YSENGRIMUS — Velho marxista que não mudará de lado, eu nunca teria pensado que era possível: do idealismo à extrema direita. Para pessoas da minha geração, a extrema direita, foram sempre milícias garantidas, Pinkertons do capital, defendendo brutalmente a lei e a ordem. A reacção não poderia promover um ideal.
Os fachos do meu tempo
contentavam-se em ficar de guarda à frente da fortaleza a definhar sobre os
valores do avô. A extrema direita representa milícias para os grandes
burgueses, mercenários. Fanáticos sem uma linha definida. Certamente não
idealistas.
E ainda assim, agora, eis que se apresentam no portão societário como pequenos jovens em fatos de cidade, limpos, tonificados, conscientes, doutrinários. Eles apresentam-se como anti-sistema e aspiram a nada menos do que uma reformulação profunda do Ocidente. Eles acreditam num ideal e, tumultuosos, esse ideal é canalizado através do tubo mais acastanhado imaginável: anti--semitismo (retorno em força da grande conspiração financeira sionista), xenofobia (terroristas escondem-se entre os refugiados das guerras imperialistas como os homens de Ulisses entre as ovelhas dos ciclopes cegos), o isolacionismo nacional (os grandes conjuntos são supremacistas do supranacionalismo extorsivo), o anti-capitalismo direitista (sim à boutique do papá, não à grande empresa exportadora de empregos), moralismo social (não a todos, em todas as suas formas), religiosidade rastejante (católicos culturais, para não dizer simplesmente católicos). É o sobressalto, a revolução social da direita, a operação bandeira castanha, com todas as evanescências oniróides (sonhadoras) que isso implica e carrega.
Com um coração apertado de tristeza infinita, vou postular que esses jovens estão de boa fé. Ademais, quisemos muito que eles estivessem de má fé, que fossem agentes cínicos e lívidos de forças populistas obscuras, meio-carreiristas, garantindo o seu futuro burocrático-empreendedor num Ocidente friamente re-fascisado. Quisemos que os jovens da extrema direita de hoje levassem a cabo políticas calculistas, insípidas e fóbicas como os seus antepassados, que avançassem no tabuleiro de xadrez de forma tendenciosa, medíocre, agressiva, hedonista e onanista. Não, jovens contemporâneos de extrema-direita não são cínicos e fatalistas. Eles são finalistas. Eles caminham a passo, com os olhos na linha do horizonte. Eles acreditam no lixo deles. Eles têm ideais.
Esse é o objetivo do drama. Pior que a má fé, há a boa fé. Quanto à má fé, pelo menos, podemos desarmar o truque. Quanto à boa fé, só podemos permanecer basbaques, braços pendurados e boca aberta. Um azedume insidiosamente xenófobo que se envolve com um lobby mercantilista a favor de um grupo para chantagear outro, é descodificado e, consequentemente, entra em conflito. Um xenófobo genuíno e ardente que acredita de boa fé na re-imigração com o propósito de proteger os valores da raça branca, o que vos deixa frios e sem palavras na sua terrível boa fé. Ao fim e ao cabo, não há maior fervor do que o fervor patriótico autêntico. E oh, oh, não é de forma alguma uma garantia de verdade e relevância descritiva, essa autenticidade ardente.
Jovens de extrema direita, o vosso
fervor é imparavelmente sintomático do declínio socio-histórico do Ocidente. Este
é calmamente irreversível. Na economia mundial do amanhã, a Europa e a América
serão grupos menores à frente da Eurásia e da África. Em 1950, os Estados
Unidos representavam 53% da producção industrial mundial. Hoje, está a diminuir
gradualmente 22%. Isso não se inverterá para agradar ao Presidente reaccionário
do momento conjuntural que quisermos. Acreditar que se contrariam tendências tão
pesadas é desarmante de ingenuidade. É, portanto, neste caminho patrioteiro sem
esperança que vocês, jovens idealistas da extrema direita, estão a embarcar.
Nunca vos direi o suficiente sobre como os políticos convencionais que vocês
abominam são suavemente complacentes para convosco, nessa abordagem global. Os políticos
profissionais corruptos e manobradores amam o vosso fervor. Você servem-nos.
Quando vocês são muito sábios, vocês fazem abertamente avançar os valores
pútridos que eles promovem por baixo. Quando vocês estão muito agitados, vocês servem-nos
como contraponto e vocês legitimam os seus próprios excessos repressivos tão
choramingas quanto implacáveis.
Neste ponto
específico, a cultura da internet, da qual vocês tanto se gabam, é um sintoma
particularmente irritante. Está a aproximar-se cada vez mais, do fim da
recriação de trolls fachos e ultra-direitistas
anónimos. O enfrentamento institucionalizado da Internet que está para vir,
vocês terão sido os agentes provocadores ideais... artesãos objectivos, na
verdade. Pelas suas práticas e seu fachoferismo,
exacerbado ou vitimista,
vocês terão legitimado todos aqueles que querem tanto ter o dedo no
interruptor da Internet. A propósito, não vos vou atirar pedras. É em grande
parte imponderável, este assunto. São como as rádios piratas do passado ou qualquer outro tipo
de Oeste Selvagem conjuntural. A civilização acaba sempre por entrar no monte,
com esse tipo de dispositivo. E, até segunda ordem, a civilização serve
abertamente a sua burguesia e isso, sem complexos. Lembrar-nos-emos disso um
dia com uma espécie de nostalgia ácida, anos de troll...
O que estou a dizer de cor, jovens idealistas da extrema direita, é que vocês estão conscientemente a serem manipulados pela ordem estabelecida. Nenhuma geração escapou, além disso, e um dia chegará, o momento amargo em que vocês também deixarão de acreditar que são, também, mais finos do que todos os outros. É necessário dizer que a vossa causa começou mal, muito mal desencadeada. Abraçando a extrema direita, tomando-a como factor de mudança, vocês devem querer devolver a vós próprios um erro inteiro da juventude em quadrafonia. A extrema direita não é estruturalmente anti-sistema. Ela serve bem o sistema como balões de ar. O que a Segunda Guerra Mundial de Hitler fez com todo o seu fervor tórrido durante seis anos (1939-1945), senão fazer a cama objectiva do triunfante liberalismo dos 30 Gloriosos (1945-1975) e a sua série de crises contemporâneas. A pensar mudar o mundo com um programa de fachos cansados da Rússia ou do Irão, é minha convicção, é preciso verdadeiramente querer sonhar.
Mas o que é que vocês
querem? Não há mais teoria económico-política, hein. Irão vocês imaginar que não terão que esvaziar os vossos
bolsos na gaveta do dinheiro, por ter substituído o marxismo pelo catolicismo.
Tudo o que é metodicamente anti-capitalista e/ou pós-capitalista, tudo o que é
genuinamente radical e subversivo, os seus saltimbancos extorsionistas e os seus
charlatões pseudo-patrióticos conseguiram fazer vocês acreditarem que eram bobos,
ultrapassados, obsoletos, intelectualistas, condescendentes, casuistas. Marxismo,
a luta de classes, a abolição da propriedade privada dos meios colectivos
de producção, o confisco sem compensação de grandes fortunas para uso cívico
imediato, a revolução dos trabalhadores, vocês tem em comum com o acima
referido sistema não quererem ouvir falar sobre isso. Bem,
as alianças objectivas serão o que serão, sem menos nem mais... Vocês
assistiram a um truque de mão sem realmente perceber. Foi-lhes feito o velho
truque de mãos sem que vocês se tivessem dado conta dele. Disseram-vos que não
valia mais a pena pensar, que bastava
simplesmente a jogada passional, pseudo-inovadora, por assim dizer dissidente e
patriótica. Vocês vão pagar por isso também. Renunciar ao pensamento
analítico-crítico eficaz só pode levar a um estado de consciência: o do duro despertar.
Jovens idealistas de extrema direita, acreditem, um velho que abraçou intimamente as suas causas e que, ao fazê-lo, tem sido muitas vezes bafejado por elas: vocês vão ser apanhados. Os políticos profissionais da extrema direita irão usar-vos para se posicionarem no mainstream político... depois eles vão lentamente recentrar-se, tomando-vos de forma sorrateira por adquiridos. Nada surgirá de inovador ou útil de todo o fla-fla da causa que vocês tão ingenuamente assumiram. A extrema direita não pode ser um factor em progresso. Isso é uma contradição em termos. Mas idiota, vamos lá. Andem em círculos na caixa de areia. Falaremos sobre isso novamente quando vocês se consciencializarem dos vossos erros de juventude e lhe tiverem lamentavelmente virado as costas. Mas aqui, é a vossa juventude, também, que não estará mais lá.
Fonte: Lettre ouverte aux jeunes idéalistes d’extrême-droite – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua
Portuguesa por Luis Júdice
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