terça-feira, 12 de dezembro de 2023

A guerra na Ucrânia acabou... ou quase

 


 12 de Dezembro de 2023  Robert Bibeau  


Por Moon of Alabama – 5 de Dezembro de 2023

Washington Post publicou um longo artigo em duas partes sobre a fracassada "contra-ofensiva" na Ucrânia. Ele culpa os americanos e os britânicos que planearam essa confusão tanto quanto os ucranianos que a executaram.

Os principais pontos da primeira parte:

Erros de cálculo e divisões marcaram o planeamento ofensivo EUA-Ucrânia (arquivado)

Os elementos-chave que moldaram a contra-ofensiva e o resultado inicial são os seguintes:

·         Oficiais militares ucranianos, americanos e britânicos organizaram oito grandes jogos de guerra teóricos para desenvolver um plano de campanha. Mas Washington avaliou mal até que ponto as forças ucranianas poderiam ser transformadas numa força de combate de estilo ocidental num curto espaço de tempo - particularmente sem dar a Kiev o poder aéreo que é parte integrante dos exércitos modernos.

·         Por vezes, os oficiais americanos e ucranianos discordavam fortemente quanto à estratégia, táctica e calendário. O Pentágono queria que o assalto começasse em meados de Abril para evitar que a Rússia continuasse a reforçar as suas linhas. Os ucranianos hesitaram, insistindo que não estavam preparados sem armas e treino adicionais.

·         Os oficiais militares americanos estavam convencidos de que um ataque frontal mecanizado contra as linhas russas era possível com as tropas e armas disponíveis na Ucrânia. As simulações concluíram que as forças de Kiev, na melhor das hipóteses, poderiam alcançar o Mar de Azov e isolar as tropas russas no sul em 60 a 90 dias.

·         Os EUA defendiam um ataque direccionado ao longo deste eixo sul, mas a liderança ucraniana considerava que as suas forças deveriam atacar em três pontos distintos ao longo dos 1000 km da frente, a sul em direcção a Melitopol e Berdyansk no Mar de Azov e a leste em direcção à cidade sitiada de Bakhmut.

·         Os serviços de informação americanos eram mais pessimistas do que o exército dos EUA, acreditando que a ofensiva tinha apenas 50/50 de hipóteses de sucesso, dadas as defesas sólidas e multi-camadas que a Rússia tinha montado durante o Inverno e a Primavera.

·         Muitos na Ucrânia e no Ocidente subestimaram a capacidade da Rússia para recuperar de desastres no campo de batalha e explorar os seus pontos fortes permanentes: mão de obra, minas e uma vontade de sacrificar vidas a uma escala que poucos outros países podem tolerar.

·         À medida que se aproximava o lançamento planeado da ofensiva, os oficiais militares ucranianos temiam baixas catastróficas, enquanto os oficiais norte-americanos acreditavam que o número de baixas acabaria por ser mais elevado na ausência de um ataque decisivo.

E na segunda parte :

Na Ucrânia, uma guerra de ganhos incrementais à medida que a contra-ofensiva estagna (arquivado)

As principais conclusões dos relatórios da campanha incluem:

·         70% das tropas, numa das brigadas que lideram a contra-ofensiva e equipadas com as mais recentes armas ocidentais, entraram na batalha sem qualquer experiência de combate.

·         Os reveses da Ucrânia no campo de batalha provocaram divergências com os Estados Unidos sobre a melhor forma de romper as defesas profundas da Rússia.

·         No início da campanha, o comandante das forças americanas na Europa não conseguiu estabelecer contacto com o comandante-chefe ucraniano durante semanas, devido às tensões causadas pelo facto de os americanos questionarem as decisões tomadas no campo de batalha.

·         Cada uma das partes acusava a outra de ter cometido erros ou de ter feito juízos errados. Os oficiais militares americanos concluíram que a Ucrânia não tinha respeitado as tácticas militares básicas, em particular a utilização do reconhecimento do terreno para compreender a densidade dos campos de minas. Os oficiais ucranianos afirmaram que os americanos não pareciam compreender como os drones de ataque e outras tecnologias tinham transformado o campo de batalha.

·         No total, a Ucrânia só reconquistou cerca de 320 km2 de território, à custa de milhares de mortos e feridos e de milhares de milhões de euros de ajuda militar ocidental só em 2023.

Todos estes factores tiveram um papel importante.

A minha opinião:

·         A Ucrânia e os seus apoiantes subestimaram sistematicamente as capacidades russas (e continuam a subestimar).

·         O reconhecimento por satélite mostrou que os preparativos de defesa da Rússia estavam ao nível dos da Batalha de Kursk. Ali, a Wehrmacht alemã, depois de demasiada preparação, não conseguiu romper as linhas russas. A lição não aprendida de 1943: quando se vêem linhas defensivas como estas, tenta-se outra coisa.

·         As simulações de batalha e os jogos de guerra de mesa têm um "factor de moral" para cada lado. Se colocarmos o nosso factor em 10 e o do inimigo em 0, como fizeram os Estados Unidos e o Reino Unido, ganhamos sempre, mas isso não tem nada a ver com a realidade.

·         O apoio aéreo não teria sido útil. As defesas aéreas russas são demasiado poderosas para as contrariar.

·         A decisão de utilizar brigadas "de novatos", mal treinadas e sem experiência de combate, foi um erro grave.

·         A não utilização de granadas de fumo e, de um modo geral, de meios de dissimulação, foi totalmente despropositada.

·         Foi um grande erro político fazer com que metade das novas tropas, a parte mais experiente, lutasse na batalha já perdida de Zelenski por Bakhmut.

Todos estes factores fizeram com que a chamada "contra-ofensiva" nunca fosse posta em prática. As actuais disputas não são mais do que uma tentativa de transferir as culpas do fracasso para o outro lado da mesa.

O general ucraniano Zaluzny aprendeu as lições da batalha. Está agora a apresentar números realistas para mostrar aos Estados Unidos quão pequenas são as suas hipóteses de vitória:

O comandante-chefe Zaluzhnyi pediu ao chefe do Pentágono 17 milhões de cartuchos de munições.

Durante uma visita a Kiev, o secretário da Defesa americano, Lloyd Austin, foi informado de que a Ucrânia precisava de 17 milhões de munições e que seriam necessários 350 a 400 mil milhões de dólares em recursos e pessoal para libertar o país.

Citação de um alto funcionário da defesa: "Austin foi informado de que eram necessários 17 milhões de cartuchos de munições. Ele ficou espantado, para dizer o mínimo, porque é impossível obter essa quantidade de munições em qualquer parte do mundo.

O exército ucraniano não tem os dez mil lançadores necessários para disparar 17 milhões de munições. Nem tem os homens necessários para fornecer essas armas imaginárias.

Zaluzhny pensa claramente que a guerra está perdida e acabada. E que é altura de fazer política pela paz:

Além disso, segundo uma fonte, Austin disse também que Zaluzhnyi se tinha queixado em privado aos generais americanos da interferência do gabinete do Presidente [...]: "Austin disse-nos em privado que Zaluzhnyi estava sempre a queixar-se aos seus generais do gabinete do Presidente e da obstrução a que este o estava a sujeitar. É óbvio que o Presidente também ouviu falar dessas conversas. E isso não é propício à confiança".

No entanto, o gabinete do Presidente está inclinado a acreditar que a demissão de Zaluzhnyi facilitaria a sua carreira política.

É mais do que tempo de a administração Biden pôr fim a esta questão. Faça como de costume: declare vitória, saia e esqueça.

Gilbert Doctorow pensa em como conseguir isso:

Seymour Hersh, Anatol Lieven e a manobra desesperada de Washington para acabar com as hostilidades na Ucrânia enquanto declaram "vitória"

Tudo o que acontecer depois disso permanecerá nas notas de rodapé.

Moon of Alabama

Traduzido por Wayan, revisto por Hervé, para Saker Francophone

 

Fonte: La guerre en Ukraine est terminée…ou presque – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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