sábado, 10 de agosto de 2024

Feminismo: símbolo de um processo de desumanização gerado pelo capital

 


 10 de Agosto de 2024  Robert Bibeau  


Por Khider Mesloub.

 

O activismo feminista simboliza a incapacidade destas activistas para transformarem as suas próprias vidas social e humanamente miseráveis. Enquanto o feminismo pequeno-burguês activamente militante se recusa a submeter-se ao alegado poder fálico dos homens, aceita servilmente a ditadura do capital, a escravidão das condições salariais e a miséria social.

O feminismo não tem como alvo o capital ou a degradação das relações humanas engendradas pela sociedade burguesa decadente. Aos olhos de um feminismo infectado pela misandria, o inimigo é o homem, acusado de perversão e de um poder fantasmagórico que tem origem no seu sexo.

Ao centrar-se no homem, o feminismo ajuda a esconder a perversidade mortal e o poder destrutivo inerentes ao sistema capitalista.


Algumas feministas, encorajadas por um clima de misandria histérica, não hesitam em proclamar que a violência e a exploração existem apenas por culpa dos homens, exonerando assim o capitalismo e todos os seus sucessores: imperialismo, sionismo, fascismo, populismo. E para remediar a situação, basta travar essa metade nociva da humanidade, o homem, permitindo assim o advento de um mundo exclusivamente feminino, cuja reprodução estaria garantida graças aos progressos da biologia, nomeadamente a procriação medicamente assistida (PMA).

Historicamente, o feminismo encarna o processo de um movimento gerado pelo capital, nomeadamente nos países ocidentais. Trata-se de um movimento histórico que retirou as mulheres da sua condição ancestral, transformando as relações entre os sexos e conduzindo à dissolução progressiva da sociedade patriarcal.

Sem dúvida que não foi o feminismo que provocou a desintegração do patriarcado, mas sim o capital, através da corrida das mulheres para o trabalho assalariado, o que levou a uma redução do tempo e da actividade dedicados aos deveres maternais e domésticos... descarregados sobre os ombros dos homens, não em benefício da sociedade, mas em benefício dos capitalistas que detêm os meios de produção e de reprodução da vida e consomem a força de trabalho masculina e feminina.

Além disso, com o progresso da indústria, a força física, outrora concentrada nas mãos dos homens, tornou-se uma prerrogativa das máquinas. Do mesmo modo, à medida que a sociedade se tornou mais estatal, a violência passou a ser dominada pelas armas de fogo, muitas vezes propriedade do Estado, que exerce uma "violência legítima" contra toda a população oprimida, independentemente do género. De facto, nas sociedades capitalistas desenvolvidas, a força física masculina e a "violência legítima" masculina foram minadas, suplantadas e destronadas pelo progresso tecnológico e pelo Leviatã estatal, agora senhores absolutos do mundo. O homem, esse ser de pés de barro, foi derrubado do seu pedestal, reduzido a partilhar o mesmo destino que a mulher.

Para além disso, hoje em dia, ao contrário do que acontecia no passado, a mulher já não se define pelo seu papel maternal. A mulher existe apenas no seu papel de escrava assalariada. Em termos sociológicos, pelo seu estatuto social profissional.

Além disso, estatisticamente, em termos de riqueza nacional, o trabalho doméstico das mulheres e/ou dos homens não é contabilizado. Por outras palavras, numa sociedade capitalista exploradora, o trabalho realizado em casa não tem valor. No entanto, só em França, segundo um relatório do Instituto Nacional de Estatística e Estudos Económicos (INSEE), as tarefas domésticas e de educação dos filhos representam mais de 60 mil milhões de horas por ano, ou seja, um terço do produto interno bruto (933 mil milhões de euros).

Afirma-se que o capitalismo libertou as mulheres. Mas, como acabámos de assinalar, emancipou as mulheres apenas para as integrar no processo de produção capitalista com vista à acumulação. Assim, o trabalho doméstico e educativo (cozinhar, limpar, estender a roupa, cuidar da educação dos filhos, etc.) é uma actividade não remunerada, realizada gratuitamente para maior lucro do capital, que beneficia gratuitamente desta força de trabalho feminina ou masculina.

De acordo com o mesmo estudo, as donas de casa e/ou os maridos gastam entre 28 e 41 horas por semana em tarefas domésticas e educativas. "Estes serviços não são contabilizados no PIB, mas sê-lo-iam se os comprássemos, sob a forma de horas de trabalho doméstico, por exemplo", sublinha o INSEE. Atribuindo preços a estas horas (com base no salário-hora especializado, no salário mínimo bruto ou no salário mínimo líquido), o Instituto estima que o trabalho doméstico representa, no mínimo, 292 mil milhões de euros e, no máximo, 1.366 mil milhões de euros. Ou seja, 15 a 70% do PIB.

Por outras palavras, do ponto de vista contabilístico, as donas e os maridos de casa são duplamente roubados: no trabalho, pelo roubo da mais-valia que geram, monopolizada exclusivamente pelos seus empregadores; e em casa, pela "captura" do seu tempo livre por actividades de "interesse nacional", realizadas, sem remuneração, para a preservação e reprodução da espécie humana (a sua descendência).


De um modo geral, com a generalização do trabalho assalariado a todos os proletários - homens e mulheres, no trabalho ou em casa - a ancestral divisão do trabalho entre os sexos foi destruída... é isto que destrói o patriarcado.  E a erosão dos fundamentos do patriarcado, ou seja, das relações hierárquicas entre homens e mulheres, é imputável ao capital e não à luta feminista "irredentista".

Não há dúvida de que o feminismo também faz parte da "societalização" da vida quotidiana, que foi deliberadamente despojada das suas dimensões sociais conflituosas e políticas emancipatórias. O feminismo contribui para a dissolução da questão social em reivindicações societais fragmentadas, encarnadas em particular pelos movimentos comunitários LGBT, religiosos e étnicos.

Mas, na realidade, a alienação dos homens é acompanhada pela alienação das mulheres. É verdade que a expansão do trabalho remunerado para as mulheres as libertou dos limites da vida doméstica e lhes deu independência financeira.

No entanto, esta libertação continua a basear-se em princípios capitalistas. Não há dúvida de que este movimento não elimina de forma alguma a subjugação das mulheres, uma vez que a reproduz sob formas inovadoras, como o trabalho assalariado, a última forma de exploração e opressão desenvolvida pelo capitalismo. No modo de produção capitalista, homens e mulheres, indistintamente, são escravizados pela exploração salarial. Sob o modo de produção capitalista regido por relações sociais de exploração, os trabalhadores (homens e mulheres) pertencem globalmente à classe capitalista como um todo. Uma relação social de opressão colectiva que se esconde por detrás da aparência de liberdade jurídica e cívica, e da ausência de qualquer vínculo de sujeição a um capitalista individual.

A maioria dos assalariados, nomeadamente as mulheres, está convencida de que é livre e independente. Desde quando é que um trabalhador é independente do seu patrão? A verdade é que, no sistema capitalista, cada trabalhador é escravo do seu patrão; por outras palavras, é um escravo pago e, como tal, não tem liberdade durante a fase de exploração, ou seja, durante o seu tempo de trabalho alienado. Está dedicado de corpo e alma ao seu patrão, a quem deve docilidade, obediência e submissão. Uma vez transpostos os portões da empresa, todos os assalariados perdem a sua liberdade (de pensar, de conceber, de planear, de programar, de decidir: faculdades totalmente monopolizadas pelo patrão). São despossuídos de si próprios. Pertencem de corpo e alma ao patrão, que impõe o calendário de produção, dita o ritmo de trabalho, prescreve as tarefas a executar, fixa os objectivos de venda a atingir e ordena-lhes que obtenham uma rentabilidade cada vez maior. Fechados nestes covis de produção, onde tudo é cronometrado, meticulosamente controlado e delimitado, os trabalhadores são totalmente despossuídos de si próprios. Já não pertencem a si próprios. São os escravos dos seus patrões, os cavalos de batalha das máquinas e dos computadores.

E pensar que este tipo de actividade assalariada alienante é apresentado como uma libertação, uma oportunidade de realização social e de auto-realização. Sobretudo para as mulheres. Hoje em dia, as mulheres orgulham-se de alienar a sua vida a uma empresa que lhes vende a esperança de se poderem endividar para comprar a vida a crédito, para grande lucro dos banqueiros. Pobre mulher! Pensa que é livre. Na realidade, é espremida pelo seu patrão, pelos seus banqueiros e pelos seus credores.

Que degradação moral. Que decadência social, esta emancipação da mulher sob o jugo do capital. Felizes os escravos de outrora que não se orgulhavam da sua condição social servil, conscientes da sua sujeição forçada. Hoje, o escravo assalariado, sobretudo a mulher, orgulha-se de exibir o seu contrato de servidão profissional, o seu recibo de vencimento como um alienado feliz, as quatro semanas de férias concedidas pelo patrão para lhe permitir reconstituir a sua força de trabalho para onze meses de exploração destrutiva.

Dito isto, embora afirme ter libertado as mulheres, a sociedade capitalista continua a confiná-las, em grande medida, a funções domésticas subalternas. De facto, a divisão do trabalho continua a ser sexualmente discriminatória, embora cada vez menos nas sociedades tecnologicamente muito desenvolvidas.

De um modo geral, as mulheres estão maciçamente empregadas em sectores dominados pela educação e pelos hospitais (ensino, enfermagem - não é esse o seu papel essencial ao longo da história: educar os filhos e "cuidar" dos maridos -), em sectores pouco qualificados (caixas, empregadas de limpeza, secretárias, escriturários, empregados de loja, etc.)... que não exigem grande força física.

Na realidade, o capital libertou as mulheres das tarefas educativas e domésticas desempenhadas pelos seus maridos (embora isso não seja verdade, uma vez que, como indicado acima, elas continuam a desempenhar essas tarefas gratuitamente, mas indirectamente ao serviço da sociedade, em particular através da educação das crianças, as futuras forças escravas destinadas a serem compradas pelos capitalistas), apenas para as transformar em escravas assalariadas que desempenham funções servis sob a autoridade dos seus patrões... que é cada vez mais uma mulher opressora e exploradora.

Na sociedade capitalista "altamente civilizada", as mulheres deixam de ser "mães" para cuidar de crianças e adultos em creches, escolas, hospitais, etc., e deixam de ser esposas para servir de secretárias aos seus novos "tutores profissionais", esses "paxás burocráticos", os patrões e as patroas.


É preciso dizer que a actividade principal das mulheres não é a produção propriamente dita, nem a criação e o design, e muito menos a gestão, mas sim as "actividades profissionais e domésticas". As mulheres são geralmente afectadas a funções educativas, domésticas e sanitárias, ou seja, sempre ao serviço das pessoas. A emancipação da mulher moderna do sistema patriarcal degradante para o assalariado desumanizante é uma conquista singular! O feminismo inscreve-se, desde o início, no processo de dissolução das estruturas sociais e familiares ancestrais, impulsionadas pelo capital, com o objectivo de integrar a mulher directamente no processo de produção.

O feminismo apoia-se na pobreza existencial e relacional das mulheres pequeno-burguesas para prosperar com reivindicações fragmentadas e particularistas. Foi menos uma luta social contra a inferiorização da condição feminina do que um conflito psicológico da mulher moderna, dilacerada pelas suas funções contraditórias provocadas pelas transformações sociais e económicas.

A tragédia da mulher moderna, desde o colapso da antiga sociedade patriarcal em que as mulheres tinham um estatuto reconhecidamente inferior, é que ela já não existe como mulher, mas como uma mera "cidadã e proletária" invisível, obrigada, além disso, a lutar numa sociedade baseada na competição e no desempenho moldado pelos homens para se enquadrar social e economicamente.

Incapaz de existir como mulher (com todas as honras devidas ao seu estatuto de mulher protegida pelas velhas formações sociais), numa sociedade baseada na indistinção e na invisibilidade dos sexos, senão como empregada anónima, a mulher, para exprimir a sua frustração, castiga a sociedade patriarcal imaginária (há muito deslocada pelo capital), culpa o autoritarismo fantasmático do macho (na verdade, há muito desintegrado pelo capital, autoridade transferida para o Estado que a exerce violentamente contra todos os membros dominados da sociedade), culpado pela degradação do estatuto da mulher.

No passado, nas sociedades antigas, o cavalheirismo valorizava o estatuto da mulher. Actualmente, a galanteria do valor do capital consiste em alienar as mulheres. Desde a sua criação, o capital reconhece os homens e as mulheres apenas pelas suas funções. Ignora a diferença entre os sexos. Se, no passado, as mulheres eram reconhecidas e valorizadas pelos seus "atributos" de reprodução humana, assegurando a descendência dos seus maridos em nome do sistema patrilinear de filiação, na época contemporânea, a função materna já não define a mulher. A mulher moderna existe apenas no seu papel de escrava assalariada, a sua força de trabalho assegurando a produção de capital e, consequentemente, o enriquecimento dos seus patrões anónimos, os seus novos e verdadeiros senhores, contra os quais o feminismo não luta.

Por tudo isto, o feminismo, ideologia burguesa por essência, sendo produto do capital, não consegue apreender esta dimensão alienante da mulher moderna, compreender a escravatura social e a pobreza humana da mulher contemporânea, supostamente emancipada.

Essencialmente centrado em castigar os homens por estarem em posição de dominação, cultivando uma polarização radical entre homens e mulheres, o feminismo pequeno-burguês revela-se também incapaz de fazer a mínima crítica objectiva ao comportamento masculino tóxico. O ódio reactivo gera inevitavelmente agressões reais ou simbólicas. Não se pode construir relações pacíficas sobre o ódio e a agressão. Esta é a característica essencial do feminismo histérico pequeno-burguês ocidental: como toda a sociedade decadente em que se desenvolve, este feminismo é odioso e agressivo. Para não dizer fascista.

O feminismo contemporâneo é emocional, não racional. Populista, não político. Isto explica o aparecimento do movimento feminista Femen, conhecido pela sua nulidade, ilustrada pela provocação indecente das suas acções histéricas mas, sobretudo, pela sua nudez, materializada pela exibição pública dos seios das suas militantes em luta (cio?).

O feminismo, arma do capital, baseia a sua existência exclusivamente na luta contra a autoridade masculina, encarnação da família patriarcal, segundo as activistas feministas. O inimigo é o homem, não o capital. O mal é o macho. Ora, se há uma "crise antropológica", ela não é feminista, mas civilizacional, provocada pela instauração do sistema capitalista desumano.

Desde que o capitalismo se espalhou pelo planeta, as sociedades foram confrontadas com uma profunda crise de identidade (pessoal, cultural, social, religiosa, radicalmente abalada e virada do avesso pelo capitalismo), desestabilizando as relações humanas.


Contrariamente à retórica ideológica propagada pelo feminismo, o problema fundamental da era moderna, com a sua desumanização das relações sociais, não é a questão da autoridade masculina. Trata-se da extensão maciça de constrangimentos multiformes aviltantes a todos os homens e mulheres do povo, imposta pelos governantes e pelos poderosos, como o ilustra dramaticamente a nossa triste época genocida, marcada pelo despotismo governamental exercido em nome do capital.

Khider MESLOUB

 

Fonte: Le féminisme: symbole d’un processus de déshumanisation généré par le capital – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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