30 de Setembro de
2022 Robert Bibeau
Hoje, a Rússia e a China propõem aos
chamados "não-alinhados" da América Latina, África e Ásia para se
libertarem das "regras" do imperialismo ocidental
"unipolar" e para defenderem as "regras" do imperialismo "multipolar"...
Lembrem-se do espírito maoísta de Bandung sussurrado pelos comparsas ao ouvido
dos novos bilionários do terceiro mundo.
By Alastair Crooke – 28 de aAosto de 2022 – Fonte Al Mayadeen
Na revista norte-americana National
Interest (uma revista de inclinação conservadora), e numa invulgar
explosão de sinceridade, Ramon Marks publicou um artigo intitulado: "Não
importa quem ganhe a Ucrânia, a América já perdeu".
Neste artigo, Marks observa que "seja
quem for q ganhar a guerra na Ucrânia, os Estados Unidos serão os perdedores
estratégicos. A Rússia estabelecerá relações mais estreitas com a China e
outros países do continente euro-asiático, incluindo a Índia, o Irão, a Arábia
Saudita e os estados do Golfo. Afastar-se-á irrevogavelmente das democracias
europeias e de Washington. Assim como o Presidente Richard Nixon e Henry
Kissinger jogaram a "carta da China" para isolar a União
Soviética durante a Guerra Fria, os Presidentes Vladimir Putin e Xi Jinping vão
jogar as suas cartas para tentar conter a liderança mundial dos Estados Unidos.
Colocada de lado a
piscadela de olho à narrativa ocidental que sugere que a questão permanece em
aberto ("não
importa quem ganhe"), a essência do artigo do National Interest está "certa", embora distorça
completamente o contexto.
A Rússia e a China
estão certamente empenhadas numa tentativa de alterar a "ordem baseada nas regras" dos
Estados Unidos. Não para substituir uma hegemonia por outra, mas sim para criar uma
pressão – sem guerra – que força uma transformação existencial da mente
ocidental. Uma pressão que deixa o Ocidente com pouca escolha a não ser pôr fim
ao seu expansionismo, forçando-o a obedecer às suas "regras" (também
conhecidas como neo-colonialismo).
Sim, a Rússia e a
China estão agora a jogar as suas "cartas" geo-estratégicas. E, de certa
forma, são "cartas" muito
familiares. Estes são os princípios da auto-determinação e do respeito pela
soberania que emergiram da reunião de Bandung em 1955 e serviram de
base ao Movimento
Não Alinhado da época. Reflectiram o descontentamento dos organizadores da
conferência com a relutância do Ocidente em os ouvir e, pelo contrário, a sua
tendência para impor o seu ponto de vista singular aos Estados asiáticos.
Assim, tal como os EUA
jogaram a carta do domínio do dólar
apoiado pelos militares nos anos que se seguiram à implosão da União Soviética
para trazer grande parte do mundo para a sua esfera baseada no domínio, também
a Rússia e a China estão agora a oferecer ao Sul colectivo, África e Ásia a
oportunidade de se libertarem das "regras" ocidentais. Estão a
encorajar o "resto do mundo" a afirmar a sua autonomia e
independência, ao estilo Bandung- (o domínio do dólar data de 1944 e o Acordo
de Bretton Woods e o seu reforço sob Nixon em 1971). ).
A Rússia, em parceria com a China, está
a construir estas extensas relações políticas sobre o controlo do fornecimento
mundial de combustíveis fósseis e de grande parte da comida e matérias-primas
do mundo. Para aumentar ainda mais a sua influência sobre as fontes de energia de
que dependem os beligerantes ocidentais, a Rússia está a criar uma "OPEP" de
gás com o Irão e o Qatar, e também fez com que as incursões da Arábia
Saudita e dos Emirados Árabes Unidos se unissem para reforçar o controlo de
todos os produtos energéticos essenciais.
Além disso, estes grandes produtores estão a juntar-se aos grandes
compradores para arrebatar os mercados de metais preciosos e mercadorias das
mãos de Londres e dos Estados Unidos, a fim de impedir a manipulação ocidental
dos preços das matérias-primas através dos mercados de derivados.
O argumento apresentado pelas autoridades russas a outros Estados é simultaneamente extremamente atractivo e simples: o Ocidente virou as costas aos combustíveis fósseis e planeia eliminá-los completamente no espaço de uma década.
Escolheram este caminho sob intensa
pressão dos Estados Unidos; um caminho que, no caso da Europa, irá impor
miséria aos seus povos nos anos vindouros.
No entanto, por mais desagradável que possa ser para alguns, a verdade é
que o crescimento económico mundial ainda requer a producção de combustíveis
fósseis. Sem mais investimento e exploração, é pouco provável que a oferta seja
suficiente a médio prazo para satisfazer a procura provável. Não há uma maneira
rápida de aumentar o fornecimento físico de energia.
A mensagem da Rússia
aos seus parceiros é a seguinte: não é preciso participar nesta "política masoquista de
sacrifício". Pode-se ter petróleo e gás natural a um preço mais baixo do que a
Europa tem de pagar. O "Bilião de Ouro" tem gozado dos
benefícios da modernidade, e agora quer que desista de tudo isto e exponha os
seus eleitores a dificuldades extremas.
A Rússia diz
simplesmente: "Não tem de ser assim".
Sim, o clima é um factor, mas há uma falta aguda de investimento em
combustíveis fósseis por razões ideológicas, e não por razões de esgotamento por
si só.
O que é necessário reter, é que o ponto de partida inicial de Bandung foi que o Ocidente simplesmente se recusa a "ouvir"; dirige e impõe. No entanto, a ideologia verde ocidental não pode simplesmente ser imposta ao resto do mundo, contra a sua vontade. Este argumento representa o caminho a seguir para que a Rússia e a China coloquem grande parte do mundo no seu campo.
Ao apertar o parafuso
da energia para dar algum peso ao seu argumento, a Rússia está a dar à UE um
aviso claro de que a classe política da Europa Ocidental pode ou salvar a sua
própria pele ao voltar ao gás russo barato, ou permanecer alinhada com
Washington sobre a Ucrânia. No entanto, neste último caso, terão de mergulhar o
seu eleitorado na miséria. Com o risco de os seus líderes enfrentarem o "inconveniente" de uma
revolta de à la lanterne
(levar para a forca – NdT). Mas a UE não pode fazer as duas coisas.
O que importa acima de tudo é a natureza da metamorfose europeia. É táctico ou é uma verdadeira "Estrada de Damasco"? Encontraremos, na sequência da crise energética russa, uma UE suficientemente ponderada para iniciar negociações não ideológicas sobre a segurança e as aspirações civilizacionais dos outros, bem como um intercâmbio baseado em formas de proteger o planeta de novas depredações?
Alastair Crooke
Traduzido por Zineb,
revisto por Wayan, para o Saker Francophone
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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