terça-feira, 31 de dezembro de 2024

Donald Trump e o novo paradigma para a paz

 


31 de Dezembro de 2024 René Naba

RENÉ NABA — Este texto é publicado em parceria com www.madaniya.info.

O paradigma dos “Acordos de Abraão” tornou-se obsoleto depois de 7 de Outubro

Donald Trump terminou o seu primeiro mandato em 2020 com o “grandioso” “Acordo do Século” para fazer a “paz definitiva” no Médio Oriente: os Acordos de Abraão.

A única coisa que faltou neste “Acordo do Século” foram os principais envolvidos: os palestinianos!

E com razão! Com os Acordos, Israel deixou de ser o inimigo. Foi substituído pelo Irão, designado como o “grande inimigo” dos árabes.

Os Acordos de Abraão oferecem aos árabes ameaçados pelo “malvado” Irão uma aliança com o Estado hebreu, que se compromete a defendê-los!

Um gigantesco programa de desinformação foi desenvolvido durante muitos anos nos países árabes para preparar estes acordos.

O Irão foi apresentado como um país herético, que provoca divisões entre sunitas e xiitas para desestabilizar os regimes do Golfo; um país que fornece armas à Polisário para enfraquecer o regime marroquino; um país que se esconde por detrás de slogans pró-palestinianos, mas que é, na realidade, seu inimigo, etc...

Esta campanha de diabolização do Irão acertou em cheio.

Os regimes do Golfo (excepto o Qatar e Omã), bem como o regime marroquino, romperam relações diplomáticas com o Irão. 

E quanto aos palestinianos?

Desapareceram da geografia e da nova geo-política neo-conservadora!

Trump tinha assim conseguido convencer certos países árabes, incluindo Marrocos, a renegar os seus compromissos com a Liga Árabe e as resoluções das cimeiras árabes, incluindo a de Beirute em 2002, que oferecia a Israel a paz em troca dos territórios palestinianos ocupados em Junho de 1967, em suma: Paz por Terra.

A posição de solidariedade árabe em torno desta proposta tinha sido um importante trunfo diplomático de apoio à causa palestiniana nas últimas décadas.

Trump conseguiu desfazê-la, como se desfaz uma trança de cebolas tirando 3 ou 4 cebolas, com as outras a soltarem-se sozinhas.

Só que, quatro anos depois, os Acordos de Abraão estão onde Trump os deixou, ainda com apenas quatro membros dos 22 países que compõem a Liga Árabe.

É verdade que as relações de certos países árabes com o Estado hebreu se desenvolveram enquanto este levava a cabo o seu plano de genocídio e de limpeza étnica dos Palestinianos.

Entretanto, a Arábia Saudita reconciliou-se com o Irão em Março de 2023, graças à mediação chinesa, minando seriamente a estratégia americana de colocar os árabes contra o Irão.

E então, a 7 de Outubro de 2023, o “Tufane Al Aqsa” (o Dilúvio de Al Aqsa) abalou a região. (1)

Israel apareceu na sua verdadeira natureza como uma entidade que só podia existir substituindo os palestinianos. As suas intenções expansionistas foram claramente expressas por Benyamin Netanyahu em várias ocasiões.

Ao mesmo tempo, o Irão está totalmente empenhado em apoiar a resistência palestiniana. É por isso que ele é o foco de todo o ódio e agressão de Israel e de todo o campo imperialista.

O paradigma dos “Acordos de Abraão” tornou-se obsoleto depois de 7 de Outubro.

Se Trump for pragmático e não ceder à influência dos neo-conservadores (incluindo o primeiro-ministro israelita Benyamin Netanyahu), terá de ter a coragem de repensar os seus planos.

A resistência palestiniana e pró-palestiniana está no campo de batalha há 13 meses. Apesar da enorme assimetria de forças a favor das forças de ocupação israelitas, apoiadas militar e politicamente pela coligação mundial dos países imperialistas e por alguns países árabes, o campo de batalha em Gaza e no Líbano continua nas mãos da resistência.

O “dia seguinte” só pode ser definido pela resistência. 

Então, o que fará Trump?

Continuará a seguir os passos dos neo-conservadores da Administração Biden até conseguir a “vitória absoluta” prometida por Benyamin Netanyahu?

Uma guerra total que pode degenerar numa guerra regional ou mesmo mundial a qualquer momento?

A imagem dos Estados Unidos no mundo deteriorou-se consideravelmente. A guerra de genocídio que estão a travar terá consequências incalculáveis para os povos árabes e muçulmanos, bem como para os americanos e outros povos do mundo.

Os dois meses que nos separam da tomada de posse do novo Presidente serão decisivos.

Se a transição for bem conduzida, nenhuma acção importante que comprometa a nova legislatura poderá ser tomada sem o acordo do novo Presidente.

Trump prometeu ao seu eleitorado - em particular aos árabes e muçulmanos - acabar com a guerra.

É difícil imaginar que uma nova agressão israelo-americana seja lançada contra o Irão durante este período de transição de dois meses.

A guerra na Ucrânia, outra obsessão de hegemonia neo-conservadora, a guerra em Gaza, no Líbano e as acções agressivas contra o Irão custaram ao orçamento dos EUA centenas de milhares de milhões, se não triliões de dólares.

Se o novo Presidente quiser relançar a economia e pôr fim à inflação, terá de pôr termo a esta hemorragia.

Os Estados Unidos terão de ultrapassar a era dos neo-conservadores e aceitar que vivem num mundo multipolar, já não sendo a única superpotência com uma hegemonia ilimitada.

Como um homem de negócios astuto, Trump terá de pesar o custo do seu apoio incondicional a Israel em relação aos benefícios que isso lhe traz.

Se Trump quer uma paz duradoura e uma economia próspera, terá de reconhecer o direito dos palestinianos a viverem livremente no seu próprio país e o direito de regresso dos que se encontram em exílio forçado.

A única solução viável é um Estado único, livre do supremacismo sionista e do apartheid e que garanta a igualdade de direitos para todos. 

Referências

1.      O que poderia ter sido uma operação limitada da resistência, que tomou de surpresa duas bases militares encarregadas de vigiar e fazer respeitar o bloqueio de Gaza, e cujo objectivo inicial era a tomada de reféns para trocar pelos 20. 000 prisioneiros mantidos como reféns por Israel, transformou-se no dia seguinte numa “história de holocausto”, digna de um cenário de terror de Hollywood, encenada por Netanyahu e pelos seus serviços de propaganda para apelar à “Shoah” e justificar o genocídio e a execução do plano dos colonos fascistas de esvaziar Gaza dos seus habitantes e anexá-la.

2.      É uma reminiscência do método utilizado pelas milícias sionistas em 1948: massacrar todos os habitantes de uma aldeia, como em Deir Yassin, e espalhar a notícia por toda a região para obrigar os outros habitantes a partir.

Para ir mais longe neste tema, veja estes links

·         https://www.madaniya.info/2019/06/01/lidylle-insolite-de-donald-trump-artisan-du-muslim-ban-avec-la-dynastie-wahhabie-1-2/

·         https://www.madaniya.info/2019/06/06/lidylle-insolite-de-donald-trump-artisan-du-muslim-ban-avec-la-dynastie-wahhabite-2-2/

Sobre os objectivos de Israel

·         https://www.renenaba.com/revue-detude-palestiniennes-n-14-fevrier-1982/

Sobre a responsabilidade de Joe Biden na reeleição de Donald Trump

·         https://legrandcontinent.eu/fr/2024/11/08/joe-biden-porte-une-extraordinaire-responsabilite-dans-la-victoire-de-trump-une-conversation-avec-patrick-weil/

 

 

Fonte: https://les7duquebec.net/archives/296795?jetpack_skip_subscription_popup

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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