20 de Dezembro de 2023 Robert Bibeau
Por Batoul Mohamed Abou Ali, em Mondialisation.ca, 18 de Dezembro de 2023. Não há mais pássaros nos céus de Gaza | Mondialisation – Centro de Investigação sobre a Mondialisation.
Eu amo o céu azul e as nuvens brancas sobre Gaza.
Gaza! Cidade de beleza, criatividade, dignidade, rebeldia, resiliência,
firmeza, ambição e triunfo.
Gaza! Uma cidade de agonia, amargura, humilhação, desperdício, deslocamento
e decadência física e psicológica.
Em Gaza, a cor do céu traz de volta memórias.
A violência genocida de Israel em Gaza começou em 7 de Outubro. Desde
então, temos sido atormentados de todas as formas possíveis.
Até o céu mudou, a sua cor fala de dor. Nunca mais será puro, está apenas
salpicado de foguetes, mísseis e fogo de artilharia.
Os pássaros ainda voam no céu, mas os sobreviventes estão a deixar Gaza e a
implacável ocupação israelita.
Mísseis atingem todos os lugares, indiscriminadamente. Bebés são
assassinados, homens são feridos e mulheres carregam dor constante nos seus
olhos.
Até os gatos se refugiam debaixo das nossas roupas ou atrás das nossas
casas.
Em vez do chilrear dos pássaros, ouvimos apenas lamentações.
"Tio, esperei três dias para que a minha irmã me
trouxesse um gole de água, mas agora ela está debaixo dos escombros. Ela só
provou um copo de tristeza", diz uma menina.
Uma mulher chora o filho que foi morto a tiros.
"Eu chamei-o de Ayoub para que ele fosse uma
fonte de tolerância... Deus, concede-me tolerância."
Um homem exausto invoca a generosidade de Deus quando a chuva cai.
"Os meus filhos não bebem água desde ontem à
noite. Hoje, matam a sede com a chuva de Inverno."
Lamentações de Gaza
Uma mãe partilha a sua dor:
"Levei 350 injecções para dar à luz depois de 12
anos de espera. Israel privou-me da criança que eu esperava há muito
tempo."
Uma mãe partilha a sua alegria:
"Minha irmã! Kamal! Ele está vivo!"
Um homem está parado nos escombros da sua casa.
"Perdi a minha casa. Perdi as minhas
memórias."
Uma menina grita revoltada:
"Mundo! Tenho orgulho da minha família ter sido
martirizada."
Um rapaz de 13 anos admite que já não sente nada:
"Perdi todas as minhas emoções."
Um pai diz à filha que anda à procura de pão há quatro dias. Uma mãe quer
morrer para estar com os filhos. Uma criança pede água. Um médico cansado berra
ordens.
Uma jovem, Khuloud, conta:
"Foi uma noite horrível. Não podíamos ligar para
o nosso pai para pedir conselhos sobre para onde ir. Bombas caíam por toda
parte. Estamos tão assustados."
"Fugimos para o fim de Gaza, mas não estamos seguros
em nenhum lugar ", disse uma mulher irritada.
Uma criança diz:
"Ficamos tão velhos..."
"Somos seres humanos?" Esta mulher perdeu
os filhos. "Somos feitos de carne, sangue,
coração e mente. Conhecemos a alegria e a tristeza. Nós amamos as nossas vidas.
Queremos viver."
Um pai enlutado nega ser um herói.
"Somos um povo forte. Mas estamos exaustos e
queremos paz."
O Conforto da Oração
O céu está escuro, o ar ecoa com lamentações.
Eu odeio a noite. Odeio-a!
Em 11 de Dezembro, a minha esposa e eu fomos sacudidos pelo barulho
aterrorizante do fogo de artilharia. As janelas foram quebradas.
O céu estava manchado com o vermelho escuro de incêndios e explosões.
Nós apressadamente deixamos nossos quartos para nos juntar à família
amontoados num espaço minúsculo apenas grande o suficiente para nos manter
juntos.
Uma mãe com seu bebé de um mês orou em voz alta:
"Deus, se morrermos, faça-me morrer com o meu
bebé. Não suporto a ideia de deixá-lo sozinho neste mundo."
As suas lágrimas tocaram-me profundamente.
No meio do caos, a minha família tranquilizou-se e eu encontrei conforto na
oração.
Israel não tem o direito de tirar a vida a pessoas inocentes. Não há
justificação para isso. As nossas almas e corpos estão mortos. Como se atrevem?
À noite, a nossa área foi bombardeada novamente, com um novo apagão de
internet e electricidade. Tinham como alvo ambulâncias e jornalistas.
Tentamos voltar a dormir, mas sem sucesso. Quando o sol nasceu, desejei até
meia hora de descanso.
Às 15h do dia 19 de Dezembro, o céu iluminou-se com um brilho sinistro,
pressagiando mais uma noite de medo.
Moralmente exausta, evito dormir para não acordar em pânico.
A noite é como uma sepultura. Nunca se sabe se a porta vai abrir ou fechar nas
suas almas e corpos.
Não quero morrer sem ver minha mãe, meu pai e meus irmãos e irmãs.
Nós pensámos que estávamos seguros em Khan Younis. Estávamos errados.
Israel está a massacrar civis, mesmo no sul.
Já não há pássaros no céu. Não há cores puras. Há um véu de fumo pesado e
cinzento, apenas perturbado pela tonalidade vermelha dos ataques israelitas.
O céu reflecte o nosso derramamento de sangue e o nosso desespero.
Batoul Mohamed Abou Ali
Artigo em inglês:
https://electronicintifada.net/content/birds-no-longer-grace-gazas-sky/42901
Tradução: Espírito da Liberdade de Expressão
Imagem em destaque: Captura de tela. Um bebé e um gato confortam-se num
abrigo temporário em Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza. Imagens de Naaman
Omar APA
Batoul Mohamed Abu Ali formou-se recentemente na
Universidade Islâmica de Gaza.
Fonte: Il n’y a plus d’oiseaux dans le ciel de Gaza – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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