sexta-feira, 30 de junho de 2023

A Ucrânia já não existe... viva a FDU (Pepe Escobar)

 


 30 de Junho de 2023  Robert Bibeau 


Por Pepe ESCOBAR

É fascinante ver como os correspondentes de guerra russos estão agora a desempenhar um papel semelhante ao dos antigos comissários políticos da URSS.

A reunião do Presidente Putin com um grupo de correspondentes de guerra russos e bloguistas do Telegram - incluindo Filatov, Poddubny, Pegov do War Gonzo, Podolyaka, Gazdiev da RT - foi um exercício extraordinário de liberdade de imprensa.

Entre eles estavam alguns jornalistas seriamente independentes que podem ser altamente críticos em relação à forma como o Kremlin e o Ministério da Defesa (MoD) estão a conduzir o que pode ser alternativamente definido como uma operação militar especial (SMO); uma operação de contra-terrorismo (CTO); ou uma "quase guerra" (de acordo com alguns círculos empresariais influentes em Moscovo).

É fascinante ver como estes jornalistas patriotas/independentes estão agora a desempenhar um papel semelhante ao dos antigos comissários políticos da URSS, todos profundamente empenhados, à sua maneira, em orientar a sociedade russa no sentido de, lenta mas seguramente, drenar o pântano.

É evidente que Putin não só compreende o seu papel, como também que, por vezes, "como um choque para o sistema", o sistema a que preside põe efetivamente em prática as sugestões dos jornalistas. Como correspondente estrangeiro que trabalha em todo o mundo há quase 40 anos, fiquei muito impressionado com a forma como os jornalistas russos podem desfrutar de um grau de liberdade inimaginável na maioria das latitudes do Ocidente colectivo.

A transcricção da reunião feita pelo Kremlin mostra que Putin não está de modo algum inclinado a fazer rodeios.

Admitiu que havia "generais de opereta" no exército, que havia falta de drones, munições de precisão e equipamento de comunicações, o que está agora a ser resolvido.

Discutiu a legalidade dos grupos mercenários, a necessidade de criar uma "zona tampão", mais cedo ou mais tarde, para proteger os cidadãos russos dos bombardeamentos sistemáticos do regime de Kiev, e sublinhou que a Rússia não responderia ao terrorismo inspirado em Bandera com terrorismo.

Depois de analisar as trocas de opiniões, uma conclusão é clara: os meios de comunicação russos não estão a preparar uma ofensiva, apesar de o Ocidente colectivo estar a atacar a Rússia 24 horas por dia, 7 dias por semana, com o seu enorme aparelho mediático de ONG e soft power. Moscovo não está - ainda? - totalmente empenhada nas trincheiras da guerra de informação; de momento, os meios de comunicação russos estão apenas a jogar à defesa.

Até Kiev?

Talvez a citação mais interessante de toda a reunião tenha sido a avaliação concisa e arrepiante que Putin fez da nossa actual posição no tabuleiro de xadrez:

"Fomos forçados a tentar acabar com a guerra que o Ocidente começou em 2014 pela força das armas. E a Rússia vai acabar com esta guerra pela força das armas, libertando todo o território da antiga Ucrânia dos Estados Unidos e dos nazis ucranianos. Não há outras opções. O exército ucraniano dos Estados Unidos e da NATO será derrotado, independentemente das novas armas que receber do Ocidente. Quanto mais armas receber, menos ucranianos e menos do que era a Ucrânia restará. A intervenção directa dos exércitos europeus da NATO não fará qualquer diferença. Mas, nesse caso, o fogo da guerra envolverá toda a Europa. Parece que os Estados Unidos também estão prontos para isso.

Em suma, esta guerra só terminará nos termos da Rússia, e apenas quando Moscovo considerar que todos os seus objectivos foram alcançados. Tudo o resto é pensamento ilusório.

De volta à linha da frente, como salientou o indispensável Andrei Martyanov, o correspondente de guerra de primeira classe Marat Kalinin expôs de forma conclusiva como a actual contra-ofensiva ucraniana de caixões de metal nem sequer foi capaz de atingir a primeira linha de defesa russa (estão a uns longos - infernais - 10 km de distância). Tudo o que o melhor exército da NATO alguma vez reunido conseguiu até agora foi ser impiedosamente massacrado a uma escala industrial.


Aqui está o Armagedom Geral em acção.

Surovikin teve oito meses para se estabelecer na Ucrânia e, desde o início, compreendeu exactamente como transformar a situação num jogo totalmente novo. A estratégia consiste, provavelmente, em destruir completamente as forças ucranianas entre a primeira linha de defesa - partindo do princípio de que alguma vez a atravessam - e a segunda linha, que é bastante importante. A terceira linha permanecerá fora dos limites.

Os meios de comunicação ocidentais colectivos entram previsivelmente em pânico e começam finalmente a mostrar as perdas horríveis sofridas pela Ucrânia, demonstrando a total incompetência acumulada pelos capangas de Kiev e pelos seus manipuladores militares da NATO.

E, para o caso de as coisas se complicarem - o que, neste momento, é uma possibilidade remota -, o próprio Putin entregou o roteiro. Devagar, devagarinho. Como em: "Devemos marchar sobre Kiev? Se sim, precisamos de uma nova mobilização, se não, não precisamos. Não há necessidade de nos mobilizarmos já".

A palavra-chave é "imediatamente".

O fim de todos os vossos planos elaborados

Entretanto, longe do campo de batalha, os russos estão muito atentos à frenética actividade geo-económica.

Moscovo e Pequim negoceiam cada vez mais em yuanes e rublos. Os dez países da ASEAN estão a mergulhar de cabeça na criação de moedas regionais, ignorando o dólar. A Indonésia e a Coreia do Sul estão a acelerar o seu comércio em rupias e won. O Paquistão está a pagar o petróleo russo em yuan. Os Emirados Árabes Unidos e a Índia estão a aumentar o seu comércio não petrolífero em rupias.

Cada um e o seu vizinho preparam-se para aderir aos BRICS+, obrigando um hegemon desesperado a lançar mão de toda uma série de técnicas de guerra híbrida.

Tem sido um longo caminho desde que Putin olhou para o tabuleiro de xadrez no início dos anos 2000 e depois desencadeou um programa de mísseis defensivos e ofensivos.

Ao longo dos 23 anos seguintes, a Rússia desenvolveu mísseis hipersónicos, ICBMs avançados e os mísseis defensivos mais avançados do planeta. A Rússia ganhou a corrida aos mísseis. Ponto final. O Hegemon, obcecado com a sua própria guerra contra o Islão, estava completamente impreparado e não fez quaisquer avanços materiais em matéria de mísseis durante quase duas décadas e meia.

Actualmente, a "estratégia" consiste em inventar do nada a questão de Taiwan, o que faz do tabuleiro de xadrez a antecâmara de uma guerra híbrida impiedosa contra a Rússia e a China.

O ataque por procuração - através das hienas de Kiev - ao Donbass russófono, encorajado pelos psicopatas neo-conservadores straussianos responsáveis pela política externa dos EUA, assassinou pelo menos 14 000 homens, mulheres e crianças entre 2014 e 2022. Foi também um ataque à China. O objectivo final desta manobra de "dividir para reinar" era infligir uma derrota ao aliado da China no Heartland, a fim de isolar Pequim.

De acordo com o sonho molhado dos neo-conservadores, tudo isto teria permitido ao Hegemon, uma vez recuperado o controlo da Rússia, como aconteceu com Ieltsin, bloquear o acesso da China aos recursos naturais russos, utilizando onze task-force de porta-aviões dos EUA e numerosos submarinos.

É evidente que os neo-conservadores, incapazes de adquirir qualquer conhecimento de ciência militar, não sabem que a Rússia é actualmente a maior potência militar do planeta.

Na Ucrânia, os neo-conservadores esperavam que uma provocação levasse Moscovo a utilizar outras armas secretas para além dos mísseis hipersónicos, para que Washington pudesse preparar-se melhor para uma guerra total.

Todos estes planos elaborados podem ter falhado redondamente. Mas há um corolário que se mantém: os neo-conservadores straussianos acreditam firmemente que podem instrumentalizar alguns milhões de europeus - quem será o próximo? Os polacos? Os estónios? Os letões? Os lituanos? E porque não os alemães? - como carne para canhão, como os Estados Unidos fizeram na Primeira e na Segunda Guerras Mundiais, sobre os cadáveres dos europeus (em particular dos russos) sacrificados pela mesma velha conquista anglo-saxónica de Mackinder.


Hordas de quintas-colunas europeias tornam muito fácil "confiar" nos Estados Unidos para os proteger, enquanto apenas algumas pessoas com um QI acima da temperatura ambiente compreenderam quem realmente bombardeou o Nord Stream 1 e 2, com a conivência do chanceler alemão das salsichas de fígado.

Em última análise, o hegemon simplesmente não pode aceitar uma Europa soberana e auto-suficiente, mas apenas um vassalo dependente, refém dos mares controlados pelos EUA.

Putin vê claramente como o tabuleiro de xadrez foi montado. E também consegue ver que a "Ucrânia" já nem sequer existe.


Enquanto ninguém estava a prestar atenção, no mês passado, o bando de Kiev vendeu a Ucrânia à BlackRock, que vale 8,5 mil milhões de dólares. Foi assim que aconteceu. O acordo foi estabelecido entre o governo ucraniano e Philipp Hildebrand, vice-presidente da BlackRock.

Estão a criar um Fundo de Desenvolvimento Ucraniano (FDU) para a "reconstrucção", centrado na energia, nas infra-estruturas, na agricultura, na indústria e nas tecnologias da informação. Todos os activos valiosos que restarem na Ucrânia serão engolidos pela BlackRock: desde a Metinvest, DTEK (energia) e MJP (agricultura) até à Naftogaz, caminhos-de-ferro ucranianos, Ukravtodor e Ukrenergo.

Então, qual é o interesse de viajar para Kiev? O neo-liberalismo tóxico de alto nível já está a dar uma festa lá.

Pepe Escobar

Fonte: Strategic Culture Foundation

tradução Réseau International

»» https://reseauinternational.net/poutine-et-ce-qui-compte-vraiment-sur-...


Fonte deste artigo: L’Ukraine n’existe plus…vive le FDU (Pepe Escobar) – les 7 du quebec

Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis Júdice




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