31 de Março de
2023 Robert Bibeau
Por Ahmed Salah.
Há mais de um ano que
a Ucrânia está em guerra. Actualmente, a situação na frente é essencialmente
uma representação viva da Primeira Guerra Mundial, com os lados a trocarem fogo
de artilharia e a cavarem trincheiras. É praticamente um impasse: as forças russas
detêm a maior parte da vasta frente e estão a empurrar a linha de volta para as
regiões de Bakhmut e Avdiivka. Enquanto a ofensiva russa, que durou mais de 10
meses sem ganhos significativos, permanece num impasse, ao mesmo tempo as
forças armadas ucranianas estão a tentar reunir recursos para uma
contra-ofensiva na região de Zaporizhzhia. Declarações de responsáveis de Kiev
e fugas dos meios de comunicação social sugerem que a Ucrânia pretende cortar a
rota terrestre da Rússia para a Crimeia e retomar a península. Além disso,
diz-se que a operação está planeada para o início de Abril. Este poderá ser o
ponto de viragem do conflito, mas se a contra-ofensiva ucraniana falhar, terá
consequências desastrosas e poderá mesmo levar a uma derrota esmagadora.
Os três recursos mais importantes desta guerra podem ser definidos, grosso
modo, como dinheiro, armas e soldados. Os três estão interligados: é necessário
dinheiro para produzir ou comprar armas e soldados para operar essas armas.
Dinheiro
Uma vasta gama de instrumentos financeiros foi desenvolvida e implementada
pelo Ocidente para visar a economia russa e reduzir a sua capacidade de
prolongar a invasão ucraniana. Entre Fevereiro de 2022 e Fevereiro de 2023, os
Estados e organizações internacionais impuseram 10608 restrições aos residentes
russos. Além disso, durante este período foram impostas 3431 sanções com base
em listas a entidades associadas à Rússia, tornando Moscovo o detentor do maior
número de sanções da história.
As sanções infligiram indubitavelmente um duro golpe à Rússia. No entanto,
o governo russo conseguiu manter a economia a funcionar. Procurou minimizar os
danos duplicando os laços comerciais com a China, Índia, Turquia e outros
Estados que compraram produtos russos (principalmente petróleo e gás) a um
preço elevado. A Rússia também tentou fazer pagamentos em rublos ou nas moedas
nacionais dos seus parceiros comerciais. Especialistas também falaram da
intenção de Moscovo de reorientar a
economia para o complexo militar-industrial. Actualmente, os economistas
prevêem o crescimento do PIB russo para os próximos dois anos, o que significa
que a Rússia é capaz de sustentar esta guerra, mesmo à custa do empobrecimento
da sua população.
Quanto à Ucrânia, a sua economia não se encontrava em boa forma mesmo antes
da invasão. Naturalmente, foi paralisada pela guerra, mas Kiev encontrou
aliados fortes nos EUA e na Europa. A economia ucraniana teria entrado em
colapso sem ajuda financeira estrangeira. As Forças Armadas ucranianas lutaram
para adquirir armas, equipamento, alimentos, etc. O Presidente Volodymyr
Zelensky não teve outra escolha senão estender a mão ao Ocidente (sic) para
financiar devidamente o esforço de guerra. Enquanto os aliados apoiarem a
Ucrânia, Kiev não terá quaisquer problemas financeiros, mas é impossível
adivinhar como será a economia ucraniana no final do conflito.
Armas
Desde a Primavera de 2022, supõe-se que a Rússia tem falta de mísseis,
munições de artilharia, veículos blindados e pessoal. No entanto, o arsenal
soviético acabou por exceder as expectativas da maioria dos analistas, apesar
de lhe faltarem armas modernas. Numerosos vídeos virais mostram russos
transportando antigos tanques da Segunda Guerra Mundial, armas e espécimes
raros de equipamento provavelmente reafectados de áreas remotas da Rússia,
incluindo o Extremo Oriente e a região do Árctico. Os russos conseguiram
compensar o armamento obsoleto com números puros, redistribuindo stocks antigos
e comprando sistemas modernos dos poucos países dispostos a satisfazer as
necessidades de Moscovo.
Durante o período mais turbulento do conflito, a artilharia russa disparou
até 20.000 cartuchos por dia, contra 7.000 disparados pelas Forças Armadas
Ucranianas. O problema persiste até hoje, uma vez que nem mesmo os fabricantes
europeus e americanos de munições juntos conseguiram aumentar a sua capacidade
de produção de cartuchos para o mesmo nível que a Rússia.
Os russos também utilizaram mísseis de defesa aérea S-300 em alvos
terrestres. Os mísseis utilizados desta forma carecem de precisão, mas estão
disponíveis em grandes quantidades. Outra forma de reutilização de armas
existentes foi demonstrada através da conversão de bombas aéreas em munições
guiadas com um GPS e um kit de controlo barato. Por outro lado, sistemas
modernos, tais como mísseis hipersónicos Zircon, também foram testados durante
o conflito.
Além disso, a Rússia confia na utilização de drones de combate Shahed-131 e
Shahed-136 adquiridos ao Irão. Os drones, rebaptizados Geran-1 e Geran-2 numa
tentativa fraca de obscurecer a sua origem, são utilizados por unidades
avançadas para atingir veículos das Forças Armadas ucranianas, posições e mesmo
objectos de infra-estruturas nas profundezas das linhas da frente.
A Ucrânia não foi capaz de igualar a quantidade de armas russas. Em vez
disso, Kiev procurou obter uma vantagem na qualidade, confiando no fornecimento
de armas avançadas pelos aliados ocidentais. Os lançadores ATGM, tais como o
Javelin americano e o NLAW sueco-britânico, e os aviões de combate Bayraktar
TB-2 turcos, funcionaram bem na fase inicial do conflito, mas até agora os
sistemas HIMARS provaram ser os mais eficazes. As unidades russas não estavam
completamente preparadas para o seu longo alcance e têm lutado para reconstruir
a sua logística tendo em mente a possibilidade de ataques HIMARS.
A mais recente adição à tripulação diversificada do equipamento ocidental
prometido a Kiev são 400 tanques da OTAN, na sua maioria Leopards de fabrico
alemão. A Ucrânia, e especialmente o Presidente Zelensky, insiste que isto não
é suficiente. Nos seus discursos, o líder ucraniano exige repetidamente que o
Ocidente aumente o seu fornecimento de munições, mísseis de longo alcance e
aviões de combate.
Soldados
No que diz respeito às
tropas, ambos os lados sofreram perdas consideráveis e, neste momento, cada um
dos lados ficou praticamente sem as forças com que começou. Inicialmente, a
Rússia destacou 150.000 tropas e a Ucrânia tinha cerca de 200.000. Pouco depois
do início da guerra, Zelensky ordenou uma mobilização geral. Recrutas dispostas
a lutar pelo seu país juntaram-se aos militares para combater o agressor. Isto
permitiu à Ucrânia abrandar a ofensiva russa e contra-ataques em importantes
direcções, incluindo a bem sucedida recaptura de Kherson.
Contudo, à medida que a especulação sobre a contra-ofensiva se intensifica, há mais provas de que os homens ucranianos estão a ser tomados à força pelos militares. O conjunto de recrutas motivados foi grandemente reduzido e as autoridades estão agora a raspar o fundo do barril. Ao contrário do dinheiro e das armas, o Ocidente não pode fornecer à Ucrânia um número suficiente de pessoas em idade de recrutamento sem uma presença militar estrangeira em grande escala em solo ucraniano, algo que os EUA e a UE estão relutantes em arriscar. Dizia-se que Zelensky estava a pedir aos Estados estrangeiros, incluindo a Polónia, que o ajudassem a identificar e deportar cidadãos ucranianos elegíveis para o serviço.
A Rússia, no entanto, só se mobilizou em Setembro. Apesar da forte migração para os países vizinhos, como a Arménia, a Geórgia e o Cazaquistão, segundo consta, 300.000 pessoas terão sido mobilizadas para o exército russo. Metade delas estão actualmente estacionadas na Bielorrússia ou ao longo da fronteira russa.
Esta breve análise comparativa mostra que a Ucrânia se encontra actualmente numa situação difícil. O Presidente Zelensky tem facilitado a prestação de assistência militar e financeira significativa à Ucrânia. Agora deve produzir resultados ou arriscar-se a perder o apoio estrangeiro. Ao mesmo tempo, o Presidente dos EUA Joe Biden deve transformar a contra-ofensiva numa vitória, a fim de justificar toda a ajuda enviada à Ucrânia para os contribuintes norte-americanos, especialmente com as eleições do próximo ano.
Ahmed Salah
Fonte: Le conflit ukrainien approche d’un tournant – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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