terça-feira, 21 de junho de 2022

O ALARGAMENTO DA UE E A CONTINUAÇÃO DA GUERRA NA UCRÂNIA

 


 21 de Junho de 2022  Robert Bibeau  

                                                          

Fonte Comunia. Tradução e comentário 

Os presidentes ou primeiros-ministros da França, Alemanha, Roménia e Itália com Zelensky em Kiev esta semana.


A Alemanha e a França tentaram esta semana recuperar a liderança sobre o desenvolvimento e os objectivos da guerra na Ucrânia. Tiveram de concordar em voltar a levantar as contradições internas da UE para enviar uma mensagem a Washington, Londres e Moscovo nas vésperas da cimeira da NATO. Mas por muito que se disfarce como uma negociata da "justiça" para a "paz", estas supostas aspirações à justiça não vão além da perpetuação do massacre, nem os “esforços de paz” têm outro objectivo além de dar um pouco de fôlego a uma guerra económica que deu errado para a parte do campo ocidental. Os Estados Unidos estão satisfeitos com os resultados deste jogo de massacre. NDE.


Tabela de Conteúdos

§  A Alemanha e a França estão a cair do cavalo?

§  Alargamento da UE e as suas contradições

§  Uma bofetada na cara dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha contra a Rússia?

A Alemanha e a França estão a cair do cavalo?

O desconto de 30% sobre os preços de exportação de petróleo russo inverteu o efeito das sanções da NATO e encontrou clientes na Ásia

Neste momento, é evidente para todos que as sanções impostas pela UE à Rússia, na sequência dos Estados Unidos, destroem o papel central do capital europeu no sistema mundial de acumulação, mas não prejudicam assim tanto a Rússia. Só em Maio, Moscovo angariou quase 20 mil milhões de dólares em exportações de petróleo. Os descontos de 30% foram suficientes para que a China e a Índia fossem às compras ao ponto de fornecer vendas aos países da NATO. A subida dos preços mundiais fez o resto.

resultado é simbolizado no novo Lada. Um triunfo para a burguesia russa, que consegue criar o seu primeiro modelo de "pós-sanções". Um empobrecimento perigoso para os trabalhadores russos a quem se destina o modelo, que não disporá de medidas básicas de segurança, como travões ABS ou airbags, dependentes de tecnologias e fornecimentos estrangeiros. Mas também um buraco no balanço da Renault (e, portanto, do capital francês), que depois de a França aderir à política de sanções e de analisar os seus custos, teve de vender a fábrica por um rublo ao Estado russo, pensando que regressaria em breve... ilusão...

Não é de estranhar que a esmagadora propaganda da guerra esteja a começar a desanuviar-se na brutalidade das suas mensagens. Scholz e, em especial, Macron estão a introduzir cada vez mais elementos do discurso a favor de "uma paz que não seja humilhante para a Rússia" porque hoje é o seu principal argumento para impor uma negociação que acabe com a guerra e permita que as suas economias (o seu capital) recuperem um mínimo de valorização... o único propósito destas "operações especiais".

Alargamento da UE e as suas contradições

Draghi, Macron e Scholz em Kiev

Mas é muito difícil impor lideranças alternativas aos EUA na guerra sem romper com a NATO e sem romper com a UE. Macron e Scholz foram claros – estas são as regras impostas por Washington – que para se aproximarem da fasquia, tinham de ser capazes de oferecer ao esforço de guerra ucraniano algo que pudesse rivalizar com o doping de armas liderado pelos EUA.

Ou seja, tiveram de oferecer "o dia seguinte". Daí a viagem de Scholz e Macron, acompanhada por Draghi e pelo Presidente da Roménia – que tem os seus próprios objectivos em relação à Moldávia – para anunciar o seu apoio a uma candidatura condicional da Ucrânia e da Moldávia à adesão à UE.

O eixo franco-alemão foi assim apresentado acompanhado por representantes dos dois grupos de países em que as aspirações imperialistas abertas pela guerra e as suas consequências económicas dividiram a UE.

Por um lado, os países do antigo bloco russo da Guerra Fria. Tudo com expectativas imperialistas directas na actual zona de influência russa e geralmente favorável a uma política que tende a trazer guerra à Rússia por todos os meios. A burguesia romena nunca deixa de sonhar com uma "reunificação" mais ou menos explícita com a Moldávia. A classe dominante polaca, diz Lukashenko, espera "recuperar" o oeste da Ucrânia – cujo pequeno campesinato está na raiz do nacionalismo ucraniano mais genocida.

Por outro lado, os países do Sul, como a Itália ou a Espanha, que pagam desproporcionalmente os custos económicos da guerra, porque os seus sistemas energéticos estão sujeitos a uma concepção de preços concebidos a partir dos interesses e objectivos do capital alemão orquestrados pelo Green Deal.

Além disso, Itália, Espanha, Portugal e Grécia estão mais relutantes em abrir as portas a uma Ucrânia que absorverá durante anos os fundos europeus que agora lhes dão oxigénio, para dotar o capital ucraniano de uma infraestrutura já obsoleta, ruinosa e ineficiente antes da guerra.

Ainda por cima, criar um consenso sobre o alargamento da UE significa entrar no complicado acto de equilíbrio dos Balcãs. A França, por exemplo, teve de aceitar as condições da Bulgária para que a Macedónia do Norte se tornasse candidata. Não é certo que a classe dirigente búlgara esteja satisfeita com isto.

O cesto de caranguejos e a caixa de pandora

Mas se a questão macedónia é difícil, o reconhecimento do Kosovo pela Sérvia continua a resistir às pressões americanas e a Bruxelas. E, de um modo mais geral, o ressentimento da Macedónia, da Albânia, da Sérvia, do Montenegro e da Bósnia a ser ultrapassado por uma Ucrânia que preenche menos condições do que quase qualquer uma delas, faz dos “gestos” para a integração de Kiev na UE a semente de uma nova dissidência pronta para abrir caminho para os imperialismos rivais da Alemanha e da França.

O facto de a Turquia se apresentar como mediador na Bósnia, uma vez que os dirigentes sérvios e bósnios-sérvios ingressam no "Davos russo" é indicativo das dificuldades e contradições da Alemanha, da França e dos objectivos que esperam alcançar com o alargamento da UE para além da situação na Ucrânia.

Uma bofetada na cara dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha contra a Rússia?

Zelensky e Macron nesta viagem

O anúncio dos quatro chefes de Estado e de Governo em Kiev não era o que Zelensky teria gostado. Em primeiro lugar, o presidente ucraniano queria armas pesadas. Por vezes, os seus conselheiros vinham pedir mais do que os países – incluindo os Estados Unidos – tinham guardado. Ganhar o estatuto de candidato da UE à Ucrânia serve para justificar a guerra em frente da população como um sacrifício necessário para o velho sonho da classe dirigente ucraniana.

Mas não se enganem: nenhum dos seus quatro visitantes quer perpetuar a guerra ou alargá-la à Rússia. E este movimento, mesmo que esteja vestido de apoio à guerra contra a Rússia, é bastante dirigido aos aliados que Zelensky considera mais fiáveis para prolongar a matança: os Estados Unidos e a Grã-Bretanha.

Quando, na sexta-feira, uma pletora von der Leyen, vestida com as cores da bandeira ucraniana e embriagada com a linguagem de "sangue e honra" dos ultras de Kiev, anunciou que as recomendações da Comissão deram rédea livre ao estatuto de candidato à Ucrânia e à Moldávia, Putin foi rápido a explicar a posição russa.

A UE não é uma organização militar, um bloco político, ao contrário da NATO. Por conseguinte, sempre dissemos que a nossa posição aqui é coerente e compreensível. Não temos nada contra. É uma decisão soberana de qualquer país se deve ou não aderir a associações económicas e a partir destas associações, aceitar ou não novos Estados como membros.

Que isso seja vantajoso ou em detrimento da Ucrânia, é também uma questão interna, do povo ucraniano e para a actual liderança ucraniana.

Mas a estrutura da economia ucraniana é tal que exigirá subsídios muito grandes, muitos subsídios. Se o mercado interno não for protegido, a Ucrânia acabará por se tornar, na minha opinião, numa semi-colónia. [Em qualquer caso,] É pouco provável que isso conduza à restauração da indústria aeronáutica, da construcção naval, da electrónica e de outras indústrias críticas.

Não é da nossa conta, mas nunca nos opusemos. Sempre fomos contra o desenvolvimento militar do território ucraniano, porque ameaça a nossa segurança.

VLADIMIR PUTIN REUNIÃO COM DIRECTORES DE COMUNICAÇÃO RUSSOS

 

Ver também: https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2022/06/ideologo-economista-chefe-de-estado-e.html  

Numa mensagem à França e à Alemanha, Putin esclareceu a limitação dos seus objectivos de guerra àqueles já alcançados, acrescentando que estava a chegar às fronteiras das duas províncias do Donbass. Jogando cínicamente ao humanitário, ele opõe-se a um assalto directo às posições ucranianas. E ainda por cima, Slutsky completou a mensagem presidencial dizendo aos jornalistas que "não exclui" o "recomeço iminente das negociações" com a Ucrânia.

Mas se o alargamento forçado da UE a Leste não excita Kiev e é aceite sem problemas pela Rússia... não é visto à mesma luz pela Grã-Bretanha. O país, que já está à beira de uma guerra comercial com a UE, não pode deixar de ver a coincidência no tempo entre as novas lógicas da política de expansão e a apresentação pelo primeiro-ministro escocês de um novo caminho para a independência que conduz à ... integração na UE.

Por outras palavras, a abertura simbólica do caminho da Ucrânia para a entrada na UE serviu para enviar uma mensagem de Paris e Berlim a Washington e Londres: estão prontos a liderar a UE à custa de fazer da Ucrânia parte integrante da economia da UE – ganhando um mercado e novos espaços para o seu capital – mas não para perpetuar uma guerra que os sufoca economicamente.

Moscovo concorda. Londres está silenciosa. Nos escritórios de Bruxelas, a embriaguez bélica continua. Washington, ao que parece, continua a apostar tudo na continuação da guerra. Todos esperam tirar algo para o seu capital do massacre, apesar da multiplicação do caos capitalista, do aparecimento de novas fomes e da recessão em curso. Cinicamente apresentam a contradição entre os seus próprios interesses imperialistas como um conflito entre a "justiça" (guerra total) e a "paz negociada" (tréguas numa guerra económica que tem sido contraproducente para os seus próprios interesses).

O que é indiscutível é que nenhum trabalhador de nenhum dos países que luta, directa ou indirectamente, nos campos ucranianos tem algo a ganhar com a guerra. Nem com alguns "esforços de paz" destinados a reparar os danos causados aos seus próprios capitalistas pela guerra económica, nem a obter vantagens para o próximo ataque militar. Não há nada para os trabalhadores nos planos de ambos os lados, senão piores condições de exploração, repressão brutal, um buraco numa vala comum ou algo ainda pior.

A escalada para o militarismo mais brutal e a generalização da guerra só pode ser travada pelos trabalhadores. E temos de nos organizar para isto agora.



Fonte: L’ÉLARGISSEMENT DE L’UE ET LA POURSUITE DE LA GUERRE EN UKRAINE – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




Sem comentários:

Enviar um comentário