7 de Outubro de 2022 Robert Bibeau
Meyssan. Na Réseau Voltaire.
Enquanto a imprensa
internacional lida com a sabotagem dos gasodutos Nord Stream numa
perspectiva noticiosa, analisamo-la como um acto de guerra contra a Rússia, a
Alemanha, os Países Baixos e a França. Com efeito, as três rotas de
abastecimento de gás para os europeus ocidentais acabam de ser cortadas
simultaneamente, enquanto, ao mesmo tempo, acaba de ser inaugurado um novo
gasoduto para a Polónia.
Tal como Mikhail Gorbachev considerou o desastre de
Chernobil como a inevitável ruptura da URSS, acreditamos que a sabotagem dos
gasodutos Nord Stream marca o início da queda económica da União Europeia.
Fotografia de satélite russa das águas borbulhantes após a sabotagem do Nord Stream.
A luta dos Estados Unidos para manter a sua
hegemonia mundial passou a sua terceira fase.
Após o alargamento da NATO ao Leste, violando os compromissos ocidentais em
matéria de não estabelecimento de armas norte-americanas na Europa Central, a
Rússia, que não pode defender as suas gigantescas fronteiras, está directamente
ameaçada.
Em violação dos
compromissos da Segunda Guerra Mundial, Washington colocou "nacionalistas
integrais" ("nazis" na terminologia
do Kremlin) no poder em Kiev. Proibiram os seus compatriotas de língua russa de
falarem a sua língua materna, privaram-nos dos serviços públicos e acabaram por
bombardear os do Donbass. A Rússia não teve escolha a não ser intervir
militarmente para acabar com a sua provação. (Ver: https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2022/10/sobre-os-referendos-no-donbass.html
).
A terceira ronda é a mudança autoritária no fornecimento de energia da
Europa Ocidental e Central. No mesmo dia em que o Gasoduto báltico
(Baltic
Pipe) entrou em funcionamento, os dois oleodutos Nord Stream foram
postos fora de funcionamento, enquanto a manutenção da Turkish Stream foi interrompida.
Esta é a maior
sabotagem da história. Um
acto de guerra contra a Rússia (51%) e contra a Alemanha (30%), co-proprietários
destes investimentos colossais, mas também contra os seus parceiros, a Holanda
(9%) e a França (9%)". De momento, nenhuma das vítimas reagiu
publicamente.
Para alcançar esta
destruição considerável, era necessário ter submarinos na área que os poderes
da região identificaram. Se não há oficialmente pistas, no sentido policial do
termo, as "câmaras de vigilância" (sonares) já falaram. Os Estados em
causa sabem com certeza quem é o culpado. Ou não reagem, e serão varridos
politicamente do mapa, ou preparam secretamente as suas reacções a esta acção secreta e
tornar-se-ão verdadeiros actores políticos quando as levarem a cabo.
Recordemos o golpe militar de 1961 e as tentativas de assassinato contra o
Presidente da República Francesa, Charles De Gaulle, que se seguiram. Este
último fingiu acreditar que eram obra da Organização do Exército Secreto (OEA)
que reunia franceses que se opunham à independência da Argélia. Mas o seu
ministro dos Negócios Estrangeiros, Maurice Couve de Murville, falou
publicamente sobre o papel da Opus Dei espanhola e da CIA dos EUA na sua
organização e financiamento. De Gaulle procurou e identificou traidores,
reorganizou a polícia e os exércitos, e de repente, cinco anos depois, anunciou
a retirada da França do comando integrado da NATO.
Deu-lhe duas semanas
para fechar a sua sede em Paris-Deuphine e migrar para a Bélgica; um pouco mais
de tempo para fechar as 29 bases militares da Aliança no país. Depois, começou
a viajar para o estrangeiro para denunciar a hipocrisia americana, incluindo a
Guerra do Vietname. A França tornou-se instantaneamente uma potência líder nas
relações internacionais. Estes acontecimentos nunca foram explicados em
público, mas todos os políticos da época podem confirmá-los [1]..
Depois do fim da União Soviética, os Estados Unidos elaboraram um mapa do mundo que perturba as relações internacionais, levando-os a derrubar governos e a combater guerras, a construir rotas para o transporte de fontes de energia. Esta foi a principal actividade do Vice-Presidente Al Gore durante oito anos, é agora a do Conselheiro Especial Amos Hochstein. Lembramo-nos da guerra da Transnístria para se apoderar de um centro de gasodutos [2], depois da guerra do Kosovo para construir uma rota de comunicação através dos Balcãs, o "8º corredor". Agora todas as outras peças do puzzle estão a descoberto.
É particularmente
difícil compreender o mal que acaba de acontecer à União Europeia e que irá,
muito provavelmente, provocar o seu colapso económico, porque a própria União tomou algumas das
decisões necessárias para a sua falência.
Até 26 de Setembro de
2022, a União era maioritariamente abastecida pela Rússia com gás. Era
transportado através do gasoduto Brotherhood seja através da Ucrânia, ou do gasoduto Nord
Stream, ou através do Turkisch Stream. Os Estados Unidos,
que garantem a segurança da União,
acabam de cortar sucessivamente estes três caminhos. É claro que o
gasoduto Brotherhood ainda está parcialmente a funcionar, mas pode ser definitivamente
interrompido a qualquer momento pela vontade de Kiev, o Nord Stream foi
sabotado e o Turkisch Stream já não pode ser mantido devido às
sanções que a União tomou a pedido dos EUA. (Ver: https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2022/10/escalada-na-guerra-da-nato-contra.html
e ver também:
https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2022/10/porque-e-que-os-americanos-sabotaram-os.html?)
Há onze anos, os europeus celebraram a sua união com a Rússia. Acreditavam que estavam a construir um mundo pacífico e próspero.
Até 26 de Setembro, a economia da União baseava-se principalmente na producção da indústria alemã. Ao cortar o Nord Stream, os Estados Unidos destruíram a indústria alemã. Nas famosas palavras de Lord Ismay, primeiro secretário-geral da NATO, a "grande estratégia" dos anglo-saxões é "manter os americanos lá dentro, os russos lá fora e os alemães sob tutela".
Ronald Reagan opôs-se à entrega de gás russo à França e à Alemanha. Depois de tomar sanções fúteis contra empresas de ambos os países, ordenou a William Casey, o director da CIA, para sabotar o gasoduto Yamal na Polónia. O que foi feito.
Esta política tem sido prosseguida por todas as administrações norte-americanas, sem interrupções desde os anos 50. O Nord Stream foi construído por 9 estados, 4 dos quais proprietários. Começou a funcionar em 2011. Desde o mandato de Donald Trump, em 2017, o Congresso norte-americano tem ameaçado sanções contra empresas envolvidas na operação do Nord Stream 1 e as envolvidas no projecto Nord Stream 2. O próprio Presidente Trump escarneceu da vassalagem alemã por beber gás russo. Foram lançados muitos obstáculos jurídicos para obstruir o gás russo na Europa Ocidental, não só pelos Estados Unidos, mas também pela Polónia. Deste ponto de vista, a nova administração dos EUA não mudou nada. A Alemanha estava errada ao acreditar que era mais benevolente. (Ver: https://queonossosilencionaomateinocentes.blogspot.com/2022/09/o-espectro-da-alemanha-belica-ergue-se.html ).
É certo que, em Julho de 2021, tinha sido alcançado um acordo segundo o qual o Nord Stream 2 seria substituído por hidrogénio fabricado... na Ucrânia e transportado, a partir de 2024 (data do fim do contrato russo-ucraniano), graças ao antigo gasoduto Brotherhood convertido.
Eleito em Dezembro de 2021, o chanceler
Olaf Scholz cometeu dois erros graves numa questão de meses.
Mal eleito, a 7 de Dezembro, foi à Casa Branca onde tentou resistir aos
Estados Unidos que lhe pediram para parar de aceitar gás russo. Em casa, optou
por manter o Nord Stream e, enquanto procurava fontes
renováveis, bloqueou o Nord Stream 2 e implementou o acordo de
Julho. Pensou, erradamente, em equilibrar a guerra do pensamento estratégico
dos EUA, as necessidades da sua indústria e a doutrina dos Verdes, membros da
sua Coligação governamental.
O Chanceler suou: durante a conferência de imprensa que realizou com o Presidente dos EUA, Joe Biden tinha dito que o seu país poderia destruir o Nord Stream 2 e que, se a Rússia invadisse a Ucrânia, o faria. Foi absolutamente assustador para Scholz ouvir o seu senhor cuspir na cara que poderia destruir um investimento de dezenas de biliões de dólares se um terceiro agisse sem ter em conta os seus ditames. Não sabemos se o Presidente Biden também mencionou a destruição do Nord Stream 1 durante as discussões à porta fechada, mas não é impossível. Em todo o caso, de acordo com os jornalistas alemães que o seguiram, o Chanceler tinha regressado à Alemanha de forma lívida.
O seu segundo erro foi
cometido a 16 de Setembro de 2022. O seu país desejava estar livre da tutela
anglo-saxónica e garantir a sua própria segurança e a de toda a União Europeia.
Como a nação mais populosa, com a maior potência económica e localizada no
centro do continente, o nosso exército deve tornar-se o pilar da defesa
convencional na Europa", disse o Chanceler. Ao especificar que estava a
falar apenas de "defesa convencional", pretendia poupar a
susceptibilidade do seu vizinho francês, a única potência nuclear da União. Não
percebeu que estava a violar a doutrina Straussiana ao imaginar que estava a
fugir do protectorado militar dos EUA. Em 1992, Paul Wolfowitz assinou a Orientação
política de defesa, dos quais excertos foram publicados no New York
Times. Indicou que os Estados Unidos considerariam qualquer desejo de
emancipação europeia como um casus belli [3].
Seis dias depois, os Navy Seals faziam explodir os dois gasodutos no Mar Báltico, fazendo a Alemanha regredir onze anos.
O acto de guerra contra a Rússia, a Alemanha, os Países Baixos e a França
obriga-nos a repensar os acontecimentos na Ucrânia. É muito mais importante do
que o que o precedeu na medida em que os Estados Unidos atacaram os seus
aliados. Expliquei longamente em artigos anteriores o que os straussianos
procuravam com as suas provocações na Ucrânia. O que acaba de acontecer
mostra-nos porque é que Washington, enquanto Estado, apoia o projecto
straussiano, e que a sua "grande estratégia" não mudou desde os anos
50.
Em 2017, um presidente dos EUA, Donald Trump, veio participar no lançamento da Iniciativa Dos Três Mares. Washington ganha muitas vezes porque vê para além dos seus aliados.
Na prática, se não for dada qualquer resposta a este acto de guerra, a União Europeia entrará em colapso económico, à excepção da Polónia e dos seus onze aliados da Europa Central, membro da Iniciativa Dos Três Mares (Intermarium) [4]. A maré está a mudar. Agora Varsóvia está na liderança.
Os grandes perdedores serão a Europa Ocidental e a Rússia, mas também a
Ucrânia, que só foi destruída para permitir este jogo de massacres.
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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