8 de Julho
de 2021 Robert
Bibeau
Por Pepe Escobar. Em Mondialisation e Reseau International.
Os Estados Unidos estão a tentar reorganizar o conceito do Intertermarium Báltico-Mar Negro pós-Guerra Mundial para fazer um muro de ferro 2.0 da Guerra Fria contra a Rússia.
Bem-vindos ao último show da OTAN: Sea Breeze começa hoje e vai até 23 de Julho. Os co-anfitriões são a Sexta Frota dos EUA e a Marinha Ucraniana. O protagonista principal é o Grupo Marítimo 2 da OTAN.
O espetáculo, na linguagem da OTAN, é apenas uma demonstração inocente do "fortalecimento da dissuasão e da defesa". A OTAN diz-nos que o exercício está "a tornar-se cada vez mais popular" e que agora reúne mais de 30 países "de seis continentes" que mobilizam 5.000 soldados, 32 navios, 40 aeronaves e "18 equipas de operações especiais e mergulho". Todos comprometidos em implementar e melhorar o conceito mágico de "interoperacionalidade" da OTAN.
Agora, dissipemos a neblina e entremos no cerne da questão. A OTAN dá a impressão de que está a apreender partes do Mar Negro em nome da "paz". Os artigos de fé supremos da OTAN, reiterados na sua última cimeira, são "a anexação ilegal da Crimeia pela Rússia" e o "apoio à soberania da Ucrânia".
Para a OTAN, a Rússia é inimiga da "paz". Tudo o resto é apenas
névoa híbrida de guerra.
Não só a OTAN "não reconhece e não reconhecerá a
anexação ilegal e ilegítima da Crimeia pela Rússia", mas também
denuncia a sua "ocupação
temporária". Este cenário, redigido em Washington, é recitado por Kiev e
praticamente toda a UE.
A OTAN apresenta-se comprometida com a "unidade transatlântica". A geografia diz-nos que o Mar Negro não foi anexado ao Atlântico. Mas isso não impede de forma alguma a boa vontade da OTAN, que, como mostram os resultados, transformou a Líbia no norte de África num deserto administrado por milícias.
Quanto à intersecção entre a Ásia Central e o Sul, o colectivo da OTAN foi corrido sem cerimónias por um bando de Pashtuns andrajosos armados com Kalashnikovs falsificadas.
Bucareste 9
A Casa Branca define os seus aliados no flanco leste da OTAN como os 9 de Bucareste.
Os 9 de Bucareste incluem os membros do Grupo de Visegrado (República Checa, Hungria, Polónia e Eslováquia), o trio báltico (Estónia, Letónia e Lituânia) e dois vizinhos do Mar Negro (Bulgária e Roménia). Sem Ucrânia – pelo menos ainda não.
Mapa regional do Mar Negro por Spiridon Ion Cepleanu. fonte: Wikimedia Commons |
Quando a Casa Branca fala em "fortalecer as relações transatlânticas", significa, acima de tudo, "uma cooperação mais estreita com os nossos nove aliados na Europa Central e nas regiões do Báltico e do Mar Negro em toda a gama de desafios". Tradução: "toda a gama de desafios" significa a Rússia.
Bem-vindo pois ao regresso, em grande estilo, do Intermarium – como por "entre os mares", principalmente o Báltico e o Mar Negro, com o Adriático como acessório.
Após a Primeira Guerra Mundial, o ímpeto para o que se poderia tornar um
assentamento geopolítico incluía os três Bálticos, Jugoslávia, Checoslováquia,
Hungria, Roménia, Bielorrússia e Ucrânia. Esta mistura foi feita na Polónia.
Hoje, sob a égide dos Estados Unidos e a sua ala armada da OTAN, um
Intermarium Báltico- Mar Negro renovado está a ser empurrado como a nova
Muralha de Ferro da Guerra Fria 2.0 contra a Rússia. É por isso que a
incorporação final da Ucrânia na OTAN é tão importante para Washington – porque
solidificaria o Intermarium para sempre.
007 faz Monty Python
Na semana passada, a sequela Sea Breeze desenrolou-se através de uma acrobacia maluca do Brittany Reigns Over the Waves, encenada como um esboço de Monty Python – mas com conotações potencialmente explosivas.
Imagine esperar numa paragem de
autocarro nalgum lugar de Kent e encontrar numa lata de lixo
uma massa encharcada – quase 50 páginas – de documentos secretos a
detalhar as explicações do Ministério da Defesa sobre a implantação explicitamente
provocativa do destroyer Defender ao
largo de Sebastopol, ao longo da costa da Crimeia.
Até um jornalista da BBC a bordo do destroyer demoliu a versão oficial de Londres de que o
destacamento do navio era apenas uma "passagem inocente". Além disso,
as armas do Defender estavam totalmente carregadas, enquanto avançavam duas
milhas náuticas para as águas russas. Moscovo divulgou um vídeo documentando a
acrobacia.
Mas há melhor. A mancha barrenta encontrada em Kent não revelou apenas discussões sobre a possível reacção russa à "passagem inocente". Também houve também divagações sobre o facto de dos britânicos, "encorajados" pelos americanos, poderem vir a deixar Comandos no Afeganistão após a retirada das tropas a seguir a 11 de Setembro.
Isso seria mais uma prova de que o conjunto anglo-americano-OTAN não vai
realmente "deixar" o Afeganistão.
Um vago "membro do público" entrou em
contato com a BBC quando
inocentemente achou o material geo-politicamente radioactivo. Ninguém sabe se
foi uma fuga, uma armadilha ou um erro estúpido. Se o "membro do
público" fosse um verdadeiro denunciante, ele teria seguido o caminho
do Wikileaks,não o da BBC.
A "passagem inocente" ocorreu poucas horas depois de Londres assinar um acordo com Kiev para "fortalecer as capacidades navais da Ucrânia".
Sobre a frente da reacção russa, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, resumiu a situação: "Londres mostrou mais uma acção provocatória seguida de um monte de mentiras para encobri-la. Os agentes 007 não são mais o que costumavam ser."
Embaixadora do Reino Unido na Rússia, Deborah Bronnert |
Enquanto isso, na frente do Mediterrâneo, que a OTAN considera o seu Mare Nostrum, dois caças russos Mig-31k – capazes de transportar mísseis hipersónicos Khinzal – foram transferidos na semana passada para a Síria. O alcance do Khinzal abrange todo o Mediterrâneo.
Por todo o Sul global, a promoção da
OTAN da "paz mundial" no porto do Mar Negro de Odessa só pode evocar
nuances da Líbia e do Afeganistão. Austin Powers - auto-proclamado Agente
Duplo, Oh! aguenta-te! – caberia perfeitamente no caso dos
"documentos secretos" da lata de lixo de Kent.
"Oh! Aguenta-te aí! " aplica-se inteiramente ao Sea Breeze. Caso contrário, pode haver uma oportunidade para dizer olá ao Sr. Kinzhal.
Pepe
Escobar
Fonte: Une mer peinte en noir OTAN – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por
Luis
Júdice
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