segunda-feira, 17 de julho de 2023

Isto é a NATO... a sua história... a sua razão de ser... O seu futuro

 


17 de Julho de 2023  Robert Bibeau  

Por Timofey Bordachev – 12 de Julho de 2023 – Fonte RT

A crise ucraniana marca a primeira vez na história que os Estados Unidos se expõem a sérios riscos ao definir os limites da sua presença militar na Europa. Qualquer iniciativa real de Washington para convidar Kiev a aderir à NATO implicaria uma vontade de entrar em confronto militar directo com a Rússia. Uma opção menos arriscada, de acordo com muitos observadores, seria prometer ao regime de Vladimir Zelensky garantias bilaterais especiais.

O bloco militar da NATO foi criado com base na divisão efectiva da Europa em zonas de influência entre os EUA e a URSS após a Segunda Guerra Mundial. Em resultado do maior confronto armado da história da humanidade, a maioria dos Estados europeus perdeu para sempre a capacidade de determinar as questões fundamentais da sua política nacional. Estas eram, acima de tudo, a defesa e a capacidade de formar alianças com outros países. A Europa ficou dividida entre os verdadeiros vencedores do conflito, Moscovo e Washington. Só a Áustria, a Irlanda, a Suécia, a Finlândia e uma pequena parte da Suíça escaparam ao seu domínio.

As duas grandes potências tinham o direito informal de determinar a ordem interna dos territórios que controlavam. Com efeito, os países em causa tinham perdido a sua soberania enquanto tal. Mesmo a França, que continuou a mostrar liberdade de pensamento durante várias décadas, não tinha dúvidas sobre de que lado lutaria no caso de um novo conflito mundial.

A NATO foi criada em 1949 para privar formalmente os aliados dos EUA da capacidade de tomar as suas próprias decisões de política externa e desenvolver as suas próprias doutrinas militares. A este respeito, a aliança não era diferente do Pacto de Varsóvia que tinha sido criado dentro da esfera de influência da URSS.

A relação entre os Estados Unidos e outros países da NATO nunca foi uma aliança no sentido tradicional. No século passado, as alianças convencionais deixaram de existir porque o fosso entre as capacidades militares das superpotências nucleares e as de todos os outros países do mundo se tinha tornado demasiado grande.

Uma aliança militar de iguais relativos é possível, como era até meados do século passado, mas as armas nucleares tornaram-na impossível. Os antigos Estados soberanos da Europa tornaram-se uma base territorial a partir da qual as grandes potências podiam negociar em tempo de paz e agir em tempo de guerra. A criação da NATO e a subsequente adesão de países como a Grécia, Turquia, Espanha e Alemanha Ocidental à aliança formalizaram as fronteiras de domínio americano que a URSS já tinha acordado nas relações bilaterais.

Após o colapso da União Soviética, estender o domínio dos EUA aos antigos aliados de Moscovo na Europa Oriental e mesmo às repúblicas bálticas também não era uma política que representasse sérios riscos para Washington. É por isso que a NATO tem uma regra informal de não admitir países com disputas territoriais não resolvidas com países terceiros – os Estados Unidos nunca quiseram ocupar terras disputadas. A expansão da NATO após a Guerra Fria baseou-se no engano, com os EUA a prometerem a Moscovo que não alargariam a NATO às fronteiras da Rússia. Mas, inicialmente, a Rússia não tinha força física para resistir. Isso significava que os EUA poderiam ocupar Estados "não reivindicados" sem a ameaça de um conflito militar imediato. A abordagem americana à NATO manteve-se fiel à filosofia dos vencedores de 1945: não há Estados soberanos, apenas territórios controlados.

Uma vez tomada a decisão em Washington, só restava garantir que os governos locais tomassem as decisões "certas". Especialmente desde que a adesão de novos países à NATO nas décadas de 1990 e 2000 andou de mãos dadas com o alargamento da União Europeia. As elites locais tinham, portanto, todas as razões para aspirar a aderir ao bloco, do qual esperavam benefícios materiais tangíveis. Para alguns – os Estados Bálticos e a Polónia – a adesão ao clube também ajudou a resolver problemas internos através de uma política agressiva anti-russa, incutindo medo ao grande vizinho de Leste. Nos Estados Bálticos, o estatuto de posto avançado americano também foi usado pelas elites para combater qualquer oposição local de nacionalistas radicais.

Para os países que aderiram ao bloco, a NATO tornou-se uma garantia de estabilidade interna. Uma vez que as decisões mais importantes para eles foram tomadas fora do seu sistema político nacional, não havia razão para competição interna nem risco de desestabilização grave.

É claro que nenhum país está imune a pequenas convulsões políticas internas, como as causadas por uma mudança de governo – especialmente se aquele que está no poder não for apreciado pelos Estados Unidos. Mas mudanças radicais, que geralmente dizem respeito a questões de política externa, tornaram-se impossíveis.

Neste sentido, a Europa Ocidental assemelha-se cada vez mais à América Latina, onde a qualidade de vida da população não tem consequências dramáticas para as elites. Nesta região, a proximidade geográfica com os Estados Unidos tem sido uma razão para o controle americano quase total. As únicas excepções foram Cuba e, nas últimas décadas, a Venezuela. Na Europa Ocidental, devido à proximidade da Rússia, este controlo é de natureza formal, o que deve, em princípio, excluir quaisquer surpresas.

A adesão à NATO é uma troca da soberania do Estado pela manutenção indefinida do poder pela elite dominante. Este é o segredo do desejo de qualquer regime político de aderir ao bloco: dá-lhes a oportunidade de serem "imortais", apesar dos seus fracassos nacionais ou económicos. Os regimes da Europa Oriental e dos países bálticos compreenderam imediatamente que não permaneceriam no poder por muito tempo sem estarem sob o controlo de Washington – a ruptura com Moscovo e a posição periférica dos seus países prometeram-lhes demasiados problemas. E se a Finlândia aderiu à NATO, é porque as elites locais já não têm confiança na sua capacidade de manter o poder por conta própria.

Para os próprios Estados Unidos, como vimos, a expansão da sua presença nunca foi uma ameaça ou risco sério. Pelo menos até agora. É precisamente isto que sublinham aqueles que, na América, apelam a uma abordagem cautelosa em resposta às exigências de adesão das autoridades de Kiev. Um apelo apoiado por alguns membros do bloco.

Entende-se que um confronto militar entre Moscovo e a NATO significaria uma guerra nuclear mundial. No entanto, nos tempos soviéticos, os Estados Unidos acreditavam que qualquer conflito com a URSS poderia ser limitado à Europa e não envolveria ataques directos ao território do outro lado. Há razões para acreditar que Moscovo pensava a mesma coisa durante a Guerra Fria.

A expansão da NATO para leste após a Guerra Fria foi uma oportunidade para adquirir um território pelo qual ninguém queria lutar. No entanto, no caso da Ucrânia, não se trata de os Estados Unidos ganharem território, mas sim de o tomarem a uma potência rival que quer manter Washington fora. Isto nunca aconteceu na história da NATO, e é compreensível para aqueles que, na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, apelam a uma reflexão séria sobre as prováveis consequências.

Convidar Kiev a aderir à NATO pode significar algo totalmente novo para a política externa dos EUA – a vontade de lutar contra um adversário de nível semelhante como a Rússia. Ao longo da sua história, os americanos evitaram fazê-lo, usando outros actores como aríetes, dispostos a sacrificar-se e sofrer pelos interesses americanos. Foi assim durante a Primeira e Segunda Guerras Mundiais. O cenário mais provável, portanto, é que os EUA simplesmente prometam abordar a questão da Ucrânia e da Nato assim que o regime de Kiev resolver os seus problemas com a Rússia de alguma forma. Entretanto, só lhes serão prometidas condições "especiais" numa base bilateral.

Por Timofey Bordachev, Director de Programas do Club Valdai.

Traduzido por Wayan, revisto por Hervé, para o Saker Francophone.

 

Fonte: Voici l’OTAN…son histoire…sa raison d’être…son avenir – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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