19 de Dezembro de 2023 René Naba
RENÉ NABA — Este texto é publicado em parceria com a www.madaniya.info.
As armas nucleares são uma opção? A sério?
O ministro ultra-nacionalista do Património israelita, Amichai Eliyahu,
considerou que um ataque com bomba atómica a Gaza era uma "opção",
provocando um clamor tanto em Israel como no resto do mundo, na medida em que
esta declaração, feita a 5 de Novembro de 2023, quase um mês após o início das
represálias israelitas contra o enclave, revelava a desarticulação da classe
política israelita face à combatividade do Hamas, mas também prestava um mau
serviço à imagem do Estado hebreu junto dos seus aliados ocidentais.
Mais grave para a estratégia atlantista, a hipótese de uma opção nuclear israelita
confirma indirectamente a posse de armas nucleares por parte de Israel, em
contradição com o sacrossanto princípio da não-proliferação nuclear que o
Ocidente brandia para evitar que o Irão se tornasse uma "potência nuclear
de limiar".
De facto, o secretismo em torno do programa nuclear de Israel era um
segredo de polichinelo. A declaração do ministro israelita apenas revelou o
engano. A folha de parra que mascarava a nudez desta enorme mentira. Uma
mentira diplomática.
No que se refere ao programa nuclear israelita, a fábula segundo a qual
"Israel, única democracia do Médio Oriente e sentinela do mundo livre face
à barbárie árabe-muçulmana, não deve ser o primeiro a introduzir armas
nucleares na região" foi durante muito tempo utilizada como viático, apesar
das torturas infligidas a Mordechai Vanunu, que teve a audácia de quebrar o
tabu, e apesar das repetidas fugas de informação para a imprensa ocidental
especializada.
A patranha foi zelosamente guardada pelos cornacas (condutores de elefantes – NdT) de Israel na Europa, nomeadamente em França, um dos maiores poluidores nucleares do planeta, fornecedor de equipamentos ao regime do apartheid na África do Sul e em Israel, e associado do Irão imperial no consórcio Eurodif, que está agora, paradoxalmente, na vanguarda da luta pela denúncia das armas nucleares, Esteve na primeira linha da luta pela desnuclearização do Irão, mas foi singularmente passivo perante os ataques destrutivos de Israel às instalações nucleares árabes, de Osirak no Iraque em 1981 a Al Kibar na Síria em 2008, incluindo os reactores de Cadarache, com a ajuda dos Sayanim no sul de França.
AH! a vanglória de Nicolas Sarkozy brandindo uma alternativa "catastrófica: a bomba iraniana ou o bombardeamento do Irão", ignorando este ignorante que, se o Irão possuísse a bomba atómica, nem a França nem Israel pensariam em usá-la contra o Irão. Um efeito dissuasor absoluto idêntico ao da Coreia do Norte contra o Japão e a Coreia do Sul, onde estão estacionadas grandes forças navais e terrestres americanas.
§ Sobre o papel obscuro de Laurent Fabius nas negociações nucleares iranianas, ver este link: https://www.madaniya.info/2015/07/24/iran-nucleaire-laurent-fabius-petit-telegraphiste-des-israeliens/
Dimona
Dimona é a central eléctrica do complexo nuclear de Israel no deserto do
Negev - cujo nome árabe original é An Naqab - 20 km a oeste do Mar Morto, 25 km
a oeste da Jordânia, 75 km a leste do Egipto e 85 km a sul de Jerusalém. O
local inclui não só uma central nuclear, mas também outras instalações
essenciais para o desenvolvimento do programa nuclear de Israel.
Em 1957, foi assinado um acordo secreto entre a França e Israel para a
construção de um reactor nuclear equivalente à célula G1 em Marcoule,
produzindo 10 a 15 kg de plutónio por ano). O complexo foi construído em
segredo e fora do regime de inspecção da Agência Internacional da Energia
Atómica). As autoridades israelitas fizeram passar o complexo nuclear por uma
simples fábrica de têxteis.
Richard Kerry - pai de John Kerry, antigo secretário de Estado de Barack
Obama - descobriu o segredo em 1959, quando trabalhava como secretário da
embaixada em Oslo. O pai relatou várias conversas sobre a venda de água pesada
da Noruega a Israel. Diz-se que o Estado hebreu tem pelo menos 80 bombas H produzidas
a partir de plutónio.
A Base de Vigilância Electrónica de Ourim
Ainda no Neguev, a cerca de trinta quilómetros da prisão de Beer-Sheva,
encontra-se a mais importante instalação de espionagem de Israel: a base de
Ourim.
Esta base, que nunca foi revelada até agora, consiste em linhas de antenas
de satélite que interceptam secretamente chamadas telefónicas, e-mails e outros
tipos de comunicação enviados do Médio Oriente, Europa, África e Ásia. A maior
parte da espionagem é efectuada a partir desta instalação situada na orla do
deserto do Negev, cerca de dois quilómetros a norte do kibutz de Ouri, que
alberga linhas de antenas de satélite de vários tamanhos e edifícios e casernas
de ambos os lados da estrada 2333 que conduz à base. A propriedade é protegida
por vedações altas, portões e cães.
As imagens de satélite desta zona não estão desfocadas e é fácil distinguir
todos os elementos característicos de um posto de vigilância electrónica. Um
grande círculo nos campos indica a localização de uma antena de localização de
direcções (HF/DF), destinada à observação marítima.
A base de Ourim foi criada há décadas para vigiar as comunicações
internacionais.
Mordechaï Vanunu
O denunciante Mordechai Vanunu, também conhecido como John Crossman,
nascido a 13 de Outubro de 1954 em Marraquexe, é um técnico nuclear israelita.
Foi conhecido pela primeira vez em 1986, quando revelou ao jornal britânico The
Sunday Times pormenores do programa nuclear militar de Israel, incluindo
fotografias tiradas no interior da central nuclear de Dimona. Após ter sido
raptado pelos serviços secretos israelitas, Vanunu foi julgado e condenado por
"traição de segredos de Estado". Passou 18 anos na prisão e, após a
sua libertação em 2004, foi proibido de contactar com qualquer jornalista
estrangeiro.
O envio de 2.000 membros das Forças Especiais dos EUA em 8 de Outubro de
2023 para Israel para a protecção do local de Dimona
O sítio de Dimona é protegido por mísseis Patriot. No entanto, a 8 de Outubro
de 2023, no dia seguinte à operação "Dilúvio de Al Aqsa", o ataque do
movimento islamita palestiniano Hamas contra o Estado judaico, os Estados
Unidos enviaram 2.000 forças especiais americanas para Israel, para proteger o
centro nuclear de ataques e "ao mesmo tempo" impedir o seu aliado
mais próximo de levar a cabo um ataque imprudente a Gaza com armas atómicas.
Segundo o diário online "Ar Rai Al Yom", os americanos enviaram
uma mensagem ao Hamas, através de um alto responsável libanês, assegurando-lhe
que as forças especiais americanas não participariam, em circunstância alguma,
nos combates ao lado do exército israelita.
(Nota do editor: A Delta Force, oficialmente 1st Special Forces Operational
Detachment-Delta (Airborne) (1st SFOD-D (A)), é uma unidade de forças especiais
americanas pertencente ao exército dos EUA e ligada ao Joint Special Operations
Command (JSOC). Uma das suas principais características é o secretismo que a
envolve, o que explica a pouca informação disponível sobre a unidade. Entre os
feitos da Delta Force estão a captura do ex-presidente iraquiano Saddam Hussein
e a eliminação de Osama Bin Laden, líder da Al Qaeda. Uma das suas outras
missões é ajudar a libertar reféns americanos, tanto nos Estados Unidos como no
estrangeiro.
Sobre o envio de 2.000 membros das Forças Especiais dos EUA para Israel
para proteger a instalação nuclear de Dimona,
§ Veja este link para o orador
árabe
Seja qual for a missão desta Delta Force, é evidente que Israel já não está em condições de se defender pelos seus próprios meios: A concentração naval americana perto do Estado hebreu, assim como a presença de oficiais superiores do Centcom (comando central americano) no quartel-general do Estado-Maior israelita, e a participação do secretário de Estado Anthony Blinken na reunião do gabinete restrito durante a sua visita a Israel, enfim, o seu activismo diplomático no Médio Oriente, com a sua visita à Jordânia, à Cisjordânia, ao Iraque e à Turquia para evitar o prolongamento do conflito, e ao mesmo tempo as tensões no seio do gabinete de guerra israelita.
§ Sobre Ron Dermer e a tensão dentro do gabinete de
guerra israelense, veja este link: https://www.lemonde.fr/international/article/2023/11/10/en-israel-les-tensions-traversent-le-cabinet-de-guerre-qui-mene-les-operations-militaires-a-gaza_6199339_3210.html
Para Israel e para o seu principal apoiante, os Estados Unidos, o ataque do Hamas de 7 de Outubro de 2023 marca uma ruptura histórica, e não apenas a abertura de um novo ciclo de violência, pois Gaza já assistiu a vários. Foi uma ruptura em termos do modus operandi, da crueldade sem sentido, da tomada maciça de reféns (incluindo crianças e idosos) e do enfraquecimento dos pilares da segurança nacional israelita, baseada em primeiro lugar e acima de tudo na dissuasão.
Para além da neutralização do Hamas, o objectivo oficial da guerra de Israel, o gás é, de facto, a verdadeira questão subjacente à batalha por Gaza. Israel teme que os campos de gás descobertos em 2000 ao largo da costa de Gaza sejam explorados, nos dois sentidos da palavra, pelo Hamas para o ajudar, se não a construir um Estado palestiniano independente, pelo menos a financiar os seus ataques ao Estado judaico.
Veja este link https://les7duquebec.net/archives/287463
Complexo de Sansão
A não ser que o ministro ultra-nacionalista israelita se alimente do
complexo de Sansão - desmantelador das colunas do Templo de Dagon, actor e
vítima da sua própria paixão, virada contra si próprio -, será que não sabe
que, dada a contiguidade e a pequena dimensão dos territórios israelita e
palestiniano, a utilização do fogo nuclear israelita sobre Gaza terá
inevitavelmente repercussões atómicas no território israelita?
A menos que estejamos a falar de urânio empobrecido, que já foi testado em
grande escala pelos Estados Unidos no Iraque em 2003. O principal risco que o
urânio empobrecido representa não é a radioactividade, mas a toxicidade química.
A este respeito, o Iraque é um país profundamente marcado do ponto de vista
ecológico devido à utilização maciça de urânio empobrecido pelos Estados Unidos
naquele país. O Iraque bate mesmo os recordes de malformações congénitas,
cancros e linfomas.
Nesta curiosa perspetiva está o comportamento dos Estados Unidos neste caso: o único país do mundo a ter usado armas atómicas contra o Japão (Hiroxima e Nagasáqui, em 1945), o único país a ter feito uso maciço do Agente Laranja no Vietname (1970-1975), e do urânio empobrecido no Iraque, está agora preocupado com o uso de armas atómicas pela sua ala israelita. Será por se tratar de uma zona situada perto do perímetro altamente inflamável do Golfo petrolífero, cuja combustão poderia prejudicar a economia dos países ocidentais, protectores de Israel? Ah, as tortuosidades da "democracia do carbono".
Epílogo: Os palestinianos, as últimas vítimas do nazismo?
Quase cem anos após a sua fundação, o Lar Nacional Judaico parece, assim,
em retrospectiva, ser a primeira operação de deslocalização em grande escala
levada a cabo numa base étnico-religiosa, a fim de externalizar o anti-semitismo
recorrente da sociedade ocidental para o mundo árabe. O refúgio dos judeus, dos
sobreviventes dos campos de extermínio e dos perseguidos, a terra do kibutz
socialista e da fecundação do deserto, dos livre-pensadores e dos
inconformistas, tornou-se também, ao longo dos anos, um bastião da
religiosidade rigorista, dos iluminados e dos falsos profetas, de Meir Kahana
(Liga de Defesa Judaica) a Baruch Goldstein (autor do massacre de Hebron, 25 de
Fevereiro de 2004), de gangues mafiosas e criminosos condenados, de Samuel
Flatto-Sharon, a Arcady Gaydamak, a Marc Rich, aos burlões do IVA sobre o
imposto sobre o carbono. Este fenómeno é amplificado pela decomposição do
espírito cívico, atormentado pela ocupação e pela corrupção empresarial dos
círculos dirigentes, materializada pelo naufrágio do Partido Trabalhista (o
"partido dos pais fundadores"), e pela cascata de demissões ao mais
alto nível do Estado, quer por assédio sexual, quer por factos relacionados com
dinheiro ilícito.
E a Palestina, neste contexto, tornou-se um enorme escoadouro de todas as
frustrações reprimidas, geradas desde os bairros de lata de Kiev (Ucrânia) e
Tbilisi (Geórgia) até às profundezas de Brooklyn (Estados Unidos), o maior
campo de concentração a céu aberto para os palestinianos, os proprietários
originais do país.
Os ocidentais nunca pararam de defender os benefícios da paz. Agora que os
palestinianos cumpriram todas as suas condições, o Ocidente abandona-os à sua
sorte.
Neste contexto, Mayssa'a Abou Zeydane, colunista do site "Ar Rai al
Yom", pergunta se, perante a indiferença dos países ocidentais face ao
drama palestiniano e o seu apoio continuado a Israel por causa do genocídio de
Hitler, os palestinianos não são, de facto, "as últimas vítimas do nazismo".
ARTIGOS RELACIONADOS
§ https://www.madaniya.info/2023/10/17/israel-palestine-loccident-vit-dans-une-bulle/
Fonte: Le nucléaire israélien: Un secret de polichinelle – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
Sem comentários:
Enviar um comentário