OLIVIER
CABANEL — Na France Telecom, os suicídios sucedem-se e são semelhantes. A
administração está a virar as costas ao referir-se a "acidentes".
Reacção indecente.
Acidente: "acontecimento fortuito, imprevisível", diz o
"Petit Robert".
Quando um ser humano dedica tempo a escrever uma carta a anunciar o que vai
fazer e porque o vai fazer, é preciso uma boa dose de cinismo para lhe chamar
"um acidente".
Desde Fevereiro de 2008, foram 24 suicídios nesta empresa.
A 11 de Setembro, um técnico em Troyes enfiou uma faca no estômago durante
uma reunião depois de saber que o seu cargo tinha sido abolido. link
De facto, devemos acrescentar aos suicídios comprovados, as tentativas. De
acordo com o Observatório do Stress, na France Telecom, foram 14.
Mas voltemos um pouco atrás.
Na altura, o Estado afirmou claramente que não se tratava de deixar a
empresa cair no sector privado, sofrendo toda a força das leis do mercado.
Sabemos o que aconteceu a seguir.
Em
1996, uma lei transformou a France Telecom numa sociedade anónima,
entendendo-se que o Estado deve manter pelo menos 51% do seu capital e que não se trata de privatização. link
Depois,
em 2003, o Governo aprovou uma lei que autorizava o Estado a descer abaixo dos
50%, tornando efectiva a privatização.
Hoje, o Estado detém
apenas 26,65% das acções da empresa.
O resultado é conhecido.
Passámos de 165 mil para 95 mil funcionários.
Tudo isto em nome da rentabilidade.
Com os efeitos colaterais que conhecemos.
Além dos suicídios, a dívida da empresa atinge os 70 mil milhões de euros.
Há vários anos que os sindicatos falam do mal-estar dos trabalhadores e da
pressão exercida sobre eles.
Eles são encorajados a deixar a empresa voluntariamente, e todos os meios
são bons para conseguir isso.
22.000 saíram.
Custa menos do que demiti-los.
No entanto, tudo começou como num conto de fadas.
Cotada na bolsa de valores a um preço de 27 euros, a acção subiu para 219
euros em 2000, descendo para 10 euros em 2002. Hoje, está estagnada nos 19
euros.
É o que provavelmente acontecerá com os Correios.
"As promessas só são vinculativas para aqueles que nelas
acreditam", disse Charles Pasqua ao seu protegido Nicolas Sarkozy. link
Este aprendeu bem a lição.
A lógica do governo poderia escapar a alguns.
Durante a crise, o Estado, ao ajudar bancos e empresas, agiu como se fossem
empresas nacionalizadas.
Não foi o caso.
Embora algumas pessoas estejam a começar a recuperar, trata-se de um
sistema estranho. link
Por isso, hoje, fala-se em trazer capital privado para o serviço postal,
alegando que continuará a ser público.
Mas nós conhecemos a música.
Começa-se por meter o pé na porta, depois abre-se a porta e, um belo dia,
acaba-se com uma instituição privada.
Trata-se de uma escolha política.
Devemos esperar que os serviços públicos sejam sistematicamente lucrativos?
Ou devemos aceitar que, nalguns casos, a rentabilidade não é uma
necessidade absoluta?
Imaginemos uma aldeia com mil habitantes,
Tem uma estação de correios e as pessoas vão lá para enviar a sua
correspondência, pagar ou levantar dinheiro, muitas vezes ajudadas pelo
empregado do balcão que, por vezes, preenche os seus formulários.
Isto é muito útil para as pessoas idosas que, por vezes, ficam atoladas em
papelada administrativa e não querem ir de autocarro ou de carro até à cidade
mais próxima para pôr o correio.
Uma estação de correios como esta não tem lugar nesta aldeia.
Será encerrada.
E os habitantes terão de ir de carro (em nome do aquecimento global que
supostamente estamos a combater) para fazer os seus pequenos negócios.
É uma escolha social.
Os hospitais, as escolas, a SNCF e outros estão a ser visados.
O hospital vê os seus recursos reduzidos, com cada vez menos pessoal, e o
serviço sofre com isso, empurrando os doentes que o podem pagar para o sector
privado.
O mesmo se aplica às escolas.
Na Grã-Bretanha, onde os comboios são privatizados, tem havido um aumento
de acidentes devido à necessidade de reduzir os custos em detrimento da
segurança.link
É o capitalismo que está a sair dos carris.
Como dizia um velho amigo africano: "a casa construída com saliva
desaba com o orvalho"
Fonte: Pendus au bout du fil… – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa
por Luis
Júdice
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