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de Dezembro de 2024 René Naba
RENÉ NABA — Este texto é publicado em parceria com www.madaniya.info.
A Arábia Saudita manteve-se discreta durante a guerra de Gaza, que eclodiu em Outubro de 2023, A principal preocupação do Abu Dhabi era obstruir os esforços diplomáticos do Qatar para conseguir um cessar-fogo, devido à sua rivalidade com o principado rico em gás, que estava ansioso por impedir o seu rival do Golfo de alcançar qualquer sucesso que o pudesse ensombrar.
São estas as revelações feitas pelo jornal libanês “Al Akhbar” a 27 de Fevereiro de 2024, referindo-se a telegramas diplomáticos árabes a que o jornal teve acesso. Em anexo, os principais pontos dessas revelações:
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Diplomatas árabes destacados em Washington
tinham alertado os membros do Congresso, já em Agosto de 2024, para uma
possível operação militar do Hamas contra Israel, mas os membros do Congresso,
amigos de Israel, não tomaram conhecimento.
· Melhor ainda, a Arábia Saudita atrasou deliberadamente em dez dias uma cimeira árabe sobre a guerra israelo-palestiniana, para não comprometer a cimeira árabe-africana que deveria acolher em meados de Outubro de 2024.
Durante todo este período, o Reino demonstrou ostensivamente o seu desinteresse pela destruição do enclave palestiniano, organizando eventos artísticos, com muita publicidade e a participação de artistas árabes.
Sobre as relações entre a Arábia Saudita e Israel, veja estes links:
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https://www.madaniya.info/2018/07/05/arabie-saoudite-etats-unis-israel-follow-the-money/
1 – A abordagem do corpo diplomático árabe ao Congresso dos EUA.
Premonitório, o corpo diplomático árabe tinha-se comprometido a alertar o Congresso americano para a situação crítica em Gaza, já em Agosto de 2024, ou seja, dois meses antes da operação “dilúvio de Al Aqsa”, mas o Congresso americano, vampirizado pelo lobby judaico americano, não fez caso.
“A contínua privação financeira em Gaza, incluindo a suspensão do financiamento da UNRWA, vai exacerbar a situação e incitar o Hamas a desencadear uma operação militar para chamar a atenção da opinião pública internacional para a situação crítica do território palestiniano”, escreve o jornal, referindo-se aos telegramas a que teve acesso.
“Uma tal operação terá repercussões tanto para Israel como para os países vizinhos do Estado hebreu, nomeadamente o Egipto e a Jordânia”, acrescenta o jornal.
A delegação árabe era composta por 4 embaixadores baseados em Washington. Em Agosto de 2024, reuniu-se com os líderes do Congresso norte-americano para lhes pedir que deixassem de privar a UNRWA (Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente) de 75 milhões de dólares destinados a ajudar a população do enclave palestiniano.
Os diplomatas árabes sublinharam igualmente a gravidade da situação resultante da decisão do PAM (Programa Alimentar Mundial) de reduzir a sua ajuda alimentar à população do enclave em Julho de 2023. Os diplomatas árabes argumentaram que a anulação do orçamento da UNRWA irá agravar o problema, uma vez que ¾ dos habitantes de Gaza vivem da ajuda da agência da ONU.
Os legisladores norte-americanos mostraram-se inflexíveis quanto a este pedido, mantendo a sua posição de congelamento do financiamento desta agência da ONU e condicionando o seu financiamento a reformas do seu funcionamento administrativo. Afirmaram ainda que “terão em conta a oposição de Israel à continuação da ajuda americana à UNRWA”, sublinhando “a falta de entusiasmo da administração americana no seu conjunto sobre este assunto, em todos os seus aspectos”.
2 – Barbara Leaf: Mahmoud Abbas é muito velho e carece de qualidades de liderança para conduzir as negociações com sucesso.
Por seu lado, Barbara Leaf, Sub-secretária de Estado para os Assuntos do Próximo Oriente, responsabilizou a Autoridade Palestiniana pela deterioração da situação na Cisjordânia. “As negociações entre Israel e a Autoridade Palestiniana não farão qualquer progresso enquanto Mahmoud Abbas se mantiver no poder. Ele está velho e não tem as qualidades de liderança necessárias para levar a cabo esta missão”, afirmou Leaf, relatando a sua visita ao Médio Oriente no Verão de 2024.
3- Egipto: O objectivo da guerra em Gaza é deslocar a população palestiniana.
O Egipto vê-se como uma grande potência regional com a maior proximidade geográfica da principal base da resistência palestiniana, Gaza.
A este respeito, o Presidente Abdel Fattah Al Sissi informou uma delegação do Congresso americano que “não podia tolerar a liquidação da questão palestiniana, em detrimento do Egipto, e que este projecto deve ser combatido por todos os meios”.
“A presença de palestinianos fora do seu território não resolverá o problema. Pelo contrário, esse projecto é prejudicial à segurança nacional egípcia, na medida em que dará a elementos do Hamas a oportunidade de se infiltrarem no Egipto”, acrescentou o Presidente egípcio.
“O Hamas não representa o povo palestiniano, mas a sua operação contra Israel não autoriza o Estado hebreu a matar à fome, e muito menos a massacrar em massa a população palestiniana. O importante é voltar às origens da crise e não às suas consequências, ou seja, o facto de o povo palestiniano ver há muito negado o seu direito a um Estado independente”, continuou Sissi.
Em resposta, a delegação do Congresso dos EUA informou tanto a Arábia Saudita como o Egipto que “a operação de 7 de Outubro de 2024 foi planeada pelo Irão para sabotar o processo de normalização entre Israel e a Arábia Saudita, que, segundo a delegação, tinha produzido bons resultados”. Os legisladores norte-americanos apelaram aos sauditas para que prosseguissem a normalização com Israel, de modo a não dar ao Irão a oportunidade de torpedear este processo.
Resposta do Marechal de Campo Sissi: “A normalização saudita-israelita não é uma solução para as crises no Médio Oriente. Os últimos acontecimentos são a prova disso. A administração americana deve reactivar os esforços de paz e satisfazer as aspirações do povo palestiniano”.
4 – A entrevista de Brett McGurk/Sameh Choukri: O verdadeiro problema é a posição dos israelitas que rejeitam a ideia de uma solução de dois Estados.
Brett McGurk, coordenador para o Médio Oriente e Norte de África da administração democrata de Joe Biden, garantiu a Sameh Choukri, ministro dos Negócios Estrangeiros do Egipto, que “os Estados Unidos apoiam uma solução de dois Estados (Israel/Palestina), mas que esta perspectiva pressupõe um acordo entre as duas partes e a reforma da Autoridade Palestiniana e dos seus serviços de segurança”.
Resposta de Sameh Choukri: O argumento de que a solução de dois Estados exige a reforma da Autoridade Palestiniana equivale a culpar a parte palestiniana por esta situação, quando o verdadeiro problema reside no comportamento dos israelitas, que rejeitam a ideia de uma solução de dois Estados. Falar de “o dia seguinte”, na ausência de um cessar-fogo, não é realista, porque o que está a acontecer é, de facto, uma transferência da população de Gaza, um prelúdio para a liquidação da questão palestiniana.
5- Rei Abdullah II da Jordânia a Emmanuel Macron: Formar uma coligação internacional contra o Hamas equivale a “tratar a resistência palestiniana como um grupo terrorista”.
O monarca jordano manifestou a Emmanuel Macron a sua “oposição resoluta” ao projecto do Presidente francês de formar “uma coligação internacional contra o Hamas”, na medida em que esse projecto, sugerido ao Presidente francês pelo filósofo Bernard Henri Lévy, “tenderia a equiparar a resistência palestiniana a um grupo terrorista”.
Abdallah II recorda, sem dúvida, o facto de o seu avô Abdallah I, fundador da dinastia hachemita no Reino da Transjordânia, ter sido assassinado em 1948, por ter feito um pacto com os israelitas. Por isso, não se pode dar ao luxo de cometer o menor deslize numa questão tão sensível, uma vez que 2/3 da população da Jordânia é de origem palestiniana, incluindo a mulher do rei Abdullah II, a rainha Rania.
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Veja este link: www.madaniya.info/2020/07/22/l-assassinate-de-roi-abdallah-1er-de-jordanie-en-1951/
Um facto que o Presidente Macron, um
novato nos assuntos árabes apesar de 7 anos no poder, não conseguiu integrar no
seu raciocínio antes de lançar o seu projecto “absurdo”.
· Sobre este plano sugerido por Bernard Henri Lévy ao presidente francês veja este link: https://www.madaniya.info/2023/12/04/gaza-les-premiers-enseignements-de-la-guerre/
As divergências entre o Rei Abdullah e o Presidente Macron levaram ambas as partes a cancelar a conferência de imprensa conjunta que os dois líderes deveriam realizar no final da visita do Presidente francês à Jordânia, em 23 de Outubro de 2023.
A experiência da Jordânia com o plano de Israel de deportar a população de Gaza é um pesadelo, e o Ministro dos Negócios Estrangeiros jordano informou os líderes ocidentais que a transferência da população palestiniana para os países vizinhos é “uma linha vermelha” para o Reino.
Safadi alertou também para os ataques aos locais sagrados de Jerusalém por parte de extremistas judeus. “Este tipo de comportamento dará aos radicais islâmicos um pretexto para se envolverem em actos que se tornam incontroláveis”, sublinhou.
6- A visita do Rei da Jordânia ao Abu
Dhabi: Obter um sistema de defesa anti-aérea.
O rei Abdullah da Jordânia pediu ajuda aos Emirados Árabes Unidos para equipar o seu reino com um sistema de defesa anti-aérea para o proteger contra ataques hostis de mísseis ou drones, “como acontece com os Houthistas no Iémen”.
Para dar ainda mais credibilidade ao seu pedido, o rei Abdullah II, diabolicamente oportunista, participou na defesa de Israel, em 13 de Abril de 2024, abatendo drones iranianos sobre o espaço aéreo jordano durante a retaliação iraniana contra Israel, na sequência da destruição do consulado iraniano em Damasco, duas semanas antes, em 1 de Abril, O envolvimento da Jordânia na defesa de Israel provocou, assim, uma permutação dos papéis respectivos dos Estados da região no confronto israelo-árabe, elevando o Irão à categoria de “país do confronto” ou “país do campo de batalha” e confirmando a Jordânia e outras petro-monarquias do Golfo no seu papel de “país de apoio” a Israel, bem como de líder da estratégia ocidental.
· Veja este link: https://www.renenaba.com/la-jordanie-et-le-maroc-deux-voltigeurs-de-pointe-de-la-diplomatie-occidentale/
7– A Jordânia propõe Mahmoud Dahlan e Marwane Barghouti como possíveis sucessores de Mahmoud Abbas.
A Jordânia sondou vários países árabes sobre a possibilidade de reformar a Autoridade Palestiniana, propondo Mahmoud Dahlan e Marwane Barghouti como possíveis sucessores de Mahmoud Abbas. “Esta solução, segundo Amã, constituiria um meio-termo entre a recusa de Israel em negociar com o Hamas e a incapacidade do Estado hebreu em desmantelar o movimento islamista palestiniano”.
Líder do Tanzim, o grupo paramilitar da Fatah, Marwane Barghouti foi preso em 2002 e condenado por um tribunal civil israelita a cinco penas de prisão perpétua pelo assassínio de cinco pessoas. Declarou-se inocente durante o julgamento. Considerado o Nelson Mandela da luta palestiniana, é a figura política mais popular na opinião pública palestiniana.
· Neste link o problema de seu encarceramento: https://www.renenaba.com/du-calendrier-comme-travail-traumático/
Natural de Khan Younès, na Faixa de Gaza, Mahmoud Dahlan é o antigo chefe da segurança preventiva do enclave palestiniano. Bête noire do Hamas, é o trunfo do Abu Dhabi na equação palestiniana. Mahmoud Dahlan supervisionou, em nome do Abu Dhabi, a construção de uma ponte marítima que liga Larnaca (Chipre) a Gaza para abastecer a população do enclave palestiniano. Um projecto concebido por Joe Biden em concertação com os israelitas.
Em Junho de 2007, em plena luta fratricida interpalestiniana entre a Fatah e o Hamas, Mohammed Dahlan refugiou-se no Egipto. Tinha criado uma comissão para investigar o fracasso dos seus serviços de segurança contra o Hamas na Faixa de Gaza em Junho de 2007. Na sequência das conclusões da comissão, demitiu-se, a 26 de Julho, do cargo de conselheiro de segurança nacional do Presidente palestiniano Mahmoud Abbas.
Exilado no Abu Dhabi desde a sua expulsão
da Fatah por acusações de corrupção, tornou-se conselheiro do príncipe Mohamad
Ben Zayed e, como tal, foi um dos arquitectos da normalização das relações
entre o Estado do Golfo e Israel.
Fonte: https://les7duquebec.net/archives/296502?jetpack_skip_subscription_popup
Este artigo foi traduzido para Língua
Portuguesa por Luis Júdice
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