7 de
Fevereiro de 2024 Equipa editorial
Artigo
de Paul Lafargue, publicado no L’Égalité de 25 de
Dezembro de 1881.
Os burgueses tem a ternura dos anjos pelos animais; sentem-se mais próximos dos animais do que dos operários. Em Inglaterra, o país oficial da hipocrisia, abundam as sociedades de protecção dos cães, dos gatos, dos pardais, etc. Todas essas sociedades são especulações: um certo número de membros influentes (presidentes, secretários, agentes, inspectores, etc.) são mantidos e engordados com os fundos destinados aos animais: eles consideram que possuem todas as qualidades necessárias para merecer a solicitude dos amigos dos animais.
De
todas estas sociedades, a mais importuna, a mais hipócrita, a mais
nauseabunda é a sociedade contra a vivissecção. Esta sociedade já fez incursões
na Alemanha, onde encontrou muitas almas animais que se compadecem com o sofrimento
dos seus companheiros de quatro patas. Está a tentar penetrar em França; está
em vias de conquistar os radicais, que fazem questão de demonstrar que têm
sentimentos delicados de sobra.
Um
colunista radical. Aurélien Scholl declarou-se o campeão dos anti-vivissectores
e o jornal do líder do radicalismo, La Justice, reproduz as suas colunas
destinadas a provocar ataques de nervos nas mulheres burguesas histéricas.
A
Sociedade de Animais Anti-Vivissectores em Inglaterra era tão
vociferante que obteve do Parlamento uma lei que proíbe as experiências
fisiológicas em animais vivos sem autorização da polícia. É assim que os
burgueses tratam os seus homens ilustres; degradam-nos ao ponto de os colocarem
sob o controlo dos esbirros da polícia, mesmo nos seus laboratórios. -- Mas
esta sociedade, que paralisou com tanto sucesso o trabalho dos fisiologistas
ingleses, não tem intenção de interferir nos prazeres dos ricos. O tiro aos
pombos, no qual milhares de pombos mansos são feridos e mutilados para o
divertimento de alguns aristocratas imbecis, é altamente aprovado pela
sociedade anti-vida; vários dos seus membros influentes são grandes atiradores aos
pombos. - Este sentimentalismo é tão turbulento que, no Congresso Médico
Internacional realizado em Londres em Agosto último, Virchow e John Simon
sentiram-se obrigados a protestar em nome da ciência alemã e inglesa.
John
Simon é um dos inspectores oficiais das fábricas inglesas.
Viu e estudou as torturas a que os ternos burgueses submetem as crianças, as
mulheres e os homens do proletariado nas prisões capitalistas, para lhes
roubarem o fruto do seu trabalho. Denunciou-as com uma coragem que os radicais
jamais conheceriam. No seu discurso ao Congresso, estabeleceu que existem dois
tipos de experiências: umas realizadas por fisiologistas em alguns animais;
outras realizadas em milhares de homens por especuladores. A título de exemplo,
cita as experiências clássicas do professor Tiersch num rato para descobrir o
modo de propagação da cólera asiática e "as conhecidas experiências
populares que, durante as duas epidemias de cólera de 1848-49 e 1853-54, foram
efectuadas em meio milhão de seres humanos nos distritos do sul de Londres, por
uma certa empresa comercial que fornecia água corrompida a esses
distritos". O fisiologista sacrificou alguns coelhos e cães para as suas
experiências; o agricultor que vendia o leite das suas vacas doentes sacrificou
milhares de homens.
Há
dois anos, um fabricante londrino de pó de arroz, o Sr. King,
adulterou os seus produtos com pó de argila arsenical: os bebés cuja pele
delicada e gretada tinha sido polvilhada com o seu medicamento morreram de
envenenamento por absorção cutânea das substâncias arsenicais. O envenenamento
foi confirmado por autópsias e análises químicas, o arsénico foi encontrado nas
embalagens seladas à venda nas mercearias e farmácias, e King foi levado a
tribunal. Doze jurados burgueses absolveram-no. - Há algumas semanas, o
fisiologista inglês Ferrier, conhecido no mundo erudito da Europa e da América
pelas suas investigações sobre a localização das funções cerebrais, foi levado
perante a polícia correccional, por não ter obtido autorização da polícia. O
cientista foi multado.
Eis onde chega o sentimentalismo burguês hipócrita. O Sr. Bright, o radical, foi um dos que mais energicamente se opuseram à aprovação da lei que limitava o trabalho das mulheres e das crianças a dez horas por dia; e o Sr. Bright, um homem piedoso, vai todos os domingos ler a Bíblia com os seus operários, que tortura e rouba na sua fábrica durante seis dias da semana: se os mata com trabalho na terra, fá-los ganhar o paraíso no céu. - Um envenenador de crianças é absolvido. - Um cientista é condenado. King, o fabricante de pó de arroz arsenical, adulterava os seus produtos para aumentar os seus lucros, ou seja, os seus roubos; e esta é a sua desculpa aos olhos da lei burguesa, promulgada e aplicada para proteger os ladrões. Ferrier, o sábio fisiologista, é condenado por ter feito experiências com macacos e por ter dado como único objectivo das suas experiências o conhecimento científico, sem qualquer ideia de lucro, e este é o seu crime aos olhos do direito burguês. Para obter lucro, isto é, para roubar, a burguesia é autorizada a torturar seres humanos nas prisões capitalistas e a envenená-los com produtos adulterados. O fim santifica os meios.
Fonte
E para continuar com o tema sobre os
ricos e os pobres …
Um achado de Robert Gil
Os direitos de autor
deste texto pertencem às entidades em causa. É publicado aqui, num espaço de
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Fonte: https://les7duquebec.net/archives/208591
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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