costa do Marfim, em França e algures no mundo. Ultimamente, anunciou-se que um primeiro milionário vietnamita comprou acções de uma empresa química multinacional, a mesma que produziu o agente laranja, cujos efeitos fazem ainda morrer as crianças vietnamitas, cujos pais se esfalfam nestas fábricas exploradoras de mão de obra da morte propriedade de um milionário vietnamita.  Não há nações oprimidas e exploradas, tal como não há nações opressoras-exploradoras, não há senão classes sociais oprimidas e classes sociais opressoras, vivendo para as primeiras sob o tecto opressivo dos governos nacionais e dos seus Estados, que cada clã nacionalista burguês quererá controlar para seu benefício. Depois de um século, depois das vitórias bolcheviques e maoistas, os comunistas e esquerdistas do mundo inteiro propuseram-se substituir-se  aos burgueses nacionalistas apodrecidos e mutantes, a fim de realizar as revoluções democráticas burguesas, esperando prosseguir até à revolução socialista em marcha para o modo de producção comunista. Todas foram derrotadas não pela falta de traidores revisionistas e oportunistas reformistas, mas porque as condições económicas objectivas, o desenvolvimento das forças produtivas nesses países atrasados, de um ponto de vista industrial exigem o desenvolvimento prévio do capitalismo. Os chefes comunistas têm-se portanto colocado na posição de quadros do capitalismo de Estado dito em marcha para o modo de producção proletário comunista via a economia de mercado e o modo de producção socialista que nunca foi outra coisa senão a via estática totalitária para o capitalismo, e depois para o imperialismo, como o demonstraram a história da URSS e da China comunista. Na história nunca houve luta de libertação nacional proletária, nunca houve senão lutas de uma burguesia nacional ou de uma facção desta, servindo-se das classes sociais camponesas e proletárias nacionais como carne para canhão para a defesa das suas causas e das suas ambições assim como o demonstram todas as guerras de libertação nacional burguesas onde o proletariado se encontra hoje, após múltiplas guerrilhas e guerras para se libertar dos seus novos carrascos nacionais. Sem libertação económica global, não há libertação política e ideológica nacional. Pior: na época do imperialismo moderno mundializado é impossível para uma secção nacional do proletariado internacional conduzir uma revolução emancipadora num só, ou em dois ou três países. A revolução proletária do futuro será mundial ou não será revolução. NDLR.

Em segundo lugar, a posição de Rosa Luxemburgo substima a importância para os socialistas da defesa dos povos oprimidos até à sua auto determinação como meio de desafiar o chauvinismo nacional que envolve os trabalhadores e as nações dominantes. Segundo Lenine, o erro de Luxemburgo, noutros termos, provêm do facto de que ela considera as lutas nacionais do ponto de vista geralmente abstracto da economia mundial.Ao fazer isso, perde de vista as dinâmicas políticas concretas, a maneira como os conflitos nacionais estruturam o terreno da luta política e a consciência de classe da classe operária. Se os marxistas devem ser realmente parte componente dos debates políticos na sociedade, afirma Lenine, uma posição abstracta e intemporal desta espécie “ todas as lutas nacionais estão ultrapassadas”,  não servem para nada. Ao invés, os socialistas revolucionários devem tentar compreender como é que as lutas    dadas afectam o terreno geral da luta política na sociedade e constroem a partir daí o seu ponto de partida Lenine apresentou a tese que desenvoveu neste domínio como uma elaboração da posição que Marx tinha tomado na luta pela independencia irlandesa. De facto, a posição de Lenine era muito mais original do que isso. Ele desenvolveu uma aproximação completamente nova de todo o problema das lutas nacionais. Mas comecemos por examinar a posição de Marx sobre a Irlanda e veremos o que fez Lenine.

 

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O professor Mcnally penetra aqui no coração da teoria leninista. Mcnally explica que Lenine efectou algumas piruetas e convida-nos  a seguir o seu caminho: 1) constata que o proletariado é influenciado pela ideologia burguesa hegemónica, pela ideologia nacionalista chauvinista, nomeadamente. Com efeito, numa sociedade de classes, a ideologia da classe dominante é hegemónica, já o escrevemos. 2) Lenine, enquanto táctico pragmático, afirma que os socialistas devem tentar compreender como as lutas nacionais dadas afectam o terreno  geral da luta política (…) é preciso construir um ponto de começo a partir daí, sugere Lenine. Tereis notado que Lenine não propõe ainda que os comunistas se apoderem da direcção das lutas nacionalistas burguesas, mas simplesmente “que  eles construam um ponto de partida!?...” Sabe-se hoje que este ponto de partida consistirá, para os partidos comunistas da III Internacional, nomeadamente, em se substituir aos burgueses nacionalistas hesitantes ou então em pôr-se a reboque das burguesias nacionais, a fim de assegurar a vitória das revoluções democráticas capitalistas. 3) Lenine tenta, em seguida, encerrar o círculo de Rosa Luxemburgo e dos internacionalistas revolucionários, chamando Marx em socorro. Voltaremos a este ponto. NDLR.

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7) Marx e Engels tinham em primeiro lugar dado pouca importância à luta da independência irlandesa face à Grã-Bretanha. Em 1848, por exemplo, haviam afirmado que o movimento operário de massa britânico deste período (conhecido como o (Chartismo) devia preocupar-se com este problema. Viam a questão irlandesa como um aspecto verdadeiramente menor da luta da classe operária de Inglatera e muitas vezes acusaram os nacionalistas irlandeses de não se aliarem ao Chartismo .Depois do declinio do Chartismo, como o sentimento anti-irlandês comecasse a desempenhar um papel mais importante na política britânica e logo que o movimento Feniano pela indepedência da Irlanda se desenvolveu de novo nos anos 60, a posição de Marx mudou de novo. A tese de Marx exprimia-se como se segue: em primeiro lugar, afirmou que sendo dado que o sentimento anti-irlandês conduziria os trabalhadores irlandeses a identificarem-se com as classes dirigentes, esta realidade era o obstáculo mais importante a uma política de independência da classe operária.

O trabalhador inglês ordinário odiava o trabalhador irlandês como um concorrente que baixasse o seu nível de vida. Nestas relações com os trabalhadores irlandeses o inglês via-se ele próprio como membro da nação dominante e posicionava-se ele mesmo como instrumento dos aristocratas e dos capitalistas do seu país contra a Irlanda,reforçando assim o seu domínio sobre ele. Este antagonismo é o segredo da impotência da classe operária inglesa.” ( Marx e Engels, a Irlanda e a questão irlandesa).

Em segundo lugar, Marx defende agora que a luta nacional na Irlanda era a chave que iluminaria a revolução operária na Inglaterra. Com isso, Marx reconhecia que havia uma alteração da sua posição anterior. “Durante muito tempo, acreditei que seria possível substituir o regime irlandês graças à subida da classe operária inglesa. Um estudo mais aprofundado convenceu-me do contrário: a classe operária inglesa não fará nada de decisivo aqui na Inglaterra, enquanto não romper de maneira absolutamente nítida, na sua política para a Irlanda,com a política das classes dominantes; enquanto não fizer  não somente a causa comum com os irlandeses, mas também não tomar a iniciativa da dissolução da união forçada de 1801 e da sua substituição por uma confederação igual e livre.” (Marx e Engels, a Irlanda e a questão irlandesa, página 294).

No extracto precedente, Marx comete um erro perfeitamente compreensível neste começo do movimento operário. Marx cria que o proletariado devia organizar-se num vasto partido de massa e apresentar uma plataforma eleitoral às eleições burguesas. Um programa de classe  compreendendo proposições como “a substituição da união forçada por uma confederação igual e livre. Mais de um século de história eleitoralista dos partidos operários no mundo ensina-nos que, de um ponto de vista revolucionário não há nada a esperar destes partidos políticos eleitoralistas de massa, nem da participação proletária nas eleições burguesas. Sabemos agora que o movimento insurreccional e revolucionário espontâneo se desenvolve de outra maneira, nomeadamente, reforçando o desprezo e a rejeição completa que de qualquer maneira o proletariado desenvolverá instintivamente sem desprezo pelos candidatos da “esquerda”  face ao estado burguês e à sua governação, face às mascaradas eleitorais e face ao nacionalismo chauvinista. Nisso podemos  afirmar que a classe operária é a vanguarda da vanguarda”. NDLR.

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A experiência de repensar a questão irlandesa foi de uma importância universal para Marx e Engels. Ela conduziu Marx, por exemplo, a formular esta magnífica reflexão: “Toda a nação que oprime uma outra forja as suas próprias cadeias”. A bem dizer , o que Lenine fez foi retomar esta intuição e aplicá-la sistematicamente.

O imperio dos czares da Rússia englobava dezenas e dezenas de comunidades internacionais oprimidas. Tentando organizar o movimento da classe operária no império czarista, os marxistas russos estavam inevitavelmente confrontados com as aspirações nacionais. Muitos dos marxistas russos recusaram-se a isso e sugeriram que as questões nacionais não teriam lugar num movimento marxista. Os primeiros escritos de Lenine não davam atenção a estas questões. Mas com o tempo a questão nacional acabou por desempenhar um papel cada vez mais importante no seu pensamento. Com a Primeira Guerra Mundial, desenvolveu uma atitude muito específica em relação a esta questão. As concepções de Lenine tomaram os seguintes desenvolvimentos…

 

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Por que é que Lenine se viu constrangido a desenvolver uma política nacionalista no decurso da revolução Russa? Porque os bolcheviques não dirigiram uma revolução proletária anti-capitalista, estando o capitalismo balbuciante e o proletariado pouco desenvolvido  na sociedade russa semifeudal onde as massas camponesas formadas maioritariamente de  mujiques  quase escravos, submetidos às relações de producção feudais, onde os elementos constituintes de uma nação estavam em desenvolvimento. Não faltava senão o Estado-nação capitalista que Estaline criou posteriormente. Para conduzir uma revolução proletária é preciso um vasto proletariado educado, experimentado, empobrecido, consciente internacionalmente e conectado com as outras facções do proletariado mundial. Para conseguir a tal revolução democrática capitalista e abolir o modo de producção feudal, Lenine e os bolcheviques tiveram de mobilizar e enquadrar as massas camponesas atrasadas, analfabetas, numa vasta  insurreição camponesa para “dar a terra a quem a trabalha” (o que não durará muito tempo), no quadro de comunidades  locais  ou regionais, e assim os leninistas consolidaram as nações burguesas de todas as Rússias, ao mesmo tempo que construíram um capitalismo de Estado vigoroso, assaz potente para enfrentar o capitalismo alemão. Não há nada de revolucionário proletário em tudo isto. E a razão pela qual, na morte de Estaline, Kruchov não teve dificuldade em consolidar o império nacional russo sob o conjunto nacional soviético, sob o qual ainda hoje voga Vladimir Putin.  NDLR

 

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Em primeiro lugar, a ordem do mundo imperialista estabelece uma hierarquia entre as nações o que produz inevitavelmente revoltas nacionalistas. Em segundo lugar, o problema principal para os marxistas é como encontrar uma base internacionalista num mundo dominado pelos conflitos nacionais. Em terceiro lugar, o problema estratégico central é o de  tentar levar trabalhadores com sentimentos nacionalistas para sentimentos internacionalistas. Em quarto lugar o maior obstáculo para fazer isso é o nacionalismo dos trabalhadiores das nações dominantes ( como afirmava Marx a respeito dos os trabalhadores ingleses no caso da Irlanda) o que os conduziu a identificar-se com a sua classe dirigente, o que rerforçava o nacionalismo dos trabalhadores das nações oprimidas (porque estes últimos não viam que os trabalhadores da nação dominante simpatizassem de todo com as suas aspirações de se libertarem da sua opressão  nacional). Em consequência, segundo Lenine, os marxistas devem sustentar o direito das nações oprimidas ao direito da auto-determinação, inclusive o direito de formar um Estado independente.

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Por que é que o facto do capitalismo se desenvolver a diferentes velocidades nos diferentes países produzirá revoltas nacionais se não é porque as burguesias desses diversos países são forçadas a afrontar-se pelos mercados? Que se deve pensar destas observações de Lenine e da sua conclusão sob o direito das nações à auto-determinação, ou seja, sobre o direito das nações a disporem de si próprias? Em 1917, e nós acrescentamos em 1949, no momento da libertação burguesa da China pela Revolucão da democracia nova, as condições objectivas e subjectivas  da revolução proletária internacionalista não estavam ainda reunidas e desta maneira a revolução proletária era impossível. Um modo de producção não pode ser substituído, enquanto não tiver desenvolvido todas as forças produtivas que é  capaz  de conter  e reproduzir o que estava longe  de ser o caso para a indústria nascente na Rússia czarista, e  da mesma maneira para a China Maoísta em 1949. É esta triste realidade que impulsionou as conclusões oportunistas de Lenine, e depois de Mao, para justificar que os comunistas dirigem estas revoluções democráticas nacionalistas burguesas. NDLR

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O ponto central da tese de Lenine é a sua insistência sobre a política contrária de Rosa Luxemburgo, que se apoiva sobre uma tese fundamentalmente económica. Lenine insiste que o nacionalismo representa uma divisão política importante no interior da classe operária. A aproximação marxista toma esta visão política como ponto de partida do esforço para a ultrapassar. Nesta finalidade, a principal questão não é a da viabilidade económica de um dado Estado- nação, mas quais as tácticas que serão mais importantes para construir a solidariedade de classe e o internacionalismo. E a resposta de Lenine é clara: minar o chauvinidsmo nacional dos trabalhadores da nação dominante, fazendo  campanha aberta pelo  direito das nações oprimidas a determinar o seu próprio fututo. Para ganhar os trabalhadores da nação oprimida, uma tal posição deverá representar o principal golpe desferido sobre as identificações nacionalistas.

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Este raciocínio do senhor Mcnalli é o contrário do de uma aproximação materialista dialéctica. As relações de producção decorrem do desenvolvimento das forças produtivas e dos outros meios de producção, e não o inverso. O que tornará os proletários internacionalistas não serão os sermões dos comunistas e de outras esquerdas oportunistas, mas o próprio desenvolvimento do capitalismo mundializado e globalizado, que forçará a internacionalização da classe operária, na prática, seja política ou ideológica o que está hoje em vias de se cumprir. NDLR.

 

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Lenine tornou muito claro que isso não significava que os marxistas quisessem ver cada vez mais Estados nacões independentes. Ao contrário como internacionalista marxista ele favorecia as federações que conduzissem os trabalhadores numa via política comum. Mas tais federações deviam ser voluntárias. Não deviam opor-se às federações políticas forçadas ou coercivas ou opressivas.” Se pedimos a liberdade de secessão para os Mongóis, os Persas, Egípcios e todas as outras nações oprimidas sem excepção, não é porque nós favoreçamos a secessão, mas somente porque defendemos a associação voluntária e diferente de uma associação forçada.”

Sustentar o direito das nações à auto-determinação tornou-se assim um elemento chave da aproximação estratégica à construcção da solidariedade internacional dos trabalhadores. Não para sustentar que este direito significa o alinhamento com o    nacionalismo dominante. Isto significa que contentar-se  com um internacionalismo abstracto conduz a reconhecer a importância da experiência da dominação ou o que Lenine chamava a psicologia que é tão importante no que concerne à questão nacional.” ( Obras Completas, Volume XIX, página 499).

A solidariedade internacional necessita, noutros termos, que os trabalhadores das nações dominantes se tornem nos defensores mais consequentes dos direitos dos povos oprimidos aos seus estados, à sua autodeterminação ( incluindo, à sua separação)

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Mas de onde provém esta ideia de que um povo oprimido possa  autodeterminar-se e emancipar-se no seu Estado nacional burguês? O Estado nacional burguês (capitalista classico ou sovietico) nunca foi o estado de “todo um povo”, e sobretudo nunca foi  do proletariado, mas é sempre o Estado da classe dominante, que oprime esse proletariado. O Estado é o primeiro instrumento de alienação da classe oprimida. Esta classe se deseja emancipar-se  deve começar por destruir o Estado democrático burguês nacional e chauvinista. Assim na União Soviética, após dezenas de anos de capitalismo de Estado, o nacionalismo, o chauvinismo, a religião retrógrada e toda uma avalanche de ideias burguesas  decadentes eram florescentes e explodiriam em plena luz do dia no momento da Perestroica - Glasnost. As vozes pias dos bolcheviques a propósito de abordar a auto-determinação nacional nunca permitiu a um único povo, ou a uma única minoria étnica deixar as correias do Estado soviético. NDLR

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Ao mesmo tempo, Lenine defende uma tal oposição de princípio ao nacionalismo dominante e permite aos trabalhadores das nações oprimidas caminhar do nacionalismo ao socialismo. Enquanto que os socialistas das nações opresssoras defendem o direito das oprimidas à auto-determinação, os socialistas das nações oprimidas  “devem conceder uma importância central à unidade e à aliança dos trabalhadores das nações oprimidas com os das nações opressoras; de outra maneira, as Teses destes sociais democratas sobre as questões nacionais e coloniais da Internacional Comunista tornar-se-iam involuntariamente aliadas da sua própria burguesia nacional.” Na mesma ordem de ideias, afirmam que mesmo concedendo um apoio às lutas nacionais burguesas contra o nacionalismo, os socialistas insistem sobre “ a independência de classe do movimento proletário.”

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 Em que país já se viu os trabalhadores da dita “nação oprimida” caminhar do nacionalismo para o internacionalismo comunista pela magia espontaneista da libertação nacional de facto? É precisamente o contrário o que a maior parte das vezes se observa. Os proletários indiferentes às ideias nacionalistas e chauvinistas burguesas subjugadas pelas ideias reaccionárias, aprisionadas como estão nas guerras nacionais fraticidas onde as suas casas são destruídas em nome da Pátria. Da nossa parte, pensamos  que, no momento em que as condições objectivas da revolução proletária mundial estiverem reunidas, a questão nacionalista burguesa já não será uma questão importante, sobretudo para o proletariado internacionalista e isso não será por falta  dos comunistas. NDLR

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Esta análise reforçou consideravelmente a capacidade  dos socialistas se empenharem com seriedade nas lutas nacionais em curso, sem abandonar os seus objectivos socialistas. Por estas razões, podemos aprender  bastante dos escritos de Marx sobre a Irlanda e das discussões de Lenine sobre a questão nacional. Ao mesmo tempo,  estes escritos já não oferecem nada senão balizas. Acima de tudo, defender o direito de separação nada diz sobre as condições em que se o defende. Mais do que fornecer uma fórmula que pode simplesmente ser aplicada em todos os contextos, serão um ponto de partida para guiar a nossa análise. Tentar utilizá-los não é um substituto para uma análise séria.  Antes de discutir como, devemos utilizar estas análises na nossa aproximação às lutas nacionais no Estado canadiano, e é importante examinar as jogadas do nacionalismo e do internacinalismo conforme se exprimem após a morte de Lenine em 1924. O movimento comunista internacional trepou do internacionalismo ao nacionalismo sob o impacto da degenescencia da revolução de 1917 na Rússia e da ascensão do estalinismo.

 

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A Revolução de 1917 foi, do princípio ao fim, uma luta da libertação nacional das burguesias nacionais de todas as Russias  que se precipitaram para aderir ao partido bolchevique enquanto a aristocracia corrompida migrava em massa para a Europa ou ainda quando ela erguia as armas brancas para defender o seu modo de producção feudal  decadente. O estalinismo não foi o coveiro da revolução proletária russa, pois esta revolução proletária nunca teve lugar – o pequeno proletário russo, fraco e inexperiente , era bem incapaz de conduzir uma tal revolução sob o vasto continente russo atrasado e pouco industrializado e ainda menos de a exportar para o mundo inteiro. Foi então que Estaline fez a demonstração de que tinha compreendido a urgência nacional soviética,  que consistia em construir rapidamente um capitalismo nacional e um Estado industrializado. Rodeada de inimigos como se achava a Rússia bolchevique, o aventureirismo pseudo- revolucionário de Trotsky, metia medo, e eis porque este intelectual burguês foi afastado do Poder. Estaline não modificou a política nacionalista bolchevique,  aplicou-a simplesmente e aceleradamente.  Apoiando-se sobre este nacionalismo, o “Pai” dos Povos pôde exigir os maiores sacrifícios estacanovistas aos camponeses russos transformados em proletários e assegurar assim a industrialização rápida do país lançando-o para confrontos com o imperialismo alemão. NDLR

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Da mesma maneira que em 1923, a ideia de um “bolchevismo nacional” foi desenvolvida pelo Partido Comunista Alemão. Uma vez que Estaline declarou que era possível construir “ o socialismo num só país”, a porta ficou aberta para a adopção da ideia de lutas nacionais distintas para o socialismo, termos de referência dos nacionalismos dominantes. Assim, e por exemplo, o Partido Comunista do Canadá descobriu rapidamente que o nacionalismo canadiano era progressista, enquanto que os membros do PC do quebec, que tentava promover uma compreensão mais deferenciada da luta nacional do Quebec era regularmente expulso sobre o apodo de nacionalismo burguês.

Uma das grandes contribuições históricas de Leão Trotski foi o resistir à noção de luta pelo socialismo como se fosse uma luta nacional e de se ater firmemente ao internacionalismo marxista. Com todos os seus terríveis problemas, os grupos trotsquistas desempenharam um papel importante na salvaguarda destas ideias vivas à época, onde o nacionalismo dominava  a esquerda. A contribuição específica de Trotsty à época foi a sua teoria da revolução permanente. Originariamente formulada como a perspectiva estratégica para a revolução russa do futuro, nos fim dos anos 20, Trostky reformulou-a como a teoria das relações entre as lutas de classes e as lutas nacionais na época do imperialismo.

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8. A teoria da revolução permanente foi uma contribuição brilhante e original para o pensamento marxista. Ao rejeitar a ideia esquemática, linear e mecânica de que toda a sociedade deveria passar por certos estádios históricos antes de lutar pelo socialismo, Trotsky defendeu que a análise concreta das dinâmicas de classe numa dada sociedade deveria fazer-se no contexto das relações com a economia mundial. Assim, enquanto que a maior parte dos marxistas russos defendia que a Rússia deveria antes de tudo fazer uma revolução democrática burguesa  contra o czarismo, e então completar um estádio do desenvolvimento capitalista antes de que a luta pelo poder operário esteja na ordem do dia, Trotsky defendeu que a burguesia russa estava demasiado assustada com o poder crescente do jovem proletariado russo para conduzir a luta contra a monarquia czarista russa. Assustada de que o movimento revolucinário pela democracia liberal pudesse transformar-se em greves de massa e fizesse descer o proletariadio insurrecto às ruas, batendo-se pelas suas reivindicações de classe particulares (o que de facto ocorreu em 1905), a burguesia russa rapidamente abandonou uma tal luta, sustentava Trotsky. Daí resultou que a direcção da luta anti-czarista passaria ao proletariado que imporia a sua marca ao movimento, conduzindo-o em direcção à luta pela democracia operária. Tomando de empréstimo uma frase de Marx, Trotsky descreveu-a como a revolução permanente – que começa como um movimento revolucionário pela democracia liberal e que se transforma  numa luta pela democracia socialista e pelo poder operário.

A teoria de Trotsky (desenvolvida em 1905-1906) demonstrou uma profunda antecipação de dinâmica de classe do processo revolucionário de 1917. Sob o impacto do movimento revolucionário na China nos anos 20, Trotsky rapidamente estende a teoria da Rússia ao mundo colonial em geral. Nas colónias, sugere ele que o mesmo modelo deva ser aplicado: uma burguesia temerosa retira-se da luta anti-colonial, esta última triunfará somente sob a direcção do partido revolucionário da classe operária.Se bem que haja aí ensinamentos importantes a extrair desta análise, existe o risco de uma sobregeneralização (sic) De mais a mais, na ausência de uma classe operária auto-organizada e combativa, como a do movimento operário russo de 1905 e 1917, por que é que os grupos burgueses e pequeno burgueses se haveriam de retirar da direcção das lutas nacionais? E, com efeito, não se retiraram.Em países como a Ìndia, a Argélia, o Paquistão, o Bangladesh e dezenas de outros, os movimentos nacionalistas não foram dirigidos pela classe operária e deram lugar ao aparecimento de Estados-nações independentes. Na China, o dito partido comunista conduziu uma luta sem nenhuma actividade auto-organizada da classe operária, e sem nenhuma aparição de órgão de democracia operária.

 O mundo posterior a 1945 foi testemunha de uma sucessão de independencias nacionais nas quais os movimentos da classe operária não desempenharam um papel significativo. Claro está que estas realidades exigem que seja revista a teoria de Trostsky. Qualquer que seja a sua força, não poderá ser utilizada como uma antevisão universalmente válida a respeito das lutas nacionais na época do imperialismo. Certos trotsquistas procuram discutir estes acontecimentos que estão claramente em contradição com a teoria de Trotsky. Outros, todavia, continuam a defender dogmaticamente à letra os escrotos de Trotsky. A maior organização  trotsquista americana ( Socialist Workers Party) produziu um documento em 1964, por exemplo, que afirma: “ Na época imperialista, a burguesia nacional nos países industrialmente retardatários trai a sua própria revolução e as tarefas democráticas burguesas, e, inclusivé a realização da independencia nacional não pode ser realizada senão através da revolução socialista.”

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9. Agora, o facto de que esta pretensão seja evidentemente falsa ( isto é, que a independencia nacional possa ser relizada sem revolução socialista) não parece ser tida em conta. Foi Trotsky quem o disse e, por conseguinte, deve ser verdadeira. E um grande número de trotsquistas que defende uma tal linha começaram a ver revoluções socialistas e estados operários um pouco por toda a parte. Na Argélia, no Egipto, onde um regime nacionalista progressista tomara o poder. Apesar de tudo, se a independencia nacional não pode ser realizada senão por uma revolução socialista, então a realização da independencia nacional deveria querer dizer que uma tal revolução já tinha tido lugar. O facto de que nada de semelhante a uma revolução socialista possa ser reconhecida – como milhões de pessoas oprimidas, descendo às ruas e lançando as bases do exército, como greves de massas e ocupação dos lugares de trabalho, como novas instituições populares de auto-governo apareceram nos locais de trabalho e nas comunidades não parecem importantes? Indo mais longe do que Trotsky foi, alguns grupos começaram a defender que havia uma lógica escondida que conduzia as lutas nacionais à revolução socialista. Mesmo que o não soubessem, os nacionalistas burgueses e pequeno-burgueses conduzem actualmente revoluções operárias. A primazia da auto-emancipação operária desapareceu rapidamente( como se a maior parte dos grupos sociais pudesse construir o socialismo). E inevitavelmente, a linha entre o nacionalisnmo e o socialismo rompeu-se. No fim de contas, se o nacionalismo anti-imperialista se transforma automaticamente em socialismo, então a linha entre os dois é verdadeiramente muito tenue. Certos trotsquistas que defenderam tais concepções tornaram.-se eventualmente mais ou menos acríticos e aderiram ao nacionalismo de feição progressista (Cuba, Nicarágua, Granada) e abandonaram a ideia da revolução permanente e a sua insistência sobre a independencia da classe operária e da sua organização socialista na luta nacional. Foi neste sentido que evoluiu o SWP americano ( Socialist Workers Party).

(Recordei)Lembrei estes elementos porque eles sublinham como é importante resistir às fórmulas simples quando falamos de lutas nacionais. Não há lei geral ou da dinâmica das lutas nacionais hoje (e aliás nunca houve) um dos erros de muitos marxistas foi procurar uma dessas leis, em vez de tomar conta da tarefa, de longe mais importante de desenvolver uma análise muito concreta da particularidade das lutas nacionais numa conjuntura histórica determinada. Com esta preocupação na cabeça, proponho-me rapidamente fazer algumas considerações preliminares sobre as lutas nacionais no Estado canadiano. Mas antes disso, quero sublinhar os sectores nos quais a aproximação marxista do nacionalismo permanece fraca e devemos estar conscientes de que tais sectores devem ser sectores de trabalho para desenvolver uma compreensão cada vez mais ampla do nacionalismo no mundo moderno.

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Terceira Parte : os Problemas da Teoria Marxista do Nacionalismo

 

10. Um dos elementos fortes das concepções de Marx sobre a Irlanda num dos escritos de Lenine sobre a questão nacional, é que eles fornecem uma maneira de sustentar as lutas nacionais dos povos oprimidos sem se fazerem campeões de uma qualquer forma de nacionalismo. É o que torna a sua herança uma herança das mais importantes.  Mas dito isto, devemos estar conscientes que nem Marx nem Lenine nos forneceram realmente uma teoria que nos permita compreender um dos problemas mais importantes que encontramos neste domínio: o incrível poder e a persistência do nacionalismo e das identificações nacionais. Mais do que uma diversão temporaria ou episódica de uma consciência de classe mais desenvolvida o nacionalismo dominou e continua a dominar os pensamentos da vasta maioria da classe operária e dos povos oprimidos. Não pretendo ter todas as respostas pelas quais ele se tornou assim. Mas deixai-me fornecer quatro explicações parciais  sobre o que deve ser explodado e desenvolvido.

11. O primeiro sujeito  é o que podemos chamar a atracção pela cidadania. Lembremo-nos que nos primeiros movimentos da classe operária foram  criados  nos contextos em que a vasta maioria da classe operária não votava. Por esta razão, a luta pelos direitos democráticos, especialmente o direito de voto, ocupava um lugar maior na agitação socialista. Com efeito, o socialismo- habitalmente designado sob o nome social democracia – apareceu muitras vezes para a inclusão da classe operária no interior da democracia capitalista. Isso produziu toda uma tradição história onde a democracia socialista era criticada nuito simplesmente por não ser sufucientemente inclusiva . Resultado: a questão da forma do poder poítico capitalista – o Estado-nação burguês – e os seus problemas inerentes (  burocratismo, definição nacional de cidadania, separação do poder económico do poder político) raramente foram ultrapassados. Isso significa que os movimentos operários procuraram geralmente a plena cidadania no interior da democracia capitalista. Não se pode negar a importancia desta luta. No fim de contas a luta pelos direitos democráticos burgueses, a batalha para ser considerado como um membro de corpo inteiro da sociedade tem um significado fundamental. Mas no processo, a classe operária acaba muitas vezes ligada a esta especie de ideia, a de que tem poucas ligações com as tradições políticas que avançam uma crítica radical dos limites inerentes e das ligações da democracia liberal em si mesma. Assim, uma definição liberal dos direitos e da cidadania enraizam-se historicamente e profundamente nos movimentos oprerários - nos quais as pessoas são definidas como entidades separadas chamadas individuos, que estão em competição económica nos mercados que são regulados por leis que não reconhecem senão os direitos dos individuos ( e das suas famílias) que são amplamente compradores e vendedores de bens e de serviços( tudo isso é num certo sentido muitas vezes definido como o reformismo ) Diz-se que os marxistas não prestam suficiente atenção ao poder ideológico das noções de cidadania, preferindo simplesmente sublinhar a corrupção e o carácter vendido dos dirigentes que trairam o movimento socialista. Se devemos desenvolver uma alternativea séria ao reformismo, será todavia necessário não somente denunciar os dirigentes corrompidos , mas o que é mais importante, de encontrar as maneiras de avançar uma crítica da democracia socialista e da cidadania, reconhecendo a importância dos direitos quando fazemos uma crítica dos seus limites, crítica que poderá ter assim eco na experiência da classe operária em lugar de soar como slogans redutores.

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Todos terão notado que o intelectual titula  o seu capítulo “ Os problemas da teoria marxista e do nacionalismo” indicando,   com isso  que o objecto do seu  estudo  não é o nacionalismo, como entrave à revolução proletária na prática concreta da luta de classes, mas a teoria marxista em si mesma, a sua pureza e a sua defesa contra a impureza desviacionista (sic), actividade que constitui em si mesma um desviacionismo proletário. O intelectual nem sequer imaginou que  “a incrível persistência do nacionalismo” chauvinista e reaccionário estivesse ligado à incrível persistência do modo de producção capitalista  que nunca acaba de titubear e de se incrementar uma crise após outra. A esquerda reformista que numa certa época se chamava “ oportunismo de esquerda”, depois “revisionismo de direita” andou sempre errante na periferia da classe proletária, procurando uma postura não demasiado constrangente pela qual poderia  vender as suas aspirações visando conservar o regime nacionalista democrático burguês ou reformá-lo até o tornar aceitável à classe operária. A pequena burguesia foi sempre a base social do esquerdismo, do anarquismo e do terrorismo, que não são senão variantes radicais do reformismo. A pequena burguesia, incluindo a sua  secção intelectual, – classe social votada ao desaparecimento sob a evolução imperialista do modo de producção capitalista - agarrou-se desesperadamente às particularidades do capitalismo nacional que asseguraram a sua subsistência, tal como o direito burguês, a representação parlamentar, a governança “democrática” do imenso Estado burguês tentacular. Tudo isso conduz a subclasse  pequeno burguesa a aderir a todas as lutas para a defesa dos direitos democráticos burgueses (gentrificação, feminismo, LGBT, direitos dos animais, comunitarismo, laicidade, justiça social, defesa dos assistidos sociais e dos SDF, escolaridade, cuidados de saúde, ambiente, agricultura humana, ecologia, consumo e sobreconsumo, pobreza voluntária, caridade pelo terceiro mundo, descolonização, nacionalismo, pacifismo, anti-racismo, direitos dos detidos, ciclismo urbano, naturismo, nutrição, etc), tudo e não importa o quê, exceptuadas as lutas da classe proletária que ela julga demasiado radical, por vezes violenta, e que não são publicitadas pelos órgãos de comunicação social populares e  pelos  tablóides. A pequena burguesia é muito sensível a este aspecto de visibilidade mediática e do efeito da moda. Isto está ligado à sua prática social e cultural. A pequena burguesia tem por função principal assegurar o serviço da reprodução da população, sob todos os aspectos. O pequeno- burguês concebe a luta de classes como uma missão e um benevolência onde deve consciencializar e fazer progredir a vontade dos oprimidos que o pequeno-burguês crê incapazes de compreenderem a sua opressão e a sua miséria. Para o  pequeno-burguês, se ele consegue convencer suficientemente as pessoas de uma causa, elas vencerão pela petição porque a pequena burguesia crê sinceramente  na democracia representativa burguesa, na democracia cidadã do número – forçosamente é o seu ganha-pão. O pequeno-burguês não compreende que para conduzir uma revolução social, deve existir uma conjuntura revolucionária que mobilizará espontaneamente os efectivos requeridos – não haverá nada a fazer por isso – a crise económica lá chegará. A verdadeira questão será então – não quantos operários serão mobilizados – mas para que objectivos são eles dirigidos? Pela sua luta quotidiana na frente económica, nomeadamente a classe proletária conhece a pusilanimidade  dos “direitos-privilégios”, das aquisições sociais efémeras arrancadas temporariamente apesar da ditadura do grande capital. A classe proletária sabe que a ditadura burguesa é “ fecha a  boca”, enquanto que a democracia burguesa é “ discute sempre”.  Nada senão a mobilização da classe operária como carne para canhão nas guerras de libertação nacional burguesas se relacionará com o proletariado, - a mobilização da classe operária nas guerras burguesas para a defesa da liberdade, da  democracia, do direito de negociar e os pseudo-direitos e aquisições sociais não lhe dizem qualquer respeito, senão a experiência de luta e das decepções . Sob a crise económica sistémica do capitalismo não há nenhum programa de reforma que valha. É a substituição do Estado burguês e a abolição do modo de producção capitalista e a sua substituição não pela economia socialista mas pelo modo de producção proletário-comunista que são os objectivos da revolução social proletária. NDLR

 

12. Ligado com este elemento, há um segundo problema: as versões do socialismo centradas na questão do Estado dominaram o século XX. Durante todo este período histórico, a parte mais importante da esquerda apresentou a propriedade estatal como a essencia social e económica do socialismo. Marx colocou no centro da sua crítica do capitalismo o que chamou as relações sociais de producção, o que significa as relações de domínio, de controlo, de alienação e de exploração induzidas pela maneira como a riqueza é produzida na sociedade capitalista. O que decorreu desta aproximação foi a ideia de que o socialismo conduz ao desenvolvvimento de novas relações de producção, baseadas sobre formas não alienadas de controlo e de auto-gestão da producção pela classe operária. O controlo operário sobre a produção e de novas instituições governamentais auto-gestionárias estão no centro de uma tal perspectiva.

Durante a época em que os partidos comunistas estalinistas dominaram a esquerda (1925-1980 ou à volta disso), estas aquisições perderam-se. A propriedade estadual dos meios de producção e a economia planificada eram apresentadas como a essência da nova sociedade. A despeito das melhores intenções, numerosos trotsquistas também colocaram a esse nível o seu ponto essencial. Resultou que a ideia de propriedade de Estado é em si mesma progressista, seja  em si socialista ou se tenha tornado largamente partilhada pela esquerda. Isso contribuiu para as políticas centradas sobre o Estado, onde as ideias de regulamentação estadual e de planificação do Estado foram elavadas a uma posição de primeiro plano na propaganda socialista. Uma das consequências disto foi que a natureza opressiva inerente ao Estado nação raramente foi atacada. De facto, até hoje, muita gente na esquerda continua a defender tais concepções e parece esquecido da hostilidade das massas para com as burocracias estaduais centralizadas, que se desenvolveram- por boas razões-, nas fileiras da classe operária na maioria dos locais do mundo.

O que estas políticas socialistas estatistas (a que podemos chamar socialismo de cima) esquecem é que o Estado nação se desenvolveu  com o desenvolvimento do capitalismo pelas classes burguesas, que procuram integrar a marcha nacional por um sistema uniforme de leis e de taxas, numa língua comum, numa governação unificada e num exército nacional para defender e avançar as suas pretensões contra os capitalistas estrangeiros  ( e esmagar as revoltas domésticas quando isso se torne necessário). Assim se perdeu o sentido próprio da forma democrática inerente à democracia burguesa (como o sublinhou Marx em A Guerra Cívil em França). Enfim, as versões estatistas do socialismo tendem a perder de vista o facto de que as estruturas nacionais e as instituições do Estado- nação perpetuam a divisão do mundo entre um nós ( que pertence a uma dada nação) e um eles ( os estrangeiros, os de fora). As consequências do socialismo estatista são o reforço do nacionalismo à custa do internacionalismo.

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Contrariamente ao que pretende Mcnally, não é o socialismo que conduz ao desenvolvimento de novas relações de producção baseadas em formas não alienadas de controlo e de auto-gestão da producção pela classe operária, mas sim o modo de producção comunista que não pode impor-se senão após um longo e considerável desenvolvimento das forças produtivas sob o capitalismo liberal, totalitário ou socialista. Incidentalmente, a classe operária tem então vocação a desaparecer (sob o comunismo). A contradição fundamental de um modo de producção (qualquer que ele seja) reside sempre no processo de producção e não nas relações sociais de producção. Assim, o que desqualifica o modo de producção capitalista é que o capital produtivo já não chega a valorizar-se em grande quantidade para assegurar a sua reprodução alargada, o que desencadeia a implosão das relações sociais de producção, provoca tumultos sociais, envenena as lutas de classes antagónicas até à insurreição e potencialmente até à revolução. Não decorre dos revolucionários  proletários criar as condições objectivas da crise económica, politica e depois social, tudo isso será espontâneo, mecânico e incontrolado. O que será consequência da revolução dos revolucionários proletários será estimular e inflectir este movimento popular insurrecional espontâneo, até fazê-lo cumprir a sua missão histórica, destruir o antigo modo de producção capitalista, para em seguida transformar esta insurreição popular em revolução proletária, o que significa construir o novo modo de producção proletário- comunista. Dito isto, o professor Mcnally tem razão em sublinhar que daí resulta entre os socialistas que a ideia da propriedade do Estado é em si progressista (….) uma consequência disso foi que a natureza opressiva inerente ao Estado nação  raramente se viu atacada….” Pela esquerda reformista nacionalista. NDLR.

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13.  Tudo isto nos conduz a um terceiro ponto: a política do espaço. Os marxistas têm curiosamente ficado indeferentes quanto às questões do espaço, especialmente no que diz respeito às idendades dos povos que têm pontos de referência espaciais e geográficos. Mesmo as memórias pessoais têm invariavelmente dimensões espaciais : Nós pensamo-nos a nós mesmos como tendo nascido num certo local, vivido , crescido, trabalhado, ir à escola em diferentes sítios, e assim sucessivamente. Até agora, para a maior parte da história da humanidade, as relações de espaço não têm nada a ver com pertencer a uma nação. De facto, as pessoas pertencem a grupos   que têm espaços mais pequenos ou maiores. Mas o capitalismo construiu aquilo que Benedict Anderson descreveu como comunidades imaginárias. As nações são assim, em parte, construcções imaginárias, - organizadas à volta de símbolos como as bandeiras, os hinos, as cores nacionais, os mitos e as histórias em grande parte artificiais ligadas às unidades administrativas nomeadas Estado nação. Nós não temos necessidade senão de observar um fenómeno como os jogos olímpicos para comprender o poder de atracção das comunidades imaginárias. Milhões de pessoas que nunca encontraram Silken Launnaum ou Donovan Bailey ajem todavia como se “fossem sua carne e seu sangue”, glorificando-se das suas vitórias e mortificanco-se das suas derrotas. Digo isto não porque pense que tudo é inevitável no que respeita às identificações nacionais, mas pelo contrário. Mas sem a compreensão socialista revolucionária de que tais identificações respondem a uma necessidade real – o desejo de pertencer a uma comunidade com outros, de ter objectivos comuns – substimaremos a necessidade para os movimentos socialistas de massa no futuro ajudarem a desenvolver os  sentimentos internacionalistas de uma comunidade que está ligada às experiências locais e mundiais. Não bastará ter uma vanguarda que poderá dizer que o nacionalismo é o seu inimigo; será necessário favorecer com novas experiências de espaço baseadas em formas de organização que criam nova solidariedade e novas identificações, forjadas na luta comum, e que ultrapassa o Estado nação.

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14. E isto leva-me ao meu quarto ponto: a subida do nacionalismo na era da mundialização. A globalização económica desencadeou-se; nenhuma parte do planeta ou quase foi poupada pela ascensão considerável das empresas transnacionais e pelos mercados financeiros globais.A maior parte dos Estados nações são economicamente mais pequenos do que as grandes empresas transnacionais e os mercados monetários mundiais ultrapassam somas todos os dias que excedem em muito tudo quanto possui um banco central qualquer ( ver o meu artigo O Fim dos Estados Nações, New socialist, n.º 3, Maio-Julho de 1996). Estas entidades económicas mundiais causam razias na vida dos povos: as empresas que encerram, as comunidades que são destruídas, os serviços sociais que são desfeitos: os hospitais comunitários, as escolas, os escritórios de correios que desaparecem, tudo em nome da globalização. Em tais circuntancias, o nacionalismo torna-se o primeiro e mais simples meio de compreender e de resistir a estas forças. Lembremo-nos que um governo nacional pode parecer como mais próximo e mais compreensível que os transnacionais ou o mercado monetário electrónico e global centrado no ciberespaço. Mas pedir ao Estado nacional que nos proteja contra o capital global conduz inevitavelmente a ver o problema em termos nacionais. Os estrangeiros ( e o que é estrangeiro) tornam-se inimigos da nossa segurança e do nosso bem- estar. Os políticos perigosos e sem escrúpulos tornam-se rapidamente os adeptos que nutrem e manipulam tais sentimentos. Assim, Os Trabalhadores Unidos do automóvel empenharam-se no afastamento dos automóveis japoneses, os jovens sem-emprego na Alemanha lançaram bombas incendiárias contra os hotéis cheios de trabalhadores imigrantes de origem turca, pessoas da Califórnia sustentaram protestos contra os ilegais do México, os canadianos-ingleses denunciaram os do Quebeque. Os Servos, os Croatas, os muçulmanos opuseram-se uns aos outros na ex-Jugoslávia. Os Hutus e os Tutsis afrontaram-se em conflitos sangrentos no Ruanda e no Burundi – e a lista poderia alongar-se.

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Partindo de um mau diagnóstico o professor propõe um mau remédio. A “globalização económica” não é um espectro que se desencadeia, repentinamente nem o fruto de uma má política liberticida e neoliberal, cujo Estado burguês cumplice poderia protejer o proletariado. O Estado burguês não é cúmplice é o artesão da globalização e não pode em caso algum ser a solução para  o modo da economia capitalista e ainda menos da sua vítima proletária.  A classe dominante e o seu Estado nacional não controlam nada no aprofundamento da crise do capitalismo. Quem é esse nós, que os reformistas utilizam? O nós cidadão-eleitor-consumidor-colaborador do Estado, transcendem os interesses das classes. É contra este tipo de reformismo pequeno- burguês que o proletariado se deve prevenir. O Estado nacional, burguês, renovado e tenso, última masmorra isolada da louca fortaleza capitalista, não é o último refúgio para a classe proletária revolucionária que, ao contrário, deve investir para destruí-lo e não fazer dele um Estado socialista. Sabemos que o espírito de capitulação pequeno-burguês já contaminou a mentalidade dos proletários desamparados, sabemos que os burocratas sindicais de negócios, que os mercenários da indústria das ONGs e outras associações da sociedade civil a soldo já se alastraram fortemente nas fileiras proletárias e que a lista dos seus crimes se irá alargar; todavia, o dever dos revolucionários proletários é o de apontar sem cansaço o nosso inimigo implacável, a classe capitalista e o seu Estado burguês nacionalista - classe contra classe - porque o proletariado não tem pátria, tal é a nossa divisa. NDLR.

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Não é por acaso, se neste período de reestruturação feroz do capital, os antigos e os novos nacionalismos levantam a cabeça – e que muitos de entre eles se tornem violentos e virulentos. Muito raramente  temos escutado o grito de clarim dos nacionalismos anti-colonialistas depois dos anos 50 e 60, visto que a maior parte de entre eles ficaram desacreditados pela incapacidade de responder às nossas esperanças de desenvolvimento. E num contexto de raiva e de desespero, quando a esquerda e o movimento operário apareciam enfraquecidos, os nacionalismos étnicos de direita retomavam a iniciativa política. Mas, ainda uma vez mais, não havia nada de inevitável.

Seria contudo imprudente subestimar a subida do nacionalismo de que temos sido testemunhas neste período de globalização. E devemo-nos lembrar que a necessidade, para os  socialistas, de colocar à frente das suas posições nacionalistas é talvez mais urgente do que nunca, agora que a maioria da esquerda adoptou o nacionalismo em 1914.  Para o fazer teremos necessidade de análises da tradição do socialismo internacional e de as desenvolver em relação às questões políticas do espaço, dos Estados nação, da globalização económica, e da crítica da forma do Estado nação burguês a partir de uma perspectiva do socialismo vista de baixo.

 

Quarta Parte: as Questões Nacionais no Canadá Hoje

15. O Canadá é um produto da expansão imperialista das potências europeias. Estabelecido como colónia de povoamento, o Canadá baseou o seu domínio na opressão e no domínio dos povos autóctones e nos habitantes franceses que tinham povoado a Nova- França e outras partes do Canadá conquistadas pelos Britânicos em 1759. O Canadá formou-se sob a opressão destes grupos: por esta razão, as políticas canadianas foram modeladas por duas lutas nacionais principais: as dos povos autóctones (ou as primeiras nações) e as dos Quebequenses.

16. Porque os povos autóctones eram economicamente marginais, politicamente não-libertos e terrivelmente oprimidos pelos políticos do apartheid da Lei dos Índios perderam muito tempo a encontrar as alavancas para exercer as suas pressões políticas. Foi precisamente no meio da explosão de protestos sociais dos anos 60 e 70 que os movimentos autóctones politicamente organizados deixaram a sua marca. Inspirados por grupos como o Black Panther Party e l’Americaine Indian Moviment dos Estados Unidos, os militantes autóctones começaram a conduzir lutas mais militantes e mais coordenadas.

Depois das insurreições do fim dos anos 60 e do princípio dos anos 70, houve tentativas de profissionalizar o movimento autóctone para fazer dele o movimento de pressão mais ordinário. Na vanguarda deste deslizamento esteve a direcção da Assembleia das Primeiras Nações. A APN centrou o seu trabalho nas mudanças constitucionais, em especial a tentativa de obter o reconhecimento do direito inerente ao autogoverno para os povos autóctones inserido no Acto Constitucional (AANB). É essencial que os socialistas apoiem esta reivindicação. Dado que os povos autóctones nunca mais aceitaram ser governados pelo Estado canadiano, o direito inerente a escolher qual seria a forma de autogoverno que desejavam deve ser reconhecido e defendido.

Da mesma maneira, devemos reconhecer que toda uma camada de militantes autóctones (muitos de entre eles formaram a jovem geração dos dirigentes da APN) rejeita a insistência sobre as mudanças constitucionais e as reclamações territoriais por intermedio dos cursos de Justiça que dominam a corrente principal dos políticos autóctones.

Estes militantes foram a vanguarda das formas de acção directa de desobediência civil como os bloqueios de estradas e autoestradas e as ocupações de terras antigas como vimos em Oka, Gustafen, Lake e Ipperwash. É essencial que os socialistas, do mesmo passo que defendem as reivindicações de um grupo como o APN, tentem também organizar a solidariedade com estas formas mais militantes das lutas autóctones. Devemos tornar claro que sustentamos a auto-actividade e a auto-organização militante dos autóctones e que denunciemos as práticas colonialistas do Estado canadiano para todas as violências que se produzam.

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É talvez essencial que os  “socialistas” sustentem as aspirações à autonomia dos chefes das tribos das Primeiras nações que desejam administrar fundos e doações de caridade, concedidos pelos governos aos grupos autóctones, com o fim de    obter a sua adesão à exploração dos recursos das reservas, mas isso não é um combate para os proletários autóctones que desejam sobretudo concentrar os seus esforços sobre a substituição do modo de producção capitalista em concordância  com os seus camaradas proletários canadianos. NDLR

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 17. A questão nacional que domina a política oficial do Canadá é a dos Quebequenses. Isso tem a ver com o facto de que, querendo aproveitar o desenvolvimento da agricultura e do comércio da Nova-França, desejam que os agricultores franceses continuem a trabalhar a sua terra, não tendo os colonizadores britânicos interesse em expulsar as pessoas da colónia. Enquanto os autóctones são cada vez mais empurrados para a margem da vida económica as coisas ficam mais complicadas para os habitantes franceses. Em primeiro lugar, os Britânicos tentaram suprimir a igreja católica e a língua francesa. Todavia, deram-se rapidamente conta de que tinham necessidade de uma aliança com a elite francesa – os senhores, o clero e alguns capitalistas – se realmente queriam governar a região. Daí resultou o encerramento da Nova- França nas relações de domínio colonial pelas autoridades britânicas em lugares que tinham feito concessões: tolerância para a língua francesa, para a igreja católica e para o código civil francês. Quando o movimento para a integração das colónias britânicas da América do Norte teve lugar, nos anos de 1860, o Quebeque obteve uma outra concessão: a restauração da sua própria assembleia legislativa. Daí resultou que uma entidade política foi criada (a província de Quebeque) onde se encontrou a segunda mais importante população do país, cuja vasta maioria era francófona, - e onde se acharam alguns dos mais importantes centros agrícolas, manufactureiros e comerciais. O que quer dizer que os agravos do Quebeque eram habitualmente negociados por uma classe dominante que falava antes de tudo inglês.

Enquanto que as pressões nacionalistas vindas regularmente do Quebeque ( e isso era muito frustrante para eles em período de guerra) e enquanto a igreja católica dominava a vida cultural e política, o nacionalismo do Quebeque não parecia particularmente ameaçado pela classe dirigente do Canadá. Tudo isso mudou nos anos 60 com a ascensão de uma classe média laica e um novo movimento operário em ruptura com o movimento da igreja e aparição de um novo movimento nacionalista (que se cristalizou finalmente com a criação do Partido Quebequês). A revolução tranquila dos anos 60, a crise de Outubro de 1970 (na qual o governo de Trudeau utilizou o exército e a polícia para esmagar a frente de libertação do Quebeque), a greve geral militante de 1972 e a eleição do governo do PQ sob a direcção de  René Lévesque em 1976, tudo isso conduziu a colocar a questão do Quebeque no poscénio do debate político.

E isso continuou assim pelo período de uma trintena de anos. Contudo, a obsessão dos políticos federais para resolver a questão do Quebeque foi explorada pelos políticos de direita que sugeriam que no meio das provações, os quebequenses procuravam obter um tratamento especial.

18. Antes de tudo, a atitude dos socialistas deve ser clara: o Quebeque é uma nação oprimida no Estado Canadiano. Conquistado primeiro pelo imperialismo britânico, o Estado canadiano continua a negar os direitos democráticos do Quebeque à autodeterminação, incluindo a secessão da Confederação Canadiana (o que não significa aceitar o direito do governo do Quebeque a negar o mesmo direito às nações autóctones). Mas a partir daí as coisas complicam-se. Como o sublinhei mais acima, não há regras gerais ou de direito universal que digam aos socialistas se eles devem defender ou opor-se à separação ou à secessão. Para escolher temos necessidade de uma análise concreta.

No fundo, a atitude socialista deve assemelhar-se à atitude de Marx a respeito da Irlanda. Se um movimento operário poderoso, unido, demonstra capacidade de abordar os problemas da opressão nacional, então a separação nacional não é necessária. Marx pensava que era o caso da Inglaterra durante o período do Chartismo que culminou em 1848. Mas se o chauvinismo em relação à nação oprimida se tornar um meio contínuo de bloquear o desenvolvimento da independência política de classe da classe operária, então será sensato defender a independência como uma maneira de acabar com o antagonismo nacional que podem defender os políticos de esquerda. O que quer que se diga a respeito do passado, creio que um bom exemplo pode ser extraído das consequências dos debates sobre a Lei 101 e da Lei 172 (as recentes leis linguísticas do Quebeque), sobre os acordos do Lake Niich e de Charlotte Town e da enorme hostilidade que gerou em todo o país a ideia de garantir o reconhecimento do Quebeque como uma sociedade distinta; O chauvinismo anti-quebequense funciona da mesma maneira que o chauvinismo anti-irlandês nos anos de 1860: uma maneira de ligar os trabalhadores anglófonos com os seus próprios dirigentes e as tradições do seu Estado canadiano. Todas as tentativas de responder às reivindicações nacionais do Quebeque reencontram em breve uma poderosa oposição de uma parte considerável das pessoas comuns de língua inglesa. No meio deste tecto anti-quebeque a identidade nacional da classe operária unida  atrás das tradições do Estado canadiano afirmou-se. Podemos pôr a questão de saber como defender uma Nova Confederação livre e igualitária, o que Marx propunha no caso da Inglaterra e da Irlanda, de modo a defender a nossa posição neste caso.

 

 

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Foi um erro da parte de Marx propor aos operários assumirem uma problemática nacionalista burguesa. Isso demonstra a sua inexperiência política, reflexo da imaturidade da consciência da classe operária britânica no princípio do capitalismo industrial. Não é de modo algum da alçada do proletariado solucionar os problemas constitucionais, legislativos e parlamentares entre duas burguesias nacionalistas e entre dois Estados capitalistas em guerra. O proletariado não quereria podê–lo fazer, pois que não possui por único poder e única riqueza senão a sua força de trabalho para vender sem sequer ter a possibilidade de  recusar . O proletariado britânico desse tempo, como o proletariado canadiano de hoje, não devem alimentar nenhuma ilusão desta natureza, não haverá nova confederação dos sovietes realmente livres e igualitários entre os proletários da terra senão no dia em que a ditadura do proletariado se imporá sob  o modo de producção comunista proletário. A superestrutura legal repousa sobre a infraestrutura fundamental, jamais o inverso. Longe de afastar o proletariado duma nação ou de uma outra futilidade nacionalista, a atitude oportunista da esquerda social-nacionalista não fez senão semear a confusão de acreditar o mito da opressão nacional e de uma possível liquidação política nacional, fora de uma fundamental emancipação económica da classe proletária. NDLR.

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Pretendo deixar bem claro neste ponto que a minha sugestão de que os  socialistas deveriam naturalmente defender a independência do Quebeque não tem nada a ver com o pensamento de que um novo Estado do Quebeque seria em si mesmo progressista, ou que a luta por ele deveria inevitavelmente desencadear um movimento social radical. Ao invés, contrariamente aos camaradas da Esquerda Socialista , penso que o Quebeque burguês independente realizado sem sublevação maciça é uma possibilidade muito real. Dela resultaria um Estado do Quebeque independente com os controlos de imigração, das práticas racistas e uma hostilidade contra os povos autóctones, o que me parece muito possível. De facto, penso que os camaradas da Esquerda Socialista se enganam quando sugerem que os nacionalistas burgueses do Quebeque (como Lucien Bouchard) não querem realmente um Estado independente e que os socialistas deviam tentar abordá-los enquanto mais  soberanistas do que os soberanistas. De facto, penso que uma tal posição corre o risco de não ser suficientemente crítica do nacionalismo quebequês e do estado nacional como forma política

 

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O professor Mcnally resume perfeitamente o ponto de vista da inteligência proletária burguesa, tanto da esquerda como da direita, a propósito da questão nacional quebequense. Contudo, o ponto de vista materialista dialéctico do proletariado revolucionário é muito diferente. Nós já o explicámos longamente: uma nação não é nunca oprimida, uma nação não é nunca opressora. Sob o modo de producção capitalista, a classe social dominante explora e oprime, em primeiro lugar, a classe alienada da sua própria nação, e se esta classe capitalista está à cabeça de uma infraestrutura industrial, comercial e de negócios, multinacionais, ela captura e oprime também a classe proletária dos países estrangeiros. A classe operária canadiana não tira nenhuma vantagem da exploração dos proletários da província do Quebeque ou dos proletários autóctones vivendo nas  reservas ou fora das reservas e neste sentido pode dizer-se que esta classe operária alienada não explora as facções quebequenses ou autóctones da classe proletária internacional. Ademais, a secção quebequense da classe capitalista canadiana obteve todos os poderes políticos e jurídicos que lhe foram requeridos para assegurar o seu desenvolvimento, enquanto secção da classe dominante no seio do conjunto federal canadiano. Podemos portanto afirmar que a classe capitalista quebequense não é oprimida pela classe capitalista canadiana de que faz parte e à qual fornece vários palhaços políticos nacionais. A emergência de vários milionários de negócios do Quebeque na cena internacional é disso uma manifestação evidente. Tudo se jogou aquando das negociações do Acto da América do Norte Britânica (AANB). Nessa ocasião (1867) a burguesia nacional quebequense obteve o controlo do seu próprio aparelho de Estado burguês, logo que a oportunidade de participar na governação do aparelho de Estado burguês canadiano assegurou também o seu desenvolvimento. Melhor, contrariamente às pretensões da esquerda e da direita burguesas, o governo do Quebeque alertava contra o direito de secessão (separação – autodeterminação – direito de dispor do proletariado quebequense). À prova, o governo nacionalista chauvinista do Quebeque fez dois referendos sobre a questão nacional (1980 e 1995) e se ele tivesse vencido um ou outro desses referendos, o Quebeque seria hoje um Estado capitalista soberano assegurando a exploração da classe proletária quebequense multiétnica e a exploração do proletariado destes países. O capital quebequense enquanto segmento do capital canadiano atingiu o patamar do desenvolvimento imperialista da economia capitalista. Como em toda a parte, a dita luta de libertação política nacional do povo do Quebeque, sem libertação económica da carapuça capitalista internacional ter-se-ia saldado para os operários pela consolidação da posição dos seus carcereiros quebequenses. A crise sistémica do imperialismo internacional bateria mesmo assim duramente o proletariado quebequense multiétnico como o proletariado canadiano multiétnico, que teriam ambos a missão histórica internacionalista de substituir a sua classe capitalista e destruir o seu respectivo Estado, a fim de erigir o modo de producção proletário-comunista. As classes proletárias quebequense e canadiana recusaram jogar este jogo nacionalista chauvinista e a cada referendo quebequense ou canadiano a classe operária internacionalista recusou deixar-se enlear nas peias  grosseiras dos capitalistas e dos seus comparsas  da esquerda aburguesada. Verdadeiramente a classe proletária canadiana não precisou de uma vanguarda nacional-socialista de rectaguarda. NDLR.

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19. Uma outra referência deve ser feita no que concerne às questões nacionais do Canadá. A maior parte das pessoas de esquerda que entretêm estas questões vêm de um período em que os imigrantes e os povos de cor não estavam ainda politicamente organizados. Muitas vezes esfalfavam como se existisse uma entidade homogénea chamada Canadá Inglês, de maneira que parecia não ter o carácter multiétnico e multiracial do país. Resultou daí que o carácter sistematicamente racista do    canadiano era subestimado ou ignorado. Isto deve ser corrigido. Os socialistas não devem privilegiar as questões autóctones ou quebequenses de uma maneira que ignore a opressão racial das pessoas de cor no Canadá. Por esta razão, o apoio consequente ao anti-racismo deve ir de par com um apoio de princípio aos direitos dos povos autóctones e quebequenses à autodeterminação.

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20. As questões nacionais tornar-se-ão mais importantes na política mundial nos próximos anos. Os socialistas revolucionários têm obrigação de tentar encontrar as maneiras de fazer face aos debates e às crises que daí decorrerão. Isso nem sempre será fácil. Se se pode utilizar as contribuições históricas dos marxistas do passado para guiar as nossa análises, devemos permanecer em guarda contra as respostas dogmáticas e simplistas que aparecem a prestar justiça à complexidade dos fenómenos implicados. E apoiando o direito das nações oprimidas a determinar o seu futuro, não devemos perder nunca de vista que um dos traços essenciais do socialismo de base é o empenhamento por uma comunidade mundial sem Estado nação.

 

Capítulo 6

Leninismo ou Marxismo?

O Imperialismo e a Questão Nacional

O Operário Comunista

Comentário de Robert Bibeau

Janeiro de 2017

 

O jornal O Operário Comunista publicou em Outubro de 1929 um artigo confrontando a posição leninista e a posição do jornal atribuída a Rosa Luxemburgo (Junius) cremos ser importante publicar este documento crucial e comentá-lo.

Em meados do século XIX, Karl Marx tinha definido o nacionalismo de que se enfarpelava a burguesia como a solidariedade de classe dos exploradores que se viravam “dentro das fronteiras contra o proletariado” e fora delas contra a burguesia de outros países: Marx acrescentava que a fraternidade engendrada pelas relações de producção capitalistas entre as diferentes nações burguesas não seria mais fraternal que a engendrada entre as diferentes classes de uma mesma nação. Para Marx, os fenómenos destrutivos induzidos pelo capitalismo num país reproduzem-se em proporções gigantescas à escala internacional. Atendo-se a essa análise apresentada por Marx logo no começo do capitalismo industrial, as esquerdas europeias concluíram que estas contradições entre as diferentes burguesias nacionais empurraram os fdalgotes provincianos para o campo proletário, particularmente dos países coloniais. Lenine nos seus textos apresenta uma síntese desta posição adoptada pelos bolcheviques. Infelizmente, a esquerda não completou os seus deveres. Em primeiro lugar, o campesinato é o grande inimigo do modo de producção comunista e um fanático defensor do pequeno capitalismo agrícola. O capital conhece estas coisas e antes de expropriar o latifundiário para reagrupar as parcelas, mecanizar e industrializar a agricultura, começa por propagandeá-lo antes de  proletarizá–lo  Os bolcheviques da União Soviética não souberam fazê-lo de outra maneira. O desenvolvimento dos meios de producção e consequentemente da necessidade de matérias primas e de forças produtivas e a necessária expansão dos mercados empurraram o capital a destruir as barreiras alfandegárias - as fronteiras nacionais-  em resumo, a estripar o bicho-da-seda nacional que se tornou uma prisão contra a expansão capitalista em fase imperialista. O desenvolvimento do modo de producção capitalista teve como consequência que todas as burguesias nacionais foram forçadas a reagruparem-se em vastas alianças capitalistas, repartindo ente si o fruto da expropriação da mais-valia em função do investimento e do risco. O que determina que uma economia nacional pertença a uma ou a outra aliança imperialista é sempre o nível de interdependência entre as economias que constituem essa aliança. A classe proletária não tem nenhum ascendente sobre esta aliança e não deve jamais apoiar uma aliança contra a outra.

Assim, os Estados Unidos foram os maiores tomadores de riscos económicos e militares, e foram os primeiros beneficiários da expansão imperialista do modo de producção capitalista. Foi o que não compreendeu Estaline, quando afirmou que “O capitalismo nada tem a oferecer aos povos dos países dependentes coloniais e semi-coloniais senão dependência e atraso económico, exploração forçada, massacres inter- étnicos, guerras e miséria. Segue-se que nenhum país imperialista tem interesse em ajudar outro país burguês a dotar-se de uma indústria e de uma agricultura autónoma com medo de contribuir para forjar um concorrente. Toda a ajuda ao desenvolvimento contém em si em germe a sua antítese e visa entravar um desenvolvimento económico nacional verdadeiramente independente.”

Hoje, em referência às vagas de deslocação industrial é fácil compreender Estaline e demonstrar que o capital não tem pátria e que ele migra de um país para o outro segundo as taxas de juro obtidas. A compatibilidade capitalista já não se estabelece em função dos países, mas em função dos grandes trustes internacionais os quais se expandem por toda a parte onde se possa investir para estripar o precioso lucro que lhes dá vida.

Se os bolcheviques e os partidos comunistas da III Internacional sustentaram as lutas políticas da dita “libertação nacional e pelo direito à autodeterminação dos povos” foi porque estes partidos estavam sob direcção da pequena burguesia nacionalista que queria apoderar-se da direcção das lutas das massas camponesas dispostas a sacrificar as suas vidas para se apropriar dos seus meios de producção (a terra), o que conseguiram em vários países com as consequências que se conhecem. Sem emancipação económica, não há emancipação política, nem ideológica. Hoje, tudo terá de ser retomado desde o princípio, de um lado, com a rica experiência acumulada na ocasião destas revoluções falhadas (que não foram na realidade), e do outro, uma confusão decuplicada nas fileiras da classe proletária.

O artigo do camarada Operário Comunista, aparecido em 1929, deve-se lembrá-lo, demonstra que a ideologia proletária revolucionária não estava morta mesmo nessa época de dominação absoluta do nacional-bolchevismo. A acuidade, a profundidade e a justiça da sua análise de classe a propósito da questão nacional burguesa reconforta-nos sobre as capacidades da nossa classe a manter o pano da nossa revolução apesar da grande tormenta.

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Eis o Artigo do Operário Comunista

 

O conflito actual da China com a Rússia e as ameaças de guerra que decorrem deste incidente inter-imperialista, como aliás de todos os que nos chegam no dia-a-dia da actualidade, assinalam a possibilidade eminente de uma nova guerra mundial e impõem-nos uma atenção renovada para o problema que o levantamento e o desenvolvimento da guerra de 1914 colocou então brutalmente diante da esquerda marxista da II Internacional.

Neste terreno diferendos muito importantes se manifestaram entre elementos Leninistas (reduzindo-se em espécie a Lenine e Zinoviev que redigiam sozinhos o Socialdemocrat) e a maioria desta esquerda (sobretudo composta de elementos da Alemanha, da Polónia e da Holanda). Não é sem importância constatar o isolamento do bolchevismo russo na sua posição particular sobre a questão nacional em face das outras correntes. Não é sem dúvida por um simples acaso que o bolchevismo ou leninismo se achava já neste terreno em contradição com a ideologia proletária ocidental.

Depois de muito tempo, estas divergências, de uma importância fundamental para o desenvolvimento da revolução internacional, foram escondidas debaixo do tapete pelos diversos elementos da III Internacional. Tal como os maioritários, os ditos oposicionistas catalogados Leninistas, Trotsquistas ou Bordiguistas fingiram sempre ignorar o antagonismo das tendências Luxemburguistas e bolchevista. Prometeu, que publicou ultimamente um artigo de Amadeu Bordiga sobre a questão nacional não faz notar em que é que o conteúdo deste artigo parecia afastar-se do leninismo para se reaproximar de Luxemburgo. Convém acrescentar que Bordiga, ele próprio, contribuiu para manter na sombra estes diferendos que existiam há mais de uma quinzena de anos na esquerda marxista, vedando-os com o manto da disciplina bolchevique. É somente na sua conferência sobre Lenine no ano 1924 que ele faz uma vaga alusão a esta divergência e manifesta numa frase diplomática a sua simpatia pela tendência anti-leninista da esquerda marxista na II Internacional.

De facto, a morte de Luxemburgo e a exclusão dos elementos esquerdistas tais como os Tribunistas holandeses e o Partido Comunista-Operário Alemão (K.A.P.D.) da III Internacional permitiram ao leninismo dominar incontestavelmente a táctica do Comintern na questão nacional, tanto quanto em todas as outras questões.

É preciso portanto, e em primeiro lugar, pôr em evidência a posição marxista sobre o problema particular tal como ele ressalta incontestavelmente das citações alegadas por Zitoniev e Lenine, eles próprios. Em Contra a Corrente, faz-se apelo à opinião de Marx no Manifesto Comunista: “Os operários não têm pátria”. Reproduzamos na sua integralidade a passagem do Manifesto onde Marx e Engels expõem o seu pensamento sobre a questão da pátria em relação com a classe operária: “Os operários não têm Pátria. Não se lhes pode tirar aquilo que não possuem. Como o proletariado deve, em primeiro lugar, conquistar o poder político, elevar-se-á à condição de classe dirigente da nação tornando-se ele mesmo a nação, ele ainda por isso nacional, embora nunca no sentido burguês da palavra. Já as demarcações nacionais e os antagonismos entre os povos desaparecerão cada vez mais com o desenvolvimento da burguesia, a liberdade do comércio, o mercado mundial, a uniformidade da produção industrial e as condições de existência que lhes correspondem. O proletariado no poder fá-las-á desaparecer. A sua acção comum em todos os países civilizados pelo menos é uma das primeiras condições da sua emancipação.”

Lenine  dá aqui uma interpretação exacta do texto de Marx, ao reconhecr que a revolução socialista não pode vencer nos limites da antiga pátria, que não pode conservar-se dentro das fronteiras nacionais, que a sua acção comum, como justamente o diz Marx, pelo menos nos países civilizados, têm uma das primeiras condições de emancipação. É claro que aqui Karl Marx envolve os proletários avançados num sentido elevado de internacionalismo mesmo antes da vitória revolucionária, e que vê neles uma base para o desenvolvimento da revolução. A expresssão nação aplicada ao conjunto social que domina o proletariado e que ele identifica progressivamente consigo mesmo formal como o resíduo vazio de sentido deixado pela burguesia na sua queda. Ela não permite de modo nenhum afirmar que Karl Marx haja sonhado com a existência  distinta de uma pátria socialista qualquer.

Ressalta claramente do resto que os limites nacionais perdem o seu significado económico e político já sob o regime burguês e que eles estão destinados a uma abolição completa com o desenvolvimento do poder proletário. O desenvolvimento ulterior da economia capitalista mostrou, no fundo, a justeza desta tese ao realizar a unidade universal do mercado das matérias primas, dos minérios e dos capitais. A última guerra acabou de desmascarar o nacionalismo como uma sobrevivência ultra-reaccionária que não exprimia mais do que os interessses de uma formação social autónoma, mas que servia de disfarce ideológico às realidades imperialistas.

Os pequeno-burgueses de gema e a aristocracia operária dos monopólios não são os veículos do patriotismo senão na medida da sua sujeição ao grande capital,  que faz deles os seus fantoches, alternando a comédia da defesa nacional com a do wilsonismo, do lucarnismo, etc..Os operários não têm nenhuma razão de ligação às demarcações nacionais, o que é manifesto para o internacionalismo operário; é evidente que a base histórica das suas lutas e das suas experiências revolucionárias conduzirá o proletariado a abolir as fronteiras, desde que ele realize a tomada do poder em mais do que um país. O carácter étnico das nacionalidades acaba de perder todo o valor, a fusão dos elementos étnicos mais disparatados é há muito tempo uma banalidade, e as fronteiras  naturais não são senão fronteiras étnicas que não resistem à corrente da civilização.

Assim, a tese internacionalista do marxismo não deve prestar-se a nenhum desprezo; a expressão que a resume – Os operários não têm pátria –é de uma clareza irrevogável, marcando a divisão real entre o nacionalismo burguês e o internacionalismo proletário, sendo que o desenvolviento histórico anterior desmascarou o carácter nitidamente burguês da ideologia patriótica e nacional. E todavia Lenine não apagou completamente da sua concepção marxista a influência desta ideologia patriótica que os elementos marxistas do ocidente rejeitaram totalmente.

É interessante notar que quando Lenine polemiza com os reformistas assume as posições ultra -esquerdistas, enquanto que quando polemiza com os ultra-esquerdistas toma atitudes reformistas. Esta posição eclética aparece generalizadamente nele em todas as questões. As oscilações do seu centrismo estão muito bem caracterizadas em obras tais como A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky, por um lado e a Doença Infantil do Comunismo, por outro. No passo citado de Contra a Corrente (página 18 no primeiro volume) Lenine polemiza contra os reformistas e social traidores. Torna-se puramente internacionalista e cita a expressão marxista:”Os operários não têm Pátria”. Polemizando contra o holandês Nieuwenhus e comparando–o a Gustavo Hervé, afirma que este último diz uma burrice: “ quando deste axioma o que se deve tirar é: toda a pátria não é senão uma vaca de leite para os capitalistas”    : a monarquia alemã e a república é tudo a mesma coisa para os socialistas. Lenine escreveu: “ Quando na sua resolução, apresentada no congresso Hervé declara que para o proletariado é totalmente indiferente que o país se ache sob a dominação desta ou daquela burguesia nacional, formula e defende um absurdo, pior que o absurdo de Nieuwenhus.  Não é de maneira nenhuma absolutamente indiferente ao proletariado poder, por exemplo, falar livremente a sua língua materna ou sofrer uma opressão nacional que venha juntar-se à exploração de classe . Em lugar de extrair premissas que anunciem o socialismo, esta dedução, de que o proletariado é a única classe que luta até ao fim, certamente contra toda a opressão nacional, pela completa igualdade dos direitos das nações, pelo direito das nações a disporem de si mesmas, em lugar disso, Hervé declara que o proletariado não tem de ocupar-se da opressão nacional, que ignora a questão nacional em geral.”

Lenine adopta naturalmente nesta circunstancias o seu métofo preferido das analogias para poder recusar uma teoria da traição de um homem. Mas isso não tem muita importancia para nós. O que é mais importante é o conteúdo dessa passagem que resume a teoria leninista sobre a questão nacional. E ele pretende extrair esta concepção particular, para ele e para os bolcheviques, das premissas que anunciam o socialismo!.

Ora,  ele havia já admitido com Marx que “Os operários não têm pátria” que a questão nacional não pode ter nenhum interesse para a classe operária. Marx disse claramente que não se pode roubar-lhes (aos operários) o que eles nunca tiveram.E portanto desta passagem de Lenine resulta claramente que não se pode roubar a pátria aos operários, que ela não é apenas um privilégio das classes dominantes, que ela é também uma vantagem  das classes exploradas. Com efeito, “não é indiferente sofrer uma opressão nacional que venha juntar-se à exploração de classe”. Aqui ressalta claramente a contradição entre o pensamento marxista e o pensamento leninista. Para Lenine o proletariado deve  ter interesse na  questão nacional, deve ser contra toda a opressão nacional, a saber, contra toda a opressão da pátria, que segundo Marx, não é nem nunca pode ser roubada. Para Lenine , o proletariado é mesmo ele o paladino da defesa nacional, pois que representa a única classe que lutará até ao fim, nomeadamente contra toda a opressão nacional. Aí estão, sem dúvida, as fontes do nacional-bolchevismo. E quando se tiver bem reflectido sobre o significado do pensamento leninista, não nos espantaremos que Bukarine tenha dito em 1923:” O conflito entre a França e a Alemanha de 1923 não é uma simples repetição do conflito de 1914. Tem aqui sobretudo um carácter nacional. Por conseguinte o PCA dever dizer claramente à classe operária da Alemanha que só ela pode defender a nação alemã contra a burguesia, que vende os interesses nacionais do seu país.”

E, com efeito, não era a  Alemanha, no espírito e pensamento leninista um país oprimido? Isso não sofre qualquer dúvida. As regiões alemãs eram oprimidas pela ocupação francesa, era do dever dos operários alemães lutarem até ao fim pela libertação destas regiões! Para a libertação da Alemanha da opressão da Entente tudo a gente conhece bem os resultados da aplicação da táctica leninista em 1923 na Alemanha.

Ressalta desta experiência desastrosa que quando o proletariado se mete a defender a sua pátria, a nação oprimida, atinge um único resultado, isto é, reforça a sua própria burguesia. Mas será necessário fazer ressaltar ainda uma contradição mais patente, que existe nos artigos de Contra  a Corrente para se dar conta da natureza equívoca do Nacional-Bolchevismo. No artigo  Os Ladrões de Zinoviev ( página 70 do primeiro volume) diz-se o seguinte: “Enquanto existirem os estados capitalistas, isto é, enquanto a política imperialista mundial dominar a vida interior e exterior dos Estados, o direito das nações a dispor de si mesmas não terá, nem na paz nem na guerra, a menor importância.Mais ainda: no actual meio imperialista não há lugar para uma guerra de defesa nacional, e toda a política socialista que faça abstração deste meio histórico e que queira orientar-se a partir da base isolada de um só país, está condenada a dar com os ossos em terra.”

Como acabamos de notar, o imperialismo suprimiu todas as possibilidades de uma guerra nacional, no sentido marxista do termo, e a opinião de Karl Marx de 1871 encontrou uma base sólida no desenvolvimento adicional do imperialismo capitalista. Agora, na passagem precipitada parece que o leninismo se aproxima na sua linha geral desta opinião. Mas não é. Na sua controvérsia com o polaco social democrata,  Lenine, assim, desenvolve o seu pensamento em contraste com estes últimos: "Claramente os autores polacos colocam a questão da "defesa da pátria" de uma forma completamente diferente de como ele é colocada pelo nosso partido. Rejeitamos a defesa da pátria na guerra imperialista (...). Obviamente os autores das teses polacas rejeitam em geral a defesa da patria, isto é dizer também para uma guerra nacional, pensando talvez que as guerras nacionais, na era imperialista, são impossíveis".

É evidente que nesta passagem Lenine afirma que para ele as guerras nacionais ainda não estão terminadas e que admite a defesa da pátria numa guerra nacional. Pode-se ver claramente que a ideologia leninista também está em contradição com o marxismo e com ela mesma. Para Lenine, a realidade oscila entre dois pólos que se negam mutuamente. Por um lado, ele reconhece a terrível realidade da guerra imperialista, que extrai a sua aparente origem de um conflito nacional, por outro ele apega-se desesperadamente a um nacionalismo cortado, antiquado, que quer forçar reviver. E é por isso que ele procura exemplos nas rebeliões nacionais que posteriormente desmascararam o seu carácter reaccionário e que não trouxeram qualquer vantagem para o movimento revolucionário do proletariado. Lenine diz isto: "Os socialistas querem usar, para a sua revolução, todos os movimentos nacionais que se desencadeiam contra o imperialismo. Quanto mais clara e acentuada é a luta do proletariado contra a frente comum dos imperialismos, mais essencial é o princípio internacionalista que diz: um povo que oprime outros povos não pode ser ele mesmo livre"(21)

Na sua controvérsia com o panfleto de Junius (página 154 do segundo volume) o pensamento de Lenine nesta matéria está a tornar-se cada vez mais preciso. Para Lenine há uma linha divisória desobstruída entre as guerras nacionais e as guerras imperialistas: "Somente um sofista (página 158) poderia tentar apagar a diferença entre uma guerra imperialista e uma guerra nacional...".

E mais abaixo ele também afirma a possibilidade de uma grande guerra nacional: "Se o imperialismo fora da Europa permanecesse durante cerca de vinte anos, sem deixar lugar ao socialismo, por exemplo, por causa de uma guerra nipo-americana, então seria possível ter uma grande guerra nacional na Europa".

Junius (Luxemburgo) argumenta de forma coerente, como marxista, que já não podem ser feitas guerras nacionais e Lenine exclama que seria falso «estender a avaliação da guerra actual para todas as guerras possíveis sob o imperialismo, esquecer os movimentos nacionais que podem ocorrer contra o imperialismo». E ele acrescenta que é possível até mesmo uma grande guerra nacional! Aqui a contradição entre o  seu pensamento e o pensamento marxista torna-se cada vez mais aguda, porque para Zinoviev mesmo a guerra de 1870-71 fechou a era das grandes guerras nacionais na Europa.

Em vão, página 122-23 do mesmo trabalho, Lenine tenta sair da sua controvérsia contra os social-democratas polacos, usando o pensamento de Engels contido na obra O Pó e o Reno. A sua contradição com o marxismo não é menos óbvia. Engels acredita que as fronteiras das grandes nações européias foram determinadas no curso da história de que ela percebeu a absorção de várias nações pequenas e insustentáveis, integradas cada vez mais numa grande pela língua e as simpatias das populações. Esta tese de Engels já está muito fraca do ponto de vista histórico. Mas, acima de tudo, Lenine é obrigado a notar que o capitalismo reaccionário, imperialista, mais e mais frequentemente quebra essas fronteiras democraticamente definidas. Agora, deve-se notar que a maneira de ver a influência do capitalismo na agitação das antigas fronteiras que Engels considerou ser "naturais" não responde absolutamente à idéia mestre do marxismo contido no Manifesto dos Comunistas na passagem pré-citada: "Já as demarcações nacionais e os antagonismos entre os povos estão a desaparecer cada vez mais com o desenvolvimento da burguesia, a liberdade de comércio, o mercado mundial, a uniformidade da produção industrial e as condições de existência que lhes correspondem".

Este processo de desaparecimento das demarcações nacionais não é considerado por Marx como um fenómeno reaccionário, como afirma Lenine. Lenine considera todo esse processo e a forma de considerá-lo posto em prática pelos social-democratas polacos, como o "economicismo imperialista". Aqui está o que diz: "Os velhos economistas, não dando dando senão uma caricatura do marxismo, ensinaram aos operários que "o que é economia" só importa aos marxistas. Os novos  "economistas" pensam que o estado democrático do socialismo vencedor vai existir sem fronteira, (no tipo de um complexo de sentimento sem matéria)? Será que eles pensam que as fronteiras serão determinadas apenas pelas necessidades de producção? Na realidade, estas fronteiras serão democraticamente determinadas, isto é, de acordo com a vontade e as simpatias da população. O capitalismo influencia violentamente essas "simpatias" e com isso acrescenta novas dificuldades ao trabalho de aproximação das nações"(22).

Existe aqui um claro contraste entre o pensamento leninista e o pensamento marxista. Para Marx, a burguesia, a organização económica do capitalismo fazem desaparecer as fronteiras, eliminam as dificuldades nacionais, para Lenine o capitalismo aumenta essas dificuldades. Pode-se enfatizar que a burguesia foi progressiva em 1848 e reaccionária na fase imperialista. Haveria uma distinção que não serviria muito, porque o desenvolvimento da economia mundial não cessou desde então, mesmo através de crises formidáveis para determinar uma abordagem cada vez mais estreita entre as populações nacionais, e, por vezes, a fusão dos elementos nacionais.

O pensamento leninista nem percebe o lado artificial dos chamados sentimentos nacionais alimentados expressamente pela burguesia. Ele não percebe que em alguns estratos da população os sentimentos chauvinistas são um simples resultado das suas condições económicas. Que hoje o amor pela pátria é relegado nestas camadas, como já indicámos acima.

O pensamento leninista parece-nos aqui como um anacronismo histórico, um retrocesso. Quer alcançar a unidade dos povos voltando a uma base histórica, que o marxismo já considerava em 1848 como ameaçada. O pensamento leninista neste terreno bem ignorado pelos militantes ocidentais comunistas pode ser definido concretamente como reacionário.

Em vez de combater sentimentos nacionais, que a burguesia tem todo o interesse em manter vivos, ela incentiva-os, legitima-os, na verdade, uma base moral de desenvolvimento do socialismo. Ninguém duvida por um momento, lendo a controvérsia de Lenine contra Junius que o sofismo está do seu lado. De facto, qual é o único argumento que pode acrescentar contra Luxemburgo? O pretexto subtil que a dialética pode deslizar para o sofismo. E ele, portanto, apela à dialéctica dos gregos que não tem nada a ver com a dialéctica materialista, que não é um método fora da realidade, mas um método na mesma realidade. Porque esta guerra nacional (a pequena Sérvia revoltada contra a grande Áustria) se transformou na guerra imperialista não no abstracto, mas na realidade. Provou claramente que o sofismo estava no terreno das guerras e das questões nacionais no lado de Lenine.

Mas antes de rever os acontecimentos históricos que vieram para confirmar este julgamento, não será mau corrigir de uma forma mais clara o pensamento de Lenine através de uma citação que não pode dar origem a qualquer disputa no seu conteúdo. No artigo contra o panfleto de Junius (página 158, segundo volume) Lenine declara claramente a sua fé nas guerras nacionais e estende a sua teoria à questão colonial: "Guerras nacionais, diz ele, não são apenas prováveis, são inevitáveis, numa era de imperialismo, do lado das colónias e semicolónias. Nas colónias e semicolónias (China, Turquia, Pérsia) há populações que atingem um total de até um bilião de pessoas, ou seja, mais da metade da população do globo. Os movimentos de emancipação nacionais, deste lado, ou já são muito fortes, ou crescem e, na maturidade. A continuação da política nacional de emancipação das colónias será necessariamente em guerras nacionais que cometem contra o imperialismo. Guerras desse tipo podem levar a uma guerra dos grandes poderes imperialistas de hoje, mas eles também podem levar a nada, isso vai depender de númerosas circunstâncias".

Até agora, observou-se as contradições entre o marxismo e o leninismo no terreno da questão nacional. Nós apontamos o contraste gritante entre a tese nacional-bolchevique do leninismo e o internacionalismo marxista dos alemães esquerdistas, dos polacos e dos holandeses. Aqueles que leram ou vão ler o artigo O comunismo e a questão nacional de Bordiga em Prometheus de 15 de setembro 1929, observarão que este contraste (ao ser escondido) igualmente existiu entre o pensamento da esquerda italiana e o pensamento leninista.

 

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Não é por acaso, se neste período de reestruturação feroz do capital, os antigos e os novos nacionalismos levantam a cabeça – e que muitos de entre eles se tornem violentos e virulentos. Muito raramente  temos escutado o grito de clarim dos nacionalismos anti-colonialistas depois dos anos 50 e 60, visto que a maior parte de entre eles ficaram desacreditados pela incapacidade de responder às nossas esperanças de desenvolvimento. E num contexto de raiva e de desespero, quando a esquerda e o movimento operário apareciam enfraquecidos, os nacionalismos étnicos de direita retomavam a iniciativa política. Mas, ainda uma vez mais, não havia nada de inevitável.

Estas considerações, que têm entretanto a sua base teórica, na concepção do materialismo histórico e que contêm o julgamento da concepção nacional do leninismo, não seriam suficientes, se não confiarem na bancarrota histórica do nacional-bolchevismo. Muitos militantes comunistas acreditaram até agora que as tácticas aplicadas pelo leninismo, bukharismo e estalinismo não tinham nada a ver com o leninismo, eles pensaram que essas linhas tácticas da International Comunista eram uma degeneração da linha pura do bolchevismo. Isto é também devido à atitude diplomática de alguns oponentes de esquerda que, como já apontamos no início deste artigo, esconderam sérias diferenças com o leninismo, apelando para a degeneração do bolchevismo. As nuances zinovievistas, bukharinistas, estalinistas e até mesmo trotskistas não se desprendem absolutamente do nacional-bolchevismo genuinamente leninista.

É por isso que temos sido obrigados a usar muitas citações de Lenine para que os trabalhadores comunistas não-fanáticos, que lêem e reflectem, possam entender que o nacional-bolchevismo tem uma única fonte que está no leninismo.

Mas vamos passar à análise do processo histórico após a fundação teórica do nacional-leninismo para ver a natureza anti-proletária e a sua falência definitiva.                                                                           

Já vimos que Lenine, em contraste com a tese marxista de 1871, contemplava a possibilidade de uma grande guerra nacional na Europa, vimos que Lenine acreditava num dever do proletariado defender a nação oprimida. Para os leninistas em 1923, no período da ocupação e da guerra económica do Ruhr, a Alemanha fazia uma guerra nacional. Eles alegaram que, no rescaldo do Tratado de Versalhes, a Alemanha se tinha tornado uma nação oprimida. É por isso que Bukharin na citação já anexada acreditava que o proletariado alemão teve de defender a nação. Zinoviev na Rote Fahne de 17 de Junho de 1923 disse que os comunistas são os verdadeiros defensores do país, do povo e da nação. Bukharin e Zinoviev eram então leninistas, bolcheviques puros. Lenine em Contracorrente não tinha previsto a "grande guerra nacional"? Claro que sim. Zinoviev esqueceu o seu artigo dos Saqueadores, mas Lenine não tinha esquecido em 1916 as suas considerações de 1914 contra os reformadores? Radek, exaltando Schlageter e entrando em polémica amigavelmente na Rote Fahne com o fascista Réventlow, era também ele um leninista coerente, porque passou a defender a Alemanha oprimida contra o imperialismo do Acordo e a burguesia alemã traidora. Certamente a Ruth Fischer ultrapassou um pouco os limites do leninismo, quando ela prosseguiu, na frente dos estudantes racistas, a sua justificação do anti-semitismo fascista para salvar a pátria oprimida, mas isso foi apenas uma imprudência devida a um temperamento excessivo. Apenas uma atitude leninista em Paul Froelich quando ele escreveu na Rote Fahne de 03 de Agosto de 1923:"Não é verdade que nós outros comunistas fomos durante a guerra anti-nacionais. Nós éstavamos contra a guerra, não porque nós éramos anti-alemães, mas porque a guerra serviu somente aos interesses do capitalismo... por esta razão nós não negamos a defesa nacional onde é colocada na agenda!"

Lenine disse que ele rejeitou a defesa da pátria numa guerra imperialista, mas não de uma forma geral? Vemos claramente que nem Zinoviev, nem Bukharin, nem Radek, nem Froelich traíam o leninismo na sua estratégia de 1923. Foi apenas o leninismo que matou a Revolução alemã, foi o nacional-bolchevismo que, fingindo salvar a nação contra a burguesia alemã, salvou a burguesia contra o proletariado alemão. A atenção do proletariado foi afastada do seu principal objectivo: a luta contra o capitalismo internacional, portanto, o sem pátria alemão estava tão longe do sem pátria de outras nações, a conversar de opressão nacional, de traição nacional da burguesia alemã e outros cânticos pequenos burgueses. Quais foram os resultados da aplicação subsequente da táctica nacional leninista no 23 alemão? Que o proletariado foi espancado, que a burguesia alemã fortaleceu tanto que Bukharin no VI° Congresso do Internacional Comunista foi forçado a revelar-nos a ressurreição do imperialismo alemão!

Isto assim que a ideologia nacional leninista, pelo menos para o que diz respeito à "grande guerra nacional europeia", encontrou o seu fim no 23 alemão. E por trás deste fim aparece a imagem sangrenta do autor do livreto de Junius gritando: «Não há mais guerra nacional sob o imperialismo capitalista».

Mas se a grande guerra nacional europeia encontrou a sua sepultura no 23 alemão, as pequenas guerras nacionais das colónias e semi-colónias (Turquia, Persia e China) igualmente morreram no pântano da reacção imperialista. Eles também não foram capazes de escapar à influência do ambiente histórico dominado pelo capitalismo. A história das guerras nacionais chinesas e turcas é a história bem conhecida de Kémal Pacha e Chang-Kai-Chek. Estas são as duas tragédias sangrentas onde o proletariado e os comunistas turcos e chineses fizeram o papel da vítima. A Rússia de Lenine, do bolchevismo, da edificação socialista deu as armas para estas guerras nacionais a Chang-Kai-Chek e a Kémal Pacha; Estes últimos, imediatamente arrastados no círculo da política imperialista, têm feito com os imperialistas frente unida contra o proletariado, eles usaram as armas que a Rússia lhes proporcionou contra o proletariado e os comunistas. E no entanto, a táctica pura leninista foi aplicada nestas circunstâncias, apesar do que dizem Trotsky e os seus seguidores. Foi dito ao proletariado chinês, ao proletariado turco para defenderem a sua pátria oprimida pelos imperialistas e agentes dos imperialistas; proclamou-se a cruzada das nações oprimidas contra o imperialismo. Lenine não tinha mesmo também recomendado o uso da frente única das nações oprimidas contra o imperialismo? Certamente não é  possível esperar que a luta pela defesa da nação oprimida possa ser conciliada com o interesse revolucionário dos trabalhadores, porque a luta do proletariado contra o capitalismo e o imperialismo internacional é a luta contra a sua burguesia, não em nome de própria nação, mas em nome do proletariado internacional. O que importou mais na China ao proletariado chinês e internacional era a entrada da classe operária chinesa na luta revolucionária proletária e não na luta nacional, que era reaccionária na sua essência, que não poderia conduzir absolutamente na emancipação nacional da China, mas em todos os casos ao laço da burguesia chinesa com o imperialismo. Podemos chamar guerras nacionais hoje a conflitos que não podem escapar do ambiente histórico do imperialismo? Não, claro que não. Além disso, a ideologia das guerras nacionais, da pátria não capitalista, não imperialista, falhou completamente em terríveis derrotas e num mar de sangue proletário. E a cruzada sagrada das nações oprimidas contra o imperialismo opressor  transforma-se num vínculo das burguesias locais e contra o proletariado mundial.

Se na China e na Turquia a lenda da guerra nacional foi resolvida com uma tragédia, no Afeganistão e na Persia morreu sob o riso da história na farsa de Amanoullah.

As próprias colónias, o Egipto, a Índia, estes países que incorporam milhões de homens e que Lenine esperava lançar no seu fogo nacional contra o o imperialismo do colosso capitalista, não nos permitem uma guerra nacional. Porque no Swaraj, no Wafd, etc, a burguesia local já perdeu a sua agressividade nacional, e procura o compromisso, a aliança submissa com o colosso imperialista. E, no entanto, os implacáveis leninistas ainda preparam novas cruzadas nacionalistas, isto é, novos massacres de proletários coloniais em vez de preparar a revolução socialista através do desenvolvimento da consciência do proletariado dos mesmos países.

Que conclusões podem ser extraídas desta análise de pensamentos e factos sobre a questão nacional?

Que não há nenhuma questão nacional para o proletariado, que os trabalhadores não podem tirar proveito da existência para eles de uma pátria e que eles não têm de lidar com a opressão nacional, o direito das nações a dispor delas próprias. O proletariado desenvolve o seu movimento, faz a sua revolução como classe e não como nação. Imediatamente após a vitória do proletariado em várias nações, as fronteiras só podem desaparecer. A tese leninista da autonomia nacional dos Estados socialistas é um absurdo. Lenine diz que enquanto o estado existe, a nação continua sendo uma necessidade. Agora, a nação é apenas um produto do estado burguês e não do estado proletário. Os Estados proletários só podem esforçar-se para unir-se e suprimir as fronteiras. Muito mais: o socialismo como ordem económica e social só pode ser alcançado com base no desaparecimento total das fronteiras. A abolição das diferenças económicas nacionais não pode ser alcançada sem a abolição dos limites nacionais que, de outro modo, são artificiais e convencionais. A ditadura proletária, o estado operário, que não é o estado burguês, só pode ter um carácter universal e não nacional, democraticamente unitário e não federativo. Os comunistas marxistas não têm de construir os Estados Unidos da Europa ou do mundo, o seu objectivo é a República universal dos conselhos operários.

Os comunistas marxistas devem propagar, como resultado, entre as grandes massas operárias o ódio pela pátria, que é um meio para o capitalismo de semear a divisão entre os proletários dos diferentes países. Eles devem recomendar entre as grandes massas operárias a necessidade da fraternidade, da união Internacional de todos os proletários em todos os países. Eles devem combater furiosamente não só todas as tendências chauvinistas, fascistas ou social-democratas que envenenam os mesmos ambientes operários, mas também todas as tendências disfarçadas, que tentam dar uma base qualquer para o ideal nacional. Eles devem lutar contra o mito das guerras nacionais, o mito das cruzadas anti-imperialistas populares. Eles devem enraizar-se, usando a experiência histórica, nas profundezas das massas proletárias, a fé na vitória do socialismo, apenas em bases puramente de classe, puramente internacionalistas.

Devemos, portanto, concentrar todos os nossos esforços na revitalização do verdadeiro internacionalismo marxista em que os social-reformistas sociais e os nacional-bolcheviques  têm semeado a confusão.

Sabemos muito bem que a nossa propaganda não pode sozinha fazer este esforço de trazer o internacionalismo para as massas e de desenvolvê-lo até um grau desconhecido até agora. Sabemos que a nossa propaganda, embora seja necessária, não terá a menor influência, se os desenvolvimentos adicionais do processo histórico não se encarregarem de a confirmar. Mas também sabemos que estes desenvolvimentos só podem empurrar o proletariado para as posições que os verdadeiros internacionalistas nunca traíram, que Rosa Luxembourgo preservou até à sua morte.

Seria contudo imprudente subestimar a subida do nacionalismo de que temos sido testemunhas neste período de globalização. E devemo-nos lembrar que a necessidade, para os  socialistas, de colocar à frente das suas posições nacionalistas é talvez mais urgente do que nunca, agora que a maioria da esquerda adoptou o nacionalismo em 1914.  Para o fazer teremos necessidade de análises da tradição do socialismo internacional e de as desenvolver em relação às questões políticas do espaço, dos estados nação, da globalização económica, e da crítica da forma do Estado nação burguês a partir de uma perspectiva do socialismo vista de baixo.

 

                                                       Notas

(1) Robert Bibeau (2016) Questão nacional e revolução proletária.
Url:
Http://les7duquebec.com/7-au-front/question-nationale-et-Revolution-proletarienne

(2) Robert Bibeau (2016) Os mistérios dourados finalmente revelados.
URL: http://www.les7duquebec.com/7-au-front/Les-Mysteres-aurifaires-enfin-reveles  Acordos de Bretton Woods. URL: http://www.les7duquebec.com/actualites-des-7/Le-troisieme-Stade-de-la-crise-systemique-Mondiale/

(3) Direitos de saque especiais. URL: http://www.les7duquebec.com/7-Dailleurs-invites/Mort-et-Resurrection-du-Veau-dor-Americain/

(4) Marx à S. Meyer e A. Vogt, em Marx-Engels, Correspondências. Url:
Https://www.marxists.org/Francais/Marx/Correspondance.htm

(5) Robert Bibeau (13.10.2014) Estados Unidos-China, o grande confronto. URL:
http://www.les7duquebec.com/actualites-des-7/Etats-Unis-Chine-la-grande-Confrontation/
Robert Bibeau (10.07.2016) Aliança de Xangai contra a União Europeia. URL:
http://www.les7duquebec.com/actualites-des-7/Alliance-de-Shanghai-contre-Union-Europeenne

(6) Conferência em Bandung. URL: https://fr.wikipedia.org/wiki/conf%C3%A9rence_de_Bandung

(7) Luniterre (21.07.2016) Controvérsia com Robert Bibeau. URL: https://tribunemlreypa.WordPress.com/2016/07/22/un-Nouvel-Echange-polemique-avec-Robert-bibeau/

(8) Robert Bibeau (8.07.2016) Ferguson, Minneapolis, Dallas, mesmo proletariado mesma luta. URL:
http://www.les7duquebec.com/7-Dailleurs-invites/Ferguson-Minneapolis-Dallas-proletariat-meme-Combat/

(9) Robert Bibeau (8.07.2016) Ferguson, Minneapolis, Dallas, mesmo proletariado mesma luta.
URL: http://www.les7duquebec.com/7-Dailleurs-invites/Ferguson-Minneapolis-Dallas-proletariat-meme-Combat/

(10) Pierre Souyri (1979). Notas de leitura. Nós usamos a versão do texto publicado no blog Spartacus em 20.07.2016. URL: http://spartacus1918.canalblog.com/archives/2016/07/20/34091094.html

As notas de leitura de Pierre Soury referem-se ao volume de Georges, Michel Lowy, Claudie Weill. Os marxistas e a questão nacional, 1848-1914. Paris, Maspero. 1974. P. 391 Notas de leitura por Pierre Souyri publicadas no Annales em julho-agosto 1979. O livro foi reimpresso por L’Harmattan, Paris, em 1997.

 

(11) Paul Mattick (1959) Nacionalismo e socialismo. Publicado em inglês no The American Socialist em setembro de 1959, em francês na Front Noir (fevereiro 1965) e no ICO n° 99 (Novembro 1970).

(12) David McNally (1996) Marxismo, nacionalismo e lutas nacionais hoje. Documento de discussão do New Socialist Group (1996). Tradução do inglês de La Gauche. Notas não publicadas.

(13) Citado em James M. Blount, A Questão Nacional: Descolonizar a Teoria do Nacionalismo. Pag. 67.

(14) Lenin. Trabalhos selecionados. Vol. 1. Éditions de Moscou. Pag. 409.

(15) Partido dos trabalhadores socialistas (1974) A dinâmica da revolução mundial hoje. Swp. Pag. 137.

(16) New Socialist (1996) Red Power, uma entrevista com Howard Adams. New Socialist. No. 2. março-abril 1996.

(17) L’Ouvriere Communiste, n ° 2/3, de outubro 1929. Leninismo ou marxismo? Imperialismo e a questão nacional. URL:
https://bataillesocialiste.WordPress.com/Documents-historiques/1929-10-leninisme-ou-Marxisme-limperialisme-et-la-question-Nationale-GOC/

(18) Karl Marx (1848) Sobre o sistema nacional da economia política de Friedrich List. Discurso sobre o comércio livre.

(19) Stalin (1913). O marxismo e a questão nacional e colonial. Url:
Http://spartacus1918.canalblog.com/archives/2016/07/20/34091094.html

(20) Lenin. Zinoviev (1914-1915) Contracorrente. Traduzido por V. Serge e Parijanne. Página 213. URL:
http://Gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k96333462

(21) Lenin. Zinoviev (1914-1915) Contracorrente. Traduzido por V. Serge e Parijanne. Página 139. URL:
http://Gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k96333462

(22) Os "economistas" formaram uma tendência da democracia russa atribuindo uma importância absoluta à luta por as reivindicações económicas parciais.

 

                                               CONTEÚDO

  

RESUMO

PREFACIO

CAPÍTULO 1  Questão nacional e revolução proletária

CAPÍTULO 2  Ferguson, Minneapolis, Dallas, mesmo proletariado, mesma luta

CAPÍTULO 3  Os marxistas e a questão nacional

CAPÍTULO 4  Nacionalismo e socialismo

CAPÍTULO 5  Marxismo, nacionalismo e lutas nacionais hoje

CAPÍTULO 6  Leninismo ou marxismo? Imperialismo e a questão nacional

NOTAS

 

Página 4 da capa de cobertura

Nesta era imperialista moderna, a política proletária sobre a questão nacional deve ser revista a fim de colocá-la na perspectiva da luta de classes. Desde Lenine e os bolcheviques, a esquerda esqueceu que o proletariado não tem pátria e que as lutas de libertação nacional da burguesia nunca levarão à luta revolucionária dos proletários para erguer o modo de producção comunista.

Para o demonstrar, Robert Bibeau, editor da revista online Les7duquebec, apresenta e comenta seis textos de autores marxistas que apresentam um ponto de vista original sobre a questão nacional e a luta pelo “direito dos povos à autodeterminação” sob o imperialismo moribundo. 

Bio

Robert Bibeau foi activista em grupos de esquerda nas décadas de 1970 e 1980, e depois activista sindical nos anos 1990. Ele é agora editor da revista internacional da web http://www.les7duquebec.com.  Robert Bibeau é o autor dos volumes: Le "projet" de Fatima (2012), L’Harmattan, Paris. Manifesto do partido Operário (2014), Publibook, Paris. E Narcissism, Neurosis of an Era (2015), Publibook, Paris.


Conclusões

                                                                                             Pg 128/130

 

         Que conclusões se podem tirar desta análise de pensamentos e de factos sob a questão nacional?


1.      Que não existe questão nacional para o proletariado, que os operários não podem tirar nenhuma vantagem da existência para eles de uma pátria e que eles não têm de se ocupar de opressões nacionais, do direito das nações a disporem de si próprias. O proletariado desenvolve o seu movimento, faz a sua revolução como classe e não como nação. Tão rapidamente quanto a vitória do proletariado nas diversas nações, as fronteiras não podem deixar de desaparecer. A tese leninista da autonomia nacional dos estados socialistas é um non-senso. Lenine afirma que enquanto exista o Estado a nação permanece uma necessidade. Ora, a nação não é senão um produto do estado burguês e não do estado proletário. Os estados proletários não podem senão tender a unificarem-se e a suprimir as fronteiras. Ou melhor ainda: o socialismo, em tanto que ordem económica e social não pode realizar-se senão na base da desaparição total das fronteiras. A supressão das diferenças económicas nacionais não pode realizar-se sem a supressão dos limites nacionais que são sempre artificiais e convencionais. A ditadura proletária, o estado operário, que não é o estado burguês  nem pode ter senão um carácter universal e nunca nacional, democraticamente unitário e não federativo. Os comunistas marxistas não podem edificar os Estados Unidos da Europa ou do Mundo, o seu fim é a República Universal dos concelhos operários.

2.      Os comunistas marxistas devem propagar, em consequência, entre as largas massas operárias o ódio à pátria, que é o meio para o capitalismo semear a divisão entre os proletários dos diferentes países. Devem preconizar entre as massas operárias a necessidade da confraternização, da união internacional de todos os proletários em todos os países. Devem combater encarniçadamente não apenas todas as tendências chauvinistas, fascistas ou social-democratas, que envenenam até os meios operários, mas também todas as tendências mesquinhas que tentarão dar uma base qualquer ao ideal nacional. Devem combater contra a lenda das guerras nacionais, a lenda das cruzadas populares anti-imperialistas. Devem incutir, utilizando a experiência histórica, no mais profundo das massas proletárias a fé na vitória do socialismo, nada senão em bases puramente classistas, puramente internacionalistas.

3.      Em consequência, é preciso conduzir todos os nossos esforços para o renascimento do verdadeiro internacionalismo marxista, no qual os social- reformistas e os nacional-bolchevistas semearam a confusão.

4.      Sabemos muito bem que a nossa propaganda não pode por si só realizar este esforço de ligar o internacionalismo entre as massas e desenvolvê-lo até um grau desconhecido no momento presente. Sabemos que a nossa propaganda, muito embora necessária, não terá a menor influência se os desenvolvimentos ulteriores do processo histórico não se encarregarem de o confirmar. Mas sabemos também que estes desenvolvimentos não podem senão empurrar o proletariado para as posições que os verdadeiros internacionalistas nunca trairão, que Rosa Luxemburgo conservou até à morte.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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