4 de Outubro
de 2023 Robert Bibeau
Por Khider Mesloub.
Lenta mas seguramente, na França oficial oligárquica e policial,
estabelece-se um novo espírito nacional totalitário. Surge uma nova ordem
nacional, baseada na trilogia Trabalho, Pátria, "Fome" (a população é
precipitada no empobrecimento).
Uma nova ordem nacional que lembra os
anos sombrios do regime fascista de Vichy. Além disso, o porta-voz do
governo, Olivier Véran, voltou aos três eixos da agenda da Macronia, que resumiu, ele próprio,
sob o tríptico: Trabalho, Ordem, Progresso. Por ordem, devemos entender: ordem
policial, cujo progresso repressivo e assassino é visto todos os dias.
"É sob o tríplice signo do Trabalho, da Família e da Pátria que devemos avançar para a nova ordem", insistia Pierre Laval, na altura do regime fascista de Vichy.
Assim que foi instalado, o regime
fascista de Vichy trabalhou para liquidar a Terceira República, para dar plenos
poderes executivos e legislativos ao Marechal Pétain. Não é este o processo a
que assistimos desde o início do mandato de Macronia?: a liquidação da Quinta
República, ilustrada pela concentração de poder nas mãos de Macron, cujo oculto Conselho de
Defesa, instituído como órgão de governo durante a crise sanitária, simboliza
excessos totalitários. Esta deriva acelera-se com o uso desproporcionado do
despótico 49.3, constantemente desembainhado para forçar as mais impopulares
leis e "reformas" anti-sociais e anti-classe operária.
Assim que foi entronizado, o regime
fascista de Vichy, liderado por Pétain, decidiu valorizar o trabalho. O
trabalho surge, portanto, como ponto central da propaganda do novo regime
fascista. Ao mudar assim o lema, os apoiantes da Revolução Nacional significam
que, para eles, o trabalho é, sem trocadilhos, crucial, ao ponto de encorajar
os franceses a darem o seu trabalho no âmbito do Service du travail
obligatoire (STO). Desde o início, o regime fascista de Vichy criticou a preguiça
difundida pela Frente Popular, acusada de ter reduzido o horário de trabalho e
introduzido férias pagas. O lema do poder de Vichy era "o trabalho dos franceses
é o recurso supremo da pátria". Além disso, o regime também
aproveitou o 1º de Maio para mostrar que "o trabalho está no
centro das atenções".
No entanto, o trabalho valorizado pelos
pétainistas é o de uma França rural e tradicional. Os dois pilares do trabalho
valorizado são o artesanal e o campesino. Por outro lado, o operário e o
mundo fabril são obscurecidos, pela sua dimensão subversiva e pela sua
inclinação para a luta de classes. O regime de Pétain glorificava um mundo do
trabalho pacificado, livre da luta de classes. O trabalho é apresentado como o
cadinho da sociedade francesa. A propaganda petainista empurrou a indecência ao
ponto de convidar operários franceses, enviados para a Alemanha como parte do
STO, para serem embaixadores da qualidade francesa. Alguns cartazes celebram a
Obra dando o Marechal Pétain como modelo, numa certa forma de culto ao chefe.
Ironicamente, tal como a França de Vichy
se baseou na derrota militar e no descalabro económico, daí a ruína dos franceses,
explicando o uso maciço de propaganda por parte do governo Pétain para tentar
criar uma falsa união nacional, o regime de Macron, da mesma forma, baseia-se
na derrota moral política, no descalabro industrial., daí
a ruína dos franceses, explicando, não o uso da propaganda estatal, hoje
inoperante devido à existência de redes sociais (verdadeiros contrapoderes
mediáticos), mas o uso da violência policial. A polícia é o último
baluarte da senil e decadente burguesia francesa a manter uma
aparência de "coesão social".
Na era da Macronia, tal é a dramática trilogia governamental (Trabalho, Pátria, "Fome") agora imposta ao povo francês pelo altivo General Macron. Como um digno herdeiro de Pétain, que inaugurou o seu regime genocida de Vichy sob os auspícios ameaçadores da Revolução Nacional, Macron iniciou a sua presidência com a publicação do seu livro de programa, também intitulado Revolução. Supunha-se que a Revolução que defendia seria liberal, libertária e libertina, mas ninguém suspeitaria que se tornaria nacional e totalitária. Militar e policial, ofensiva e repressiva.
A título de recordação, em Junho de 1940, o marechal Pétain, num discurso moralista e culpabilizante, responsabilizando o próprio povo francês pela sua derrota, denunciou as causas dos infortúnios da França nestes termos: "Desde a vitória [de 1918], o espírito de gozo prevaleceu sobre o espírito de sacrifício. Reclamámos mais do que servimos. Quisemos poupar esforços; hoje somos confrontados com a desgraça". Em suma, o marechal Pétain critica o povo francês por se ter tornado brando na sua busca de bem-estar.
Na mesma linha, com uma retórica quase idêntica, em 24 de Agosto de 2022, o promotor da colaboração com a finança genocida internacional, Macron, assumiu uma postura moralista e culpabilizadora semelhante em relação ao "seu" povo, incriminado pela sua suposta indolência e prodigalidade insolente. Macron discursou a 24 de Agosto de 2022, na abertura do Conselho de Ministros, cujos primeiros minutos foram deliberadamente transmitidos em directo para todos verem. No seu preâmbulo, Macron apelou ao povo francês para estar preparado para fazer mais esforços e sacrifícios porque "o mundo está a enfrentar uma grande convulsão" (...) "uma grande convulsão". (...) "Grandes convulsões energéticas, como consequência directa da guerra na Ucrânia e das alterações climáticas". O eurodeputado alerta ainda para o facto de a França entrar agora numa nova ordem marcada pelo "fim da abundância" e pelo "fim de uma forma de despreocupação".
Agora, Macron pretende continuar o seu trabalho reaccionário através da Revolução Trabalhista. Macron, como um digno herdeiro de Pétain, que quis voltar a pôr a França a trabalhar no dia seguinte à sua derrocada, para apoiar o esforço de guerra nazi, ao serviço de quem estaria agora a trabalhar (tal como a França de Macron está actualmente a trabalhar ao serviço da NATO, ou seja, dos Estados Unidos, os senhores da Europa vassala), quer remodelar o trabalho, tornando-o mais flexível e mais extenso. Por outras palavras, aumentando a semana de trabalho e prolongando o emprego assalariado, ou seja, fazendo recuar a idade da reforma, actualmente fixada em 64 anos, graças ao projecto de lei 49.3 e à colaboração dos sindicatos, os organismos que enquadram os trabalhadores.
Em 2022, durante a campanha para as eleições presidenciais, na sua "Carta aos Franceses", Macron já tinha mencionado o seu desejo de alargar o horário de trabalho, uma vez reeleito. "Não pode haver independência sem força económica. (Esta carta prova a hipocrisia dos sindicatos e dos partidos de esquerda: há muito tempo que estas organizações conhecem as intenções reformistas destrutivas de Macron e, no entanto, pedem para votar nele). É claro que se trabalha mais, mas não se ganha mais. A prova: devido à inflação especulativa orquestrada pelo Estado, os trabalhadores e os reformados vêem o seu poder de compra cair a pique.
Entre as medidas previstas para obrigar os trabalhadores a trabalhar mais e durante mais tempo, Macron planeia desmantelar a semana de trabalho de 35 horas e substituí-la por um sistema em que o horário de trabalho variará consoante a fase da vida.
Não só os assalariados terão de trabalhar mais sem compensação financeira,
provavelmente com semanas de 50 horas, como a partir de agora, desde a adopção
da reforma das pensões, terão também de trabalhar mais tempo, até aos 64 anos.
Por outras palavras, a exploração dos trabalhadores está a ser alargada a
montante e a jusante. Os jovens vão ter de trabalhar mais. Os trabalhadores
mais velhos terão de trabalhar mais tempo. Semanas de 50 horas. E as carreiras
profissionais prolongam-se até aos 64 anos. É este o sistema de exploração
assalariada a que serão submetidos os trabalhadores franceses. Esta é a
revolução laboral que o regime totalitário de Macron vai iniciar, em que a
exploração salarial vai aumentar de intensidade e extensão.
O regime de Macron, neste período de economia de guerra, e portanto de
militarismo "que exige a mobilização de todas as forças vivas da nação
para defender a Pátria ameaçada por regimes iliberais e autoritários",
segundo a retórica atlantista ocidental, quer pôr toda a gente a trabalhar.
É o caso, nomeadamente, dos
desempregados e dos beneficiários do RSA (rendimento mínimo – NdT), que passam
a ser obrigados a contribuir para o esforço (económico) de guerra, integrando
as empresas para poderem beneficiar das prestações sociais e do subsídio de
desemprego. Os beneficiários do RSA deixarão de poder continuar a receber o seu
subsídio sem compensação.
Para assegurar esta transição para o trabalho obrigatório, de memória sinistra, o governo Macron decidiu efectuar uma revisão total (totalitária) do Centro de Emprego. Para começar, o governo Macron muda o nome do Centro de Emprego, considerado impessoal e neutro. A partir de agora, o Centro de Emprego chamar-se-á France Travail. O que soa como um slogan patriótico, um grito de guerra: France Travail. Ou mesmo uma injunção peremptória: "France, travaille" (França, trabalha) (o dia de glória chegou... Às armas, cidadãos (trabalhadores), formai os vossos batalhões (as vossas equipas), Marchons, oui marchons (marchemos) (trabalhemos, sim produzamos), Qu'un sang impur abreuve nos sillons (Que o sangue impuro beba os nossos sulcos (Que o suor impuro beba as nossas empresas)).
A France Travail substituirá o Centro de Emprego ( Pôle emploi) a partir de 2024. O Centro de Emprego será transformado em France Travail, "a fim de organizar as condições de colaboração e de eficácia colectiva, no quadro da governação global do Estado, das colectividades locais e dos parceiros sociais", como sublinha o relatório elaborado por Thibaut Guilluy, Alto Comissário para o Emprego e o Empenho das Empresas.
Com esta nova organização, a France Travail quer "reduzir significativamente os postos de trabalho por preencher devido à falta de candidatos". É isso, tudo é revelado nesta passagem do relatório citado acima. A missão da France Travail será fornecer mão de obra às empresas deficitárias em termos de emprego. Inclusive por meios coercitivos. A nova entidade France Travail terá como objectivo colocar os desempregados a trabalhar, especialmente neste período de economia de guerra, militarismo.
E como tenciona o Governo Macron
proceder para "reduzir significativamente os postos de trabalho por preencher por falta de
candidatos"? O novo Centro de Emprego, France Travail, tornará obrigatória a
inscrição dos franceses quando procuram emprego, o que não acontece actualmente
(cada um é livre de se inscrever ou não no Centro de Emprego e de trabalhar ou
não). Em todo o caso, quem não está inscrito não recebe qualquer subsídio de
desemprego. De facto, actualmente, pouco mais de um desempregado em cada três
recebe qualquer subsídio. Dos 6,5 milhões de pessoas inscritas no Centro de
Emprego em Dezembro de 2022, apenas 2,6 milhões recebem subsídio. Um número que
continua a diminuir). Para o conseguir, cada empresa e cada candidato a emprego
passam a comunicar com um único conselheiro, um negreiro dos tempos modernos
encarregado de fornecer aos capitalistas os trabalhadores-escravos. Para garantir o fornecimento de escravos
assalariados às empresas, o número de "conselheiros" será aumentado,
o que explica o custo da transformação do Centro de Emprego em France Travail.
De acordo com o relatório publicado na quarta-feira, 19 de Abril de 2023, estas
mudanças custarão entre 2,3 e 2,7 mil milhões de euros até 2026.
Entre os projetos da France Travail, está também a reforma relativa ao reforço do apoio aos beneficiários do RSA (rendimento activo solidário), na mira do Governo. Segundo o semanário L'Express, "o Governo quer que os beneficiários da RSA cumpram os deveres definidos por Emmanuel Macron". Que deveres são esses? Em troca do seu subsídio, os beneficiários do RSA terão de trabalhar para as colectividades locais ou para as empresas. Por exemplo, o Governo Macron pretende condicionar o pagamento do RSA ao cumprimento de 15 horas de actividade por semana, ou seja, 15 horas de trabalho forçado. Uma reforma que abre a porta a que este esforço seja exigido a qualquer pessoa inscrita no Centro de Emprego, e não apenas a um beneficiário do RSA.
Segundo a CGT, "as actividades exercidas" (trabalho forçado) podem ser de qualquer tipo. "Por isso, é de recear que sejam realizadas apenas no seio das empresas e das colectividades locais, sem oferecer um verdadeiro acesso à formação aos beneficiários", sublinha a CGT.
Como denuncia a CGT, "com esta reforma, o governo retrocede no direito fundamental ao emprego, consagrado na Constituição de 1946, e afasta-se cada vez mais do direito ao emprego para uma obrigação de trabalhar". Denis Gravouil, Secretário-Geral da FNSAC, denuncia que "em vez de contratarem trabalhadores das colectividades locais, as colectividades locais em causa poderão contar com o trabalho gratuito dos beneficiários do RSA ou, pior ainda, as empresas poderão aproveitar o financiamento público (através dos impostos) do RSA para obterem trabalho gratuito". Para a CGT o Centro de Emprego, "o desenvolvimento de um apoio intensivo, com um mínimo de 15 horas de atividade por semana [...], alterará radicalmente a oferta de serviços e aumentará inevitavelmente os riscos de sanções e de privação do mínimo necessário à sobrevivência de muitos dos inscritos".
Como já referimos, esta medida de actividades laborais obrigatórias de 15
horas semanais faz lembrar o Serviço de Trabalho Obrigatório (STO), instituído
pelo governo de Vichy, por lei de 4 de Setembro de 1942, para satisfazer as
necessidades de mão de obra alemã através do fornecimento de trabalhadores
franceses. Esta lei obrigou 600.000 franceses a irem trabalhar para a Alemanha.
Felizmente, com o magnânimo governo de Macron, os franceses desempregados não
precisarão de atravessar a fronteira (Rua) para irem ser explorados
gratuitamente nas empresas. Vão poder suar a camisa nas empresas francesas geridas
por capitalistas franceses.
A medida já está a ser testada em 18 departamentos. Cerca de 40.000 pessoas
estão a ser acompanhadas pelo seu conselheiro do Centro de Emprego. O governo
de Macron quer generalizar a medida. A partir de agora, os 2 milhões de beneficiários
do RSA terão de dedicar 15 horas por semana a uma actividade numa associação,
autarquia ou empresa para poderem beneficiar do subsídio. Por outras palavras,
as associações (muitas vezes com fins lucrativos), as colectividades locais e
as empresas terão à sua disposição mão de obra gratuita, que pode ser explorada
à vontade. Caso contrário, os beneficiários do RSA poderão perder parte ou a
totalidade do seu subsídio, actualmente de 607 euros para uma pessoa solteira.
Por outras palavras, um subsídio mínimo de sobrevivência. Neste caso, o Governo
Macron é incapaz de oferecer um emprego à altura das competências dos
beneficiários da RSA, ou uma verdadeira reconversão profissional, mas obriga-os
a inscreverem-se para trabalhar gratuitamente numa autarquia ou numa empresa
(de armamento?). Assim, os beneficiários do RSA terão de seguir uma via imposta
pelo Estado e aceitar um "trabalho" não remunerado para não ficarem
sem qualquer subsídio e, portanto, condenados a afundar-se na pobreza extrema.
Na realidade, esta reforma será uma máquina de guerra destinada a forçar os
desempregados e os beneficiários do RSA a aceitarem qualquer emprego que
consigam arranjar para sobreviver. Além disso, fará baixar os salários numa
conjuntura económica marcada por um mercado de trabalho já altamente
competitivo.
Segundo os governos e os empregadores, os beneficiários do RSA e os
desempregados são "preguiçosos deliberados e inveterados", que devem
ser tratados com severidade, como crianças irresponsáveis, para lhes ensinar o
gosto pelo esforço e os fazer regressar ao trabalho. Pierre-Édouard Magnan,
presidente do Mouvement national des chômeurs et des précaires (Movimento
nacional dos desempregados e precários), observa: "Faz lembrar o que se
escrevia sobre os povos colonizados nos manuais escolares do final do século
XIX. É exactamente o mesmo tipo de raciocínio.
O objectivo da reforma "France Travail" é reforçar os controlos e
as sanções e impor obrigações profissionais através de actividades
obrigatórias. O objectivo desta reforma é obrigar os beneficiários da RSA a
aceitarem qualquer emprego que consigam arranjar, generalizando a anulação da
inscrição.
O principal objectivo desta reforma laboral, para os capitalistas neste
período de crise económica sistémica e de queda das taxas de lucro, é obter uma
força de trabalho, se não de graça, pelo menos a um preço baixo (ou ambos). Por
outras palavras, o Estado dos ricos, através dos seus dois ramos
institucionais, o governo Macron e o parlamento, nesta fase de militarização da
sociedade e de vichysation das mentes, está a trabalhar para fornecer às
empresas esta "reserva" providencial de mão de obra que pode ser pau
para toda a obra e moldável à vontade.
Quando chegou ao poder, a 17 de Junho de 1940, Pétain declarou: "Dou à França o dom de mim próprio para aliviar a sua desgraça". Hoje, a burguesia francesa decadente incita cada proletário a doar a sua pessoa para aliviar os infortúnios do capitalismo francês, para apoiar o esforço de guerra económico conduzido pelo seu Estado através do governo Macron no processo de fascistização.
Khider MESLOUB
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa
por Luis
Júdice
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