9 de Junho de 2024 ROBERTO GIL
Pesquisa realizada por Robert Gil
A fome contribui para a morte de um ser humano a cada quatro segundos. Em Setembro
de 2022, cerca de 230 ONG denunciaram a inacção dos poderes públicos face ao
escândalo da fome, que é responsável pela morte de cerca de 9 milhões de
pessoas por ano, ou seja, mais de um décimo de todas as mortes no mundo, logo a
seguir ao cancro e atrás das doenças cardiovasculares. A fome é também
responsável por metade das mortes de crianças com menos de cinco anos... mas,
para além de declarações vazias, nada muda. De onze em onze anos, temos um
total de 100 milhões de mortes, de quem é a culpa? Mau tempo, problemas
técnicos, qualidade das sementes, má organização... capitalismo? não, deve ser
azar, e é pena que continue, não podemos chamar-lhe Holodomor... não há
vestígios de comunismo!
Em Inglaterra, a primeira revolução industrial fez-se à custa dos
camponeses. A densa rede de aldeias desapareceu, mas foi criada uma “oficina
mundial”. Em 1850, a fome causada pela “praga da batata”, combinada com a
política fundiária do governo britânico, levou à morte de mais de 1 milhão de
irlandeses (numa população de 8 milhões) na Terra do Trevo.
No Japão, no início da década de 1930, milhões de agricultores japoneses
sofriam de subnutrição e a fome generalizou-se em Hokkaido, Okinawa e no norte
de Honshu. Ao mesmo tempo, o Império do Japão continuou a industrializar-se,
construindo caminhos-de-ferro, armando-se rapidamente, construindo uma marinha
poderosa e moderna e reconstruindo antigos arsenais. A fome em massa era comum
em todo o mundo durante este período. Muitos países europeus, especialmente na
Europa de Leste, viviam da mão para a boca nesta altura. Na República Checa, os
pobres sofriam de subnutrição, apesar de o país ser considerado o mais próspero
dos Estados criados após a Primeira Guerra Mundial. Na Polónia e na Roménia, a
maioria dos cidadãos comuns passava fome. Na Polónia, os camponeses da Galiza e
da região de Hutsul, do oeste da Bielorrússia e da região de Vilna passavam
fome.
Nos EUA, no auge da Grande Depressão, centenas de milhares de pessoas
morreram. Não se fala de distribuição aos famintos e desempregados, como se o
“mercado” resolvesse o problema. A África estava a passar fome, especialmente a
Etiópia, onde as quebras de colheitas eram uma ocorrência regular. Esta
situação mantém-se até aos dias de hoje. A fome chinesa de 1928-1930, que
atingiu o noroeste e o norte da China, nomeadamente as províncias de Henan,
Shaanxi e Gansu, fez cerca de 3 milhões de vítimas. Entre 1810 e 1849, registaram-se
quatro fomes na China, que provocaram a perda de 45 milhões de vidas. Até 1949,
a China foi colonizada pelas potências ocidentais e pelo Japão.
Os franceses provocaram uma fome no Vietname no início dos anos 30:
obrigaram os camponeses da Indochina a abandonar o cultivo do arroz e da
batata-doce em favor da produção de juta e de algodão, que prometiam mais
rendimentos e eram necessários para a economia de guerra. Os armazéns de
géneros alimentícios existentes, criados em caso de fome devido a más
colheitas, foram liquidados. Esta situação conduziu à fome, que continuou
durante a ocupação japonesa. Os vietnamitas alimentaram as tropas japonesas. Em
consequência, morreram mais de 3 milhões de pessoas.
No início da década de 1940, a fome começou em Bengala (actual Bangladesh). A fome foi também provocada pela administração colonial britânica, que dominava os nativos locais. De acordo com os dados britânicos, 1,5 milhões de pessoas morreram de fome e de epidemias, enquanto os dados indianos apontam para 9 milhões. Entre 1757 e 1947, mais de 30 milhões de pessoas morreram em fomes forçadas devido ao imperialismo britânico, segundo dados apresentados pelo político indiano Shashi Tharoor no livro Inglorious Empire: What the British Did to India, de 2016.
Em 1932, as colheitas foram fracas na URSS. Uma série de fomes mortais
atingiu as regiões e repúblicas do Cazaquistão, Volga, Kuban e Ucrânia.
Infelizmente, esta era uma situação recorrente tanto no Império Russo como na
jovem Rússia Soviética. Esta situação não era nova: no Império Russo, no tempo
dos czares, os anos de escassez ocorriam regularmente e a fome assolava certas
províncias ou distritos. A fome russa de 1891-1892 foi uma das mais importantes
que afectou a Rússia no século XIX. Matou mais de dois milhões de pessoas ao
longo do Volga, desde os Urais até ao Mar Negro... mas não se chamou Holodomor.
Na terça-feira, 28 de Março de 2023, a Assembleia Nacional Francesa
reconheceu a fome de Holodomor dos anos 30 na Ucrânia como genocídio,
atribuindo-a a Estaline e ao comunismo. As outras fomes, as outras centenas de
milhões de mortos, foram relegadas para o caixote do lixo da história. Esta
decisão é puramente política. Era necessário um inquérito ou um debate entre
historiadores? Não, para que uma fome seja classificada como Holodomor, basta
que haja vestígios de comunismo!
Referência
Histoire et Société, 09/04/2024: “O mito de que a liberdade da Índia foi conquistada de forma não violenta é um travão”.
Fonte: Avant, il n’y avait pas d’Holodomor, après, non plus – les 7 du quebec
Este artigo foi traduzido para Língua Portuguesa por Luis
Júdice
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