18 de Setembro
de 2023 Robert Bibeau
Por Khider Mesloub.
Logo que rebentou a guerra russo-ucraniana, vários milhões de ucranianos fugiram do seu país no espaço de poucos dias para se refugiarem em muitos países europeus. Logo que rebentou a guerra na Ucrânia, a situação dos ucranianos que fugiam do conflito causou uma agitação imediata em toda a Europa. Uma manifestação espontânea de solidariedade. Os migrantes ucranianos foram acolhidos prontamente e com simpatia por todos os países europeus.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) contabilizou
cerca de 8 milhões de refugiados ucranianos. Este número representa 20% da
população do país. Pouco mais de metade destes cidadãos ucranianos exilados -
4,8 milhões - encontraram refúgio num Estado-Membro da União Europeia e no
Reino Unido. Este êxodo é o maior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Sem
hesitações nem discriminações, todos os países membros da União Europeia
abriram as suas fronteiras para acolher os refugiados ucranianos.
Concederam-lhes imediatamente o estatuto de protecção temporária.
Recorde-se que a protecção temporária permite aos seus beneficiários e às
suas famílias obter automaticamente o direito de residência no Estado-Membro da
sua escolha, bem como o acesso ao mercado de trabalho, à habitação, à saúde, à
educação e à assistência social. A protecção temporária tem a duração mínima de
um ano, mas pode ser prorrogada até três anos. Ou até mais.
Desde a sua chegada aos países da UE, os ucranianos têm direito ao subsídio
de requerente de asilo (ADA), mesmo que não sejam requerentes de asilo. O
montante do subsídio é fixado em 6,80 euros por dia para uma pessoa, acrescido
de 3,40 euros por cada pessoa adicional do agregado familiar, se esta for
alojada a expensas do contribuinte. E 14,20 euros por dia se não for oferecido
alojamento ao requerente. Para além deste subsídio, recebem ainda o subsídio
personalizado de alojamento (APL) e a protecção universal de saúde (Segurança
na Saúde), que lhes dá direito a cuidados médicos gratuitos. Os imigrantes
ucranianos podem também inscrever-se no Centro de Emprego para encontrar um
emprego ou seguir uma formação profissional.
Melhor ainda. Os refugiados ucranianos, que beneficiam automaticamente de
protecção temporária, podem igualmente solicitar a sua inscrição no registo profissional
e no registo comercial e de empresas, a fim de exercerem uma profissão
independente.
Além disso, todos os jovens ucranianos menores de idade podem inscrever-se
numa escola. Do mesmo modo, os jovens que atingiram a maioridade podem
candidatar-se a frequentar o ensino superior ou a inscrever-se em centros de
formação de adultos. Receber bolsas de estudo. Serem acolhidos num alojamento universitário.
Receber refeições a 1 euro nos restaurantes universitários e subsídios para
comprar material escolar e livros.
Recorde-se que o custo médio por refugiado ucraniano em 2022 terá sido de
cerca de 5 462 euros, sem contar com a remuneração paga às famílias de
acolhimento, só em França, que acolhe apenas 115 000 migrantes ucranianos. O
custo total é de 630 milhões de euros. Para 2023, serão mais de mil milhões.
Para a União Europeia no seu conjunto, cuidar dos 8 milhões de refugiados
ucranianos custará várias dezenas de milhares de milhões de euros.
Em todo o caso, o contraste entre o acolhimento dado aos cidadãos
ucranianos e o que é habitualmente dado aos exilados de outras nacionalidades,
nomeadamente os refugiados do Leste, do Norte de África e da África subsariana,
é gritante. A diferença de tratamento é gritante. Os imigrantes do Terceiro
Mundo são submetidos a tratamentos violentos e degradantes em todos os países
europeus, incluindo a França... e o proletariado internacionalista europeu não
tem qualquer responsabilidade por estas calamidades...
Portanto, dois pesos e duas medidas no acolhimento dos exilados de outros
países. A prova. O acolhimento dado ao desembarque de 6.000 refugiados
africanos na ilha italiana de Lampedusa. Todos estes refugiados provêm de
países onde a pobreza grassa, onde o proletariado nada gere, nada governa, nada
decide, mas sofre os conflitos regionais provocados pelo capitalismo mundializado
para partilhar recursos e mercados.
No entanto, como forma de boas-vindas, as autoridades da pequena ilha
declararam imediatamente o estado de emergência. O estado de emergência é
normalmente uma medida adoptada por um governo em caso de ameaça grave à ordem
pública ou de perturbação grave. Implica o aumento dos poderes policiais e
restricções a certas liberdades públicas ou individuais.
Para vossa informação, Lampedusa é um dos muitos "hotspots",
eufemisticamente chamados "centros de acolhimento e triagem de
migrantes". Na realidade, são verdadeiras prisões a céu aberto,
principalmente em Itália e na Grécia. Recentemente, o site de informação Info
Migrants descreveu as terríveis condições de vida dos refugiados detidos nestes
campos de detenção: "Em Julho de 2022, fotografias publicadas na imprensa
que mostravam o interior do centro a transbordar de lixo e exilados obrigados a
dormir ao relento em colchões de espuma levaram as autoridades a evacuá-lo com
urgência".
Como era de esperar, na maioria dos países europeus, incluindo em França, a
direita e a extrema-direita aproveitaram-se imediatamente da situação e,
sobretudo, do seu ódio xenófobo e defenderam medidas racistas e repressivas
contra os refugiados africanos que tinham chegado à ilha de Lampedusa. Para
Matteo Salvini, vice-primeiro-ministro italiano, a chegada de tantos migrantes
representa um "acto de guerra". No ano passado, em Fevereiro-Março de
2022, 175.000 imigrantes ucranianos chegaram a Itália no espaço de algumas
semanas. O tratamento benevolente deste fluxo de migrantes ucranianos,
orquestrado pelas autoridades europeias, foi descrito como um "acto de
amor". Um acto de humanidade. Os italianos foram convidados a abrir os
seus corações para acolher este afluxo de migrantes ucranianos, mas também a
abrir as suas casas para oferecer alojamento e alimentação a estes eslavos da
Ucrânia. Os migrantes africanos nunca gozaram de tal acolhimento. Nomeadamente
os últimos a chegar à ilha de Lampedusa. E, no entanto, não foram 8 milhões de
refugiados africanos que desembarcaram na Europa, mas 6.000.... Tudo isto prova
que a grande burguesia - o capital mundializado que "governa" os
governos - é racista e que consegue inocular nas populações indefesas o veneno
do racismo e do chauvinismo étnico.
Em França, Marine Le
Pen, seguindo as pisadas de Matteo Salvini, tweetou: "Quem é que ainda se
recusa a falar de inundações quando o equivalente à população de uma ilha chega
em apenas algumas horas? Claro que estes imigrantes não vão ficar em Lampedusa...".
Quanto à sua sobrinha, Marion Maréchal, disse na BFMTV que se tratava de um
"desafio civilizacional". Isto é apenas o início [...], podemos falar
de uma submersão migratória.
Uma coisa é certa: a crise dos refugiados africanos que chegam à ilha de
Lampedusa recorda-nos que o humanitarismo dos governos ocidentais (de esquerda)
é de geometria variável. No Ocidente, as regras da hospitalidade não são as
mesmas consoante a origem étnica dos refugiados, ou seja, consoante a
pigmentação da pele do exilado. Esta dupla hospitalidade é também a marca do
racismo subjacente à política de migração da União Europeia, nomeadamente da
França, que recusa categoricamente aceitar refugiados "não europeus"
nos seus centros de acolhimento.
Aos olhos racistas dos ocidentais ricos, os refugiados que contam são os
exilados brancos. O exemplo dos ucranianos ilustra-o. Comparados com outros
refugiados, os refugiados ucranianos são reconhecidos como brancos, arianos. O
Ocidente acolheu os ucranianos por solidariedade racial (sic).
“A diferença de tratamento dos refugiados diz-nos algo
sobre o racismo institucional e descarado dos Estados fantoches governados pelo
grande capital ocidental. A hospitalidade selectiva dos governos europeus
também nos diz algo sobre o racismo das políticas de migração em vigor entre
esses pretensos pregadores anti-racistas... à direita e à esquerda... sob o
"Directório" dos Verdes.
Khider MESLOUB
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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