Apesar de escrita em
termos individuais, a carta que um médico que integra o SNS – mormente numa
Unidade de Saúde Familiar do centro de Lisboa – endereçou aos Grupos
Parlamentares “à esquerda do PS”, e que agora acolho nas páginas do meu blogue,
expressa a denúncia e revolta de toda a classe médica.
Não posso, contudo, deixar de enquadrar esta denúncia no contexto da crise sanitária do COVID 19, durante a qual os médicos foram impedidos de implementar o estado da arte, isto é, foi-lhes vedado o dever de receber e avaliar pessoalmente os seus doentes, diagnosticar as suas fragilidades de saúde e implementar as respectivas terapêuticas.
A classe médica foi remetida ao estatuto de observador passivo face ao desenrolar da aplicação de terapêuticas genéticas experimentais – vulgo “vacinas” - que contrariam todos os manuais de medicina e seu histórico de praxis.
Em meu entender, os médicos deverão afastar qualquer tipo de ilusão quanto à possibilidade de um governo resolver a crise que ele próprio se encarregou de provocar. E, muito menos, deverá alimentar a ilusão de que a chamada esquerda parlamentar – que apoiou todas as medidas do governo Costa durante a chamada crise pandémica –conseguirá emendar a mão de um governo com quem, directa ou indirectamente, colaborou e colabora.
Entendo o que motivou o envio da presenta carta aos Grupos Parlamentares, mas não posso deixar de referir que tal carta cairá – como tantas outras – na mais abjecta da indiferença da “esquerda” parlamentar.
Só quando perceberem que a luta pela satisfação das necessidades que elencam nesta carta exige a UNIDADE entre todos os profissionais assalariados do SNS, é que poderão vislumbrar o almejado sucesso quanto às exigências – as que estão expressas na carte e outras – que formulam.
Os profissionais do SNS – médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, técnicos, administrativos, etc – devem compreender que enquanto as suas lutas estiverem sequestradas pelos Sindicatos que as “dirigem”, o resultado a esperar será sempre o mesmo: derrota, desilusão e, sobretudo, um sentimento de frustração e desmobilização enormes.
Vamos, então, ao conteúdo da supracitada carta, aqui publicada na íntegra e sem “filtros”.
"Muito boa tarde.
Sou médico de família
em exclusividade (de exercício, não em termos remuneratórios) na função
pública desde 2011, actualmente com contrato de trabalho em funções públicas
por tempo indeterminado. Vivo em Lisboa, de onde não sou natural.
Nenhuma das minhas entidades patronais do sector público (dos 3 contratos que assinei ao longo do tempo) me informou que o subsídio de alimentação pode ser pago em dinheiro ou como vale/cartão refeição.
Esta informação chegou-me via uma publicação no Dr Finanças (mea culpa por nunca ter investido na minha literacia financeira e ter assumido que a entidade patronal "estado" zela pelo melhor interesse dos seus funcionários):
Visto que nunca recebi esta informação, perguntei aos recursos humanos do meu ACES, que não me souberam responder, se eu teria sequer o direito de escolha de como seria pago.
A possibilidade desta escolha não é desprezível.
Em 2022 a taxa média
de inflação foi de 7.8% e para 2023 já se estima que possa ser de
5.8% (e ambos menosprezam o peso dos aumentos da energia, bolha imobiliária e
aumentos dos produtos de tecnologia pelos problemas das cadeias de
abastecimento). Desde 2011 perdi para a inflação 20% do valor da minha grelha
salarial, e no final deste ano rondará os 27% (porque as carreiras especiais
não tiveram qualquer aumento em 2023)... isto sem contar com o aumento da perda
aquando as alterações dos escalões do IRS, e o actual peso contributivo para a
ADSE.
Sendo médico, e numa
USF modelo B estou numa situação extremamente privilegiada, mas ainda assim
sinto o peso da inflação e temo pelo futuro (pessoal mas também do
SNS), considerando a enorme desvalorização não mitigada que a minha grelha
sofreu em apenas pouco mais de uma década, a expectativa que isto se mantenha
se continuar a trabalhar no sector público (ou no país), e as previsões que na
década de 2050 o valor da reforma passe a ser apenas de 43% do ordenado.
Imagino o que
enfrentarão todos os demais funcionários da função pública, especialmente os
que vivem nas zonas mais caras do país (como são a AMLisboa, AMPorto e
Algarve).
Poder escolher receber o subsídio de refeição como vale/cartão refeição, significa um aumento "salarial" líquido de 3.12€ por dia, significa um aumento anual a rondar 720€ (assumindo 30 dias de ausências, entre férias, feriados e incapacidade temporária).
Este aumento
ultrapassa largamente 50€ de aumento bruto dados este ano na
carreira geral em FP (não fiz contas para os 2% mas assumo que se mantenha
verdade)
Pergunta:
-O funcionário público
pode escolher receber o subsídio de alimentação em vale/cartão (idealmente
um cartão semelhante a um cartão de débito convencional)?
-Se sim, porque não é
esse direito divulgado amplamente (ao ponto dos recursos humanos não saberem
responder)?
-Se não, o que impede
o trabalhador de ter o direito de escolher o que é melhor para si?
Envio esta mesma mensagem aos 3 partidos com assento parlamentar, à esquerda do PS.
Não espero resposta
pessoal, mas considero ser um tema muito pertinente, pelo menos para discussão
interna.
Esta temática sublinha infelizmente o nível miserável de remuneração no nosso país, mas seria um
"quick win" em termos de implementação, considerando que já existe
base legal e os valores já foram negociados com os sindicatos.
Os melhores cumprimentos,
João Sousa"
Luis Júdice
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